O Esgotamento da Política Monetária - Instituto de Economia

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07/15/2005
O Estado de S. Paulo
São Paulo - SP
Artigo
O esgotamento da política monetária
B2
O esgotamento da política monetária
Fernando Fróes, Rui Modenesi e André Modenesi*
O grande desafio atual para a manutenção do regime de metas de
inflação está na dificuldade de compatibilizar a política monetária com
uma estratégia de crescimento econômico sustentável, sem
comprometer o equilíbrio fiscal.
O problema é fácil de ser entendido. Dadas as características da
economia brasileira - a acentuada participação dos preços
administrados; a vulnerabilidade externa, que obriga a adoção de uma
permanente política de atração de capitais externos via taxa de juros
reais altas; e a forte influência da taxa de câmbio sobre o nível geral
de preços -, o alcance de níveis de inflação próximos à meta, entre
2000-2004, só foi possível pela fixação da taxa básica de juros, a
Selic, em patamares excessivamente elevados.
Assim, a política monetária, quando obteve êxito em manter a inflação
em níveis reduzidos, o fez deprimindo fortemente a demanda
agregada e contendo apenas os preços que respondem às forças de
mercado, os chamados preços livres.
Essa política restritiva, via taxa de juros, não só afetou negativamente
o produto e o emprego, como também agravou o desequilíbrio fiscal,
nos três níveis de governo, tendo em vista o impacto da taxa Selic
sobre o resultado das contas públicas e o endividamento público (os
juros incidentes sobre a dívida pública dependem da Selic e do
estoque da dívida, o qual, por sua vez, resulta do acúmulo de déficits
passados).
As estatísticas da dívida pública líquida, desde a implantação do
regime de metas de inflação no País, são inequívocas ao revelarem o
impacto fortemente negativo da política monetária nas finanças do
governo, confirmando as estimativas de A. Povoa, segundo as quais
cada elevação de 0,5 ponto de porcentagem na Selic implica aumento
de cerca de R$ 2,5 bilhões no serviço da dívida pública.
Os dados do Banco Central mostram que, em todos os anos desde a
implantação do novo regime monetário, as despesas com o pagamento
de juros sobre a dívida pública líquida inverteram os resultados das
finanças do governo, transformando superávits fiscais primários em
déficits nominais. Pior, os déficits nominais foram crescentes de 2001
a 2003 (3,6%, 4,6% e 5,1%, respectivamente, em 2001, 2002 e
2003), a despeito do esforço de ajuste das contas públicas realizado
nas três esferas de governo.
Uma outra face desse problema causado pela política monetária foi o
forte crescimento da relação dívida líquida do setor público/PIB, que
saltou de 41,7%, em dezembro de 1988, para 57,2%, em 2003, e
recuando para 51,8%, em 2004. Isto é, não obstante a busca
insistente da sustentabilidade da dívida pública por meio da geração
de superávits primários crescentes, a relação dívida pública líquida/PIB
continuou em níveis elevados, ou seja, acima de 50%.
A sustentabilidade é importante para garantir o pagamento da dívida
no longo prazo e, ao mesmo tempo, reduzir o risco e o custo de seu
carregamento pela obtenção de taxas reais de juros cada vez
menores.
Aliás, o próprio Banco Central deve estar surpreso com este resultado,
pois, em relatório de 1999 sobre a dívida líquida e o déficit do setor
público, previra que, pela geração de superávits primários de apenas
3% do PIB ao ano, seria possível reduzir a relação dívida pública
líquida/PIB para níveis inferiores a 46,5%, já ao final de 2001. Hoje,
em 2005, o País continua com uma relação ainda superior a 50%.
Enfim, dado o forte impacto da taxa de juros Selic no endividamento
público (no governo federal, a participação dos títulos públicos
indexados à taxa Selic chega a mais de 60%), o custo da política
monetária sobre as finanças públicas está excessivamente elevado.
Além disso, e mais grave ainda, mesmo com a manutenção da taxa
Selic em patamares recordes, a política monetária não livrou a
economia brasileira de um longo período no purgatório, em que
persistem um alto piso inflacionário - de natureza inercial -, reduzidas
taxas de crescimento econômico e elevados níveis de desemprego.
Parece que se está perto do limite, além do qual a elevação da taxa de
juros será cada vez mais contestada por seus efeitos negativos sobre
as finanças públicas, sugerindo estar próxima a hora de rever
objetivos e mudar o mix de instrumentos da política antiinflacionária,
necessariamente desindexando a economia.
*Fernando Fróes e Rui Modenesi são economistas do BNDES.
André Modenesi é autor do livro: Regimes monetários: teoria e a
experiência do real (Manole, 2005)
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