Gramsci, António (1891-1937) Autor neomarxista italiano. Nasce na Sardenha e estuda em Turim. Militante do partido socialista, destacando-se as suas colaborações em L’Avanti. Funda em 1919 L’Ordine Nuovo. Fundador do PCI em 1921, torna-se seu secretário-geral em 1924. Preso pelo fascismo a partir de 1926, acaba por morrer na cadeia de tuberculose. Influenciado por Benedetto Croce e Giovanni Gentile. Identifica o político com o coercitivo, considerando a sociedade civil como a zona da hegemonia, o reino das superestruturas culturais e ideológicas pelos quais a classe dominante no poder obtém a adesão ou consentimento, em tensão com uma sociedade política, entendida como o reino do político, do domínio, o aparelho coercitivo destinado a conformar as massas, incluindo tanto as forças destinadas à coerção física (forças armadas, polícia e justiça) como os órgãos de formação do direito (a burocracia, o parlamento e o governo). É neste sentido que visiona o Estado como a soma da sociedade civil e da sociedade política, a hegemonia couraçada pela coerção, uma trincheira avançada atrás da qual se encontra uma robusta cadeia de fortalezas e casamatas, diferentemente de uma sociedade civil primitiva e gelatinosa . Considera a sociedade civil como o conjunto dos organismos vulgarmente ditos privados que correspondem à função de hegemonia que o grupo dominante exerce em toda a sociedade e a sociedade política, também identificada com o Estado, como aquela que corresponde à função de hegemonia que o grupo dominante exerce em toda a sociedade. Enquanto a sociedade civil é o reino das super-estruturas culturais e ideológicas, a sociedade política é o reino do político. A sociedade civil é o conteúdo ético do Estado, a organização material destinada a manter a dependência e a desenvolver a frente teórica e ideológica da classe dominante (a Igreja, a organização escolar, as organizações da imprensa, as forças armadas e a magistratura). A sociedade política é o aparelho coercitivo destinado a conformar as massas, é a burocracia que exerce o poder coercitivo e que, de certa maneira, se transforma em casta. Se a sociedade política exerce uma função de coerção, dado que até pode intervir supletivamente as organizações para-militares, já a sociedade civil apenas exerce uma função de hegemonia. Considera que a tomada do poder político é impossível sem a prévia tomada do poder cultural, pelo que visiona a necessida de intelectuais orgânicos que dêem homogeneidade ideológica aos revolucionários. António Gramsci,por exemplo,que recebeu Hegel através de Labriola e Croce, retomou, a partir de 1930,os manuscritos do jovem Marx, vem considerar que o marxismo constitui fundamentalmente "a filosofia da praxis",diferentemente das qualificações de "materialismo histórico" e "materialismo dialéctico",nunca utilizadas por Marx, onde a "teoria penetra na massa,mas também emerge dela.Isto é,surge e afirma-se na interacção prática material que constituem as relações sociais que formam a massa".Neste sentido apela para a "unidade dialéctica do pensar e do ser,da verdade e da realidade,do abstracto e do concreto,do ideal e do real". Para o mesmo autor ,"o comunismo crítico nada tem de comum com o positivismo filosófico,metafísica e mística da evolução e da natureza.O marxismo baseia-se no idealismo filosófico".Segundo ele,Marx porque "não era filósofo de profissão e às vezes dormitava...introduziu nas suas obras elementos positivistas",mas no "essencial da sua doutrina é tributário do idealismo filosófico" e que no desenvolvimento ulterior desta filosofia se encontra a corrente idealista em que o movimento proletário e socialista conflui numa aderência histórica". Gramsci, com efeito, considerava que a filosofia é um pensamento que também é acção, um pensamento intimamente ligado a regras de conduta, não se distinguindo da moral e da política.Neste sentido, chega mesmo a defender um novo bloco cultural que levasse à união das massas e dos intelectuais, ligado ao desenvolvimento da actividade científica. O mesmo Gramsci chega a concluir que "o factor máximo da história não são os factos económicos,brutos,mas o homem" e que a vontade humana é que é a "força motriz da economia,a plasmadora da realidade objectiva".Como assinala Pedro Cavalcanti e Paolo Piccone,"é um marxismo que não vê Hegel como precursor de Marx,mas faz de Marx um continuador de Hegel". Ou,como diz Edgar Morin,"favoreceu o desenvolvimento de um marxismo 'aberto' que reestabeleceu a comunicação com a filosofia hegeliana e admitiu em todas as coisas a contradição e o excesso" Neste sentido,quase pode subscrever-se uma asserção do mesmo Gramsci,para quem "todos são um pouco marxistas inconscientemente". Ou,como salienta Popper,"Marx abriu e aguçou a nossa visão de muitos modos.uma volta à ciência social anterior a Marx é inconcebível.todos os escritores modernos têm dívida para com ele,mesmo que o ignorem". Quaderni del Carcere 1929 1935. L'Ordine Nuovo 1919 1920 Turim, Edizioni Einaudi, 1954. Scritti Giovanili 1914 1918 Turim, Edizioni Einaudi, 1958. Sotto la Mole Turim, Edizioni Einaudi, 1960. Socialismo e Fascismo. L'Ordine Nuovo 1921 1922 Turim, Edizioni Einaudi, 1966. Note sul Machiaveli, sulla Politica e sullo Stato Moderno Turim, Edizioni Einaudi, 1968. La Costruzione del Partito Comunista 1923 1926 Turim, Edizioni Einaudi, 1971. Escritos Políticos 4 vols., trad. port. de Manuel Simões, Seara Nova, 1977. Quaderni del Carcere, 1929-1935 Gramsci, António Note sul Machiaveli, sulla Politica e sullo Stato Moderno Gramsci, António Avanti (L’) Gramsci, António Ordine Nuovo Gramsci, António Hegemonia e Domínio Gramsci, António Hegemonia couraçada pela coerção Gramsci, António Burocracia como casta Gramsci, António Intelectuais orgânicos Gramsci, António Marxismo como filosofia da Praxis Gramsci, António Comunismo crítico Gramsci, António Marxismo aberto Gramsci, António Togliatti Gramsci, António Anderson, P., Sur Gramsci, Paris, Éditions Maspero, 1978. 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