ESPIRITUALIDADE NA EVANGELIZAÇÃO 1. Espiritualidade missionária (João 3, 16-18; Marcos 3, 13-19; Mateus 28, 16-20) Existem filosofias e religiosidades que colocam o objetivo principal da sabedoria na conquista de um bem que se situa dentro do próprio indivíduo, como, por exemplo, conseguir a harmonia interior perfeita. A harmonia interior é um bem desejável, sem dúvida, mas o objetivo da espiritualidade vai além, tal como nos mostra o próprio Jesus. Faz sentido alguém procurar a paz interna só para si enquanto o próximo sofre dores terríveis? Na visão cristã da realidade existe um elo ou comunhão humana entre as pessoas de forma que tudo quanto afeta ao outro tem a ver também comigo. Daí que a nossa espiritualidade não pode ser meramente individualista mas de comunhão. Espiritualidade que passa, necessariamente pelo coração de cada um, mas não fica isolado de forma egoista para si. Jesus tinha consciência de ser missionário do Pai para servir a humanidade. Quer dizer, Ele sabe que é alguém que vem do Pai para o mundo com uma missão. A vida toda de Jesus se programa em relação a este objetivo: EVANGELIZAR, anunciar aos seres humanos a misericórdia de Deus que é Pai amoroso de todos e, como conseqüência, a fraternidade humana universal. Jesus continua a dinâmica do Pai: chama e envia os discípulos para dar seguimento à sua missão sob a inspiração do Espírito Santo. A missão de evangelizar não é como um objeto acessório que faz de enfeite mas que se pode prescindir sem perder nada essencial. Evangelizar é coração da identidade cristã. A forma de evangelizar varia de um para outro, mas é ocupa o centro do discípulo de Cristo. O batizado se coloca a serviço do Reino de Deus. É este serviço que vai marcar a sua vida. Jesus vem do Pai e se entrega por amor a todos os seres humanos. O cristão segue o seu exemplo, se sabe alguém que Deus escolheu e enviou para o bem dos outros, de acordo com o projeto do Pai. 2. Descobrir e acolher o dom de Deus. SOMOS EVANGELIZADOS. (João 7, 37-39; Efésios 2, 1-10; Salmos 9291 e 27-26) Deus é a fonte do amor e da alegria humana. É para Ele que voltamos o olhar e o coração a todo instante para saciar nossa sede de paz. A tentação humana é querer de alguma forma comprar ou adquirir a misericórdia divina em troca de alguma coisa. Penitências, promessas, sacrifícios... são expressão da nossa fé ainda imperfeita. Deus aproveita pedagogicamente também estas expressões para nos ajudar a caminhar na fé. Mas nos convida a procurar de graça a fonte da água viva que é Jesus e o seu Evangelho. A cada dia somos convidados a realizar na fé este encontro vivo com Jesus Cristo ressuscitado e com Ele beber do amor do Pai que jamais acaba. O Espírito Santo nos convida a toda hora para darmos este passo de fé: deixar de negociar com Deus a nossa salvação e nos entregarmos confiantes em suas mãos amorosas. Aqui nasce a liberdade do Espírito! Quando não precisamos fazer coisas para agradar a Deus e ganhar o seu favor para conosco. Nesse caso ficamos presos das nossas próprias obras... que, por outro lado, jamais serão perfeitas, dignas do céu. Eis aí uma religião que gera angústia e prega o moralismo sem jamais alcançar o objetivo da santidade pelo cumprimento de normas e ritos externos. Religiosidade que produz frustrações que se disfarçam por meio de ritos externos. Livre de ter que agradar a Deus a espiritualidade cristã se concentra na acolhida do dom gratuito de Deus, que é o Espírito Santo. Receber o dom gratuito, agradecer e deixar que este Dom frutifique em nós. Nisto consiste a espiritualidade cristã. Tem capacidade de amar quem é amado. Tem capacidade de evangelizar quem é evangelizado. É de graça que a cada dia saboreamos a presença do Senhor e provamos do seu amor que não tem comparação com nenhum outro amor humano. Conquistados pela ternura do Senhor somos transformados a semelhança de Jesus e com Ele anunciamos ao mundo que existe uma esperança, um caminho, um projeto válido de vida em comunhão... apesar de tantas contradições e sofrimentos. 3. Ser um dom para os outros. SOMOS EVANGELIZADORES. (1 Coríntios 9, 16-18; 2 Coríntios 3,1-6) O mundo moderno descobriu valores muito importantes para conseguir uma vida com maior qualidade material para todas as pessoas. É claro que isto é muito importante e necessário. Todas as conquistas em favor de uma vida mais digna para o povo se relacionam diretamente com a presença do Reino de Deus no meio de nós. Devem ser valorizadas e desenvolvidas. A novidade do Evangelho de Jesus vai ainda mais longe. É a descoberta do mistério que se esconde em cada ser humano como um dom de Deus para os outros. A verdadeira mística evangélica não se fecha para conservar coisas ou situações materiais. Se abre para se doar e enriquecer os outros com o próprio dom. Não somos donos dos valores principais que carregamos nas mãos: a vida, o amor, a fé. Somos administradores que recebemos de graça e somos convidados a partilhar com alegria e simplicidade a vida que nos vem de Deus. É assim que Jesus entendeu a sua vida e foi coerente até o fim. Ser um dom para os outros não quer dizer que o cristão deve estar a toda hora procurando agradar aos outros. De jeito nenhum! Aí seria um desvio psicológico. Nós temos uma referência, um projeto: o Evangelho de Jesus Cristo, o Reino de Deus, o projeto do Pai para cada um e para todos. Porque os cristãos e a Igreja podemos ser utilizados para outros projetos históricos ou interesses de grupos ou sociedades que nos afastam do caminho do Senhor. Nós entregamos a própria vida a partir do Deus de Jesus e caminhando para esse mesmo Deus. Na história da Igreja os cristãos tem sido instrumentos a serviço de interesses feudais, colonialistas, capitalistas... e, agora, neoliberais. Os santos souberam sempre servir à humanidade mantendo a independência necessária dos poderes de cada época. Quando aceitamos nosso ser como um dom para os outros é que adquirimos a liberdade dos filhos e filhas de Deus, pois nada temos a perder dado que nossa existência está nas mãos de Deus. Até a própria vida podemos doar sem medo de perder nada. Esta liberdade evangélica é sumamente eficaz em favor da dinâmica do amor no mundo e possibilita profundas transformações para o crescimento do Reino de Deus. 4. Espiritualidade do Êxodo. SOMOS PEREGRINOS / “TENDA”. (Marcos 10, 32-45; ). Êxodo significa saída, caminho para a liberdade. Páscoa é passagem: da escravidão para a liberdade, da morte para a vida. A espiritualidade cristã não pode jamais cochilar na paz etérea das fumaças do incenso. É peregrina e caminheira, lutadora e transformadora. A própria Igreja sempre se entendeu a si mesma como Povo de Deus a caminho do Reino definitivo. A história carrega as sementes do Reino. É por isso que o Reino já está no meio de nós. Mas ainda não plenamente. A realização total acontece do outro lado da história que fica oculta para nós. É por isso mistério que acolhemos na fé. Um sinal desta fé consiste em viver como peregrinos, sem se apegar de forma absoluta a nada nem a ninguém... Só Deus é absoluto e só nele que encontraremos a plenitude da vida. Quem caminha procurando a liberdade não precisa carregar muita coisa. Coisas demais atrapalham. Leva-se o essencial. Deus no coração, mãos abertas para o próximo, o projeto de Jesus na cabeça e a leveza do Espírito nos pés. A exemplo de Maria, caminheira que sai de Nazaré para servir a Isabel. É impossível o Êxodo sem Aliança. Não dá para caminhar na vida da fé sem amor nem compromisso, sem projeto e sem promessa. O amor de Deus engrandece nosso coração para nos doar sem medida. Sua Palavra nos encoraja nas dificuldades, ilumina nas incertezas, consola nos sofrimentos, anima nas provações, cura as feridas, corrige nos momentos de fraqueza, perdoa nossas falhas... A Palavra é Viva: Jesus peregrino conosco, solidário, presente como com os discípulos de Emaús. A Igreja precisa mudar muito ainda para se abrir a uma nova espiritualidade que está desabrochando em novos ministérios onde os leigos e leigas desenvolvem a sua fé. A comunidade de Jesus não pode ficar parada nem se fechar em si mesma porque pertence a Deus e o Espírito a anima a se inserir na história dos homens para ser fermento, luz e sal... QUESTIONÁRIO PARA OS CÍRCULOS DE REFLEXÃO: 1. Escolher rapidamente (se ainda não foi indicado) um(a) coordenador(a) e um(a) secretário(a) para o grupo. O coordenador irá controlar o tempo com equilíbrio, procurando a participação de todos, concentrando o diálogo dentro do assunto e agilizando a reunião para poder abordar todos os itens deste questionário. 2. Fazer a leitura do texto “A espiritualidade das Diretrizes”. (Encontra-se depois deste questionário). 3. Comentar a palestra e o texto. 4. Perguntas para todos os grupos: - Quais são as maiores dificuldades hoje para um leigo(a) cultivar apropriadamente uma espiritualidade que seja cristã? - Quais instrumentos a Igreja coloca em nossas mãos para poder articular uma espiritualidade que seja evangelizada e evangelizadora? 5. Perguntas para cada grupo: - GRUPO 1: Perante uma sociedade que exagera o individualismo o Evangelho de Jesus nos convida a viver uma espiritualidade de comunhão. O que significa no mundo atual espiritualidade de comunhão? - GRUPO 2: Perante uma sociedade mergulhada no consumismo o Evangelho de Jesus nos convida a viver uma espiritualidade de misericórdia. Como pode hoje a Igreja desenvolver uma espiritualidade de misericórdia? - GRUPO 3: Perante uma sociedade que busca soluções mágicas e fáceis para resolver os problemas o Evangelho de Jesus nos convida a assumir uma espiritualidade do compromisso. Como nós podemos colocar na prática uma espiritualidade comprometida e solidária? - GRUPO 4: Perante uma sociedade que confunde a fantasia dos meios de comunicação com a realidade, tantas vezes difícil para o nosso povo, o Evangelho nos convida a trabalhar uma espiritualidade solidária com os sofredores, pé no chão e realista. Como nós podemos desenvolver nas comunidades esta espiritualidade? - GRUPO 5: O mundo atual parece que quer manipular a religião, a Deus, em proveito próprio. Parece que é Deus quem está na obrigação de fazer a vontade do homem. Eu participo de um culto e Deus tem que me dar saúde, dinheiro, felicidade, etc. Se eu não receber esses bens materiais largo essa religião para abraçar outra. O - 336. 337. 338. 339. 340. 341. 342. Evangelho de Jesus nos convida a viver uma espiritualidade da obediência a Deus. É na escuta da Palavra, na Liturgia e na prática da caridade que se alimenta esta espiritualidade. Como poderíamos melhorar a prática destes 3 meios em nossas comunidades? GRUPO 6: A sociedade moderna se pauta pelo comodismo e o desejo de receber tudo prontinho na mão. Maria de Nazaré, quando ficou grávida de Jesus pela ação do Espírito Santo, saiu da casa dela e peregrinou para visitar e servir à sua prima Izabel. Ela nos ensina a viver a espiritualidade da visitação. Como nós podemos imitar o exemplo de Nossa Senhora em nossas comunidades? ESPIRITUALIDADE DAS DIRETRIZES (Diretrizes da Ação Evangelizadora. Anos 99 a 02). A exigência maior para cada evangelizador é de viver uma espiritualidade sólida e capaz de dar conta da própria esperança. Só uma espiritualidade firme pode dar sustentação ao testemunho cristão, especialmente se levarmos em conta que a cultura atual aprecia a religiosidade e os valores espirituais, mas numa perspectiva fortemente individualista e subjetivista, e tende a atribuir o mesmo valor às várias opções religiosas. Do evangelizador exige-se uma profunda mística cristã e missionária, que tenha força para envolvê-lo totalmente, ajudando-o a renovar as expressões do anúncio, o ardor evangélico e a busca de novos métodos. O evangelizador, portanto, viverá e cultivará a espiritualidade autenticamente cristã, que tem seus fundamentos na Palavra de Deus e na Eucaristia, nas celebrações dos mistérios de Deus, na vida comunitária e no serviço ao mundo. Alguns aspectos são particularmente relevantes: - Deixar-se conduzir pelo Espírito, capaz de transformar tímidos discípulos em testemunhas corajosos, atentos aos “sinais” da presença do Reino em ação. - Viver em íntima comunhão com Cristo. Enviado para evangelizar, o Filho de Deus despoja-se de si mesmo, renuncia a projetos humanos e dedica-se totalmente ao projeto do Pai. - Abrir-se a uma profunda sensibilidade com a maneira de ser do nosso povo, em sua fé, de modo especial, em sua piedade mariana. Para o evangelizador, a Virgem Maria, Mãe de Cristo e da Igreja, a mais perfeita discípula, é o modelo de todos os discípulos e evangelizadores. - Pautar-se por uma profunda caridade apostólica. Percorrer o caminho de Jesus como evangelizador hoje leva-nos a descobri-lo como servo de todos, numa atitude de abertura e de diálogo, anunciando a Boa-Nova do 343. 344. 345. 346. 347. 348. 349. Reino, vivendo em íntima comunhão com o Pai e com os discípulos, com eles celebrando a ação de graças e de louvor ao Pai. Essa caridade apostólica é “feita de atenção, ternura, compaixão, acolhimento, disponibilidade e empenho pelos problemas da gente”. - Abraçar uma atitude missionária que, vencendo o comodismo e o medo, anuncia explicitamente Jesus Cristo e seu Reino. Esse anúncio explícito insere-se no meio da vida das pessoas e dos grupos e leva muito em conta as culturas (INCULTURAÇÃO). - Cultivar uma atitude de fortaleza e perseverança diante das perplexidades, adversidades e conflitos. Essa atitude é fruto da esperança a que somos chamados, e está fundada nas promessas do Senhor e não em nossos projetos. Não pode ser confundida com fundamentalismo, fanatismo ou teimosia. - É preciso descobrir as aberturas do coração humano e seus anseios como, por exemplo, daqueles que estão à procura de solidariedade, de paz, de novas relações com a natureza, de defesa dos direitos humanos, das minorias, da mulher... - Abrir-se para uma atitude de acolhida do outro, em especial de quem pertence a tradições religiosas e culturais diferentes. Essa atitude está alicerçada num espírito de tolerância e respeito e realiza-se mediante o diálogo aberto, que valoriza a experiência do outro e o ajuda na sua busca, sem julgar nem condenar nem impor. - Assumir uma atitude de misericórdia, daquela misericórdia do próprio Deus, que encontrou a sua expressão mais alta nas atitudes de Jesus para com pobres, aflitos e pecadores, para com todos os crucificados dessa terra, que o evangelizador amará como os preferidos de Deus e ajudará a tornar-se eles mesmos evangelizadores, a partir de sua experiência do sofrimento e da paixão de Cristo. - Participar generosa e alegremente na vida e na missão da comunidade, sinal e germe do Reino, vencendo os perigos do individualismo e do fechamento em grupos restritos. Testemunho particularmente válido hoje é a comunidade solidária e alegre, imagem e início da comunhão com a Trindade Santa. Em resumo, o evangelizador de hoje deve ser um santo, cheio de ardor missionário; seu zelo “brote de uma verdadeira santidade de vida, alimentada pela oração e, sobretudo, pelo amor à Eucaristia”. Assim, imitar-se-ão tantos exemplos de fidelidade do passado e alongar-se-á o martirológio, segundo a sugestão do Papa. - - - - - - - - - Diretrizes: anos 2.003 a 2,006). Documento 71 da CNBB. Fazer da Igreja a casa e a escola da comunhão: coração voltado para a Trindade, capacidade de sentir o irmão de fé como um que faz parte de mim, capacidade de ver o que há de positivo no outro e criar espaço para o irmão levando os fardos uns dos outros. (18). Celebrar a liturgia. O mistério de Cristo vai sendo celebrado no decorrer do ano, tendo como ponto culminante a Páscoa. Valorizar os tempos litúrgicos, ressaltando a espiritualidade e as atitudes próprias de cada tempo, sempre na perspectiva do mistério pascal. (19). A vivência da tríplice dimensão (escuta da Palavra, comunhão fraterna e compromisso com a justiça) alimenta e expressa a espiritualidade batismal, que configura o cristão com Cristo e o faz viver como filho, irmão e servidor. (43). Participar dos Conselhos Pastorais. Escuta recíproca e eficaz, diálogo, buscando a mais ampla convergência possível e não apenas uma maioria simples. Garantir a mais ampla escuta de todo o povo de Deus. (106). Educar para a oração. Nossas comunidades devem tornar-se autênticas escolas de oração, onde o encontro com Cristo não se exprima apenas em pedidos de ajuda, mas também em ação de graças, louvor, adoração, contemplação, escuta, afetos da alma, até chegar a um coração verdadeiramente apaixonado. Uma oração intensa, mas que não afasta do compromisso na história. (109). Temos o dever de oferecer às pessoas programas de boa qualidade para a espiritualidade cristã, mediante os novos meios de comunicação. (111). No interior da comunidade eclesial, o diálogo deve ser uma regra permanente para a boa convivência e o aprofundamento da comunhão. A variedade de vocações deve ser vista como riqueza e não como motivo para competição e rejeição. (132). Valorizar o aspecto comunitário da Igreja, busca de comunidades eclesiais menores, de rosto humano, mais afetivas e acolhedoras, com mais participação. Envolver todos na Pastoral de Conjunto. (139). É necessária uma espiritualidade de comunhão, alimentada pela celebração eucarística, pois a eucaristia cria comunhão e educa para a comunhão. Esta espiritualidade se torna visível também no modo de orar. É preciso saber equilibrar as orações que expressam o “eu” (as necessidades do indivíduo) com a expressão do “nós” (a solicitude pela comunidade).