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Apelação Cível n. 2006.014959-9, de Balneário Camboriú
Relator: Des. Cesar Abreu
AÇÃO
CIVIL
PÚBLICA.
PRELIMINARES
AFASTADAS.
CONSTRUÇÃO
DE
EDIFÍCIO
RESIDENCIAL. VENDA DE FRAÇÃO IDEAL (APTO. 304)
SEM REGISTRO DA INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA
(ART. 32 DA LEI N. 4.591/64). CONCLUSÃO DA OBRA
COM OBSERVÂNCIA DAS EXIGÊNCIAS LEGAIS
PERTINENTES, INCLUÍDOS O HABITE-SE E A
INSTITUIÇÃO, CONSTITUIÇÃO, DISCRIMINAÇÃO E
CONVENÇÃO DO CONDOMÍNIO, COM A RESPECTIVA
AVERBAÇÃO NO REGISTRO DE IMÓVEIS. FATO
SUPERVENIENTE (ART. 462 DO CPC) A ENSEJAR A
PERDA DE OBJETO DA ACTIO, POR FALTA DE
INTERESSE DE AGIR. EXTINÇÃO DA AÇÃO. DESPESAS
PROCESSUAIS PELOS RÉUS, ANTE O PRINCÍPIO DA
CAUSALIDADE. RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE .
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação
Cível n. 2006.014959-9, da comarca de Balneário Camboriú, em que são
apelantes Espólio de Hermínio Kuntze e outro e apelado o Representante do
Ministério Público:
ACORDAM, em Segunda Câmara de Direito Público, por
votação unânime, dar provimento parcial ao recurso.
Custas na forma da lei.
RELATÓRIO
Cuida-se de Ação Civil Pública deflagrada pelo Ministério
Público contra Hermínio Kuntze e sua mulher Francisca Thives Kuntze por
terem os réus comercializado (apto. 304) frações ideais de terreno,
representadas por unidades condominiais autônomas a serem construídas –
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Edíficio Residencial Hermínio Kuntze -, em desconformidade com a Lei n.
4.591/64 (arts. 32, 65 e 66), ou seja, não procederam ao "prévio registro de
incorporação perante o cartório imobiliário" competente.
Deferida a liminar, os réus contestaram o feito (fls. 45-60)
aduzindo, em resumo: preliminarmente: a) impossibilidade jurídica do pedido e
ilegitimidade ativa. No mérito, asseveraram que a comercialização da unidade
habitacional sem o procedimento da incorporação deveu-se por extrema
necessidade (doença grave do réu varão) e quando já concluída a
construção, portanto, não na condição de incorporadores mas de vendedores.
Requereram, por fim, o julgamento do feito na fase em que se encontrava, por
ser matéria estritamente de direito. Encartaram a documentação que
entenderam necessária (fls. 61-80).
Após resposta do Ministério Público (fls. 82-92) e dos réus
(fls. 93-96), sobreveio sentença (fls. 129-138) de procedência da ação.
Oferecidos embargos de declaração pelos réus (fls. 140146), sobre os quais manifestou-se o Ministério Público (fls. 150-152), o MM.
Juiz rejeitou-os (fls. 154-155) por entender ausente a omissão aventada.
Irresignados com a prestação jurisdicional, apelam os
vencidos. Para tanto, renovam as preliminares argüidas anteriormente,
acrescentando a de cerceamento de defesa. No mérito, além de reafirmar os
argumentos já expendidos, põem ênfase ao fato de que, "com a venda de uma
unidade do edifício após estar devidamente construído não mais é passível o
registro
da
incorporação,
mas
suscetível
a
instituição,
constituição,
discriminação e convenção do condomínio, a teor do art. 7º, ambos da
mencionada Lei n. 4.591/64, o que foi realizado pelos apelante, conforme
atestam os documentos de fls. 98/100 dos autos, e, também, outorgada a
escritura pública de transmissão definitiva ao único adquirente – Marcelo
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Paschoalini Garcia – registrada sob n. R-1, na matrícula 78.255, aos 27-112000 (fl. 96), inexistindo prejuízo ao comprador.
O
Ministério
Público
apresentou
contra-razões
pela
manutenção do decisum (fls. 179-189).
Noticiado o falecimento de Hermínio Kuntze, houve a
habilitação do espólio (fls. 191-196).
Os autos subiram e foram à Procuradoria-Geral de Justiça,
que opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 201209).
VOTO
O recurso comporta provimento parcial.
Inicialmente, registra-se que as preliminares foram bem
afastadas pelo Magistrado a quo. De fato, há possibilidade jurídica do pedido à
medida que houve infringência ao art. 32 da Lei n. 4.591/64 com a venda do
apartamento do edifício ainda em construção, sem que fosse procedida a
incorporação. O Ministério Público, por outro lado, está legitimado à propositura
da presente ação porque, segundo determina o art. 129, III, da Constituição
Federal, c/c os artigos 81, parágrafo único, e 82, I, do Código de Defesa do
Consumidor, está autorizado a pleitear em Juízo a tutela coletiva dos
interesses e direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos dos
consumidores, sendo o caso dos autos. Cerceamento de defesa também não
houve, haja vista a desnecessidade, in casu, de dilação probatória por ser a
hipótese estritamente de direito.
Pois bem, a ação foi proposta por haver os réus infringido
os seguintes artigos da Lei n. 4.591/64:
"Art. 32 – O incorporador somente poderá negociar sobre
unidades autônomas após ter arquivado, no cartório
competente de Registro de Imóveis, os seguintes documentos:
[...]."
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"Art. 65 - É crime contra a economia popular promover
incorporação, fazendo, em proposta, contratos, prospectos ou
comunicação ao público ou aos interessados, afirmação falsa
sobre a construção do condomínio, alienação das frações
ideais do terreno ou sobre a construção das edificações."
"Art. 66. São contravenções relativas à economia popular,
puníveis na forma do artigo 10 da Lei n. 1.521, de 26 de
dezembro de 1951: I - negociar o incorporador frações ideais
de terreno, sem previamente satisfazer as exigências
constantes desta Lei; [...]."
De fato, há nos autos prova inequívoca de que os réus
negociaram o apartamento n. 304 do edifício Hermínio Kuntze em
desconformidade com os dispositivos acima transcritos, sendo irrelevante o
argumento de que a comercialização se deu por extrema necessidade, ou seja,
por doença grave do réu varão.
Entretanto, fato superveniente à propositura da ação fez
com ela perdesse o seu objeto, qual seja, a obra foi concluída e possui todas
as licenças e alvarás exigidos na legislação de regência, mormente o "Habitese" (fls. 72) e a instituição, constituição, discriminação e convenção de
condomínio, devidamente averbado no Registro de Imóveis sob a Matrícula
60.632 (fls. 98-99).
Ora, colhe-se da lição de Franciny Beatriz Abreu de
Figueiredo e Silva, in Prática de Registro de Imóveis, Florianópolis: Conceito
Editorial, 2008, p. 105:
"O registro da incorporação é procedimento obrigatório, e
requisito essencial para colocação a venda e oferta ao público de um
empreendimento imobiliário em fase de construção.
"A obrigatoriedade do registro da incorporação, entretanto,
somente existe, é bom ressaltar, quando há colocação a venda de
unidades em construção, ou seja, quando caracterizada a atividade
econômica de oferta a público do empreendimento imobiliário.
Assim, não existe obrigatoriedade do registro de incorporação
imobiliária no caso de vários co-proprietários de um terreno
construírem para si próprios em conjunto um prédio. Somente
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haverá, in casu, o registro da instituição do condomínio edilício e da
sua divisão amigável."
Destarte, o fato superveniente (art. 462 do CPC) de
conclusão da obra e providenciadas todas as exigências legais a ela inerentes,
não há mais como reclamar ou obrigar o procedimento de incorporação,
perdendo completamente o seu objeto a presente Ação Civil Pública, ficando
os réus liberados à negociação que lhes for mais conveniente.
Registra-se, por fim, que, tendo em vista o princípio da
causalidade, uma vez extinto o processo sem julgamento de mérito, em razão
da perda de objeto por fato superveniente, as despesas processuais devem ser
suportados pela parte que, de forma injurídica, deu causa ao ajuizamento da
demanda (Apelação Cível n. 2007.056349-3, da Capital, Relator Des. Sérgio
Roberto Baasch Luz).
Custas e demais despesas processuais, portanto, a cargo
dos réus.
DECISÃO
Ante o exposto, por unanimidade de votos, a Câmara
decidiu dar provimento parcial ao recurso.
O julgamento, realizado no dia 8 de julho de 2008, foi
presidido pelo Exmo. Sr. Des. Orli Rodrigues e dele participou o Exmo. Sr. Des.
Cid Goulart. Funcionou como Procurador de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Guido
Feuser.
Florianópolis, 10 de julho de 2008.
Cesar Abreu
RELATOR
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