SOUZA, EG. Eutanásia e responsabilidade médica

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A EUTANÁSIA, O DIREITO À VIDA E SUA TUTELA PENAL Á LUZ
DA CONSTITUIÇÃO
AMÉRICO DONIZETE BATISTA
Bacharel em Direito pelo Instituto Municipal de Ensino Superior de Bebedouro SP – IMESB,
Mestrando em Direito pelo Centro Universitário Toledo/UNITOLEDO de Araçatuba SP.
RESUMO
Este trabalho se propõe a analisar a questão da eutanásia no Direito Pátrio, por meio de uma
discussão aprofundada de caráter filosófico, político, religioso e, fundamentalmente, jurídico.
A eutanásia é uma forma de eliminação da vida, motivada na vontade de abreviar um
sofrimento, de caráter iminentemente individual, de uma pessoa que está em grave situação de
saúde, sem esperança de se curar. Essa conduta é atualmente ilícita no ordenamento jurídico
penal brasileiro, enquadrando-se no crime do art. 121 do Código Penal. A Eutanásia confronta
com os princípios de ordem religiosa, considerando que a sociedade brasileira é estruturada na
fé cristã e isso gera uma oposição em relação à adoção desse tipo de excludente de ilicitude no
país. A Constituição Federal consagra a vida como direito fundamental, que deve ser
resguardada de todas as formas de ameaça ou lesão, de forma irrenunciável. Por outro lado,
em razão da liberdade de escolha há quem defenda o direito do indivíduo em viver ou não.
Isto gera um contraste entre o direito à vida e o direito de morrer, que precisa ser enfrentado
para responder o questionamento sobre se é pertinente permitir ou recriminar a eutanásia.
Entretanto, o maior dos direitos, sem dúvida, é o direito à vida. No entanto, o trabalho parte
de uma comparação entre as posições favoráveis e contrárias, inclusive verificando o
entendimento dos Tribunais, buscando resolver esse conflito de valores e interesses.
PALAVRAS-CHAVES
Direito à vida; eutanásia; liberdade de escolha; direito de morrer.
ABSTRACT
This work intends to analyze the question of the euthanasia in the Native Law, by means of a
deepened discussion of philosophical politician, religious and basically, legal character. The
euthanasia is a form of elimination of the life, motivated by the will to shorten a suffering, of
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imminently individual character, of a person who is in a bad situation of health, without hope
of if cure. This behavior is currently illicit in the Brazilian criminal system, being fit in the
crime of art. 121 of the Criminal Code. The Euthanasia collides with the principles of
religious order, considering that Brazilian society is structured in the Christian faith and this
generates an opposition in relation to the adoption of this type of exculpatory of illegality in
the country. The Federal Constitution consecrates the life as a fundamental and irreversible
right, that must be protected against all the forms of threat or injury, of inrenounce. On the
other hand, due to the reason of the choice freedom there is who defends the right of the
individual to live or not. This generates a contrast between the right to live and the right to
die, which it needs to be faced to answer the question about the pertinence to allow or to
recriminate the euthanasia. However, the greatest of the rights, without a doubt, is the right to
the life. The work starts with the comparison between the favorable and contrary positions,
also verifying the understandings of the Courts, in order to decide this conflict of values and
interests.
KEYWORDS
Right to the life; euthanasia; choice freedom; Right to die.
RESUMEN
Este estudio tiene como objetivo examinar la cuestión de la eutanasia la ley en el hogar, a
través de un amplio debate de carácter filosófico, político, religioso y, sobre todo, legal. La
eutanasia es una forma de eliminación de la vida, motivado el deseo de acortar el sufrimiento
de carácter inminente, una persona que está en grave estado de salud, sin esperanza de cura.
Esta conducta es actualmente ilegal en la legislación penal brasileña, se inscribe en el crimen
de arte. 121 del Código Penal. La eutanasia se enfrentan con los principios de la orden
religiosa, teniendo en cuenta que la sociedad brasileña se estructura de la fe cristiana y que
crea una oposición en relación con la adopción de tal exclusión ilegal del país. La
Constitución consagra el derecho fundamental a la vida, que debe ser protegido contra toda
forma de amenaza o del agravio, de manera ineludible. Además, a causa de la libertad de
elección son aquellos que defienden el derecho de las personas a vivir o no. Esto crea un
contraste entre el derecho a la vida y derecho a morir, que hay que hacer frente para responder
a la pregunta de si es conveniente para permitir la eutanasia o recriminate. Sin embargo, el
mayor de los derechos, sin duda, es el derecho a la vida. Sin embargo, el trabajo parte de una
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comparación entre las posiciones a favor y en contra, incluida la comprobación de la
comprensión de los tribunales, la búsqueda de resolver este conflicto de valores e intereses.
PALABRAS LLAVES
Derecho a la vida, la eutanasia, la libertad de elección, derecho a morir.
Este estudo faz uma análise da questão da Eutanásia no Direito Pátrio,
empreendendo uma discussão aprofundada, que abrange o caráter filosófico, político,
religiosos e, fundamentalmente, o jurídico.
A eutanásia pode ser conceituada como a eliminação da vida alheia, praticada
por um relevante valor moral, com o intuito de livrar um doente, sem esperança de cura, dos
inúmeros sofrimentos que vem passando. O ordenamento brasileiro, de forma alguma, não
exclui a ilicitude dessa conduta, haja ou não o consentimento do ofendido, enquadrando-a no
crime do art. 121 do Código Penal, mas permite o reconhecimento do privilégio, configurando
uma redução da pena de um sexto a um terço.
O anteprojeto da Parte Especial do Código Penal de 1984 previu, pela primeira
vez, a isenção de pena da conduta eutanásica do médico que, com o consentimento da vítima,
ou na sua falta, de ascendente, descendente, cônjuge ou irmão, antecipasse a morte iminente e
inevitável do doente, desde que atestada por outro médico.
No entanto, o projeto foi abandonado, por diversos motivos, principalmente,
por fortes influências de ordem religiosa, considerando que nossa sociedade é estruturada na
fé cristã, onde a vida humana é entendida como uma dádiva, pois foi criada por Deus e
somente por vontade Dele é que se termina.
A complexidade do tema chama a atenção, pois envolve um conflito de valores
e interesses, não apenas de enfoque jurídico, mas, primordialmente, de enfrentamento
religioso e moral. Por um lado tem-se a vontade de abreviar um sofrimento que prejudica um
indivíduo e a família, de cunho iminentemente individual, e de outro lado tem-se a tutela
integral do direito à vida como algo irrenunciável, a qual o homem não pode interferir.
A eutanásia envolve o direito mais sublime do ser humano, que é o direito à
vida, consagrado constitucionalmente. Esse, por sua vez, consiste no direito de sobreviver, de
defender a própria vida, de buscar meios de permanecer vivo, com saúde e com dignidade,
impedindo que a mesma seja interrompida por qualquer meio que não seja a morte natural e
inevitável. Nesse entendimento, exclui-se o direito de morrer das pessoas.
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Há países, como a Holanda, em que a eutanásia não é mais tipificada. O tema
da legalização da eutanásia é sempre atual e polêmico e, por isso, merece uma atenção
especial, devendo ser abordado com total imparcialidade. Para tanto, fez-se necessário o
estudo das correntes favoráveis e não-favoráveis à Eutanásia, contrapondo os argumentos de
ambos, na tentativa de construir um posicionamento que contribua para o amadurecimento da
questão no universo jurídico.
Em relação ao aborto, que também diz respeito à eliminação da vida, o Direito
Penal permite duas hipóteses legais de excludente de ilicitude em casos considerados
extremos e justificados. Perante este fato legal, este trabalho busca levantar a questão de que
não seria pertinente o legislador prever algumas hipóteses de permissão da eutanásia, como
fez com o aborto, cabendo analisar qual medida de valor que o legislador e a sociedade têm
para permitir o aborto legal e recriminar a eutanásia.
Este estudo não visa resolver este impasse quanto à aceitação ou não da
eutanásia, mas sim, alargar o campo de idéias quanto ao direito de viver e morrer do individuo
em casos extremos, onde quando a única opção é o de viver vegetativamente, optando pela
morte como a única forma digna de resolução da causa.
Enfoca-se também o papel do profissional da medicina quanto ao código
específico da profissão e o juramento proferido por este de estar sempre ao lado da vida,
objetivando a qualquer custo a sua continuidade.
O método utilizado na fundamentação teórica do trabalho é o Dialético, onde
as diversas opiniões, devidamente fundamentadas, são valorizadas, buscando efetivamente
confrontar as versões favoráveis e contrárias a legalização da eutanásia, elencando de forma
imparcial, os pontos negativos e positivos da tese proposta, onde o resultado deste confronto
será obtido através da síntese dos resultados.
Como fonte de pesquisa, foi realizada a leitura de livros e artigos sobre o tema;
códigos do ordenamento jurídico brasileiro; código de ética da medicina, além de visualização
de filmes e análise dos documentos oficiais da Igreja que tratam do tema, pois a religião tem
forte influência na sociedade brasileira, e o legislador ao redigir as leis tem que se orientar
pelo pensamento e valores do grupo.
Ao se tratar da morte, devemos explanar sobre a vida que pode-se definir
fisiologicamente como um aglomerado protéico que se mantém ativo pela queima de
Adenosina Tri-Fosfatada (ATP) obtida numa reação química em que o oxigênio é absorvido e
o gás carbônico liberado. Outra forma de defini-la seria referir-se aos seres fotossintetizantes
que obtém a energia do sol, absorvem gás carbônico e liberam oxigênio, sendo que nenhuma
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destas definições, obviamente, é suficiente para definir a vida humana. A vida humana não é
apenas a síntese da luz em energia, tampouco é apenas a queima de ATP. Nem mesmo o mais
insensível dos seres definiria a vida humana de maneira tão estritamente fisiológica
(SANTOS, 2005).
Buscando parâmetros bem definidos do que venha a conceituar um ser vivo,
para efeitos do reconhecimento dos sinais de vida em outras partes do universo, a Nasa
estabeleceu uma definição simples e ampla, segundo a qual “a vida é um sistema químico
auto-sustentável,
capaz
de
evoluir
de
maneira
darwiniana.”
(Disponível
em:
<http://www.aventurasdaciencia.blogspot.com/2007>).
O Novo Dicionário Aurélio da língua portuguesa trata a vida como um
conjunto de propriedades e qualidades pelo qual plantas e animais, opostos a organismos
mortos, se mantêm em contínua atividade através do metabolismo, crescimento, adaptação ao
meio, reação a estímulos e reprodução da espécie (FERREIRA, 2004).
Em se tratando das leis brasileiras, estas não conceituam o direito à vida, mas
sim, o garante, fato descrito como garantidor encontra-se expresso no Artigo 5° da
Constituição da República Federativa do Brasil, 1988, e dos crimes contra a pessoa e a vida
no artigo 121 do Código Penal brasileiro.
O conceito de vida humana tem que ser visto não simplesmente como
sobrevivência, mas alberga o conceito de dignidade humana. O conceito de dignidade da
pessoa humana é, inclusive, mais importante que o próprio conceito fisiológico.
O serviço a favor da vida deve ser unitário: não pode tolerar discriminações, já
que a vida humana é inviolável em todas as suas fases e situações; é um bem indivisível.
Trata-se de cuidar da vida toda e da vida de todos (JOÃO PAULO II, 87).
Portanto, ao se falar de vida humana requer uma vida plena, que respeite os
direitos fundamentais, seja de liberdade, seja social, seja coletivo ou difuso. Dignidade é o
elemento valorativo que secciona o mundo humano do mundo vegetal e animal. A dignidade
é
a
gênese
do
conceito
humano
de
vida
(Disponível
em:
<http://www.
realouimaginario.blogspot.com>).
A dignidade inerente da pessoa humana deriva obviamente, no primeiro direito,
o da vida. Respeitar a dignidade do indivíduo implica, necessariamente, abster-se de qualquer
ato objetivando seu fim (NINO, 1994).
De acordo com a tradição Cristã, o direito de morrer com dignidade é parte
constitutiva do direito a vida, ou seja, implica que o significado que se atribui ao conceito de
“morrer com dignidade” se distingue radicalmente da proposta dos defensores da eutanásia. O
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direito de uma morte digna é o direito de viver dignamente a própria morte (PAULINA,
2000).
O preâmbulo da Declaração Universal dos Direitos Humanos remete ao
reconhecimento da dignidade intrínseca e dos direitos iguais e inalienáveis de todos os
membros da família humana, como base da liberdade, justiça e paz no mundo. O pacto
internacional de Direitos Civis e Políticos iniciam seu preâmbulo reconhecendo a dignidade
inerente a todos os membros da família humana, assinalando mais adiante, que os direitos
iguais
e
inalienáveis
do
homem
se
derivam
desta
mesma
dignidade
(<http://www.interlegis.gov.br/processo_legislativo>).
No Brasil, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, 1948 em seu artigo
1° diz que: “Todos os homens nascem livres e iguais em dignidade. São dotados de razão e
consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade”, trazendo
ainda em seu artigo 3° que: “Todo homem tem direito à vida, à liberdade e a segurança
pessoal”, sendo considerado este modelo de declaração a ser seguido pelo constitucionalismo
liberal. (PESSINI e BARCHIFONTAINE, 1997).
A Constituição da República Federativa do Brasil, 1988, trata em seu artigo 5º
dos direitos e deveres individuais e coletivos onde a inviolabilidade do direito à vida é
tutelada, sendo tal direito limitado em face ao princípio da relatividade ou convivência das
liberdades públicas pelos demais direitos igualmente delineados pela carta magna, onde o
artigo em questão visa a preservação da vida em sua totalidade, quanto da liberdade,
igualdade, segurança e propriedade (NELSON NERY JR. 2008).
O direito a vida se tornou um direito fundamentalmente reconhecido pelo
direito internacional, fruto este, de uma difícil conquista da humanidade quando da violação
de seus direitos fundamentais, suprimidos através dos tempos, onde a “Declaração Universal”
se caracteriza, primeiramente, por sua amplitude sendo esta um conjunto de direitos e
faculdades sem as quais o ser humano não pode desenvolver sua personalidade física, moral e
intelectual. Traz também como característica a universalidade que é aplicável a todas as
pessoas de todos os países, raças, religiões e sexos, seja qual for o regime político dos
territórios nos quais incide. Desta forma a comunidade internacional reconheceu que o
indivíduo é membro direto da sociedade humana, na condição de sujeito direto do Direito das
Gentes o que naturalmente, o torna alem de cidadão de seu país, também cidadão do mundo,
pelo fato mesmo da proteção internacional que lhe é assegurada (CASSIN apud PIOVESAN).
Segundo o parecer emitido pelo Comitê Nacional de Bioética da Itália, datado
de 14 de Julho de 1995, sobre a “Questão bioética relativa ao fim da vida humana”, nenhuma
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legislação propriamente eutanásica pode ter valor bioético. Defende que é lícito e digno de
respeito por parte do terapeuta o motivo do paciente desejar a terapia, sempre que de forma
livre, atual e consciente, ou seja, qualquer intervenção de caráter paliativo, sendo um dever a
suspensão por parte do médico de qualquer ensaio terapêutico. Por fim, este Comitê,
considera ilícita qualquer forma de eutanásia eugenésica e sobre neonatos com má formação
ou ainda, qualquer forma de eutanásia sobre um paciente que não demonstre seu
consentimento.
Os Hospitais brasileiros também possuem código de ética, onde o artigo 8°
esclarece que: “O direito do paciente à esperança pela própria vida torna ilícita –
independente de eventuais sanções legais aplicáveis – a interrupção de terapias que a
sustentem. Executem-se, apenas os casos suportados por parecer médico...” (PESSINE E
BARCHIFONTAINE, 1997).
Quanto ao código de ética dos Profissionais de Enfermagem, Capítulo I, artigo
3°, diz que: “O profissional de enfermagem respeita a vida, a dignidade e os direitos da pessoa
humana, em todo o seu ciclo vital, sem discriminação de qualquer natureza”, no Capítulo V,
artigo 46 que: “Torna-se proibido promover a eutanásia ou cooperar em prática destinada a
antecipar a morte do cliente” (PESSINE E BARCHIFONTAINE, 1997).
No juramento de Hipógrates, o profissional da medicina promete aplicar os
regimes para o bem dos doentes e nunca para prejudicar ou fazer mal a quem quer que seja,
não dando, nem para agradar, remédio mortal nem conselho que o induza a destruição
(PESSINE E BARCHIFONTAINE, 1997).
Hipócrates, cerca de 500 anos antes do nascimento de Cristo, formulou uma definição
clássica do instante da morte. Este texto se encontra no De morbis, 2º livro, parte 5:
Testa enrugada e árida, olhos cavos, nariz saliente, cercado de coloração escura.
Têmporas deprimidas, cavas e enrugadas, queixo franzido e endurecido, epiderme
seca, lívida e plúmbea, pêlos das narinas e dos cílios cobertos por uma espécie de
poeira, de um branco fosco, fisionomia nitidamente conturbada e irreconhecível
(PESSINE e BARCHIFONTAINE, 1997).
O conceito de morte até pouco tempo atrás era o da paralisação da função
cardíaca e respiratória, mas, nos dias atuais, o critério diagnóstico de morte é a paralisação das
funções cerebrais, o que resulta em uma intensa discussão técnica e ética (GOGLIANO,
1993).
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Para os médicos neurologistas, a revisão do conceito de morte tornou-se
imperiosa devido à capacidade da medicina moderna em prolongar indefinidamente uma vida
por meios artificiais tornando imperativo que se defina a morte encefálica, cabendo a estes
profissionais, a difícil tarefa de reconhecer, a despeito dos recursos disponíveis, a cessação
irreversível da atividade encefálica (GOGLIANO, 1993).
Tais princípios a serem adotados quando da afirmação da morte irreversível, é
tratada pelo Conselho Federal de Medicina através de atribuições que lhe confere a Lei n°
3.268, de 30 de setembro de 1957, regulamentada pelo Decreto n° 44.045, de 19 de julho de
1958 e publicada no D.O.U. de 17 de Outubro de 1991, p. 22.731.
Através da Declaração de Sidney quando da 22ª Assembléia Médica Mundial
em Sidney, Austrália, em 1968 e emendada pela 35ª Assembléia Médica Mundial em Veneza,
Itália, em outubro de 1983, o momento da morte, na maioria dos paises, é de responsabilidade
do médico, que poderá determiná-lo utilizando critérios clássicos conhecidos por estes
profissionais, através da constatação da cessação definitiva das funções espontâneas cardíacas
e respiratórias bem como a cessação irreversível de toda a função cerebral, pensamento
idêntico
ao
estabelecido
na
Lei
de
Doação
de
Órgãos
(http://www.dhnet.org.br/direitos/codetica/medica/22sidney.html).
A palavra eutanásia deriva da expressão grega euthanatos, onde eu significa
bom e thanatos morte. Numa definição puramente etimológica, é a morte boa, a morte calma,
a morte piedosa e humanitária, a morte sem sofrimento e sem dor.
Suetónio, no segundo século, assim descreveu a morte do imperador Augusto:
"Sua morte foi suave, tal como sempre a tinha desejado, porque quando ouvira dizer que
alguém tinha morrido rapidamente e sem dor, ele desejava o mesmo para si e os seus, usando
a expressão euthanasia" (De vitae Caesarum) (LEPARGNEUR,1999).
Frank Bacon no século XVII, que defendia a prática da eutanásia pelos
médicos, quando estes não mais dispusessem de meios para levar à cura um enfermo
atormentado disse: “a meu ver eles (médicos) deveriam possuir a habilidade necessária a
dulcificar com suas mãos os sofrimentos e a agonia da morte” e ainda que: "o médico deve
acalmar os sofrimentos e as dores não apenas quando este alívio possa trazer a cura, mas
também quando pode servir para procurar uma morte doce e tranqüila" (BACON, 1963).
No século XIX, os teólogos Larrag e Claret, em seu livro "Prontuários de
Teologia Moral", publicado em 1866, utilizaram eutanásia para caracterizar a "morte em
estado de graça" (GOLDIM, 2004).
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O dicionário Aurélio conceitua eutanásia como morte serena, sem sofrimento,
ou a prática pela qual se busca abreviar, sem dor ou sofrimento, a vida de um doente
reconhecidamente incurável (FERREIRA, 2004).
José Ildefonso Bizatto, 2000 citando Morselli, define eutanásia como “aquela
morte que alguém dá a outrem que sofre de uma enfermidade incurável, a seu próprio
requerimento, para abreviar agonia muito grande e dolorosa”.
Antônio Fernandez Rodriguez, 1990 diz que eutanásia é a “morte
misericordiosa ou piedosa, é a que é dada a uma pessoa que sofre de uma enfermidade
incurável ou muito penosa, para suprimir a agonia demasiado longa e dolorosa”.
De acordo com Pinan Y Malvar, citado na obra de Menezes, 1977, cujo tema
se define em “Direito de Matar”, o conceito de eutanásia, se identifica como “aquele ato em
virtude do qual uma pessoa dá morte a outra, enferma e parecendo incurável, ou a seres
acidentados que padecem, a seu rogo ou requerimento e sob impulsos de exacerbado
sentimento de piedade e humanidade”.
Já Asúa, 1929, renomado professor espanhol, define a eutanásia como: "morte
que alguém proporciona a uma pessoa que padece de uma enfermidade incurável ou muito
penosa, e a que tende a extinguir a agonia demasiada cruel ou prolongada".
De maneira geral, entende-se por eutanásia quando uma pessoa causa
deliberadamente a morte de outra que está mais fraca, debilitada ou em sofrimento. Neste
último caso, a eutanásia seria justificada como uma forma de evitar um sofrimento acarretado
por um longo período de doença.
Percebe-se pelos vários conceitos que existe uma finalidade altruística.
Pode-se dividir a Eutanásia em: ativa, quando ocorre o ato deliberado de
provocar a morte sem sofrimento do paciente, por fins humanitários, utilizando por exemplo
uma injeção letal; passiva, quando a morte ocorre por omissão proposital em se iniciar uma
ação médica que garantiria a perpetuação da sobrevida, por exemplo, deixar de se iniciar
aminas vasoativas no caso de choque não responsivo à reposição volêmica; de duplo efeito
que ocorre nos casos em que a morte é acelerada como conseqüência de ações médicas não
visando ao êxito letal, mas sim, ao alívio do sofrimento de um paciente quando por exemplo
do emprego de morfina para controle da dor, gerando, secundariamente, depressão
respiratória e óbito (SOUZA, 2007).
A eutanásia ativa é uma das questões mais debatida na era contemporânea,
abrangendo a ética médica, legislação e política. Ao longo dos últimos 20 anos, milhares de
artigos acadêmicos e livros têm abordado o tema, explorando as dimensões filosófica e
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teológica, debatendo processos judiciais e alterações legais e realizando um levantamento de
atitudes práticas reais no mundo (STOLBERG, 2007).
É importante conceituar outros termos próximos a Eutanásia que são
empregados de forma equivocada, como a Distanásia, onde à morte ocorre de forma lenta,
ansiosa e com muito sofrimento, sendo considerada como o antônimo de eutanásia. A
Ortotanásia é a atuação correta e adequada perante de um paciente que está morrendo.
Mistanásia ou eutanásia social é a morte miserável, fora e antes da hora onde se focaliza as
situações: a grande massa de doentes que, por motivos políticos, sociais e econômicos, não
chegam a ser pacientes, pois não conseguem ingressar efetivamente no sistema de
atendimento médico, os doentes vítimas de erro médico e os pacientes que acabam sendo
vítimas de má-prática por motivos econômicos, científicos ou sociopolíticos.
A prática eutanásica é encontrada até mesmo no reino animal, quando os
insetos necrófilos dão morte aos velhos para livrá-los de sua existência infeliz (SILVA, 2000).
A eutanásia não é uma prática recente, podendo ser encontrada no começo da
civilização, mais precisamente entre os gregos, sendo que a eutanásia que estes povos
conheceram e praticaram e da qual se tem provas históricas é a que chamada "falsa
eutanásia", ou seja, a eutanásia de fundamento e finalidade "puramente eugênica".
Em Atenas, 400 anos a.C Platão pregava no terceiro livro de sua
"REPÚBLICA" o sacrifício de velhos, fracos e inválidos, sob o argumento de interesse do
fortalecimento do bem-estar e da economia coletiva, anteriormente Licurgo fazia matar as
crianças aleijadas ou débeis que, impiedosamente, eram imoladas em nome de um programa
de salvação pública de uma sociedade sem comércio, sem letras e sem artes e trabalhada
apenas pelo desígnio único de produzir homens robustos e aptos para a guerra (SILVA,2000).
Os romanos também praticaram a falsa eutanásia, mas há notícias de que
conheciam a morte piedosa, onde o autor do fato era movido por compaixão do enfermo,
visando pôr fim às suas dores. Todavia, os romanos chamavam tal situação de homicídio
benigno ou tolerável, e a lei dava a este tipo de homicídio tratamento especial e mais brando,
tendo em vista os móveis generosos e nobres que o inspiravam. Os magistrados julgadores e
os tribunais do povo consideravam a diferença entre o homicídio e a eutanásia não apenas
para as decisões de culpabilidade, como também para graduar a pena.
Ainda entre os povos antigos, tem-se notícia de que os germanos matavam os
enfermos incuráveis; estes, na Birmânia, eram enterrados vivos juntamente com os velhos. Os
eslavos e os escandinavos também apressavam a morte de seus pais quando estes sofriam de
mal incurável, irreversível (BITTENCOURT, 1939).
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Menezes, 1977, citando José Ingenieros, menciona a prática de um costume
denominado "despenar" (privar de pena, de sofrimento), atribuída à população rural de
algumas colônias sul-americanas. Tal costume consistia na morte dada a alguém que padecia
muito, por um amigo que agia piedosamente. Não se tratava apenas de costume, era dever do
bom amigo e quem se negasse a fazê-lo era reputado impiedoso e covarde.
Tem-se notícia que durante as guerras, era usado entre os soldados um punhal
pequeno e afiado, chamado "misericórdia", com o qual se livravam dos sofrimentos os
mortalmente feridos.
Durante a Idade Média, em razão das inúmeras epidemias e pestes, era comum
a prática da eutanásia, uma vez que as doenças alastravam-se com maior facilidade, devido ao
grande estado de miséria em que se encontrava a população durante o período de decadência
do feudalismo (SILVA, 2000).
Nos tempos modernos convém lembrar o pedido feito por Napoleão, na
campanha do Egito, ao cirurgião Degenettes, de matar com ópio soldados atacados de peste,
respondendo este que a isso se negava porque a função do médico não era matar e sim curar.
Ensina a história que o objetivo de Napoleão era matar os enfermos irremediavelmente
perdidos e já moribundos, a fim de que não caíssem vivos em poder dos turcos, uma vez que
não mais podiam seguir a campanha.
No último século a eutanásia esteve em vários momentos no centro das
discussões sociais e jurídicas pelo mundo.
Em muitos países europeus, um crescente público debate diariamente a
aceitabilidade e regulamentação da eutanásia. Na Bélgica e na Holanda, este debate resultou
na legalização da eutanásia. Uma vez que ocorreu a promulgação da lei belga sobre eutanásia,
o objetivo é debater sobre a forma de lidar com os pedidos eutanásicos dentro de hospitais,
pedidos estes que foram intensificados. Com efeito, os cuidados relacionados aos
profissionais da saúde quanto a estes pedidos, os tornaram mais conscientes da complexidade
clínica e da ética quando da decisão circundante voltados aos pedidos de eutanásia o que
ultrapassa a relação médico-paciente, afetando de forma mais ampla a responsabilidade do
profissional e do hospital (LEMIENGRE et al., 2007).
É de se saber que em 1903 na Alemanha tentou-se legitimar a eutanásia no
Parlamento da Saxônia, que a repudiou. Em seguida em 1922 foi apresentada uma moção
propondo que o Parlamento Inglês através do Comitê Municipal, aprovasse um projeto de lei
que criaria um tribunal médico com autoridade e poder para apressar o fim rápido e calmo
daqueles que sofriam de mal incurável.
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Em 1925 o projeto tcheco de Código Penal preceituava a eutanásia atribuindo
ao Tribunal à faculdade de atenuar excepcionalmente a pena ou eximir o castigo sendo que
em 1992 os dinamarqueses concordaram em fazer no caso de doença incurável ou de grave
acidente, um "testamento médico”.
Nos anos de 1993 e 1994, a Justiça da Grã-Bretanha autorizou médicos a
abreviarem a vida de doentes mantidos artificialmente sendo que no mesmo ano o Estado do
Oregon (USA) autoriza a eutanásia para doentes declarados em fase terminal e que fazem o
pedido formalmente a um tribunal do Estado.
O tribunal federal de apelações de New York, que tem competência em
Vermont e Connecticut, autorizou a eutanásia médica em 1996 neste mesmo ano na Escócia,
pela primeira vez, uma paciente foi autorizada a morrer.
No ano seguinte, a Corte Constitucional da Colômbia admitiu a prática da
eutanásia para doentes em fase terminal passando a China em 1998 a autorizar os hospitais a
praticarem a eutanásia em pacientes terminais de doença incurável.
Conforme explicito anteriormente, em 28 de novembro de 2000 a Holanda
passou a ser o primeiro país a autorizar oficialmente a prática da eutanásia. A nova legislação
permite aos médicos recorrerem à eutanásia em condições muito restritas, onde o enfermo
deve estar sem qualquer esperança de sobrevivência e desejar pôr fim a sua vida, sendo que os
médicos holandeses são treinados na sua formação em como praticar a eutanásia, e a
Sociedade Holandesa Real de Farmacologia distribui a todos os médicos um livro a cerca de
como praticar a eutanásia, contendo receitas de venenos que não são detectáveis, e que os
médicos podem colocar na comida ou injetar de tal forma que se torna quase impossível
detectá-los durante uma autópsia.
A Sociedade Holandesa da Eutanásia publicou, em 1977, o manual "Como
praticar a eutanásia", do Dr. Pieter Admiraal. Os grupos de eutanásia oferecem esse manual a
todos os médicos na Holanda, traduziram-no para Inglês e enviaram-no para os Estados
Unidos da Américo (EUA).
Também na Holanda, os médicos sabem previamente, quanto custa cada
tratamento para cada dano ou doença comum, pois estão registrados em diagramas de fácil
consulta e análise. Os administradores de hospitais orientam os seus médicos em geral, para
usarem esses diagramas e aplicarem injeções letais involuntariamente aos pacientes idosos
cuja assistência é considerada "muito dispendiosa". Oitenta por cento dos médicos holandeses
assassinaram pessoas propositadamente por meio da eutanásia direta, ativa (não-passiva).
13
Um levantamento governamental, em 1991, constatou que apenas 1 em cada 10
médicos holandeses recusaria um pedido de eutanásia. Como acontece nos EUA, o verdadeiro
motivo da maioria das eutanásias holandesas não é o de aliviar a dor dos pacientes, mas sim a
comodidade dos médicos e das famílias, com isso as técnicas para controlar a dor na Holanda
são muito primitivas, devido à facilidade da realização da eutanásia. O Dr. Pieter Michels,
diretor de um hospital holandês para pacientes terminais, disse que apenas 9 das 3.000
pessoas que morreram e que passaram pelo seu hospital, solicitaram a eutanásia nesses vinte
anos, e a maioria desses pedidos surgiram devido à pressão das suas famílias.
De acordo com Caritas Flandres, a eutanásia deve ser limitada a casos muito
excepcionais (estados de necessidade) cabendo-a apenas a doentes terminais, e não nos casos
de pacientes que assim se julgam (LEMIENGRE et al., 2007).
De acordo com STOLBERG, 2007 um médico admitiu ter matado pessoas
porque o quadro do sofrimento delas o perturbava, existindo muitos opositores a esta posição,
entre eles, grande parte da classe médica e diversos grupos religiosos, considerando que este
médico cometeu suicídio assistido, o que é incompatível com a santidade da vida profissional
do médico e do dever de preservá-la.
Como líder holandês da prática da eutanásia, o Dr. Pieter Admiraal afirmou na
oitava conferência bianual da Federação Mundial das Sociedades do Direito a Morrer: "Todo
o paciente tem o direito de julgar se o seu sofrimento é insuportável, e o direito de solicitar a
eutanásia ao seu médico". A dor raramente é o motivo para a eutanásia.
O Brasil, nos seus primitivos tempos, também conheceu a eutanásia. Essa
prática foi detectada entre os silvícolas.
Algumas tribos deixavam à morte seus idosos, principalmente aqueles que já
não mais participavam das festas e caças. Acreditavam esses indígenas que viver era poder
participar de festas, caças e pescas, logo, aqueles privados de tais ações não teriam mais
nenhum estímulo para a vida. Assim, a morte viria como benção, uma vez que a vida sem
aquelas atividades perdera todo seu significado (SILVA, 2000).
Além da prática entre indígenas, a eutanásia no Brasil apresentou-se na época
colonial como conseqüência da tuberculose, moléstia até então sem cura e que conduzia a um
definhamento crescente até a morte. A nossa literatura dá-nos alguns exemplos, através de
poetas do romantismo que, atacados de tuberculose, pediam e deixavam-se morrer mais
rapidamente, já que era certa a morte.
Nos dias atuais, ainda há práticas eutanásicas, só que não são divulgadas, pois a
nossa lei penal considera-a como crime.
14
No passado, o Código Criminal do Império (1830) e o Código Penal
republicano, através do Decreto n. 847, de 11-10-1890, não contemplou qualquer disposição
relacionada ao homicídio caritativo, e destacou em seu art. 26, c: "Não dirimem nem excluem
a intenção criminosa, o consentimento do ofendido, menos nos casos em que a lei só a ele
permite a ação criminal".
Por sua vez, a Consolidação das Leis Penais, Código Penal brasileiro
completado com as leis modificadoras então em vigor, aprovada e adaptada pelo Decreto n.
22.213, de 14-12-1932, em nada modificou o tratamento legal anteriormente dispensado ao
tema, conforme seu Título X, que tratou "Dos crimes contra a segurança da pessoa e vida"
(arts. 294/314). Também não estabeleceu atenuante genérica relacionada ao assunto,
conforme se infere da leitura de seu art. 42, ou outro benefício qualquer. Por sua vez, o
Anteprojeto de Código Penal em estudo pela Comissão encarregada de introduzir mudanças
na Parte Especial do Código em vigor, ao tratar do homicídio no art. 121, dispõe (§ 3º):
Se o autor do crime é cônjuge, companheiro, ascendente, descendente, irmão ou
pessoa ligada por estreitos laços de afeição à vítima, e agiu por compaixão, a
pedido desta, imputável e maior de dezoito anos, para abreviar-lhe sofrimento físico
insuportável, em razão de doença grave e em estado terminal, devidamente
diagnosticados: Pena - reclusão, de dois a cinco anos. Já no § 4º estabelece: Não
constitui crime deixar de manter a vida de alguém por meio artificial, se
previamente atestada por dois médicos a morte como iminente e inevitável, e desde
que haja consentimento do paciente ou, em sua impossibilidade, de cônjuge,
companheiro, ascendente, descendente ou irmão (PIRAGIBE, 1933).
A visão da igreja em relação à eutanásia está demonstrada em dois importantes
documentos o da Conferência Episcopal da Alemanha (2011-1978) e o documento da Santa
Sé sobre a Eutanásia de 5 de maio de 1980. Tais documentos do Vaticano definem a eutanásia
como sendo: “uma ação ou omissão que, por sua natureza, ou nas intenções, provoca a morte
a fim de eliminar a dor. A eutanásia situa-se, portanto, no nível das intenções e no nível dos
métodos empregados” (PESSINI e BARCHIFONTAINE, 1997).
Afirma ainda tal documento que nenhuma pessoa pode autorizar a morte de um
ser humano inocente, seja feto ou embrião, criança ou adulto, velho, enfermo, incurável ou
agonizante e da mesma forma nenhuma autoridade pode legitimamente impô-lo nem permiti-
15
lo, por se tratar de uma violação a lei divina e de uma ofensa à dignidade da pessoa humana,
de um crime contra a vida e de um atentado contra a humanidade (RADDATZ, 2000).
O Vaticano critica a legalização da eutanásia na Holanda e, para o
representante do Papa, “essa lei contradiz a declaração de Genebra de 1948 da Associação
Mundial dos Médicos, assim como os princípios éticos médicos aprovados por doze paises da
Comunidade Européia em 1987” (Disponível em: <http://www.terra.com.br/mundo/2000>).
O porta-voz do Vaticano, Joaquim Navarro Valls, prevê que “o primeiro
problema que gera a legalização da eutanásia tem a ver com a consciência dos médicos"
(SILVA, 2000).
Para o PAPA JOÃO PAULO II "nenhuma lei poderia jamais tornar lícito um
ato intrinsecamente ilícito. Estas leis carecem de autêntica validade jurídica" (COSTA,
OSELKA e GARRAFA, 1998).
A Bíblia Sagrada nos mostra o exemplo de Saul, que quando tendo se ferido
em batalha contra os Filisteus e temendo ser capturado por estes, pediu ao seu escudeiro que
tirasse sua vida. Negando-se o escudeiro, Saul atirou-se sobre a própria espada, ferindo-se
gravemente. Não tendo encontrado a morte, apesar disso, chamou um amalecita e pediu-lhe
que o matasse, visto não mais suportar o sofrimento, e foi atendido. David, ao receber a
notícia da morte de Saul, contada pelo amalecita que o matara a seu pedido, não o perdoou e
mandou puni-lo com a morte (I Samuel 31, 3-13).
Em 1980, o Vaticano divulgou uma Declaração sobre Eutanásia, onde existe a
proposta do duplo efeito e a da descontinuação de tratamento considerado fútil:
Nada nem ninguém pode de qualquer forma permitir que um ser humano inocente
seja morto, seja ele um feto ou um embrião, uma criança ou um adulto, um velho
ou alguém sofrendo de uma doença incurável, ou uma pessoa que está morrendo. O
Princípio do Duplo Efeito está proposto no item III deste documento. É admissível
utilizar medicação analgésica com o objetivo de reduzir dor insuportável, mesmo
que um efeito colateral não intencional seja a morte do indivíduo. O importante é
caracterizar a intenção da ação. Esta colocação se baseia na Ética das Virtudes. Se
vista dentro de uma perspectiva consequencialista a aplicação deste conceito
poderia ser discutível (VATICANO,1980).
Este documento da Igreja Católica admite que medidas extraordinárias, de
acordo com o risco, sofrimento ou custo associado pode ser implantado em pacientes com
16
morte iminente. Faculta, igualmente, a utilização e retirada de medidas experimentais, quando
procedimentos terapêuticos usuais não estejam disponíveis (VATICANO,1980).
Em Êxodo (20,13), encontra-se a um dos mandamentos da Lei de Deus
segundo a Bíblia católica, Deus fala de forma clara: “Não Matarás”, sendo confirmado através
do Novo testamento por Cristo no Evangelho segundo Mateus (5, 21-22).
Ouvistes que foi dito aos antigos: Não matarás; mas qualquer que matar será réu de
juízo. Eu, porém, vos digo que qualquer que, sem motivo, se encolerizar contra seu
irmão será réu de juízo, e qualquer que chamar a seu irmão de raca será réu do
Sinédrio; e qualquer que lhe chamar de louco será réu do fogo do inferno (BÍBLIA
SAGRADA, 1993).
Paulo na segunda Epístola aos Coríntios (1, 8-9), relata o imenso sofrimento
pelo qual passou, mas manteve-se firme na luta pela vida e confiou em Deus, dizendo:
Porque não queremos, irmãos, que ignoreis a tribulação que nos sobreveio na Ásia,
pois que fomos sobremaneira agravados mais do que podíamos suportar, de modo
tal que até a vida desesperamos. Mas já em nós mesmos tínhamos a sentença de
morte, para que não confiássemos em nós, mas em Deus, que ressuscita os mortos.
(BÍBLIA SAGRADA, 1993).
Diante disse observa-se que Paulo nunca se desesperou ao ponto de acolher a
idéia do suicídio, sempre perseverou até o fim na vida que levava, pois sabia que a vida é um
dom divino, e que só cabe a Deus decidir o momento da morte chegar ao ser humano.
A Igreja Católica de Mendoza diz-se pressionada pela legislação, mas a própria
Igreja, nunca utilizou-se da legislação para proibir a eutanásia. Apesar de a Igreja Católica
tradicional argumentar que só Deus é o meio e o final da vida, a oposição à eutanásia também
se estende para muitos cristãos evangélicos e islamismo (CEASER, 2008).
Os pedidos de eutanásia de enfermos em estado terminal e mesmo doentes
terminais não-pacientes, encontram muita resistência Católica nos hospitais. No entanto,
apenas entre 28 e 38% dos católicos aceitam a eutanásia em casos excepcionais, depois de
usar os filtros paliativos. Em contrapartida, o público neutro ou não-religioso aceita em
porcentagem muito maior que hospitais possam realizar a eutanásia, em conformidade com o
direito sem outras restrições. A influência óbvia de filiação religiosa sobre a postura que se
17
deve tomar quando da eutanásia em hospitais, é detectado em estudos-piloto nos Países
Baixos (LEMIENGRE et al., 2007).
Destaca-se que nos Países Baixos, a legalização da eutanásia foi o resultado de
um processo social, com duração de cerca de duas décadas e com o envolvimento ativo do
Parlamento, do sistema judicial, profissionais da saúde e grupos de doentes, sempre ladeado
pela ética. O Governo neo-holandês também utilizou-se repetidamente de pesquisas onde os
pesquisadores investigaram a incidência da eutanásia somado a procedimentos médicos,
visando uma possível decisão entre a realização da eutanásia ou a manutenção da vida
(BILSEN, STICHELEB e BROECKAERTC, 2007).
Se a maior parte dos homens considera que a vida tem um caráter sagrado e
admite que ninguém pode dispor dela a seu bel-prazer, os crentes vêem nela, também, um
dom do amor de Deus, que eles têm a responsabilidade de conservar e fazer frutificar
(PAOLO II, 1995).
A eutanásia é enquadrada dentro do direito brasileiro como homicídio
privilegiado art. 121, parágrafo 1º do Código Penal Brasileiro, isto é, um tipo de homicídio
em que a lei prevê uma redução da pena de um sexto a um terço, assim dispõem a lei: "se o
agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o
domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima" (DAMÁSIO,
2001).
Assim, pode-se afirmar que a eutanásia na forma ativa no Brasil se caracteriza
crime enquanto que a passiva, o deixar morrer, não é enquadrado na legislação brasileira.
Muitas pessoas proporcionam a "morte boa" a amigos e familiares, sem que tal
fato seja divulgado; sabe-se até de médicos que a praticaram a pedido e súplica de pacientes
irremediavelmente doentes.
Já as espécies de eutanásia selecionadora e econômica são definidas no código
penal como homicídios qualificados, sem qualquer piedade.
Índices obtidos através de pesquisas publicadas na revista periódica
"Residência Médica" mostram que as maiores causas da eutanásia são o câncer e a AIDS,
seguidos da raiva. Os dois primeiros justificam sua posição pelo fato de que não trazem a
morte instantânea. Diz ainda a citada revista que a fase terminal de um paciente canceroso ou
aidético vai, em média, de seis meses a dois anos, período este em que o paciente fica
submetido a rigorosos tratamentos de combate à dor.
Em 1984, o Anteprojeto de Reforma da Parte Especial do Código Penal
brasileiro, (artigo 121, § 3°), disciplinou a eutanásia, ao isentar de pena o médico, assim
18
dispondo: "o médico que, com o consentimento da vítima, ou, na sua possibilidade, de
ascendente, descendente, cônjuge ou irmão, para eliminar-lhe o sofrimento, antecipa morte
iminente e inevitável, atestada por outro médico". Porém, houve a reforma da Parte Geral da
atual legislação penal, sem que a parte especial chegasse a ser realizada.
Atualmente, em tramitação perante o Congresso Nacional, o Projeto de reforma
do Código Penal, disciplina a eutanásia, dentre – Dos crimes Contra a Vida- Homicídio em
seu Art. 121 [...], da seguinte forma:
§ 3°. Se o autor do crime agiu por compaixão, a pedido da vítima, imputável e
maior, para abreviar-lhe sofrimento físico insuportável, em razão de doença grave:
Pena — reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos”.
Observa-se, desta forma, que se aprovada a reforma proposta, a eutanásia
passará a configurar uma causa de diminuição de pena do homicídio.
Mister se faz salientar que, quanto à Ortotanásia, o projeto de reforma do
Código Penal atribui uma causa de exclusão da antijuricidade, ao determinar em seu artigo 12,
§4° que: "Não constitui crime deixar de manter a vida de alguém por meio artificial, desde
que a morte iminente e inevitável seja testada por dois médicos e haja consentimento do
paciente ou de familiares".
Tramita no Senado Federal, um projeto de Lei 125/96, elaborado desde 1995.
Tal projeto estabelece critérios para a legalização da "morte sem dor" e prevê a possibilidade
de que as pessoas com sofrimentos físicos ou psíquicos possam solicitar que sejam realizados
procedimentos que visem a sua própria morte. A autorização para estes procedimentos será
dada por uma junta médica, composta por cinco membros, sendo dois especialistas no
problema do solicitante. Caso o paciente esteja impossibilitado de expressar a sua vontade,
um familiar ou amigo poderá solicitar à Justiça tal autorização.
Observa-se que projeto de lei é bastante falho na abordagem de algumas
questões fundamentais, tais como o estabelecimento de prazos para que o paciente reflita
sobre sua decisão, sobre quem será o médico responsável pela realização do procedimento
que irá causar a morte do paciente, entre outros itens.
Por sua vez, o Anteprojeto de Código Penal em estudo pela Comissão
encarregada de introduzir mudanças na Parte Especial do Código em vigor, ao tratar do
homicídio no art. 121, dispõe no § 3.º:
19
Se o autor do crime é cônjuge, companheiro, ascendente, descendente, irmão ou
pessoa ligada por estreitos laços de afeição à vítima, e agiu por compaixão, a pedido
desta, imputável e maior de dezoito anos, para abreviar-lhe sofrimento físico
insuportável, em razão de doença grave e em estado terminal, devidamente
diagnosticados: Pena - reclusão, de dois a cinco anos.
Já no § 4.º estabelece:
Não constitui crime deixar de manter a vida de alguém por meio artificial, se
previamente atestada por dois médicos a morte como iminente e inevitável, e desde
que haja consentimento do paciente ou, em sua impossibilidade, de cônjuge,
companheiro, ascendente, descendente ou irmão.
Para Bilding e Hoche, o direito de matar deveria ser oficialmente reconhecido
aos agentes sem perspectiva de vida e problemas mentais em nome da sociedade (MEINER,
1920).
Segundo Afrânio Peixoto, obedecendo a uma tradição através do sacerdócio
seguido pela ética médica, a eutanásia não é aceita porque doenças até a pouco consideradas
incuráveis, hoje tornam-se curáveis (CÓDIGO PENAL BRASILEIRO, 2004).
Arturo Santoro, 1968 nos traz: "o direito a vida é indisponível pelo titular desta
e mesmo com o consentimento para sua supressão, não elimina a antijuridicidade do fato”.
Na legislação da Bolívia, está introduzido em seu ordenamento jurídico no
artigo 257, um tipo penal que se refere expressamente a eutanásia, no qual o homicídio
através da eutanásia impõe ao autor, a reclusão de um a três anos, sendo que nos casos de
homicídios chamados com consentimento do interessado, poderá ser concedido o perdão
judicial, dispondo ainda de atenuantes especiais (CÓDIGO PENAL BOLIVIANO, 2003).
Nestes casos a conduta continuará no caso do perdão judicial sendo
antijurídica, pois dadas às circunstâncias particulares do caso, é estabelecida uma pena
reduzida em relação à indicada para homicídio simples e agravado, sendo catalogada como
homicídio piedoso, sendo caracterizado por elemento subjetivo do tipo que exclui qualquer
outra forma para se cometer tal delito (CÓDIGO PENAL BOLIVIANO, 2003).
Já a Colômbia regula o homicídio piedoso no artigo 326 de seu Código Penal,
onde quem matar outrem objetivando por fim a sofrimento intenso proveniente de lesão
corporal ou enfermidade grave ou incurável, incorrerá em pena de prisão de seis (6) meses a
três (3) anos de prisão, se diferenciando do código penal boliviano quanto a não necessidade
20
de manifestação do voluntário, ou seja, do sujeito passivo para configurar o delito (CÓDIGO
PENAL COLOMBIANO, 2003).
A eutanásia é praticada informalmente por alguns médicos na Colômbia há
mais de 10 anos após o alto tribunal decidir que este processo não era considerado crime em
determinadas circunstâncias. Mas dizem vários defensores que a prática ainda precisa ser
regulamentada para reduzir as oportunidades de abuso (CEASER, 2008).
Em El Salvador, a eutanásia esta compreendida no artigo 130, como forma de
homicídio piedoso, sendo por sua vez estabelecida à sanção de um a cinco anos de prisão
sempre que ocorra: que a vítima se encontre em estado de desespero através de sofrimento
conhecido publicamente e observado pelos médicos que assistam o paciente; que o sujeito
ativo esteja ligado por um vinculo familiar; amizade íntima ou de amor com o enfermo e que
o sujeito passivo demonstre seu desejo de morrer através de manifestação externa de pedidos
reiterados e expressos (CÓDIGO PENAL EL SAVADORENHO, 2004).
O Código Penal do Paraguai, também regula expressamente a eutanásia. O
artigo 106 traz expresso: No caso do homicídio motivado por súplica da vítima, o autor que
cometeu o delito contra outrem que se encontre gravemente enfermo, obedecendo a súplicas
verdadeiras, reiteradas e insistentes da vítima, será penalizado com pena privativa de
liberdade de até três anos (CÓDIGO PENAL PARAGUAIO, 2003).
A legislação do Peru estabelece em seu artigo 212 que o homicídio piedoso,
onde por motivo de piedade mata-se um enfermo incurável que solicita de maneira expressa e
consciente como forma de por fim a uma dor intolerável, receberá o autor do delito, pena
privativa de liberdade não maior que três anos (NUEVO CÓDIGO PENAL, 1996).
Em 2002, a Bélgica se tornou o segundo país depois dos países baixos a
promulgar uma lei sobre a eutanásia. Esta lei permite a eutanásia sob condições estritas e a ser
realizada apenas por médicos onde taxas de mortalidade na Bélgica e na Holanda são baixas,
variando de 0,30 a 1,20%, para a Bélgica e de 1,70 para 2,59% para os Países Baixos
(LEMIENGRE et al., 2007).
O resultado obtido através deste estudo demonstra que o tema “eutanásia” é
ainda muito debatido nos meios de comunicação, devido à divisão de ideologias quanto ao
aceitar ou não tal procedimento.
É de se destacar que a religião é uma forte influente nas opiniões dos religiosos
e seguidores, e que mesmo sofrendo interferências, os fieis encontram-se divididos acerca do
assunto em tela.
21
É perceptível as controvérsias quanto aos operadores e doutrinadores do
direito, pois enquanto uma grande maioria se baseia nas leis expressas para defender a não
realização da eutanásia, outra parte procura brechas nesta mesma lei do ordenamento jurídico,
afim de encontrar lacunas que favoreça sua realização.
Nota-se que além do código penal brasileiro, os códigos de ética da medicina,
enfermagem e hospitais, visam defender a vida de todas as formas até o seu fim natural, mas
utilizando processos análogos a leis internacionais, muitos ainda defendem o fim alheio
quando dos quadros irreversíveis e de sofrimento extremo.
Por fim, o aumento do número de simpatizantes a eutanásia vem crescendo
consideravelmente, o que se nota quando da verificação de paises que a cada ano classifica a
eutanásia como ato lícito, mesmo que dentro de certas condições para ocorrer.
Fica clara a necessidade de mais estudos acerca do tema, visto que o Brasil, por
ser um pais de maioria católica e onde o tema começa a ser tratado de forma mais concisa nos
dias atuais, torna-se de suma importância um aprofundamento concreto quanto aos resultados
obtidos nos paises em que a eutanásia é permitida bem como nas leis e condições gerais para
que este processo possa vir a ser realizado no Brasil.
A eutanásia é a sentença de morte determinada por um indivíduo desprovido de
consciência exata da situação, visando apenas uma ação, objetivando resultar o cessar
instantâneo da aflição momentânea pela qual passa.
Legalizar a eutanásia é atestar a incapacidade de se lutar pela vida, vida esta
tutelada de forma objetiva antes da situação determinante de seu fim, quando de sua
manutenção moral, física e ideológica, contradizendo não só o fato fundamental defendido
por diversas religiões quanto ao retirar da vida, mas também dando a outrem o poder de
decisão de manter ou não tal direito.
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