MARCELO DE PAIVA ABREU DIONÍSIO DIAS CARNEIRO GUSTAVO H. B. FRANCO WINSTON FRISTCH LUIZ ARANHA CORRÊA DO LAGO EDUARDO MARCO MODIANO LUIZ ORENSTEIN DEMÓSTHENES MADUREIRA DE PINHO NETO ANDRÉ LARA RESENDE ANTÔNIO CLÁUDIO SOCHACZEWSKI SÉRGIO BESSERMAN VIANNA MARCELO DE PAIVA ABREU (ORGANIZADOR) A ORDEM DO PROGRESSO CEM ANOS DE POLÍTICA ECONÔMICA REPUBLICANA 1889-1989 RESUMO BERNARDO LANZA QUEIRÓZ BRUNO CARAZZA DOS SANTOS CARLA AGUIAR GUSTAVO DE BRITTO ROCHA GUSTAVO C. PATRÍCIO HUMBERTO CARLOS FARIA TEIXEIRA JANETE DUARTE MARIA FERNANDA DIAMANTE BASQUES MATHEUS ALBERGARIA DE MAGALHÃES PATRÍCIA ALVARENGA BRUNO CARAZZA GUSTAVO BRITTO MATHEUS ALBERGARIA (ORGANIZADORES) SUMÁRIO Capítulo 1- A Primeira Década Republicana ............................................................................................... 3 Capítulo 2 - Apogeu e Crise na Primeira República: 1900-1930 ................................................................. 6 Capítulo 3 - Crise, Crescimento e Modernização Autoritária, 1930-45 ....................................................... 9 Capitulo 4 - Política Econômica Externa e Industrialização: 1946-1951 ................................................... 11 Capítulo 5 – Duas Tentativas de Estabilização: 1951-1954 ....................................................................... 13 Capítulo 6 - O Interregno Café Filho: 1954-55 .......................................................................................... 17 Capítulo 7– Democracia com Desenvolvimento – 1956-61 ....................................................................... 20 Capítulo 8 - Inflação, Estagnação e Ruptura: 1961-1964 ........................................................................... 23 Capítulo 9 - Estabilização e Reforma: 1964 / 1967 .................................................................................... 28 Capítulo 10 - A Retomada do Crescimento e as Distorções do “Milagre”: 1967-1973 ............................. 32 Capítulo 11 - Crise e Esperança: 1974-1980 .............................................................................................. 37 Capítulo 12 – Ajuste Externo e Desequilíbrio Interno: 1980-1984 ............................................................ 43 Capítulo 13 - “A ópera dos três cruzados : 1985-1989” ............................................................................. 48 2 CAPÍTULO 1- A PRIMEIRA DÉCADA REPUBLICANA Gustavo H. B. Franco (Gustavo C. Patrício) 1. Introdução A primeira década do regime republicano foi das mais difíceis para a política econômica. Tais dificuldades devem-se ao fato de que ai observam-se os momentos cruciais de importantes transformações "estruturais" na economia do país, destacadamente a súbita disseminação do trabalho assalariado no campo e o reordenamento da inserção do país na economia internacional. A década de 90 seria memorável em seus debates em torno da orientação a ser dada a política macroeconômica. A República teria como seu primeiro ministro da Fazenda um campeão papelista de indiscutível talento, Rui Barbosa. Uma depreciação cambial em 1891 inauguraria um período de hesitações e de progressiva deterioração das contas externas, recebendo em contra partida, uma reação conservador avassaladora, a partir de meados da década, e em 1898, o país lavaria um plano conservador de saneamento monetário e fiscal as suas últimas conseqüências. Os anos 90 conhecem, portanto, ambos os extremos do espectro doutrinário. 2. O Brasil e a Economia Internacional O crescente envolvimento do Brasil com a economia internacional constitui um traço fundamental, da história econômica do país nos últimos anos do século XIX. O valor das exportações per capita, contudo, não chega a definir o Brasil como uma economia especialmente "aberta". Além disso, a participação brasileira sobre o comércio mundial é ainda, muito pequena, inferior a 1% em 1913. A participação brasileira no tocante ao investimento internacional é bem mais substancial. O montante do estoque de capital estrangeiro no Brasil em 1913, incluindo-se ai investimentos inglese, franceses, alemães e norte-americanos, diretos e de carteira representa cerca de 30% do total para a América Latina e 5,4% do total mundial. Ao longo dos anos 90 a convivência do país com os mercados financeiros internacionais se enriquece sobremaneira. A conta capital passa a ter importância crescente no contexto das contas externas do país, tornandose um mecanismo através do qual a instabilidade da receita comercial poderia ser compensada, e que também permitia a manutenção de níveis de absorção maiores do que seria possível na ausência de capitais externos, em contra partida, argumenta-se comumente que é exatamente, na articulação perversa entre movimentos de capital e as contas comerciais que se devem procurar as raízes da instabilidade macroeconômica a que esteve sujeita a economia brasileira em sua fase caracteristicamente, primário-exportadora. Este é, na verdade, um debate que extravasa a historiografia brasileira. Os mesmos mecanismos que asseguram estabilidade macroeconômica nos países centrais implicam instabilidade nos países da chamada periferia. A evidência disponível no que tange aos países centrais não é definitiva, mas parece apontar na direção de um comportamento contracíclico em se tratando de saídas de capital, e pró-cíclico no que respeita aos termos de troca. Para o Brasil em particular, convém observar que, tomando o período 1870-1900, como um todo, a correlação entre movimentos de capital e termos de troca não revela nenhum padrão dominante. A relação entre movimentos de capital e a evolução da capacidade para importar melhor informa sobre a influência daquele sobre o estado das contas externas do país e consequentemente, sobre as flutuações da taxa de câmbio. Em dois períodos onde as entradas de capital são reduzidas, 1876-1883 e ao longo dos anos 90, de fato se observaram dificuldades cambiais. A depreciação cambial assume dimensões de crise em 1891, em função disso, observa-se uma significativa desvalorização real da taxa de câmbio, o que certamente teve papel importante em reduzir o déficit em conta corrente. Esta forma de ajustamento fornece talvez um dos melhores exemplos disponíveis do que se convencionou chamar, segundo análise pioneira de Furtado, de "socialização das perdas". No tocante à crise de 1891 a interpretação tradicional atribui o colapso cambial a expansão monetária provocada em última instância, pelas reformas no sistema monetário introduzidas por Rui Barbosa em 1890, o que também se aplica a crise que nos levou a moratória de 1898. É comum o viés no sentido de se explicar as flutuações cambiais nos anos 90 através das variações no preço do café. Vários estudos não são conclusivos, gerando dúvidas sobre interpretações simplistas da relação entre taxa de câmbio, a moeda e aos termos de troca. 3. Trabalho Assalariado e a Política Monetária O aumento da importância relativa do setor assalariado representou uma mudança qualitativa na organização econômica do país. Esta transição teve grande impacto monetário, com elevado grau de monetização e demanda por moeda na economia pela atividade agrícola, por exemplo. O sistema bancário, àquela época, era bastante concentrado na capital e seu incipiente desenvolvimento o tornava vulnerável às variações sazonais na procura por crédito e nos seus depósitos. Uma baixa propensão do 3 público para reter moeda sob forma de depósitos bancários impunha uma limitação estrutural à capacidade dos bancos de expandir seus empréstimos, ou créditos. Uma preocupante sucessão de crises na década de 1880, com crescente gravidade à medida que se aproximava o ano da Abolição, resultou em tornar inoportuna a política monetária deflacionista. Neste contexto, surgiu o primeiro grande projeto de reforma monetária, apresentado ao Senado em 1887. Contrapunham-se idéias sobre expandir e contrair a moeda. Em 1889, só o que a reforma de 87 tinha alcançado fora restabelecer a adesão ao padrão ouro à paridade de 1846, o que tornou possível ao Império propor a "emissão conversível". 4. Política Econômica nos anos 1890 O retorno do país ao padrão ouro far-se-ia em função de uma situação cambial extremamente favorável: a taxa de cambio atingiria a paridade de 1846 em outubro de 1888, sem que isto estivesse associado a nenhum esforço deflacionista. Neste mesmo ano é incorporado o Banco Nacional do Brasil (BNB) com faculdade emissora e responsável pela "emissão conversível". Sem sucesso, em fins de 1889 a necessidade de novas emissões já era exaltada em tons dramáticos. Rui Barbosa, o primeiro ministro da Fazenda de República foi por certo, um dos mais controvertidos. É objeto de irrestrita admiração, mas atribuem-lhe a responsabilidade suprema da inundação de papel-moeda, que quase fez naufragar o país com os desastres que nos levaram à moratória de 1898. Sua principal medida de política econômica foi a lei bancária de 17 de janeiro de 1890, que estabelecia emissão bancárias a serem feitas sobre um lastro constituído por títulos da dívida pública. Três regiões bancárias seriam formadas, a central pelo BEUB, Banco dos Estados Unidos do Brasil. Tal tentativa de se regionalizar a emissão bancária não seria bem sucedida. Algumas alterações, que descaracterizaram o decreto de 17 de janeiro foram feitas para atender a demanda "reprimida" de numerário. Dados pela Abolição, a entrada no país de mais de 200 mil imigrantes, o grande impulso no nível de atividade e o estado favorável das contas externas, o papel-moeda emitido em setembro de 1890 já havia crescido 40% em relação a 17 de janeiro. A especulação bursátil preocupa o governo que promove a fusão do BNB e do BB no Banco da República dos Estados Unidos do Brasil (BREUB), com o propósito de constituir uma espécie de banco central; um grande banco de depósitos e descontos com poderes para regular o volume de crédito, através de emissão e mercado de câmbio. No início de 1891, Rui Barbosa é sucedido pelo conselheiro Alencar Araripe e em seguida pelo barão de Lucena. Uma queda inusitada da taxa de câmbio neste ano é atribuída às omissões e hesitações destes dois, aliadas a influências "exógenas" tais como: o colapso da casa Baring Brothers em Londres e a moratória da Argentina. Empréstimos junto aos Rothschild tornam-se inviáveis e pouco pôde ser tentado a título de política cambial em 1891. Acarretou-se a isto, a dissolução do Congresso e a ascensão de Floriano Peixoto em novembro. Seu ministro da Fazenda, Rodrigues Alves, proporia um plano deflacionista em 1892, sem sucesso no Congresso. Serzedelo Correia - um industrialista de certa projeção - o substitui, então. Pouco ou nada resultaria da tentativa de Serzedelo - através do BRB, Banco da República do Brasil, fusão do BREUB com o BB - de "sanear a praça". A especulação na bolsa contaminara muito profundamente a carteira o próprio BRB. Ao mesmo tempo, a crise cambial aprofundava-se alimentada pela deterioração da situação política que tornava claro o estado de paralisia decisória em que se debatia o governo. O déficit orçamentário cresceria de forma significativa após a crise de 18891. Diante deste quadro a reação do novo governo que se instalou em fins de 1894 - tendo Prudente de Morais na Presidência da República e Rodrigues Alves, mais uma vez, na Fazenda - foi a de procurar insistentemente junto aos Rothschild prover-se de recursos para financiar suas despesas no exterior. Durante 1895 negociou-se um grande empréstimo em bases traduzidas nestas palavras dos próprios banqueiros: "acreditamos que o que o Brasil quer é um ou dois anos de tempo para respirar a fim de permitir a um governo sábio e conservador colocar as finanças do país em ordem, em caráter permanente." Nenhuma melhora na situação cambial se observaria ao longo de 1896 e 1897, sendo o empréstimo de 1895 - não tão grande assim - rapidamente consumido. O enfraquecimento dos preços de café, reflexo dos plantios do começo da década, debilitou ainda mais as contas externas do país. As negociações continuaram e por fim, um plano de refinanciamento de pagamentos é finalmente acordado entre o governo brasileiro e a casa Rothschild, através do qual seria emitido o chamado funding loan. O plano tratava-se de rolar compromissos externos do governo, vale dizer, o serviço da dívida pública externa e algumas garantias de juros, em troca de severas medidas de saneamento fiscal e monetário. A política econômica do ministro Joaquim Murtinho – que, na verdade, constitui-se na execução do funding scheme - estava fundada sobre concepção bastante rudimentares quanto a natureza do ajustamento necessário para solucionar as dificuldades de pagamentos do país. Tratava-se de uma seleção natural entre os diversos lavradores sem crédito. A redução do papel-moeda em circulação é, portanto, a pedra de toque do 4 programa. A conseqüência mais imediata dessa política seria a avalanche de falências bancárias ocorridas em 1900, uma torrente que tragou o próprio BRB. O programa conseguiria uma apreciação cambial distante da pretendida e ainda fora favorecida pela extraordinária recuperação das exportações em 1899, para a qual a borracha contribuiu significativamente. Finalmente, novamente, não é claro a priori em que medida a apreciação cambial se devia a contração monetária ou a fatores exógenos associados ao balanço de pagamentos. Além disso, observa-se uma revitalização das entradas de capital a partir da adoção do programa conservador. Um curioso fenômeno que se observa ao longo dos anos 90 e viria a se repetir muitas vezes nos anos seguintes, é o fato de crises (ou melhorias) cambiais serem geradas de forma espúria pelo "mau (ou bom) comportamento" das políticas monetárias e fiscais, não em função dos efeitos diretos destas, mas em função da percepção dos banqueiros internacionais tinham sobre estas políticas, pois esta percepção via de regra, era fundamental para determinar a magnitude dos fluxos de capital direcionados para o Brasil. ÍNDICE CRONOLÓGICO 1887 - primeiro grande projeto de reforma monetária; junho de 1889 - surgimento do BNB, como fusão entre Banco Internacional e Banque de Paris et des Pays Bas, pivô da fase da "emissão conversível", frustrada ainda em 1889; 17 de janeiro de 1890 - lei bancária de Rui Barbosa, que já descaracterizada foi responsável pelas críticas a pessoa de seu idealizador; 1890 - surgimento do BEUB, banco de emissão da região central de Rui Barbosa; início de 1891 - Rui Barbosa deixa a Fazenda, substituído por Alencar Araripe; 1891 - ascensão de Floriano Peixoto, ano de grande depressão cambial; 1892 - primeira proposta de Rodrigues Alves de clara tendência deflacionista, sem respaldo no Congresso; 7 de dezembro de 1892 - fusão do BREUB e BB, decorrente das propostas de Serzedelo Correia; 1893 - Revolta da Armada, em meio a qual a especulação da bolsa teria seu desfecho; Fevereiro de 1898 - moratória, que duraria até o ano de 1900; 1898 - plano conservador de saneamento monetário e fiscal; 1899 - recuperação das exportações, principalmente borracha, colaborando com melhoria no balanço de pagamentos; 1900 - avalanche de falências bancárias, consequência mais imediata do funding scheme. Políticas: i) Monetária: expansionista a partir de 17 de janeiro de 1890, com Rui Barbosa, passando a conservadora a partir de Prudente de Morais, até meados da década seguinte; ii) Fiscal e cambial: em geral acompanharam a política monetária, no período. 5 CAPÍTULO 2 - APOGEU E CRISE NA PRIMEIRA REPÚBLICA: 1900-1930 Winston Fritsch (Bruno Carazza) 1. Introdução Apogeu, tensões e ruptura da inserção da economia brasileira na Pax Britannica. Período caracterizado por uma “sucessão de crises econômicas esgarçam o tecido político além de sua possibilidade de resistência”. No fim da Primeira República temos o início de uma dupla transição: 1) mudança de uma economia primárioexportadora baseada no café, com regimes cambial e comercial relativamente livres, para uma economia “voltada para dentro” e com severos controles sobre o comércio exterior e 2) de uma plutocracia paulista para algo mais difuso em termos de distribuição regional e social dos favores do Estado (Era Vargas). 2. Política Econômica na Primeira República a) A Tendência ao desequilíbrio externo e o quadro institucional O problema da política econômica durante a Primeira República estava em isolar a economia dos desequilíbrios provocados pelas bruscas alterações na posição externa brasileira. A economia primário-exportadora brasileira estava sujeita a 2 tipos de choques exógenos: i) flutuações abruptas da oferta de café (quebras de safra, superprodução) e ii) flutuações da demanda nos países centrais e bruscas descontinuidades do fluxo de capital do centro para a periferia. b) Ciclos e Crises da Primeira República A Era do Ouro, 1900-1913 Ciclo de crescimento entre o ajuste recessivo da virado do século e a desaceleração que precede a Primeira Guerra. Melhora da posição externa no Governo Rodrigues Alves (1902/06), com o crescimento das exportações de borracha e o início do boom de investimentos europeus na periferia. O controle monetário imposto pelas negociações da dívida com grupos internacionais e o crescimento da receita líquida de divisas forçaram uma substancial apreciação cambial. Interesses do setor produtivo levaram à criação de um mecanismo automático de padrão ouro – a Caixa de Conversão, em 1906 – que possuía o poder de emitir notas plenamente conversíveis em ouro, a uma taxa fixa de câmbio. Agravamento do desequilíbrio no mercado mundial do café e uma breve mas grave crise financeira internacional fizeram com que o governo federal temesse um colapso dos preços do café que, somado à queda dos influxos de capital, comprometeria a posição externa. O governo acabou então por avalizar, junto a seus banqueiros de Londres, um empréstimo que permitisse financiar os estoques de café a longo prazo e garantir a estabilidade de preços no curto prazo. Com a normalização dos mercados internacionais e o retorno do afluxo de capital, além da ajuda da recuperação dos preços da borracha, o país entrou numa fase de crescimento acelerado até 1913. Estágios iniciais desse crescimento: súbita melhora no Balanço de Pagamentos, que causou grande expansão monetária via influxos de ouro na Caixa de Conversão. Essa posição era extremamente frágil, pois uma retração da entrada de capital e das exportações não é acompanhada automaticamente pela queda na demanda de importados. Em 1912 passou a haver uma situação de deterioração do BP e dificuldades de levantar novos empréstimos. Esse cenário toma dimensão de crise em 1913, devido à reversão da posição do BP e a uma forte retração da liquidez decorrente das operações do padrão-ouro. O Impacto da Grande Guerra, 1914-18 A guerra teve efeito imediato sobre o fluxo de pagamentos externos, a receita tributária e a indústria do café. Governo fechou a Caixa de Conversão e autorizou uma grande emissão de notas inconversíveis, que serviram para aliviar por um tempo a crise de liquidez e atender a despesas do governo. Negociação de um funding loan em 1914, que aliviou o BP. O principal impacto da guerra para o comércio exterior brasileiro foi a estagnação das importações, que afetaram o equilíbrio fiscal do governo (uma vez que as tarifas de importação constituíam um importante meio de receitas governamentais). Como a guerra persistia, o governo viu-se forçado a tomar medidas mais radicais para ajustar a economia com vistas a equilibrar as finanças do setor público (com a ampliação de produtos sujeitos ao imposto de consumo e a manutenção das despesas a níveis baixos) e também para reverter o substancial aperto de liquidez (com a autorização de uma nova emissão de notas do Tesouro e títulos federais de longo prazo). 6 A queda dos salários reais em função do aumento do preço dos alimentos levou à primeira onda de greves operárias da História do Brasil. Enquanto isso, no início de 1918, cresciam as preocupações com a fragilidade da posição externa e da indústria do café com o prolongamento da guerra. No entanto, com o fim do conflito, e uma forte geada que elevou os preços internacionais do café, o Brasil emergia da guerra sem problemas de excesso de oferta de café e com equilíbrio externo. O Boom e a Recessão do Pós-Guerra, 1919-22 Período influenciado pelo rápido e violento movimento de auge e recessão das economias aliadas. Aumento dos preços das commodities levou a um aumento explosivo das exportações das exportações brasileiras. Houve também uma rápida recuperação das importações vinculada à significativa demanda reprimida durante a guerra e a apreciação do mil-réis. No entanto, a adoção de políticas monetárias restritivas nos países centrais precipitou o início de uma forte recessão, refletida no colapso dos preços dos produtos primários. O resultado imediato foi a reversão da balança comercial em 1920, seguida de recessão e depreciação cambial. Governo procurou adotar as seguintes medidas diante desses fatos: i) diminuir a velocidade e magnitude da desvalorização cambial (dada a posição financeira do governo, com grandes despesas expressas em moeda estrangeira) e ii) emitir um pequeno lote de títulos e criar a Carteira de Redesconto do Banco do Brasil, cedendo a pressões do setor cafeeiro demandando maior liquidez e estabilidade. As dificuldades do governo em financiar seu crescente desequilíbrio fiscal (em meados de 1921) tinha consequências na viabilidade de um esquema de proteção do café – que foi remediado com um crédito de curto prazo junto a bancos comerciais ingleses. Esse severo desequilíbrio fiscal decorrente do pós-guerra foi financiado por uma expansão da base monetária, aumentando a pressão da inflação. Ao lado da necessidade de liquidar as dívidas de curto prazo, houve motivação para a adoção de uma política fiscal recessiva. Recuperação, Desequilíbrio Externo e Ajuste Recessivo, 1922-26 Fim do governo Epitácio Pessoa (1992) é marcado pelo preço do café em ascensão, reversão de tendência de queda das exportações e do déficit da balança e retomada da produção industrial. Por outro lado, seu sucessor, Artur Bernardes, herdava um BP vulnerável e crônica crise fiscal. Suas metas eram: i) transformar o Banco do Brasil em banco central, retirando os poderes de emissão do Tesouro, ii) fortalecer a posição externa, com a institucionalização de um novo e ousado programa de defesa dos preços do café (controle de oferta passou a ser feito através de retenção compulsória da safra em “armazéns reguladores”, e não mais pela compra e estocagem do excedente pelo governo) e iii) reduzir drasticamente o déficit público. Dificuldades com a safra de café (excesso de oferta) tornou necessária a emissão de títulos por parte do Banco do Brasil, acelerando a depreciação cambial. A saída encontrada para evitar uma crise cambial – que tinha impactos negativos sobre o déficit público – e diminuir o ritmo das emissões seria um empréstimo a ser conseguido junto a banqueiros ingleses, com o objetivo de saldar parte da dívida do Tesouro para com o Banco do Brasil. Devido a imposições do governo britânico contra empréstimos externos, o dinheiro não saiu. Para complicar a situação, as revoltas militares de 1924 trouxeram consigo despesas imprevistas e a interrupção das transações bancárias em São Paulo, levando a uma nova explosão de emissões: maiores pressões inflacionárias. Havia então a necessidade de elaboração de um programa rígido de ajuste externo e interno, que envolveu a transferência da responsabilidade do programa de valorização do café para o Estado de São Paulo (1924) e o aumento das taxas de redesconto com vistas a reduzir a base monetária (início de 1925), além da continuidade do esforço para equilibrar o orçamento. Os efeitos dessa política foram recessão, queda do crescimento e do investimento industrial, apreciação cambial e queda da inflação. O Boom e a Depressão após o Retorno ao Padrão Ouro, 1927-30 O novo presidente Washington Luís promoveu uma mudança radical das políticas monetária e cambial. Atingiu-se uma recuperação econômica graças a uma política monetária mais expansionista por parte do governo e uma situação externa também favorável – em decorrência da valorização dos preços do café e investimento e financiamentos externos. 7 Ao adotar uma nova política restritiva de crédito em 1929, vinculada ao retorno do padrão ouro (1927-30), a economia caminhou para um período de severa recessão. Essa situação foi agravada por uma safra recorde de café e a restrição do financiamento externo. Com a grande depressão, os preços do café caíram vertiginosamente, decretando o “golpe de misericórdia” no equilíbrio do BP. 8 CAPÍTULO 3 - CRISE, CRESCIMENTO E MODERNIZAÇÃO AUTORITÁRIA, 1930-45 Marcelo de Paiva Abreu (Bruno Carazza) 1. Superação da Crise e a Política Econômica do Governo Provisório (1930-34) Em decorrência da Crise de 1929, os preços das exportações caíram (sem aumento do quantum exportado) e interrompeu-se o influxo de capital: deterioração do câmbio e queda das reservas. Adotou-se uma política cambial restritiva em 1930-31, com moratória do pagamento de dívidas em moeda estrangeira. Mil-réis sofreu uma desvalorização de 55% entre 1930-31, prejudicando a economia cafeeira (pois a demanda internacional do café é praticamente inelástica em relação ao preço; com a desvalorização, o café fica mais barato no exterior, mas a receita cambial cai). Indústria foi protegida, graças ao controle das importações e a queda generalizada dos preços das commodities. Dívidas públicas cresceram tendo em vista a crise cambial. A dívida externa brasileira distribuía-se principalmente entre dois credores: Reino Unido (num montante de US$ 600 milhões, com investimentos em queda e concentrados em setores tradicionais) e Estados Unidos (US$ 200 milhões, com investimentos que quadruplicaram de 1914 a 1930, concentrados em atividades comerciais e indústria de transformação). Essa composição gerou interesses divergentes entre os credores: enquanto os britânicos queriam maximizar os pagamentos atrasados e os americanos preferiam manter sua posição de influência comercial no Brasil. A crise cambial brasileira e a recessão internacional afetaram os investimentos no país, principalmente os provenientes da Europa (a participação americana cresceu nesse período). Enquanto Vargas parecia “encarnar o ‘Estado de Compromisso’, tratando de acomodar os interesses conflitantes do café e da indústria”, sua atuação tendeu a favorecer principalmente a indústria. A crise cambial, com a deterioração dos termos de troca, colaborou para que a recuperação da atividade pósrecessão se desse de forma mais rápida. No entanto o governo federal, através do Conselho (depois Departamento) Nacional do Café, efetuou uma significativa compra e posterior destruição dos estoques de café, buscando reduzir o descompasso entre seu nível e a capacidade de absorção do mercado mundial. O governo ampliou ainda outra política de redução da oferta de café, logo após a Revolução Constitucionalista (1932), com a destruição de mais de 70 milhões de sacas foram destruídas entre 1931 e 1943. A desvalorização cambial e o controle de importações reorientaram a demanda para produtos nacionais, levando a uma reversão do saldo do BP (via balança comercial). A política econômica do Governo Provisório pode ser considerada pré-keynesiana devido à intenção de acomodar um choque fiscal (recessão internacional) através de um aumento no déficit público. Abandono do padrão-ouro em 1930: fim da pressão sobre a base monetária (mecanismo: a partir de um choque externo há uma pressão para desvalorizar a moeda, caem as reservas, Banco do Brasil vende US$ e compra mil-réis, com isso reduz-se a oferta monetária). A produção nacional caiu 9%, entre 1928 e 30, permaneceu estagnada em 1931-31 e cresceu a uma média de 10% ao ano entre 1932 e 1939. A participação das importações na oferta total caiu de 45% em 1928 para 25% (1931) e 20% (1939). 2. Boom Econômico e Interregno Democrático, 1934-37 Período marcado pela pressão americana para o Brasil liberar um regime de câmbio especial para os EUA. Entre 1936 e 1937 as reservas acumularam-se, como resultado da ampliação das exportações, enquanto as importações permaneceram constantes. Essa folga cambial levou a um relaxamento dos controles de importação e a liberação das remessas de lucros, gerando um descoberto de 6 milhões de libras esterlinas no final de 1937. Apesar das dificuldades no BP, a economia crescia a 6,5% ao ano entre 1934 e 37, graças ao encarecimento das importações e a adoção de políticas fiscal, cafeeira e monetária expansionistas. Agricultura cresceu a 2% ao ano, entre 1934-37, enquanto a indústria teve uma média de 11% ao ano (com crescimento mais elevado de setores não-tradicionais: borracha, papel, cimento, metalurgia, química e têxtil). Acordo comercial com os EUA (1935): O Brasil concedeu reduções tarifárias para produtos americanos (duráveis de consumo), enquanto os EUA mantiveram as principais exportações brasileiras livres de tributos (o que teve pouco impacto sobre a indústria nacional). Aproximação do Brasil com a Alemanha: Aumento das exportações de café e algodão e deslocamento de importações tradicionalmente britânicas (carvão, material elétrico, Folha-de-flandres, etc.) para a Alemanha. Com isso as importações americanas também ganharam participação. Política externa de “comércio de compensação”: Vargas conseguia apoio dos Estados que exportavam para a Alemanha (Nordeste e Rio Grande do Sul). 9 Participação alemã no comércio brasileiro passou, entre 1928 e 1938, de 12% para 25%, em detrimento dos EUA (27 para 23), Reino Unido (22 para 10) e França (6 para 3). Substituição drástica de produtos britânicos por alemães. 3. Estado Novo e Economia de Guerra, 1937-45 Centralização do poder, com criação de agências governamentais com objetivos reguladores na área econômica. Estado transitou da arena normativa para a provisão de bens e serviços. 1937: Escassez de divisas (elevação das importações, investimentos públicos, pagamento de serviços da dívida), governo foi levado a desvalorizar a moeda doméstica. Controles cambial e de importações foram os principais instrumentos de política comercial no período. O comércio de compensação foi gradativamente sufocado à medida que se tornava perigoso acumular reservas em marcos, tendo em vista a possibilidade de guerra. Com a Segunda Guerra, até 1941 o país teve dificuldades com o BP (queda dos mercados de exportação). A partir de 1941 a situação se reverte com a recuperação e ampliação das exportações (suprindo economias em guerra) e com a estagnação das importações: expansão dos saldos na balança comercial. Efeitos contraditórios na indústria: estímulo à produção e exportação, mas com dificuldades de obtenção de insumos e bens de capital. O PIB teve um efeito menor em razão do fraco desempenho da agricultura. 1942 representa um ponto de inflexão na economia brasileira: crescimento industrial acelerado, país passa a acumular reservas cambiais (reduzidas desde os anos 20), entrada de capital americano, políticas fiscal, monetária e creditícia expansionistas a partir de 1942. Política monetária: moderada (fins de 1938 até fins de 1939) e expansionista a partir de 1940 – reforma monetária de 1942 (aumento de liquidez na economia) e expansão do crédito, com crescimento inflacionário. Acordos com os EUA para suprimento de matérias-primas e bens primários, em contrapartida haveria a manutenção dos preços desses produtos. CSN: governo brasileiro viu-se obrigado a participar diretamente do projeto tendo em vista o desinteresse dos grandes produtores norte-americanos de aço. 10 CAPITULO 4 - POLÍTICA ECONÔMICA EXTERNA E INDUSTRIALIZAÇÃO: 1946-1951 Sérgio Besserman Vianna (Humberto Carlos Faria Teixeira) O cenário econômico internacional no período pós-guerra (1946-1951) foi marcado pela assinatura do tratado de Bretton Woods que previa a implementação de mudanças substanciais na organização da economia mundial. No bojo do acordo, destacam-se propostas visando: o restabelecimento do padrão-ouro divisas nos mercados cambiais, constituindo o dólar a moeda internacional de reserva, a transição para a livre convertibilidade das moedas e a criação do GATT (Acordo Geral de Tarifas e Comércio) com o propósito de reduzir as barreiras ao livre comércio entre os países. O Fundo Monetário Internacional (FMI), criado com o objetivo de zelar pelos acordos de Bretton Woods e efetuar empréstimos aos países com dificuldades no balanço de pagamentos e o Banco Mundial também datam dessa época. Os acordos internacionais do período apresentavam, portanto, um caráter eminentemente liberal. A política econômica adotada no Brasil no período 1946-1951 seguiu, em primeira instância, os preceitos liberais. VIANNA (1988) argumenta, entretanto, que o país não diagnosticou de forma precisa o ritmo e o próprio movimento nos mercados internacionais da época. A interpretação equivocada do governo Dutra expressa-se em três pontos: a idéia de que o pais encontrava-se em situação confortável em termos de reservas cambiais, a suposição de que uma política liberal de câmbio seria capaz de atrair expressivo fluxo de capitais externos ao país e a aposta nos Estados Unidos como grande credor do país em contrapartida a colaboração brasileira durante a segunda guerra mundial. Em linhas gerais, a política econômica adotada então privilegiou o combate à inflação, expressa na adoção de políticas monetária e fiscal contracionistas (notadamente até 1949). No que se refere à balança comercial, nota-se que o Brasil apresentava um desempenho favorável com os países de moeda de baixa conversibilidade (moedas fracas) e desfavorável com os países de moeda forte (de elevada conversibilidade). No período pós-guerra, verifica-se ainda uma redução das exportações de matérias-primas e manufaturados brasileiros. Estas que representavam 20% da pauta de exportações em 1945, reduzem-se para 7,5% em 1946 e atingem a marca de 1% em 1952. VIANNA (1988) atribui este processo à recuperação econômica dos países envolvidos na guerra marcado pelo retorno de antigos fornecedores ao mercado internacional. As importações, por sua vez, eram pressionadas pela dependência da produção nacional em bens de capital (equipamentos) estrangeiros. O elevado acréscimo dos preços desses bens (os preços dos equipamentos sobem 47% em 1947 em relação ao ano anterior) supera o aumento dos preços das exportações (que sobem apenas 15% no mesmo período), prejudicando o desempenho da balança comercial brasileira. Percebida então a modesta entrada de capitais externos no país, um desempenho mais favorável na balança comercial seria alcançado por intermédio de medidas de controles cambiais e uma política de contingenciamento de importações.1 A vigência de uma taxa de câmbio sobrevalorizada, conjuntamente com as medidas de restrição às importações e controles cambiais (mencionadas acima) produziram três efeitos: (a) efeito subsídio, beneficiando a importação de bens de capital e insumos básicos para suprimento da produção nacional; (b) efeito protecionista, através das restrições às importações de bens substitutos ou concorrentes aos produzidos nacionalmente e (c) efeito lucratividade, decorrente da taxa de câmbio sobrevalorizada que, ao alterar a rentabilidade relativa entre a produção exportada e aquela alocada para o mercado doméstico, beneficiou a produção voltada para o mercado nacional. Neste contexto, torna-se evidente o estímulo das medidas supracitadas em favor de um processo de substituição de importações. O período é marcado ainda, conforme mencionado acima, pela adoção de uma política econômica ortodoxa, enfatizando o combate à inflação através de políticas fiscais e monetária contracionistas. Deve-se ressaltar, entretanto, que a política de crédito foi, em grande medida, expansionista dada a política de concessão de crédito efetuada pelo Banco Brasil. A política de crédito adotada visava facilitar investimentos nacionais no processo de substituição de importações. A política de crédito, portanto, operava em contramão à estratégia de se adotar uma política monetária e fiscal mais restritiva no início do período. Vale mencionar também que cogitava-se na época a adoção de uma reforma tributária como forma de ajustar as finanças públicas. O projeto de reforma tributária, no entanto, não encontrou respaldo político suficiente, sendo abandonado em 1947. O período caracteriza-se ainda pela obtenção de maior autonomia administrativa por parte de estados e municípios concedido pela Constituição de 1946. A maior autonomia relativa adquirida pelos estados e municípios em relação à União comprometeu os esforços desta (a União) no sentido de promover o ajuste fiscal, prejudicando assim as finanças públicas. 1 Institui-se então o regime de câmbio por cooperação, segundo o qual os bancos atuantes no mercado cambial vinham-se obrigados a vender 30% de suas compras no mercado livre ao Banco do Brasil à taxa de câmbio oficial. O contingenciamento de importações, por sua vez, era feito através da concessão de licenças de importação. 11 Quanto ao processo inflacionário, verifica-se um crescimento dos índices de inflação a partir de 1949. VIANNA (1988) ressalta os componentes estruturais desse repique inflacionário: (a) pressão de demanda advinda do processo de urbanização e industrialização sobre a produção agrícola, alternando os preços relativos da economia em benefício deste setor, refletindo-se em aumento generalizado de preços; (b) tendência inflacionária subjacente ao aumento dos preços das exportações e (c) a existência de baixa capacidade ociosa na economia, reduzindo a possibilidade de choques de demanda serem absorvidos integralmente através de aumento da produção, ou seja, expansão da oferta agregada. ÍNDICE CRONOLÓGICO 1944: Conferência de Bretton Woods 1947: Proclamação da Doutrina Truman nos EUA, destacando-se a elaboração do Plano Marshall como instrumento de auxílio às economias européias arruinadas com a guerra 1947-48: Fim do mercado livre de câmbio e a adoção de um política de contingenciamento de importações no Brasil entre meados de 1947 e início de 1948. 1948: Constituição da Comissão Técnica Mista Brasil - Estados Unidos, mais conhecida como Missão Abbink, que preconizava que o desenvolvimento brasileiro deveria centrar-se em três pontos: “a reorientação dos capitais formados internamente, o aumento médio da produtividade e o afluxo de capitais estrangeiros.”(VIANNA, 1988:117). 1949: Afastamento do ministro da Fazenda Correa e Castro em meados de 1949, indicando a passagem de uma política econômica contracionista, tipicamente ortodoxa, em direção a uma maior flexibilidade nas metas monetárias e fiscais. Sob sua gestão na Fazenda, os investimentos públicos e a emissão de moeda foram reduzidos a praticamente zero em 1947. O crédito real à indústria cresceu 38%, 19%, 28% e 5% nos anos de 1947, 1948, 1949 e 1950, respectivamente. 1949: Adoção do Plano Salte, considerada “a única iniciativa de intervenção planejada do Estado para o desenvolvimento econômico” (VIANNA, 1988:116). Previa investimentos públicos nos setores de saúde, alimentação, transporte e energia para os anos de 1949 e 1953. 1950: Surge a União Européia de Pagamentos (UEP), existente até 1958, que conjuntamente com a desvalorização da libra esterlina em 1949, indicam uma transição lenta em direção às trocas multilaterais e à conversibilidade geral das moedas. Política cambial: O câmbio foi mantido grosso modo à paridade de 1939, de 18,5 Cr$/US$, sendo instituído o mercado livre, com a abolição das restrições a pagamentos existentes desde os anos 30. Considerando-se que a inflação brasileira no período foi o dobro da verificada nos EUA, tornase evidente a sobrevalorização cambial. Por outro lado, as importações de bens considerados necessários à economia usufruíam de acesso à taxas de câmbio mais favoráveis, caracterizando uma desvalorização implícita da moeda. As importações eram restringidas pela concessão de licenças de importação. Nota-se, entretanto, uma liberalização na concessão das licenças de importação a partir de meados de 1950 com a alta do preço do café (aumentando a capacidade importadora da economia) no mercado internacional e dada o elevado nível de contingenciamento já alcançado nas importações. 12 CAPÍTULO 5 – DUAS TENTATIVAS DE ESTABILIZAÇÃO: 1951-1954 Sérgio Besserman Vianna (Carla Aguilar) A conjuntura encontrada pelo governo Vargas pode ser resumida, no setor interno, pela retomada do processo inflacionário e pela recorrência do desequilíbrio financeiro do setor público e, no setor externo, pela expectativa favorável devido a elevação do café e a mudança do governo dos Estados Unidos em relação ao financiamento dos programas de desenvolvimento do Brasil. È tendo em vista este cenário que o governo traçou sua política econômica apoiada em um projeto de governo bem definido que tinha por objetivo dividir o governo em duas fases. A primeira (1951-1952) constituiria na estabilização da economia utilizando-se como pilar as políticas fiscais e monetárias. A Segunda (1953-1954) seria para os empreendimentos e realizações tendo como pilar seria a Comissão Mista Brasil - Estados Unidos (CMBEU), constituída em 19502. O CMBEU era importante, pois os financiamentos fornecidos pelo Banco Mundial e pelo Eximbank é que assegurariam a estrangulamentos em setores básicos da economia (energia, portos, etc.) que propiciariam uma ampliação do fluxo de capital dirigido para o Brasil. Tal afluxo de capital permitiria a fase das realizações e empreendimentos concomitantemente com uma política econômica austera e ortodoxa. PERÍODO DE 1951-1952 Tendo em vista o quadro externo descrito acima, a política de comércio exterior apoiou-se em uma taxa de câmbio fixa e sobrevalorizada e um regime de concessão de licença para importar (esta última política modificou-se ao longo do tempo, pois foi extremamente relaxada nos primeiros 7 meses de governo). A liberalização na política de concessão deveu-se aos seguintes fatores: persistência da pressão inflacionária interna e de aguda propensão a importar; precário abastecimento interno por produtos importados, perspectivas decrescentes de escassez internacional de matérias-primas e equipamento importável em função dos programas armamentistas; perspectivas favoráveis da evolução das exportações dos principais produtos e posição cambial temporariamente favorável. Essa extensa liberalização na política de concessão impactou violentamente as reservas em moedas conversíveis que reduziram de US$162 milhões para US$43 milhões de março para julho de 1951. Diante disto, em 1º de agosto de 1951 o Conselho da Superintendência da Moeda e do Crédito (Sumoc) define instruções para que a CEXIM reintroduza um regime mais severo de licenciamento. Apesar disso, os licenciamentos continuaram elevados até dezembro deste mesmo ano resultando na necessidade de uma nova restrição no princípio de 1952. Como as licenças que eram concedidas possuíam vida útil de 6 meses a 1 ano tal medida necessitou de um prazo extenso para refletir nas estatísticas de importação. A balança comercial apresentou um pequeno superávit em 1951. Já, em 1952, a balança comercial foi deficitária e, além disto, houve o esgotamento das reservas internacionais e o acúmulo de atrasados comerciais. Tal situação ocorreu, principalmente, devido a uma não alteração no quadro das importações (uma vez que havia uma defasagem na adoção da política de restrição e o seu efeito e somando-se a isso foi necessária a compra de trigo nos EUA por causa da seca na Argentina) e a uma redução das exportações em 20% se comparado com 1951. Esta queda deveu-se aos efeitos da sobrevalorização do cruzeiro e das pressões inflacionárias internas bem como à crise enfrentada pela indústria têxtil mundial que levou a uma paralisação das vendas de algodão segundo produto mais importante da pauta de exportações brasileira. Pelos motivos apresentados acima e o baixo influxo de capital estrangeiro que não ajudou a diminuir tais dificuldades houve em 1952 uma crise cambial que resultou na fratura de uma das pernas que deveria sustentar o projeto do governo Vargas. A política econômica teve como objetivos nesta primeira fase: comprimir as despesas governamentais, aumentar na medida do possível a arrecadação, adotar políticas monetária e creditícia contracionistas. Os três primeiros objetivos foram alcançados. As despesas governamentais foram reduzidas tanto que o investimento público decresceu cerca de 3% em termos reais. As receitas governamentais aumentaram devido à inflação, ao crescimento real da economia, à melhoria da eficiência do sistema arrecadador e ao extraordinário crescimento das importações. Houve em 1951 um superávit global da União e Estados que não acontecia desde 1926. Em 1952 a política fiscal foi mantida fazendo com que o superávit da União fosse quase o mesmo do ano anterior, no entanto, não foi possível o mesmo desempenho para os estados e municípios. A política monetária foi conduzida ortodoxamente assim como a política fiscal. A exceção foi a política creditícia que se moveu em direção contrária, pois o presidente do Banco do Brasil (Ricardo Jafet) tinha posição distinta da ortodoxa. Sendo assim, as reduções das necessidades de empréstimos do Banco do Brasil ao Tesouro 2 O projeto sustentava-se em 2 pernas: o saneamento econômico-financeiro e o afluxo de capitais, devido a isso o governo Vargas foi comparável aos governos Campos Sales e Rodrigues Alves. 13 Nacional foram compensadas com a expansão do crédito às atividade econômicas. Os fatores que avalizaram tal expansão foi em 1951 a recuperação de parte das disponibilidades antes imobilizadas em empréstimos ao setor público e em 1952 soma-se a este primeiro a expansão do aporte de recursos adicionais devido ao aumento nos depósitos correspondentes aos débitos em divisas dos importadores em função do acúmulo de atrasados comerciais. Houve um aumento do PIB em 4,9% em 1951 e 7,3% em 1952. O aumento das importações, nesse período, afetou positivamente o setor de serviços que apresentou maior crescimento e negativamente a produção industrial que apresentou as menores taxas anuais de crescimento. A estagnação do café e a queda da produção de algodão e cacau fizeram com que a agricultura apresentasse pequeno crescimento em 1951, mas em 1952 o crescimento da exportação de produtos agrícolas aumentou 17% provocando uma recuperação neste setor. Este período (1951-1952) foi marcado pela elevação das taxas de investimento e o aumento da participação do setor privado no investimento global em detrimento dos investimentos do setor público. As fontes de financiamento para esse investimento foram a liberalização das importações e a política creditícia. PERÍODO DE 1953-1954 A segunda fase do governo (empreendimento e realizações) deveria começar em 1953 baseada na estabilização e no acordo CMBEU. No entanto, a primeira não foi alcançada pelos fatores apresentados no item anterior e a segunda também não devido ao fim da Comissão Mista Brasil Estados Unidos. Sendo assim os dois pilares do governo Vargas ruíram no primeiro semestre de 1953. Tais acontecimentos associados à uma mobilização social reinvidicadora e à uma reacomodação política derivada das eleições municipais de 1953 levaram o governo a abandonar o projeto inicial e sustentar o propósito de estabilização econômica. O encerramento da CMBEU ocorreu devido aos seguintes fatores: (i) a vitória de Eisenhower para presidente dos EUA fazendo com que a orientação da política norte-americana prioritária para a América Latina passasse a ser o combate ao comunismo e, além disso, sob o argumento de que precisaria manter gastos não financiaria mais os projetos que a comissão mista elaborasse. O apoio deste governo ao Banco Mundial em conflito com o Eximbank também prejudicou o Brasil, pois o primeiro era a favor de empréstimos de longo prazo do Eximbank para o desenvolvimento da América Latina apenas quando não pudesse fazê-lo. As razões para isso era que queria controlar mais as políticas econômicas dos países demandantes de crédito. (ii) deterioração da situação cambial brasileira ao longo de 1952 resultando no acúmulo de vultosos atrasos comercias levando o Banco Mundial a mudar de postura para com o Brasil, passando a interferir na política econômica do governo. O primeiro semestre de 1953 foi marcado pela promulgação da Lei 1807(Lei do Mercado Livre) e pelo empréstimo de US$300 milhões de dólares junto ao Eximbank. A Lei do Mercado Livre tinha como objetivo aumentar as exportações de gravosos sem prejudicar a receita proveniente do café e do cacau; e reduzir a propensão a importar. Para tal adotou cinco taxas de câmbio do lado da oferta e duas do lado da demanda. As taxas para exportação eram: a taxa oficial aplicada a 85% das exportações (limitadas ao café, algodão e cacau), as três taxas de câmbio flutuante (misturavam 15,30 e 50% da taxa oficial e a taxa de mercado livre) aplicada às demais exportações e, por último, a taxa de mercado livre que era aplicada às transações financeiras (com algumas exceções). As taxas estabelecidas para demanda eram: a taxa oficial utilizada para transações essências (2/3 das importações totais) e remessas financeiras do governo de entidades pública e semi-públicas; e a taxa de mercado livre para o restante das importações e remessas. A assinatura do acordo de empréstimo conseguida em 30 de abril de 1953 pelo governo brasileiro ocorreu devido a pressões de exportadores e investidores norte-americanos no Brasil, que tendo em vista a Lei 1807, desejavam evitar a concorrência entre a procura de dólares para remessas de rendimentos e aquela voltada para a obtenção de divisas com o objetivo de pagamento de atrasados. Esse empréstimo foi concedido nas seguintes condições: deveria ser integralizado em três anos, com pagamentos mensais a partir de 30 de setembro 1953. A taxa de juros adotada foi de 3,5% a.a., e o Brasil comprometia-se a liquidar os restantes dos atrasados comerciais não, cobertos pelo empréstimo, com os EUA até 31 de Julho do ano corrente. O principal objetivo da Lei 1807 (aumentar o desempenho das exportações) não foi alcançado, pelo contrário, as exportações tiveram seu valor reduzido em 11% no primeiro semestre de 1953. Isto ocorreu porque as exportações de gravosos não responderam bem à política de desvalorização com que foram beneficiadas e os exportadores passaram a reter os embarques com o objetivo de pressionar o governo. Esta evolução pouco favorável das exportações fez que os atrasados comerciais aumentassem, levando o Eximbank a suspender o desembolso da segunda parcela do empréstimo conseguido em abril. Para agravar a situação interna do país os meios de pagamento elevaram-se de Cr$7 bilhões contra menos de Cr$1 bilhão no mesmo período de 1952, isso ocorreu devido ao aumento dos gastos do governo com a seca no Nordeste bem como o financiamento aos produtos dessa região e ao socorro a bancos de estado. Tais acontecimentos levaram a uma impressão de perda do controle das autoridades econômicas. Paralelamente a essa situação o governo enfrentava dificuldades no plano social, pois em 23 de março de 1953 eclodiu a greve dos trabalhadores em São Paulo o que sinalizava um enfraquecimento das bases de sustentação desse governo. Com o objetivo de fortalecer a coesão do governo, Vargas fez uma reforma ministerial 14 na qual o ministro da Fazenda Horácio Lafer foi substituído por Osvaldo Aranha e quem passou a ocupar a pasta do Ministérios do Trabalho foi João Goulart Ao assumir o ministério, Aranha tomou como primeiras medidas a homogeneização do benefício dado às exportações; introduziu o sistema de pauta mínima e cobrou a liberação da 2ª parcela do empréstimo junto Eximbank. A primeira medida foi estabelecida reduzindo as cinco taxas de câmbio existentes em apenas três, uma taxa oficial, uma de mercado livre e uma terceira, flexível, resultante da mistura (em 50%) das duas primeiras. A segunda foi através da permissão para que exportadores de determinados produtos (café, cacau, etc.) negociassem no mercado livre as divisas excedentes a cota mínima fixada para cada um deles. A terceira, foi apresentar junto aos financiadores como condição para renegociação a liberação da 2ª parcela do acordo de empréstimo. Tais medidas alcançaram seus objetivos, a exportação de café respondeu positivamente aumentando 56% e 81% em agosto e setembro, respectivamente, em relação a julho de 1953 e o empréstimo foi liberado. A política de Osvaldo Aranha consistia numa nova tentativa de estabilização, mantendo-se a visão ortodoxa, no entanto, privilegiando o ajuste cambial. A primeira reforma implementada por este ministro foi a instrução 70 da Sumoc baixada, em 9 de outubro de 1953. A instrução 70 da Sumoc restabeleceu o monopólio cambial do Banco do Brasil e substituiu o controle quantitativo das importações pelo sistema de leilões. Neste sistema as importações foram divididas em 5 categorias de acordo com o critério de essencialidade, a três primeiras categorias absorviam aproximadamente 80% das importações. As taxas sobre a importação passaram a ser três, uma taxa oficial sem sobretaxa (válida para importações especiais como trigo e papel imprensa), uma taxa oficial com sobretaxa fixa (para importações dos governos, autarquias e sociedade de economia mista) e, por último, uma taxa oficial acrescida de sobretaxa variável (segundo lances feitos em bolsa) para as demais importações. Com relação às exportações, as taxas mistas foram substituídas por bonificações de Cr$5/US$ para o café e Cr$10/US$ para as demais exportações. Os primeiros resultados da instrução 70 foram positivos, houve superávit entre as exportações (FOB) e importações (CIF), e o governo aumentou significativamente suas receitas com a cobrança de ágios sobre as importações. Apesar da elevada receita a União apresentou déficit público, em 1953, devido aos gastos do governo na seca do Nordeste, ao aumento das despesas nas obras públicas, a um abono elevado concedido ao funcionalismo civil da União, ao pagamento de atrasados comerciais feito pelo Banco do Brasil aos credores com recursos próprios e ao empréstimo concedido pelo Banco do Brasil ao tesouro paulista. A política creditícia, neste ano, foi afetada pelo déficit público, a sua tendência foi invertida em relação aos dois anos anteriores e a sua composição foi modificada, os empréstimos do Banco do Brasil foram mais direcionados ao Tesouro Nacional e menos às atividades econômicas. A política monetária também foi expansionista. A inflação neste ano aumentou se comparada com a do ano de 1952, isso seria explicado pelas desvalorizações cambiais resultantes da instrução 70 que pressionaram os custos das empresas conduzindo-as a reagir através do aumento de preços. O crescimento do PIB foi bem inferior ao dos anos anteriores, apesar do crescimento da indústria em 9,3%. O baixo crescimento do PIB foi devido ao baixo rendimento apresentado na agricultura (seca que aconteceu no país) e à estagnação do setor serviços (esta devido a diminuição das importações e redução das atividades comerciais). Os investimentos privados foram reduzidos neste ano, devido principalmente às restrições feitas às importações, os investimentos do governo não cresceram em termos reais mantendo-se constante como proporção do PIB. As maiores dificuldades enfrentadas por Aranha na implementação do seu plano de estabilização em 1954 foram o aumento do salário mínimo de 100% e a crise enfrentada pelo café. Estes dois fatores comprometeram profundamente o plano em meados de 1954. O aumento do salário mínimo teve como objetivo melhorar a imagem do governo junto aos trabalhadores uma vez que Vargas estava interessado nas eleições de outubro de 1954. A crise do café deveu-se primeiro, a uma geada que afetou uma das mais importantes áreas de produção brasileira levando à redução das exportações, e segundo devido ao boicote americano ao consumo de café que fez com que reduzissem sua compras ao mínimo. O governo com objetivo de aumentar a receita cambial expediu, em junho de 1954, um decreto determinando preço mínimo elevado para o café. Tal política fez com que o governo americano, em protesto, deslocasse suas compras para outros países produtores de café. No entanto, não se pode imputar a este decreto a redução das exportações, pois estas já vinham caindo antes de sua implementação e, além disso, devido a pressão dos cafeicultores e exportadores de café essa medida durou apenas 45 dias. Osvaldo Aranha baixou a instrução 99 da Sumoc em 14 de agosto de 1954, esta resolução não modificou a cotação mínima em cruzeiros estabelecida para a exportação de café, mas alterou o sistema de bonificações estabelecido pela instrução 70. Os exportadores passariam a receber Cr$5/US$ ou Cr$10/US$ sobre 80% das cambiais negociadas independente do produto, sobre os 20% restantes seria abonada a diferença entre a taxa oficial e a média das taxas de compra no mercado livre, para cada moeda, no dia útil imediatamente anterior ao do fechamento de câmbio. A política creditícia adotada por Aranha nesse período foi expansionista, não por uma mudança em sua visão ortodoxa, mas pela necessidade de atender às demandas imediatas dos estados bem como às pressões das indústrias para compensar as perdas devido ao aumento do salário e à instrução 70 da Sumoc (no ponto que se refere a defasagem entre o momento da licitação e a obtenção da licença para importar). 15 O descontentamento com Vargas estava presente em todas as classes, desde trabalhadores até capitalista, ele não conseguiu contentar o amplo espectro da sociedade sem nenhuma mudança estrutural e sem o apoio da sociedade civil organizada. O governo Vargas estava isolado politicamente e ficou vulnerável ao golpe que o depôs em 1954. ÍNDICE CRONOLÓGICO Julho de 1951-início da atividades da Comissão Mista Brasil Estados Unidos. 1º de agosto de 1951-o Conselho da Superintendência da Moeda e do Crédito (Sumoc) define instruções para que a CESIM reintroduza um regime mais severo de licenciamento das importações. Apesar dessas instruções o licenciamento até dezembro do mesmo ano foram elevadas, sendo necessárias novas medidas de controle no início de 1952. Janeiro de 1953-promulgação da Lei 1807 (Lei de Mercado Livre) que concedia ampla liberdade de movimentos pelo câmbio livre ao capital estrangeiro no Brasil e tinha por objetivo elevar as exportações. Estas ao contrário ao invés de aumentar diminuíram e tal fato levou à modificação desta lei posteriormente. 30 de fevereiro(?) abril de 1953-assinatura do acordo de empréstimo de US$300 milhões de dólares junto ao Eximbank, que seria liberada em parcelas. A primeira parcela foi entregue, mas devido ao não pagamento dos atrasados comerciais pelo Brasil junto aos EUA a segunda parcela foi adiada até a entrada do novo ministro da fazenda Osvaldo Aranha. 23 de março de 1953-greve dos trabalhadores paulistas que chegou a paralisar 300 mil operários. Abril de 1953-liberação da primeira parcela do empréstimo concedido pelo Eximbank. 15 de Junho de 1953-Horácio Lafer deixa o ministério e é substituído por Osvaldo Aranha, esta mudança está inserida na reforma ministerial feita por Vargas. 9 de outubro de 1953-instituída a instrução 70 da Sumoc que introduziu importantes mudanças no sistema cambial. Obteve êxito nos primeiros resultados, conseguindo elevar as exportações e manter as importações no nível dos trimestres anteriores além de elevar a receita do governo. 1º de maio de 1954-aumento do salário mínimo em 100%, quando na realidade para recompor os salários era necessário apenas um aumento de 53%. Vargas tomou esta decisão imbuído pelos interesses eleitorais. Junho de 1954-decreto fixando um elevado preço mínimo para o café com o objetivo de maximizar a receita cambial, devido a crise enfrentada por este produto no mercado interno e externo. Vigorou por apenas 45 dias. 14 de agosto de 1954-baixada a instrução 99 da Sumoc que alterou o sistema de bonificação instituído pela instrução 70 para as exportações. Esta veio como resposta às dificuldades enfrentadas pelo café no mercado externo. Políticas: Política Monetária: restritiva até início de 1953 passando a partir de então a ser expansionista por problemas conjunturais da economia. Política Fiscal: restritiva até 1952 tornando-se expansionista a partir de 1953. Política Creditícia: expansionista até saída de Jafet , foi restritiva até 1954 voltando a ser expansionista em 1954. 16 CAPÍTULO 6 - O INTERREGNO CAFÉ FILHO: 1954-55 Demosthenes Madureira de Pinho Neto (Bruno Carazza) O período compreendido entre o suicídio de Vargas e a posse de Juscelino Kubitschek costuma ser colocado em segundo plano na historiografia brasileira, dadas suas características de transição. Durante os poucos meses de duração, podemos delinear duas fases bastante distintas de política econômica: as administrações Gudin e Whitaker. Tendo em vista o período de instabilidade que se seguiu ao Governo Vargas, Café Filho buscou sustentar seu governo em bases bastante heterogêneas, embora o caráter ortodoxo das figuras ligadas à UDN e ao movimento antigetulista prevalecesse. Para a pasta da Fazenda foi indicado o nome de Eugênio Gudin, economista respeitável e de grande prestígio junto a comunidade financeira internacional – uma das virtudes que mais pesou na sua escolha. Gudin poderia ser considerado um severo crítico das propostas desenvolvimentistas e adepto a políticas ortodoxas, atribuindo o processo inflacionário ao déficit público e à expansão creditícia. Gudin assumiu ao Ministério da Fazenda num momento de grave crise cambial, decorrente do colapso dos preços e das quantidades exportadas de café. Mesmo com uma desvalorização de 27% da moeda nacional no final do governo Vargas (ago/54), houve um grave impacto sobre as receitas de exportação, uma vez que a elasticidade da demanda internacional do café era baixa no curto prazo. Outro problema que complicava a situação externa do Brasil era o acúmulo dos atrasados comerciais e a necessidade de renegociar as dívidas brasileiras junto aos credores internacionais. Acontece que o governo americano, sob gestão de Eisenhower, mostrava-se intransigente com os países em desenvolvimento, tendo inclusive manifestado que o problema do financiamento da dívida da América Latina deveria ser resolvido por fluxos de capitais privados e não por auxílio econômico do governo americano. Destarte o fracasso de sua negociação com o governo americano em Washington, Gudin conseguiu levantar US$ 200 milhões junto a um consórcio de 19 bancos privados americanos, o que aliviava a situação cambial até que medidas mais profundas surtissem efeito junto ao Balanço de Pagamentos. Neste sentido, Gudin mostra-se disposto a remover os obstáculos ao livre fluxo de capital estrangeiro para o país, expresso na Instrução 113 da Sumoc – liberalização da entrada de capital, voltada para o saneamento econômico e o financiamento doméstico. O programa de estabilização de Gudin sustenta-se em dois pilares: austeridade fiscal e contração monetário-creditícia. Sua política monetária valeu-se de diversas instruções da Sumoc, que envolveram a elevação dos juros e das taxas de redesconto (Inst. 105 e 106). A Inst. 108 determinou um aumento significativo dos compulsórios, agora recolhidos junto à Sumoc, buscando uma eficácia maior de sua função redutora, uma vez que os compulsórios eram recolhidos anteriormente ao Banco do Brasil (que também era um banco comercial). Essa instrução estabeleceu ainda um limite para os empréstimos das carteiras do Banco do Brasil, inclusive junto a entidades públicas e ao Tesouro. Podemos definir suas políticas monetária e creditícia como fortemente contracionistas. Ao contrário do lado monetário, Gudin não obteve muito sucesso com a política fiscal. Gudin objetivava reduzir as despesas governamentais e ampliar a receita, mas não foi muito feliz em suas metas, uma vez que sua modificação mostrou-se inviável devido às dificuldades de aprovação de uma elevação da carga tributária no Congresso e o comprometimento do Orçamento da União. Seu único êxito consistiu na redução de verbas para alguns ministérios, resultando numa queda do investimento público. De um modo geral, as medidas adotadas por Gudin levaram a uma crise de liquidez, queda na formação bruta de capital fixo e nos investimentos em bens de capital (tendo em vista o esfriamento da atividade nesse período). As razões para a substituição de Gudin residem no descontentamento do setor cafeeiro com as medidas adotadas, sintetizadas naquilo que a oposição chamou de “confisco cambial”. Como o setor cafeeiro representava uma importante base política, sua pressão resultou no pedido de demissão de Eugênio Gudin em 4 de abril de 1955. Para aplacar a fúria da cafeicultura paulista, Café Filho escolheu José Maria Whitaker para o ministério da Fazenda, ex-ministro de Vargas durante o governo provisório. Na gestão Whitaker podemos verificar uma inflexão na política econômica, dado que “a inflação parecia preocupá-lo apenas enquanto exercício de retórica”. Em maio de 1955, ainda em conseqüência das medidas contracionistas da política monetária de Gudin, aflora uma crise bancária decorrente da falta de liquidez do setor financeiro. Whitaker baixa então a Instrução 116 da Sumoc, que nada mais faz do que refogar as instruções 106 e 108 tomadas pelo seu antecessor. Whitaker definia-se como seguidor da real bills doctrine, acreditando que as emissões destinadas aos setores produtivos não eram inflacionárias. Como resultado dessa visão, ampliaram-se as concessão de crédito ao setor privado e ao investimento público. Whitaker decretou ainda o fim “temporário” da intervenção brasileira no mercado do café, baseado na tese de que a queda decorrente dos preços do café beneficiaria o Brasil ao eliminar do mercado os produtores marginais e menos eficientes. 17 Durante a gestão Whitaker o país recebeu a visita de uma missão do FMI, cujo resultado foi o chamado “Relatório Bernstein”, que apresentava como alternativas para a reforma cambial no Brasil i) a desvalorização e unificação do câmbio, mantendo os leilões cambiais para importação e ii) o abandono do regime de taxas fixas, com a instituição de um mercado livre. A reforma realmente elaborada estipulava um regime cambial unificado por meio de taxas flutuantes, mantendo um regime diferenciado para o café. No entanto, esse projeto foi sepultado pelo Congresso, tendo em vista as eleições presidenciais. ÍNDICE CRONOLÓGICO setembro de 1954: Gudin embarca para Washington (reunião anual do FMI). Consegue US$ 80 milhões de empréstimo da instituição e acerta outro de US$ 200 milhões com um consórcio de bancos privados. Outubro de 1954: Instituídas as seguintes Instruções da Sumoc: 105 (fixava os juros pagos aos depósitos a vista e a prazo em 3% e 7% ao ano), 106 (elevava a taxa de redesconto das promissórias de 6 para 10% e das duplicatas de 6 para 8%) e 108 (aumentos dos compulsórios sobre depósitos a vista de 4 para 14% e a prazo de 3 para 7%). Tornava-se explícita a orientação contracionista do governo. Novembro de 1954: Instrução 109 da Sumoc: fixou-se a bonificação para a venda de café no mercado internacional (a política vigente anteriormente estabelecia que essas bonificações flutuariam conforme o mercado) Janeiro de 1955: Instrução 112 da Sumoc: Governo eleva as bonificações para os demais produtos de exportação (incluindo algodão e cacau) 27 de janeiro de 1955: É publicada a Instrução 113 da Sumoc, que concede significativos instrumentos para a entrada de capitais externos no país. Fevereiro de 1955: Dada a insatisfação da cafeicultura diante daquilo que chamou-se de “Confisco cambial”, o governo volta atrás e equipara a bonificação do café com a das demais mercadorias (Instrução 114 da Sumoc). 4 de abril de 1955: Gudin deixa o governo em virtude da pressão da cafeicultura paulista. Assume o ministério em seu lugar o banqueiro paulista José Maria Whitaker. Abril de 1955: Whitaker suspende temporariamente a compra de café, insatisfeito com a prática intervencionista do governo brasileiro na sustentação dos preços mínimos do café, que acabava privilegiando os concorrentes do produto nacional. Maio de 1955: Através da Instrução 116 da Sumoc Whitaker revoga as Instruções 106 e 108 assinadas por Gudin. Os compulsórios e redescontos voltaram aos níveis anteriores. Agosto de 1955: Forte geada força o governo a adotar uma desvalorização gradual do câmbio-café. Setembro de 1955: Reforma cambial. Unificação do câmbio através de taxas flutuantes, com um regime diferenciado para o café (a fim de eliminar os efeitos do “confisco cambial”). Contexto internacional – O período é marcado pela indisposição do governo Eisenhower em financiar o endividamento dos países latino-americanos. Essa decisão apenas reforça uma tendência já verificada, em diferentes intensidades, durante todo o pós-guerra, como atesta o fim prematuro da Comissão Mista Brasil Estados Unidos (CMBEU) já no governo Vargas. O país viu-se então forçado a negociar, na gestão Gudin, empréstimos junto ao setor financeiro privado internacional, criando ainda mecanismos para atrair a entrada de capital (Instrução 113 da Sumoc). No ministério de Whitaker o governo estabeleceu contatos com o FMI a fim de implementar uma reforma cambial. Política Monetária – Fortemente contracionista durante o ministério Gudin. O ministro implementou medidas que aumentavam os juros, compulsórios e redescontos (Instruções 105,106 e 108 da Sumoc). Esse período é considerado como um dos mais efetivos na condução de uma política de cunho restritivo-ortodoxo já implementadas no país, resultando numa significativa crise de liquidez. Já na gestão Whitaker essa política de estabilização é seriamente afetada pelas medidas que revogaram as instruções que implementavam uma política monetária creditícia. Esse período também é marcado pela ampliação do crédito ao setor produtivo, especialmente a agricultura. 18 Política Fiscal – Gudin considerava o processo inflacionário como fruto da expansão monetária (já combatida pelo programa contracionista descrito acima) e dos déficits públicos. Para combater esse segundo ponto, Gudin pretendia ampliar a arrecadação mediante a elevação da carga tributária, e reduzir as despesas. Devido às dificuldades de aprovar no Congresso uma medida impopular, Gudin só conseguiu uma redução da dotação de verbas para os ministérios, reduzindo a participação do governo na formação bruta do capital. 19 CAPÍTULO 7– DEMOCRACIA COM DESENVOLVIMENTO – 1956-61 Luiz Oreinstein e Antônio Cláudio Sochaczewski (Bruno Carazza) O Brasil encontrava-se em meados da década de 1950 num dilema que envolvia a necessidade de levar adiante o processo desenvolvimentista de substituição de importações e a queda no saldo disponível das divisas internacionais. A diminuição das receitas de exportação e o aumento das importações – que determinavam o desajuste externo – contrastava com a necessidade de aumentar a entrada de bens de capital e matérias-primas para incentivar o crescimento industrial. A única solução viável para esse problema de Balanço de Pagamentos (BP) seria a entrada líquida de capitais autônomos, a fim de manter alta a taxa de investimento e não afetar o fluxo de importações. Para tanto o governo JK tomou como uma das medidas iniciais de seu governo a criação de um arcabouço institucional para estimular a entrada de capital, mesmo que isso se desse a custo de maiores pressões no BP. O governo levou adiante ainda uma reforma cambial (1957), reduzindo as taxas múltiplas (de 5 para 2, a geral e a especial, que tornava certas importações mais caras), impondo tarifas ad-valorem e desvinculando recursos obtidos com os leilões cambiais (permitindo assim maior flexibilidade de gastos do setor público). De um modo geral essa reforma buscou compatibilizar a contradição entre prover a importação a baixo custo de equipamentos e matérias-primas e estimular a produção interna. Essa determinação em levar adiante com maior fôlego o processo de desenvolvimento era evidente desde a posse do governo. Além dessas medidas de reforma cambial e estímulo à entrada de capitais, o governo JK já no início de 1956 criou o Conselho de Desenvolvimento, encarregado de elaborar o que no final do ano foi lançado como Plano de Metas, que resumia os objetivos de atuação das esferas pública e privada no estímulo ao crescimento econômico. O Plano de Metas baseou-se nos diagnósticos elaborados por programas como o CEPAL-BNDE (1953), e da Comissão Mista Brasil Estados Unidos (CMBEU, segundo governo Vargas), que definiam áreas-chave de investimento e os pontos de gargalo da economia brasileira. O plano trabalhava com um espaço de tempo de 5 anos e definia o campo de atuação do Estado em investimentos em áreas básicas e de infra-estrutura e no estímulo aos investimentos privados. Contemplava-se cinco áreas principais: energia, transporte, alimentação, indústria de base e educação, além da construção de Brasília (que não estava orçada no Plano). Do total de recursos necessários para tanto, 71,3% se concentrariam nos setores de energia e transporte (quase que totalmente arcados pelo setor público), 22,3% na indústria de base (envolvendo o setor privado, financiado por entidades públicas) e apenas 6,4% para os setores de alimentação e educação. O desembolso ficaria em 50% a cargo do setor público, 35% viria da esfera particular e 15% de agências internacionais que financiariam programas tanto públicos quanto privados. Lessa (1981) define quatro pontos básicos para o Plano de Metas: 1. Tratamento especial para o capital estrangeiro 2. Financiamento dos gastos públicos e privados via expansão dos meios de pagamento e do crédito – provocando forte pressão inflacionária. 3. Ampliação da participação do setor público na formação bruta de capital. 4. Estímulo à iniciativa privada – através de reserva de mercado para a produção nacional (lei do similar nacional), câmbio preferencial para a importação de bens de capital para setores especiais (automobilística e naval, por exemplo) e crédito com carência e juros subsidiados do BNDE e do Banco do Brasil. O governo previa para os anos seguintes um déficit decrescente do BP, alcançando o equilíbrio em 1961. Estabelecia-se uma meta inflacionária de 13,5% ao ano e déficits orçamentários de 2,2% do PIB por parte do setor governamental – o que parece incompatível, uma vez que a única forma de se financiar esse déficit seria a emissão de moeda, o que desencadearia uma série de pressões inflacionárias. No final do período pode-se constatar que a maioria das metas específicas do Plano de Metas alcançaram altas taxas de realização (referentes a expansão da malha rodoviária, energia, produção industrial, etc.). O PIB cresceu à taxa média anual de 8,2% (o PIB per capita cresceu 5,1%) e a inflação média, porém, ficou em 22,6% ao ano – ambas superiores ao objetivo, só que a primeira com efeito positivo e a segunda, negativo. O período apresentou ainda fortes déficits no BP, resultado da queda dos preços do café e da estagnação de outros componentes da pauta de exportação de 1958 a 60. Pode-se delinear como impactos do Plano de Metas a preocupação com os pontos de estrangulamento da infra-estrutura e a modernização e ampliação do parque industrial, ainda que às custas do aprofundamento das desigualdades sociais e regionais. As principais dificuldades enfrentadas no período foram a ausência de definição dos mecanismos de financiamento das metas (como por exemplo a elevação da carga fiscal, dado a pouca expressividade do sistema financeiro nacional), a resistência do empresariado frente a medidas de controle 20 inflacionário e a atitude dúbia da política monetária, ao tentar tornar compatíveis metas antagônicas como crescimento, estabilidade, altos lucros e baixo custo de vida. O papel do setor público Além da tendência verificada desde o início dos anos 50 de atribuir ao setor público a solução para os problemas de infra-estrutura que dificultassem a industrialização, a partir da segunda metade da década delega-se também ao Estado o provimento de insumos básicos. O governo controlava nesse período as três maiores siderúrgicas do país (CSN, Cosipa e Usiminas), detinha o monopólio da produção e refino do petróleo (Petrobrás), produção e exportação do minério de ferro (CVRD), participação crescente no setor energético (CHESF, Furnas), importância fundamental nos transportes (através da RFFSA, Lloyd Brasileiro, DNER e DER) e ainda o controle sobre o crédito (Banco do Brasil) e a comercialização do café, cacau, borracha, açúcar, etc. através dos vários institutos. O governo contou como suas principais fontes de recursos no período o imposto sobre o consumo, imposto de renda e o saldo de ágios e bonificações do imposto de importações. A participação da receita do governo no PIB, que permaneceu entre 19 e 20% até 1957, chegou a 23.2% no auge do Plano de Metas. No entanto o governo ampliou o peso de seus gastos de 19% do PIB em 1952 para 23,7% em 1961, colocando em risco a capacidade de poupança do setor público. Os investimentos do setor público concentraramse no setor industrial (química e mineração, mais transportes e comunicações a partir de 1958, com a formação da RFFSA). Ao exercer uma demanda autônoma de investimentos, o Estado exerceu posição central para a sustentação do ciclo econômico, principalmente para o setor de bens de capital. Políticas fiscal e monetária Durante o governo JK as políticas monetária e fiscal ficaram para segundo plano, ficando vinculadas ao processo de industrialização. No campo monetário a política econômica era gerenciada pela Sumoc, Banco do Brasil e pelo próprio Tesouro. Cabia à Sumoc a política cambial, a fixação das taxas de redesconto e compulsórios, a fiscalização do capital estrangeiro e dos bancos comerciais e as operações de open market. O Tesouro emitia papel-moeda e amortizava-o através da Caixa de Amortização. As funções do Banco do Brasil, no entanto, eram as mais contraditórias. Ao Banco do Brasil estava delegada a operação da carteira de redescontos (para crédito seletivo e de liquidez) e da caixa de mobilização bancária (emprestador de última escolha), operava ainda a carteira de câmbio e de comércio exterior (Cacex) – implementando decisões da Sumoc. O Banco do Brasil recebia ainda a arrecadação tributária e efetivava os pagamentos da união (banco do Tesouro), sendo responsável ainda pelo serviço de compensação de cheques e o depósito das reservas voluntárias dos bancos comerciais. A ambigüidade das funções do Banco do Brasil residia no choque entre seus papéis de banco comercial e autoridade monetária (não existindo limites rígidos à emissão de papel-moeda) e por outro lado de depositário das reservas dos bancos comerciais e ele mesmo sendo um banco comercial (não havendo limite para suas operações ativas). Durante o período JK a cobertura do déficit de caixa governamental se fez quase que exclusivamente através de empréstimos do Banco do Brasil ao Tesouro. Como o BB exercia funções de banco central e banco comercial, qualquer crédito contra ele tornava-se base monetária (e não moeda escritural secundária). Logo, a cobertura dos déficits do Tesouro com crédito em conta corrente no Banco do Brasil representava expansão primária dos meios de pagamento. Além dessa controversa atuação do Banco do Brasil, o governo encontrava dificuldades na utilização dos instrumentos tradicionais de política monetária para restringir a expansão do crédito: i) as operações de open market eram praticamente inexistentes, pois não havia um montante suficiente de letras do Tesouro em circulação, ii) as autoridades relutavam em utilizar o depósito compulsório, uma vez que esse meio seria lento e de grande impacto, iii) o redesconto também foi pouco utilizado. As autoridades monetárias contaram então com dois instrumentos heterodoxos: a manipulação dos empréstimos das diversas carteiras do BB e a compra e venda de divisas de câmbio – as chamadas PVCs (Promessas de Venda de Câmbio). Dessa forma a eliminação do déficit do Tesouro só poderia se dar através do aumento da receita tributária (que se fazia desinteressante para o Congresso), lançamento de títulos da dívida pública (havia no entanto restrições com relação ao patamar de sua taxa de juros) e a compressão de despesas – afetando diretamente o investimento, pois o funcionalismo público era bastante forte. Como a inflação havia saltado de 7% (57) para 24,3% (58), Lucas Lopes assumiu o Ministério da Fazenda encaminhando ao Congresso o Programa de Estabilização Monetária. Seus principais objetivos: num primeiro momento, reduzir o ritmo da inflação mediante distribuição de renda e orientação de investimentos e preços; posteriormente, limitar a expansão dos meios de pagamento, com vistas à estabilização. Associado ao conservadorismo e às políticas ortodoxas do FMI em plena euforia do “50 anos em 5”, o plano sofreu um rápido desgaste junto à classe política e à opinião pública. O resultado foi a queda de Lucas Lopes e Roberto Campos (então presidente do BNDE) e o rompimento do governo com o FMI. 21 ÍNDICE CRONOLÓGICO Agosto de 1957: Nova reforma do sistema cambial, com o objetivo de simplificar o sistema de taxas múltiplas e introduzir um mecanismo de proteção específica por produtos da mesma categoria. 27 de outubro de 1958: É encaminhado ao Congresso o Programa de Estabilização Monetária do ministro Lucas Lopes. Janeiro de 1959: Liberação das exportações de manufaturados pelo mercado livre (Instrução 167 da Sumoc) Abril de 1959: Liberação dos fretes (Instrução 181) Dezembro de 1959: Transferiu todas as exportações para esse mercado, com a exceção de café, cacau, óleo mineral cru e mamona (Instrução 192). Meados de 1959: Lucas Lopes é substituído no Ministério da Fazenda por Sebastião Paes de Almeida (então Presidente do Banco do Brasil), Roberto Campos dá lugar a Lúcio Meira no BNDE e o governo brasileiro rompe com o FMI. Política cambial: Reforma implementada em agosto de 1955, introduzindo apenas duas taxas de câmbio: a Geral (matérias-primas, equipamentos e bens sem suprimento nacional) e a Especial (bens de consumo e outros com similar nacional). Um dos objetivos dessa reforma foi estimular o processo de substituição para o setor de bens de capital (que, em conseqüência, cresceu a uma taxa de 26,4% ao ano entre 1955 e 1960). Plano de Metas: Previsão e Resultados (1957-61) Previsão Realizad % o Energia elétrica (1.000 kw) 2.000 1.650 82 Carvão (1.000 ton) 1.000 230 23 Petróleo-produção (1.000 barris/dia) 96 75 76 Petróleo-refino (1.000 barris/dia) 200 52 26 Ferrovias (1.000 km) 3 1 32 Rodovias-construção (1.000 km) 13 17 138 Rodovias-pavimentação (1.000 km) 5 Aço (1.000 ton) 1.100 650 60 Cimento (1.000 ton) 1.400 870 62 Carros e caminhões (1.000 unid) 170 133 78 Nacionalização (carros) (%) 90 75 Nacionalização (caminhões) (%) 95 74 Fonte: Banco do Brasil, Relatório e Anuário Estatístico. Apud (Orenstein & Sochaczewski, 1997) Política monetária: A cobertura do déficit de caixa do governo se fez quase que exclusivamente através de empréstimos do Banco do Brasil ao Tesouro. Desta forma, a cobertura dos déficits por meio de crédito em conta corrente no Banco do Brasil implicou permanente expansão primária dos meios de pagamento. Dada a reação negativa do Programa de Estabilização Monetária (PEM), optou-se pela continuação do projeto desenvolvimentista sem políticas de controle monetário. A partir daí as tentativas de estabilização de preços restringiram-se a frustrados “Planos de Contenção” da despesa orçamentária. Política fiscal: Além das despesas de custeio, o item mais importante de gasto do governo referia-se aos subsídios às empresas de transporte de propriedade do governo federal. Elas receberam subvenções do governo federal da ordem de 12 a 13% da sua receita em 1955-60. O governo mostrou-se incapaz de conter os gastos correntes, principalmente com a folha de pagamentos (dada a força política do funcionalismo público. 22 CAPÍTULO 8 - INFLAÇÃO, ESTAGNAÇÃO E RUPTURA: 1961-1964 Marcelo de Paiva Abreu (Matheus Albergaria de Magalhães) 1.A Tentativa Ortodoxa sob Quadros Jânio Quadros assumiu a presidência do país no dia 31 de janeiro de 1961, com sua vitória sendo conseqüência de uma coalizão momentânea entre o voto conservador e setores populares da sociedade, sensibilizados pelo apelo populista de suas propostas. O novo presidente denunciou então, as dificuldades econômicas herdadas de seu antecessor, que eram basicamente as seguintes: aceleração inflacionária, indisciplina fiscal e deterioração do balanço de pagamentos. Neste cenário, dominava uma visão conservadora na formulação e implementação da política econômica. Em março de 1961, o governo realizou uma importante reforma no regime cambial vigente, a partir da Instrução 204 da Superintendência da Moeda e do Crédito (SUMOC), onde procurava atingir dois objetivos básicos: a) desvalorizar a taxa de câmbio; e b) unificar o mercado cambial. Os motivos primordiais para que tal reforma fosse feita relacionam-se a dificuldades do balanço de pagamentos e a preocupações com a inflação. Para tanto, foram tomadas as seguintes medidas: i)a categoria geral do regime cambial vigente anteriormente foi transferida para o mercado dito livre; ii)o “câmbio de custo” aplicável a importações preferenciais (trigo, petróleo, etc.) foi desvalorizado em 100%. iii)o sistema antes vigente, de diferir a entrega de cambiais aos importadores, foi substituído pelo sistema das Letras de Importação. (Neste sistema, os importadores, ao comprarem divisas para realizar suas importações, eram obrigados a realizar simultaneamente, uma operação colateral, onde deveriam depositar o valor em cruzeiros correspondente à importação no Banco do Brasil durante 150 dias. Em troca, receberiam as Letras de Importação). Adicionalmente, foram editadas novas instruções da SUMOC que, além de extinguirem o câmbio de custo, determinavam a retenção de US$ 22 por saca de café exportada e que as exportações seriam realizadas à taxa do mercado livre. Ao longo dos meses de maio e junho de 1961, o governo teve sucesso nas negociações com credores norte-americanos e europeus, conseguindo novos empréstimos e um significativo reescalonamento da dívida externa que venceria entre 1961 e 1965 (ou seja, conseguiu adiar o pagamento de parte da dívida referente a esse período). Apesar disto, no que diz respeito à política externa, o governo assumiu uma posição singular, distanciando-se da posição norte-americana de isolar Cuba, bem como procurando reatar relações com a União Soviética e apoiar a descolonização da África. (É a chamada “política externa independente”). No dia 25 de agosto de 1961, Jânio Quadros renunciou ao poder, o que acabou por resultar no colapso de seu programa de estabilização. Devido à curta duração de seu mandato, passa a ser bastante difícil realizar uma avaliação criteriosa dos resultados de suas políticas econômicas, uma vez que a crise política de agosto a setembro de 1961 teve como conseqüência o descontrole monetário, fiscal e creditício. 2. O Impasse Parlamentarista Com a renúncia de Jânio Quadros, foi instaurado no país o regime parlamentarista, devido ao veto militar à posse do Vice-Presidente (tal como estabelecia a constituição), com tal regime durando de setembro de 1961 a janeiro de 1963. O primeiro gabinete parlamentarista foi formado sob a presidência do então deputado Tancredo Neves, tendo o banqueiro Walter Moreira Salles como Ministro da Fazenda. O programa de governo apresentado durante esse período era muito genérico, onde apesar de ter a baixa taxa de crescimento da economia como principal problema a ser resolvido, estabelecia diversos objetivos que admitia não serem todos compatíveis entre si. Para tanto, o governo propunha-se a elevar a taxa de poupança (via uma reforma fiscal) e realizar a contenção do déficit de custeio das empresas públicas, bem como estabeleceria prioridades e corrigiria desperdícios para melhorar a composição dos investimentos, e introduziria técnicas de planejamento. No caso, eram contemplados três níveis de planejamento: o Plano Perspectiva (20 anos), o Plano Qüinqüenal e o Plano de Emergência. No que diz respeito às políticas monetária, bancária e financeira, o governo estabeleceu medias de emergência e de reforma institucional. Em relação à área monetária, o governo demonstrou enorme preocupação com a expansão monetária, impondo controles quantitativos de crédito até o final de 1961, e estabelecendo mecanismos de depósito compulsório sobre depósitos à vista dos bancos privados (já que houvera um certo volume de expansão monetária durante a crise política). Quanto a reformas institucionais, foi feita menção à criação do Banco Central e do Banco Rural, bem como foi feita uma reforma da legislação bancária vigente. Em relação à política financeira pública, o governo propunha-se a aplicar o Plano de Economia de gastos aprovado por Quadros e a financiar o déficit programado de 1962 de forma não-inflacionária (ou seja, sem emitir moeda 23 para cobrir tal déficit). Em termos das reformas, a reforma vista como básica era a da área fiscal. Já em relação à política cambial, o programa defendia a adoção de uma taxa de câmbio única, fixada em um nível “realista”. Contraditoriamente, enfatizava ao mesmo tempo, a necessidade de manter o controle quantitativo de importações não-essenciais. Nessa época, o novo presidente, João Goulart (que tomou posse em 07/09/1961) comprometeu-se ainda com a realização da reforma agrária. Neste período, as relações Brasil-EUA acabaram por sofrer um certo desgaste devido a modificações na legislação econômica brasileira, que acabavam por prejudicar a remessa de lucros de capital estrangeiro, bem como cancelavam certas concessões feitas a companhias norte-americanas. A “política externa independente” inaugurada por Jânio Quadros teve continuidade com João Goulart. De qualquer forma, mesmo com a renúncia de Jânio Quadros, os resultados econômicos de 1961 foram bastante razoáveis. A inflação manteve-se estável em torno de 30%, o PIB cresceu 8,6%, o balanço de pagamentos foi beneficiado pela recuperação das exportações e a renegociação da dívida externa. A formação bruta de capital fixo (um importante indicador do nível de investimento do país), no entanto, reduziu-se de 15,7% do PIB em 1960 para 13,1% em 1961, seu menor valor desde 1949. Estes bons resultados, no entanto, não duraram muito. Em maio de 1962, o déficit de caixa do governo aumentou significativamente devido ao aumento das despesas públicas e o aumento da taxa de expansão da oferta monetária. (A principal pressão sobre os gastos públicos provinha do déficit das empresas do governo no setor de transportes). No final de maio de 1962, ocorreu uma crise política interna ao governo que acabou por culminar na renúncia coletiva do gabinete Tancredo Neves. O nome indicado para sucedê-lo foi o de Santiago Dantas, mas que acabou não vingando, devido a certa resistência política do Congresso. Após algum tempo, foi aprovado o nome de Brochado da Rocha. O programa político de Brochado da Rocha abordava diversos temas, desde a reforma agrária até a energia nuclear. Suas propostas revelavam-se, no entanto, bastante vagas, o que dificultava sua aceitação no Congresso. Seu programa econômico pretendia estabilizar a inflação em torno de 60% em 1962 e reduzi-la para 30% em 1963. Seu gabinete procurou obter poderes especiais para legislar sobre diversos temas, inclusive as reformas de base, bem como na antecipação da data de realização do plebiscito acerca da permanência do sistema parlamentarista de governo. A maior parte dessas propostas acabou sendo recusada no Congresso, o que levou à renúncia do gabinete Brochado da Rocha em setembro de 1962. A proposta relativa à antecipação do plebiscito, no entanto, foi aceita, com sua realização sendo marcada para o dia 06 de janeiro de 1963. Durante esse período de transição, o gabinete foi chefiado por Hermes Lima. Apesar de haver um programa de transição que incluía um plano de controle da inflação, este acabou sendo comprometido pela concessão do 13º salário aos trabalhadores urbanos. As relações com os EUA continuaram a desgastar-se no período, com o Brasil finalmente concordando com o bloqueio a Cuba (apesar de ser contra a intervenção armada naquele país). As conseqüências de tamanha instabilidade política acabaram sendo refletidas a nível econômico no segundo semestre de 1962. O governo perdeu o controle de suas contas no final do ano, a expansão dos meios de pagamento aumentou enormemente, a inflação aumentou e a taxa de crescimento PIB reduziu-se para 6,6% (tal taxa havia sido de 8,6% em 1961). 3.O Plano Trienal e seu Fracasso Em fins de dezembro de 1962 foi apresentado o Plano Trienal de Desenvolvimento Econômico e Social, elaborado sob a coordenação de Celso Furtado. Em janeiro de 1963, as condições políticas mostravam-se um tanto favoráveis à colocação em prática do Plano, uma vez que houve a vitória do regime presidencialista no plebiscito. Apesar de ser um plano elaborado por economista ligado à tradição estruturalista cepalina (Celso Furtado), o Plano Trienal caracterizava-se por um diagnóstico bastante ortodoxo da inflação no país, enfatizando o excesso de demanda via gasto público como a causa mais importante. As medidas propostas eram semelhantes às de outros programas de estabilização antes adotados: correção de preços defasados, redução do déficit público e controle da expansão do crédito ao setor privado. Havia ainda as metas de 25% de taxa de inflação para 1963 (10% em 1965) e 7% para o crescimento anual do produto. Logo após o anúncio do Plano houve um salto no índice de preços industriais por atacado, o que se deveria, conforme sugerido por Sochaczewski (1980) a expectativas de imposição de controle de preços. No início de 1963 ocorreram cortes nos gastos públicos, limites à expansão do crédito privado, desvalorização cambial, e aumento do depósito compulsório. Setores de esquerda criticaram duramente o Plano, denunciando o caráter recessivo da política econômica e a submissão dos interesses nacionais aos EUA. O ano de 1963 foi, portanto, um ano recessivo. Há, no entanto, uma certa divergência quanto à interpretação das causas de tal recessão. Parece ser difícil fazer uma análise de curto prazo do programa de ajuste devido à indisponibilidade de dados de boa qualidade. Em relação aos dados anuais, têm-se discrepâncias gritantes: a taxa de crescimento do PIB caiu de 6,6% em 1962 para 0,6% em 1963 (o mais baixo nível desde a 2ª Guerra). A restrição de liqüidez imposta pelo governo afetou o desempenho dos gêneros industriais que 24 dependiam do crédito (em especial, os produtores de bens de consumo durável (Wells 1977)). Os dados relativos ao investimento parecem ambíguos, já que dados da Fundação Getúlio Vargas indicam um crescimento da FBKF (de 13,1% em 1961 para 15,5% em 1962 e 17% em 1963); ao passo que dados desagregados apontam para uma pronunciada queda do nível real de investimento. Ao traçarem a relação causal entre o programa de estabilização do Plano Trienal e a recessão que veio em seguida, há quem enfatize a perda de dinamismo do processo de substituição de importações, com aumento da relação capital/produto e flutuações de investimento associadas à instalação de plantas com escalas de produção muito além do tamanho de mercados, durante o Plano de Metas. Outras interpretações enfatizam uma possível incompatibilidade entre a demanda associada a perfis específicos de distribuição de renda e a oferta de certos gêneros industriais (Tavares 1972, 1975; Furtado 1968). Existem ainda, interpretações tidas como de difícil comprovação, como aquelas que associam a recessão à aceleração inflacionária ou deterioração do quadro político (Simonsen 1963) ou a importância de restrições externas (Leff 1968). 4. A Agonia da Terceira República Em junho de 1963, tornou-se explícita a polarização da disputa pelo poder entre massas urbanas mobilizadas pelo populismo e antigas estruturas de poder. Ocorre uma fragmentação de recursos políticos, havendo intensa rotatividade na equipe governamental. Gradativamente, vai sendo formada uma coligação parlamentar em defesa do status quo (Santos 1986). As forças armadas também se voltam contra o Presidente, após a rebelião de sargentos da Marinha e Aeronáutica contra a decisão do Supremo Tribunal Federal de manter a anulação da eleição de sargentos um ano antes. Neste período, ocorre o descontrole das contas públicas, bem como rápida expansão da oferta monetária e deterioração do balanço de pagamentos. A fragmentação política vigente fez com que forças conservadoras passassem a realizar manifestações que mobilizaram maciçamente a classe média, explicitando o isolamento político do Presidente e a debilidade de seu apoio político e militar. No dia 31 de março de 1964 iniciou-se uma rebelião militar apoiada pelo empresariado, a classe média e a maioria parlamentar, pondo fim à Terceira República, sendo rompida então a legalidade constitucional. ÍNDICE CRONOLÓGICO 31 de Janeiro de 1961 – Jânio Quadros assume a Presidência da República amparado pela mais significativa votação popular que registra a história das eleições presidenciais brasileiras. Março de 1961 – Governo realiza importante reforma do regime cambial vigente através da Instrução 204 da SUMOC, tendo como objetivo a desvalorização da taxa de câmbio e a unificação do mercado cambial. 25 de Agosto de 1961 – Renúncia de Jânio Quadros. É adotado então, o sistema parlamentarista de governo. No meio tempo, Pascoal Ranieri Mazilli assume o poder, ficando de 25/08/1961 a 07/09/1961. 07 de Setembro de 1961 – João Goulart, o “Jango” assume a Presidência da República. Maio de 1962 – Ocorre a renúncia coletiva do 1º gabinete parlamentarista, sob a presidência do então deputado Tancredo Neves. Após um certo impasse, o Congresso aprova o nome de Brochado da Rocha para o cargo de 1º Ministro. Dezembro de 1962 – É apresentado o Plano Trienal de Desenvolvimento Econômico e Social, elaborado sob a coordenação de Celso Furtado. 06 de Janeiro de 1963 – Após ter sua realização antecipada, ocorre o plebiscito para a votação a respeito do sistema de governo vigente. Ocorre uma vitória maciça dos defensores do regime presidencialista. Junho de 1963 – O presidente Goulart promove uma reforma ministerial, substituindo ministros responsáveis pelo fracasso do Programa de Estabilização (o Plano Trienal). Outubro de 1963 – Goulart envia mensagem ao Congresso pedindo aprovação do estado de sítio como reação às declarações de Carlos Lacerda, governador da Guanabara. O pedido, no entanto, é retirado mais tarde. Dezembro de 1963/Março de 1964 – O governo demonstra apresentar grande fragilidade política, o que acaba por levar a manifestações das forças conservadoras que mobilizam maciçamente a classe média. 25 31 de Março de 1964 – Inicia-se a rebelião militar, com amplo apoio do empresariado, da classe média e respaldo da maioria parlamentar, pondo fim à Terceira República. POLÍTICAS: i)Monetária/Creditícia: Durante a curta duração do mandato de Jânio Quadros (31/01/1961 a 25/08/1961), houve um certo descontrole monetário (no entanto, exatamente devido a essa curta duração, é difícil fazer uma análise criteriosa da política econômica do período). Durante a vigência do 1º gabinete parlamentarista comandado por Tancredo Neves, foram adotadas medidas de emergência que incluíam controles quantitativos de crédito bem como o estabelecimento de mecanismos de depósito compulsório sobre os depósitos à vista dos bancos privados, tudo isto visando manter a oferta monetária constante em termos reais. No 2º semestre de 1962, devido à instabilidade política vigente no país, a expansão dos meios de pagamento descontrolou-se, indo de 4% a.m. a 13% a.m. em dezembro daquele ano. A inflação conseqüentemente aumentou. Com a instauração do Plano Trienal, em fins de 1962, tinha-se como parte de seu receituário, a correção de preços defasados e o controle da expansão do crédito ao setor privado. Do mesmo modo, houve um aumento do depósito compulsório de 24% para 28% dos depósitos à vista. Tais medidas acabariam por revelar-se mais tarde, como causadoras de uma grande recessão, uma vez que impuseram uma tremenda restrição de liqüidez a gêneros industriais produtores de bens de consumo durável que dependiam do crédito (Wells 1977). Após isto, a oferta monetária foi mantida sob razoável controle até os primeiros meses de 1963, quando passou a expandir-se rapidamente, gerando taxas de inflação semelhantes (e até mesmo superiores) às geradas no passado. ii)Fiscal: Ao longo do período 1961/1964, o governo preocupou-se bastante com o equilíbrio do balanço de pagamentos. Como citado antes, com a renúncia de Jânio Quadros (e a crise política daí decorrente) houve um descontrole fiscal. Com o gabinete parlamentarista de Tancredo Neves, o governo procuraria alcançar os objetivos de seu programa através de uma elevação da taxa de poupança, via uma reforma fiscal e contenção do déficit de custeio das empresas públicas. Procuraria assim, obter uma melhor programação dos investimentos públicos, e uma reforma fiscal que estimulasse o aumento da formação bruta de capital fixo e melhorasse a tributação indireta. Com o fim do gabinete Tancredo Neves e início da gestão Brochado da Rocha, este novo PrimeiroMinistro tentou obter poderes especiais junto ao Congresso para legislar sobre diversos temas, inclusive a reforma tributária. A maior parte dessas reivindicações, no entanto, foi negada (o que levou à renúncia de Rocha). No 2º semestre de 1962, o controle das contas do governo (que havia sido retomado em alguma medida por Rocha) foi perdido no final do ano. Com o Plano Trienal, no fim de 1962, tinha-se como um de seus principais objetivos, a redução do déficit público, o que esperava-se atingir através de um plano de economia e deferimentos de despesas. Houve efetivamente um corte nos gastos públicos (juntamente com a já citada restrição do crédito ao setor privado). Com a instabilidade política de 1963, o balanço de pagamentos deteriora-se de forma considerável, a despeito da recuperação das exportações, em vista da contração das entradas autônomas de capital. iii)Cambial: Logo após Jânio Quadros assumir a presidência, em janeiro de 1961, foi instaurada, em março do mesmo ano, a Instrução 204, cujos objetivos básicos eram a desvalorização da taxa de câmbio e a unificação do mercado cambial. A categoria geral do regime cambial antes vigente foi transferida para o mercado livre; o “câmbio de custo” aplicável a importações preferenciais foi desvalorizado em 100% (mais tarde esse câmbio foi extinto, sendo transferido para o mercado livre). O sistema anteriormente vigente, de diferir a entrega de cambiais aos importadores, foi substituído pelo chamado “sistema das Letras de Importação”, através do qual os importadores, ao comprarem suas divisas eram obrigados a realizar uma operação colateral, depositando no Banco do Brasil por 150 dias o valor em cruzeiros correspondente à importação e recebendo Letras de Importação em troca. Com o primeiro gabinete parlamentarista (Tancredo Neves), de 1961, pretendia-se a adoção de uma política cambial baseada em uma taxa única e “realista”. Logo após a saída de Quadros, em 1961, foi possível manter algum controle sobre as importações, graças ao aumento do requerimento para compra compulsória das Letras de Importação. Uma política semelhante foi adotada em relação a remessas financeiras. No entanto, ambas as políticas vieram a ser temporariamente revertidas no começo de 1962. Durante a instabilidade política do 2º semestre de 1962, apesar de haver problemas em relação às políticas fiscal e monetária, não há evidência de graves distorções da política cambial. (Na verdade, tentou-se torná-la mais transparente no período). Com o Plano Trienal, o câmbio foi desvalorizado em cerca de 30%. Apesar disto, o governo reintroduziu o subsídio a importações de alguns bens, como o trigo e derivados do petróleo. Em 1963, após o fracasso do Plano Trienal, a política cambial passa a refletir a deterioração da confiança no governo, aumentando significativamente os requisitos de depósitos prévios relativos a importações. A taxa cambial relevante para a remuneração de exportações, por sua vez, foi reajustada muito abaixo do valor requerido para manter constante em cruzeiros a remuneração real dos exportadores. iv)Contexto Internacional no período 1961/1964: No início desse período (maio/junho de 1961), o governo obteve sucesso quanto à negociação da dívida externa junto a credores internacionais. Ainda em 1961, no 26 entanto, as relações com os EUA especificamente, deterioraram-se devido a alterações na legislação econômica brasileira que prejudicavam interesses americanos. Esta situação era agravada pela “política externa independente” adotada pelo Brasil, que não se alinhava com algumas proposições do governo norte-americano, principalmente aquelas relacionadas a Cuba. Em 1962, as relações com os EUA continuaram a deteriorar-se devido às mudanças de legislação e à política externa independente já citadas. Ainda assim, o Brasil acabou aprovando o bloqueio à Cuba, cedendo a pressões políticas norte-americanas. 27 CAPÍTULO 9 - ESTABILIZAÇÃO E REFORMA: 1964 / 1967 André Lara Resende (Patrícia Silva Alvarenga) O PAEG (Plano de Ação Econômica do Governo), foi um plano de estabilização econômica elaborado pelo Ministério do Planejamento e Coordenação Econômica (Campos no Ministério do Planejamento e Bulhões no Ministério da Fazenda) posto em prática em 1963. O plano visava conter progressivamente a inflação entre 64 e 65 (gerando efeitos já em 66); acelerar o desenvolvimento econômico (interrompido em 62/63); atenuar diferenças setoriais e regionais; aliviar tensões criadas pelos desequilíbrios sociais; política de investimentos para proporcionar oportunidades de empregos e corrigir déficit do balanço de pagamentos. INSTRUMENTOS DE AÇÃO POLÍTICA FINANCEIRA Política de redução do déficit público diminuindo a pressão inflacionária e fortalecendo a capacidade de poupança nacional através do disciplinamento do consumo e das transferências do setor público e na melhoria da contenção da despesa. Política tributária para aumentar a arrecadação e combater a inflação, estimulando a poupança , melhorando a orientação dos investimentos privados e atenuando as desigualdades econômicas regionais e setoriais. Política monetária de acordo com os objetivos de estabilização, evitando redução do nível de atividade e a redução da capacidade de poupança das empresas. Política bancária fortalecendo o sistema creditício, ajustando-o às necessidades de combate a inflação e de estímulo ao desenvolvimento. Aumento do redesconto, compulsório e operações de open market (vendas de títulos públicos). Políticas de investimentos públicos para fortalecer a infra-estrutura econômica e social, e criar as economias externas necessárias ao desenvolvimento das inversões e atenuar desequilíbrios regionais e setoriais. Procurou-se ativar a bolsa de valores e foram criados bancos de investimento para se estimular a poupança privada. Criou-se o Banco Nacional de Habitação sendo um agente de captação da poupança privada forçada. Em um primeiro momento, esses fundos foram utilizados para absorver os títulos da dívida pública, financiando o déficit público. A instituição da correção monetária (um mecanismo de indexação) permitiu a captação da poupança privada voluntária e a reativação do sistema financeiro POLÍTICA ECONÔMICA INTERNACIONAL Política cambial e de comércio exterior para diversificar as fontes de suprimento e incentivar as exportações. Política de consolidação da dívida externa e de restauração do crédito do país no exterior de modo que aliviasse pressões de curto prazo sobre o balanço de pagamentos. Política de estímulos ao ingresso de capitais estrangeiros e de ativa cooperação técnica e financeira com agências internacionais de modo que acelerasse o desenvolvimento econômico. POLÍTICA DE PRODUTIVIDADE SOCIAL Política salarial assegurando a participação dos trabalhadores nos benefícios do desenvolvimento econômico, sendo compatível com a política de combate a inflação, do lado da procura e do custos, e que protegesse a capacidade de poupança do país (conseqüência do combate a inflação). Além da política salarial o PAEG compreendia também política agrária, habitacional e educacional. O crescimento programado para os anos de 65 e 66 era de 6% aa. O combate à inflação estava sempre qualificado no sentido de não ameaçar o crescimento econômico. As três causas da inflação, segundo o PAEG , são: déficit público, expansão de crédito às empresas e os aumentos institucionais de salários em proporção superior à do aumento da produtividade. Assim as causas citadas acima induzem um aumento dos meios de pagamentos, propagando a inflação no sistema econômico. Como soluções do processo inflacionário o plano propõe contenção do déficit público, (através de cortes de despesas desnecessárias e racionalização do sistema tributário), crescimento dos salários reais proporcional ao aumento da produtividade, restrição de crédito das empresas para conter a inflação de procura. POLÍTICA SALARIAL DO PAEG 28 Dadas as metas de política monetária e crescimento real do produto propostas pelo plano, as taxas de inflação correspondentes deveriam ser de 25% em 1965 e 10% em 1966. Enquanto o plano trienal sugeria reajustes salariais moderados, o PAEG tinha uma política salarial bem definida, baseando-se em: manter a participação dos assalariados no produto nacional impedir reajustamentos salariais desordenados que causam inflação corrigir as distorções salariais, no Serviço Público Federal , nas Autarquias, e nas Sociedades de Economia Mista As negociações diretas entre trabalhadores e empregadores foram substituídas por uma fórmula de reajuste salarial estabelecida pelo governo: deveria ser estabelecido o salário médio real dos últimos 24 meses anteriores as mês do reajustamento sobre este salário real médio , deveria incidir a taxa de produtividade, acrescentando a metade da inflação programada pelo governo para o ano seguinte (resíduo inflacionário) criação da data base de reajuste salarial Como a previsão do resíduo inflacionário , ou seja, da inflação para o ano seguinte, que entrava na fórmula de reajuste salarial, era a previsão oficial que era inferior à inflação efetiva ocorrida, o salário mínimo real médio era reduzido. Em junho de 68 a fórmula de reajuste foi alterada da seguinte maneira: se o resíduo inflacionário tivesse sido subestimado nos últimos 12 meses, o salário real deste período seria computado não pelo seu nível efetivo mas pelo que teria prevalecido se o resíduo inflacionário tivesse sido corretamente estimado, ou seja, o salário médio real ficava menos defasado com relação a alta de preços. A lei de 1974 finaliza a queda do salário real médio. O índice de salário mínimo real médio sofreu uma queda de sete pontos percentuais em 65 quando foi introduzida a fórmula de reajuste salarial, e em 66 foi novamente reduzida em sete pontos. Nos próximos anos, os índices continuam a cair com um ritmo menor. EFICÁCIA DAS POLÍTICAS MONETÁRIA E FISCAL Das políticas desinflacionárias do PAEG (contenção déficit público, política salarial e creditícia), a mais eficaz quanto aos objetivos do plano foi a política de contenção do déficit público. Aumentaram-se os impostos diretos e indiretos e o déficit como proporção do PIB foi reduzido gradativamente . O financiamento do déficit foi alterado a partir de 1964, passando de emissões de moeda (empréstimos junto ao BACEN) para o financiamento através de vendas de títulos da dívida pública, pois a criação da ORTN e correção monetária tornam os títulos públicos atrativos (empréstimos junto ao público) . Quanto às políticas monetária e de crédito, não foram atingidas as metas . A expansão monetária de 64 e 65 chegou a 83,5% sendo que a meta era de 30% . A causa da expansão dos meios de pagamentos está relacionada com a incapacidade da política monetária de contrabalançar o superávit do balanço de pagamentos. Este superávit externo deve-se ao ingresso de empréstimos estrangeiros, redução das importações, (devido à queda do crescimento) e aumento das exportações. Em 1966 a política monetária foi restritiva e a expansão dos meios de pagamentos foi apenas de 35,4% no período. A inibição do crédito foi menor que o aperto monetário pela ação do Banco do Brasil. Os empréstimos totais ao setor privado caíram e os empréstimos do Banco do Brasil ao setor privado expandiram-se. IMPACTO DAS POLÍTICAS MONETÁRIA, CREDITÍCIA E FISCAL SOBRE PRODUÇÃO E PREÇOS Durante todo o ano de 1964 o nível de preços permaneceu elevado. Este fato ocorreu devido ao aumento das tarifas dos serviços públicos; liberação dos aluguéis congelados; elevação dos salários dos servidores públicos; foi a chamada inflação corretiva. Cronologia: o aperto da moeda e do crédito em 63 paralisa a atividade industrial, enquanto os preços se aceleram. A política monetária foi mais folgada em 64 do que no ano anterior, mas os índices de liquidez continuaram negativos. Este alívio relativo da liquidez permitiu pequeno alívio na produção industrial. Em 1965 houve uma queda na tendência inflacionária sendo que os produtos agrícolas apresentaram queda no 1º trimestre e os preços industriais no 2º trimestre. Neste ano a política fiscal restritiva associada a um aperto de crédito faz com que a atividade industrial entre em colapso. Em contrapartida a agricultura tem um excelente ano e cresce 13,8% neste período. Com a política salarial do PAEG , os preços industriais apresentam os primeiros sinais de quebra de tendência. 29 O ano de 1966 apresenta um crescimento industrial devido ao crédito fácil do ano anterior e à capacidade ociosa acumulada em três anos de estagnação. A agricultura tem um mau desempenho sofrendo uma queda na produção de 3,2%. A política salarial volta a reduzir o salário e a inflação diminui. Outro fator do desempenho da indústria neste ano , foi a alteração da política monetária e creditícia. Apesar da redução de emissão monetária (devido a mudança do financiamento do déficit público), a ação do Banco do Brasil , expandindo os seus empréstimos, evitou que a política monetária restritiva atingisse o crédito ao setor privado. Em 1967 Delfim Netto substitui Campos no comando da economia e se afasta da ortodoxia e abandona o objetivo de acabar com a inflação. A partir daí a moeda e o crédito são expandidos de forma liberal, proporcionando uma recuperação da produção industrial. A agricultura recupera-se obtendo um crescimento de 5,7% ao ano. A política salarial continua reduzindo o salário e a inflação no período apresenta um queda. O ano seguinte, 1968, marca o fim da fase de estabilização. Moeda e crédito continuam se expandindo e a inflação sofre mais um pequeno declínio. CUSTOS DA ESTABILIZAÇÃO No período do PAEG, criou-se um hiato entre o produto observado e o produto potencial. O caráter regressivo das políticas do plano fica evidenciado pelo número de concordatas e falências por ramo de atividade do período. Os setores mais atingidos foram vestuário, alimentos e construção civil. Os dois primeiros são setores de estruturas menos oligopolizadas, onde predominam pequenas e médias empresas. A indústria de construção civil foi vítima da política fiscal que reduziu as despesas com obras públicas. Como o setor de construção civil emprega grande parte de mão de obra não qualificada, pode-se perceber o caráter regressivo do PAEG. O PAEG E A TEORIA ORTODOXA A teoria ortodoxa relaciona a causa de inflação com a excessiva expansão monetária, devido ao financiamento do déficit público (o tesouro nacional vende títulos ao BACEN transferindo a este o direito de emitir moeda). A ortodoxia aponta políticas monetária e creditícia restritivas para enxugar o excesso de moeda no mercado. Também seria necessário política fiscal restritiva , que reduz o déficit público e reformula a estrutura de gastos do governo considerada ineficiente e causadores de distorções da economia. Quanto ao balanço de pagamentos, sugere o câmbio “realista” (flexível, pois a intervenção do governo mantinha a taxa de câmbio sobrevalorizada prejudicando exportações) e redução da proteção tarifária à indústria ineficiente. A ortodoxia acredita que o mercado de trabalho é o último a se ajustar às políticas restritivas mencionadas acima. Isto acontece por causa do poder de mercado dos sindicatos e da rigidez das expectativas que mantêm os salários reais acima do nível compatível com o equilíbrio não inflacionário. PAEG não foi, de certa forma, ortodoxo, pois se preocupou com a manutenção das taxas de crescimento e, portanto, com alguma inflação, combatida gradualmente. O diagnóstico da inflação aponta para a incompatibilidade entre as parcelas reivindicadas pelo governo, pelas empresas para investimento e pelos trabalhadores para consumo como causa da inflação (a expansão monetária seria um agente de propagação da inflação dado esta inconsistência da esfera distributiva na economia). O reconhecimento de que existem pressões reais na economia que são inflacionárias que podem ser resolvidas pela contenção da taxa de expansão dos meios de pagamentos fica explícito na política creditícia do plano. A política econômica do PAEG não se restringiu às soluções dadas pela ortodoxia. Procurou-se ativar a bolsa de valores e foram criados bancos de investimento para se estimular a poupança privada. Criou-se o Banco Nacional de Habitação sendo um agente de captação da poupança privada forçada. Em um primeiro momento, esses fundos foram utilizados para absorver os títulos da dívida pública, financiando o déficit público. A instituição da correção monetária (um mecanismo de indexação) permitiu a captação da poupança privada voluntária e a reativação do sistema financeiro. Outra área de ação da política econômica foi o setor externo. Criaram-se e reformularam-se instituições públicas ligadas ao comércio exterior; instituíram-se estímulos fiscais às exportações que culminaram com a indexação da taxa de câmbio (em 68) com o nome de mini desvalorização, na tentativa de manter a paridade do poder de compra entre a moeda doméstica e o dólar. O principal ponto de combate a inflação no PAEG foi a política salarial compatível com a teoria ortodoxa. O processo desinflacionário do PAEG substituiu a negociação salarial por uma fórmula oficial de reajuste, ou seja, usou o poder de repressão sobre a sociedade e principalmente sobre os sindicatos, para se chegar ao objetivo da ortodoxia: solucionar o impasse distributivo através da redução da parcela salarial. Neste ponto o plano de estabilização de 1964 se afasta um pouco da ortodoxia, pois o estado intervém diretamente sobre o impasse distributivo. A ortodoxia utiliza da restrição de liquidez, deixando ao mercado o encargo de selecionar os mais fracos. As políticas monetárias e fiscais restritivas, na realidade, são regressivas, ou seja, seus custos recaem sobre os desempregados e sobre as pequenas e médias empresas incapazes de ter acesso ao crédito racionado. A possibilidade de obter empréstimos externos em moeda estrangeira, deu às empresas estrangeiras e às grandes empresas estatais acesso a uma linha de crédito vedada às pequenas e médias empresas nacionais. 30 ÍNDICE CRONOLÓGICO 1964 – A forma de financiamento do déficit público é alterada (com o objetivo de conter a inflação), passando de emissão monetária para vendas de títulos da dívida pública junto ao público. 1965 – Foi implementada a fórmula de ajuste salarial do plano, sendo proposta da seguinte maneira: sobre o cálculo do salário mínimo real médio dos últimos 12 meses incidia o aumento da produtividade mais metade da inflação prevista para próximo ano. 1967 - Delfim Netto assume o Ministério do Planejamento e abandona o objetivo de conter a inflação, expandindo o crédito e melhorando a produção industrial. 1968 – Fim da fase de estabilização. Moeda e crédito se expandem e a inflação sofre um pequeno declínio. Política fiscal – restritiva com aumento de impostos diretos e indiretos e contenção de gastos. Política monetária – restritiva em 63, expansionista em 64 e 65; restritiva em 66 e expansionista a partir de 67. Política creditícia – restritiva até 66 (com exceção de 65) e expansionista a partir de 67. Política cambial – política de estímulos às exportações. Política de mini desvalorizações a partir de 68 para manter a paridade do poder de compra entre a moeda doméstica e o dólar. Política salarial – redução progressiva do salário mínimo real médio durante o plano, em decorrência da fórmula de ajuste salarial. 31 CAPÍTULO 10 - A RETOMADA 1973 DO CRESCIMENTO E AS DISTORÇÕES DO “MILAGRE”: 1967- Luiz Aranha Corrêa do Lago (Bernardo Lanza Queiroz) 1- Novo diagnóstico dos problemas brasileiros Em 1964 o governo havia identificado a inflação como problema básico da economia brasileira. a inflação era de demanda, sancionada pela excessiva expansão monetária. entre 1964-66 governo implanta medidas duras na área fiscal e monetária. Em 1967 a herança é uma grande recessão, mas as diversas mudanças ocorridas no período anterior tiveram impacto positivo em diversas áreas da economia. O novo governo que assumia tem como objetivos: o crescimento econômico, redução do papel do setor público e incentivo ao papel do setor privado e expansão do comércio exterior. A inflação de demanda já parecia controlada, dessa forma governo centraria suas ações na inflação de custos. As diretrizes da política econômica eram: i) crescimento econômico e ii) contenção da inflação. Projeto em duas etapas: 1) utilizar a capacidade instalada existente e 2) expandir a quantidade e melhorar a qualidade da capacidade produtiva. Concentração do investimento público em: infra-estrutura, siderurgia, mineração, habitação, saúde, educação e agricultura. Em resumo, a política econômica do governo era: i) maior estímulo a demanda (política monetária, creditícia e fiscal mais flexível); ii) incentivo ao sistema financeiro da habitação; iii) política de incentivo as exportações e entrada de investimentos diretos estrangeiros; iv) programa de incentivos e subsídios para promover regiões e setores; v) BNDE como financiador dos investimentos; vi) manutenção da política salarial anterior. 3- Crescimento econômico, Formação de Capital e Inflação Expansão da Economia crescimento acelerado do PIB: taxa média anual de 11,2% crescimento industrial mais significativo (cerca de 14% ao ano); setor primário cresceu cerca de 4,5% ao ano e o terciário cerca de 11,1% ao ano. Governo adotou políticas especificas para favorecer a evolução dos diversos setores. Agricultura: crédito a taxas subsidiadas e acelerado processo de mecanização. Indústria: começa crescimento com base na capacidade ociosa existente, incremento de investimentos públicos e privados, aquecimento da demanda interna. Construção Civil: obras de infra-estrutura do governo, demanda do setor habitacional. investimentos do governo em infra-estrutura contribuíram para a consolidação do setor de bens de capital. aceleração da produção de bens de consumo (principalmente duráveis) devido a: i) processo de concentração da renda pessoal; ii) forte expansão do crédito ao consumidor (financiamentos, controle dos juros e consórcios) aproveitando-se da reforma do sistema financeiro de 1996 há uma grande expansão do sistema no período. Evolução da taxa de investimento, política industrial e papel da estatais Entre 1968-70 a Formação Bruta de Capital chega a 18,9% do PIB, entre 71 e 73 atinge 20,5%. Processo de formação do capital influenciada pela política industrial iniciada em 1964. Em resumo, concessão indiscriminada de incentivos. CDI, BNDE e FINAME: papel importante na recuperação da demanda interna e no crescimento do setor de bens de capital. crescimento da participação das empresas privadas e familiares e empresas públicas. importância da política de investimentos do governo como fator impulsionador do crescimento global da economia e em particular para a indústria de bens de capital. investimentos estatais crescem 20% ao ano entre 1967-73. papel pró-cíclico das empresas públicas. Trajetória da inflação e a política de controle de preços ganhos no combate à inflação deixaram de ser tão expressivos. governo admitia um certo nível de inflação. Entretanto, governo controlava todos os reajustes de preços. Estes eram baseados na variação dos custos. 32 aceleração da inflação associado ao nível de atividade da economia e com as políticas expansionistas do governo. 4- Política Monetária e Creditícia e Desenvolvimento do sistema financeiro Expansão dos meios de pagamento e da base monetária e diversificação dos haveres financeiros A partir de 1967 ocorreu uma significativa expansão da oferta de moeda e crédito. em termos reais, os aumentos reais de oferta de moeda e de crescimento médio real dos meios de pagamentos se mantiveram em linha com o crescimento do PIB real. Principais fatores de expansão e contração da oferta monetária: i) 1967: relaxamento da política fiscal, necessidade de financiar o déficit da União, aumento do redesconto e outros empréstimos. ii) 1968: repete-se a pressão do financiamento do déficit de caixa pelas autoridades monetárias e a expansão foi de 40% e iii) 1969 e anos seguintes: déficit de caixa passa a ser financiado integralmente pela colocação de títulos junto ao público, que se tornaria fator permanente de contração dos meios de pagamento e o aumento das reservas cambiais que tem efeitos expansionistas. entre 1967-73 há um processo de substituição dos depósitos a vista por haveres não-monetários. Aumento da participação de títulos da dívida pública. Além disso, a existência de correção monetária e de investimentos financeiros pós-fixados embutindo uma expectativa de inflação levaram a uma mudança no comportamento dos poupadores no sentido do redirecionamento de suas aplicações. Política Monetária Em 1964 o redesconto passa a ser regulamentado pela CMN e BACEN. assim tornou-se possível ao BACEN contar com um instrumento que permitia injetar recursos no sistema bancário e influenciar a taxa de juros. até 1973 a política de redesconto foi flexível. Entre 1967-73 a política de redesconto passa a ter como objetivo o controle quantitativo do crédito. além disso, assume grande importância a política de mercado aberto. ORTNs: visava substituir a emissão de moeda no financiamento do setor público. e assim, regularizar a liquidez da economia. Política de Juros e o processo de concentração bancária Em 1967, o governo acreditava que os custos financeiros eram muito elevados e que as taxas de juros eram elemento de custo das empresas e precisavam ser reduzidos. A política de juros da nova administração era: i) controle direto das taxas de juros; ii) incentivos aos bancos comerciais para redução das taxas de juros; iii) eliminação das deficiências do setor bancário e iv) aproveitamento das escalas (concentração e obstáculos a abertura desordenada de agências). governo claramente não permite a formação das taxas de juros pelo livre jogo do mercado. taxas de juros para setores prioritários fixadas em valores nominais. governo foi fixando tetos mais baixos de juros para segurar uma possível tendência de crescimento dos juros reais. durante todo o período 1967-73 não foi permitida a fixação de taxas de mercado para captação e aplicação. nova administração via com bons olhos a redução do número de bancos e a consolidação do sistema de bancos comerciais. Diretriz do Governo de 1967: listava medidas favoráveis a fusão e incorporações bancárias; vantagens fiscais para tais processos; benefícios para a formação de conglomerados financeiros. Entre 66 e 73, 190 bancos foram absorvidos por outros. processo de concentração bancária parece ter decorrido das medidas de política econômica adotadas, inclusive a política de teto de juros e às restrições a entrada de bancos estrangeiros e outros no mercado. resultado foi uma concentração expressiva da captação e das aplicações em um número reduzido de conglomerados financeiros. As principais fontes de oferta de crédito e a política creditícia do governo i) conter as necessidades de financiamento do setor público e ii) assegurar a oferta de crédito adequada ao setor privado oferta de crédito total expandia-se rapidamente após 1967 empréstimos do sistema monetário cresceram a taxa média de 23,5% ao ano entre 67-73. a participação do sistema monetário no fornecimento de crédito foi se reduzindo devido a importância concedida pelo governo ao crédito consumidor e a área de habitação e a criação dos bancos de investimento (aumento da participação do sistema não-monetários) 33 dessa forma, o controle do crédito não podia se limitar via base monetária ou política de redesconto. nova organização do sistema financeiro não alcançou resultados almejados, créditos de longo prazo permaneceram sendo fornecidos por agências públicas e bancos oficiais. crédito de curto e médio prazos supridos por bancos comerciais e o Banco do Brasil Entre 67-73 o governo durante alguns anos dosou a taxa de expansão monetária mas garantiu uma elevada taxa de expansão do crédito total. O setor agropecuário mereceu atenção especial do governo via política de juros subsidiados. Este era um dos componentes do déficit do governo. Apesar disso, o crédito rural cresceu a taxas reais inferiores as taxas de expansão do crédito total do sistema financeiro. o crédito se expandiu a taxa muito superior a dos meios de pagamentos e da base monetária. Mercado acionário como fonte alternativa de financiamento Decreto Lei-157: criou fundos fiscais de investimentos com propósito de financiar capital de giro de Cias. Abertas, desenvolver o mercado de capitais e educar o investidor individual. mecanismo iria canalizar volumosos recursos para a bolsa de valores e seria reforçado pelo crescimento econômico. 5- Política fiscal, os estados e municípios, a política regional, as estatais e o papel do governo na economia Governo beneficiou-se das reformas tributária e administrativa implementadas pelo governo anterior e tenta aumentar a eficiência da máquina administrativa. Em 1972, governo cria mais um imposto: IOF (Imposto sobre Operações Financeiras). No período há uma redução da despesa com pessoal a nível federal: de 32% em 63-64 para 18% em 71. Apesar disto, grande parte da receita do governo era vinculada. Pr exemplo, os Fundos de Participação de Estados e Municípios. A renúncia fiscal (perda de arrecadação) era elevada devido aos incentivos dados pelo governo para promover o crescimento econômico de regiões e/ou setores. Até 1968, o déficit do governo era financiado pelas autoridades monetárias, ou seja, emissão de moeda. A partir de 1969, passa a ser amplamente coberto pela colocação líquida de títulos da dívida pública federal (ORTNs e LTNs), o que permitiu realizar uma política monetária mais eficaz. A redução do déficit do tesouro e a geração de um superávit do governo em 1973, refletem, sem dúvida, um saneamento das contas do governo, consolidando os esforços empreendidos de 1964 a 1966. Havia existência de poupança em conta-corrente do governo suficiente para financiar o investimento da administração pública. A carga tributária apresentou tendência ascendente no período, sobe de 22,4% do PIB entre 6569 para 24,7% em 1970-73 (carga bruta). Entretanto, há uma forte política de incentivos, os subsídios sobem de 7,1% nos anos 60 para 8,1% nos 70, resultando uma carga líquida de 16,8% entre 65-69 e uma de 17,2% entre 70-73. Por outro lado, dados do IBGE, mais recentes, mostram uma carga tributária bruta de cerca de 26% do PIB entre70 e 73, com a carga líquida oscilando de 16,8% a 17,2% do PIB no período. Entre 70-73, observou-se uma redução das despesas correntes do governo, com queda na participação de salários e encargos de 8,3% em 1970 para 7,4% em 1973. Em resumo, o período 1967-73 pode ser caracterizado como: i) Aumentou a arrecadação líquida do governo; b) diminuição de importantes contas do lado da despesa e iii) geração de poupança em conta corrente suficiente para financiar investimentos. Finanças Estaduais e Municipais Sub-esferas do governo estavam subordinadas a orientação do governo federal. Carta de 1967: permite a intervenção da área federal em assuntos financeiros dos estados e municípios Foi delegada ao BACEN a responsabilidade e controle sobre a emissão de papéis estaduais. Em 1968, com o AI-5 foi reduzida a parcela do Fundo de Participação dos Estados e Municípios. A característica básica do período 67-73 foi a centralização das decisões de alocação de recursos no governo federal. Assim, depois de 1968 observou-se uma redução do desequilíbrio existente nas contas do Estado e do Distrito Federal. O aperfeiçoamento do ICM representou importante fonte de recursos para os estados. a política regional do período não foi baseada no livre-jogo do mercado: mas o governo entrava regulando e consertando as falhas das empresas privadas. 34 Havia uma política nacional de desenvolvimento integrado executada por órgãos de presença nacional como o BNDE, DNER, Embratel, SUDEPE e órgãos de presença regional como a SUDENE. A ênfase do governo era: i) obras públicas e oferta de recursos para investimentos e ii) direcionamento dos investimentos privados diretos. Um dos objetivos da política regional do governo era o desenvolvimento do Nordeste através de incentivos fiscais e obras de infra-estrutura. Além disso, planejou-se a abertura da Amazônia que terminou revelando-se um fracasso. Crescimento das Estatais e descentralização governo central permitiu a proliferação de empresas estatais federais e estaduais entre 67-73. As causas desta proliferação foram: i) decreto-lei número 200 de 1967: dava oportunidade para criação de diversas subsidiárias de empresas estatais existentes. ii) criação de holdings setoriais para centralizar a coordenação e administração das empresas. iii) administração das empresas teria se tornado mais eficiente, gerando excedentes para a expansão natural das empresas. iv) empresas estatais centraram sua atuação no desenvolvimento de áreas onde a iniciativa privada não se arriscava ou não tinha condições de operar. Apesar deste crescimento do papel do setor público o emprego nele crescia menos do que a média de crescimento do emprego nacional. As fontes de financiamento das empresas públicas eram: i) significativos recursos internos, grau de autofinanciamento era de 45%; ii) receitas vinculadas do tesouro eram de 12,3%. iii) subscrição de ações: 1,8% do total. iv) 25,2 % de empréstimos sendo 8,3% do BNDE e 16,9% de fontes externas aproveitando a alta liquidez internacional. Participação do Estado na Economia emprega 8,5% da PEA em 1973. representa metade (50%) dos investimentos totais. intervenção na economia via políticas monetária, fiscal e creditícia. estado-empresário: supri insumos e serviços básicos a economia. o setor público tem participação de 20% na atividade econômica. elevação da carga tributária: melhoria da eficiência administrativa, aproveitou-se das reformas realizadas no período anterior e beneficiada pelo acelerado crescimento econômico. forte centralismo da economia. supria crédito e demandava bens: influi ativamente na economia. 6- Setor Externo na Economia importantes mudanças no setor externo, associada a medidas de política econômica (cambial e incentivos as exportações). Entre 1967 e 1973 observou-se: a) aumento das exportações, b) diversificação da pauta de exportação com incremento de manufaturados, c) aumento da importação de bens de capital, d) maior diversificação de parceiros comerciais. Os objetivos da área externa eram: i) aumento da competitividade; ii) maior diversificação da pauta; iii) ampliação dos mercados externos e iv) manter suprimento adequado de matérias-primas para garantir crescimento da economia. A política de exportações era baseada em: i) medidas fiscais e creditícias diretas; ii) política cambial mais flexível; iii) medidas indiretas (desburocratização e melhoria de infra-estrutura de comunicação e transportes) há uma política de incentivo para atração de investimentos diretos estrangeiros visando aumento da capacidade produtiva. Dentre estas pode-se destacar: i) isenção de Imp. Importação e IPI até 1/3 do valor líquido exportado; ii) não sujeição a lei do similar nacional; iii) possibilidade de transferência de benefícios fiscais; iv) permissão para transferência de créditos fiscais e v) abatimento do lucro tributável. no período as exportações (FOB) crescem 24,6% ao ano. A balança comercial apresentou os seguintes resultados: foi positiva entre 1967-70; negativa entre 71 e 72 e voltou a se equilibrar em 1973. mesmo com todas estas medidas, o coeficiente de abertura da economia brasileira continuou baixo em termos mundiais. Endividamento externo e acumulação de reservas aumento da dívida externa bruta entre 67-73 a taxa anual de 19,3% ao ano. aumento da dívida líquida de 9,6% ao ano => resulta numa expressiva acumulação de reservas. 35 aumento da participação de empréstimos privados externos em detrimento aos órgãos oficiais. (atinge cerca de 64% em 1973) Aumento dos investimentos estrangeiros dirigido basicamente ao setor industrial saltam de US$ 57 milhões entre 64-66 para US$ 267 milhões entre 67-73 (na média) distribuição do investimento direto estrangeiro: 77% na indústria de transformação; 4,2% nos serviços industriais; 1,7% no setor mineral; 3,5% em bancos e cia. De investimento e 0,7% na agropecuária. mais importante: grande taxa de reinvestimento => aumento da capacidade produtiva e realizar aquisições. os investimentos estrangeiros tem papel relevante na expansão da exportação de manufaturas e nos desenvolvimento de novas atividades. Fatores de relevância para ampliação dos Investimentos Estrangeiros: i) nova política cambial (governo adota as mini-desvalorizações); ii) política de incentivo às exportações; iii) retomada do crescimento econômico; iv) programas conhecidos de investimentos públicos e política industrial favorável e v) maior estabilidade política do país. 7- Política Salarial, distribuição de renda e emprego herdou política salarial restritiva do governo anterior. redução do campo de negociações salariais. redução do poder de barganha dos trabalhadores. legislação trabalhista restritiva. entre 67-73 há uma estagnação do salário mínimo real apesar do forte crescimento da economia e da produtividade do trabalho. Distribuição da renda e nível do emprego Distribuição Setorial da Renda: queda da participação da agropecuária; forte incremento da indústria. concentração da renda nas classes mais altas: 5% dos ricos concentravam 34,1% da renda nacional, enquanto 50% mais pobres 17,4% da renda. entre 60 e 70 há uma grande deterioração da distribuição da renda: GINI salta de 0,497 em 1960 para 0,562 em 1970. por outro lado, devido ao crescimento da atividade econômica houve uma crescimento significativo do pessoal ocupado. 8- Considerações Finais objetivo básico do governo Costa e Silva foi o desenvolvimento econômico e social e a contenção da inflação. o PIB cresceu a uma taxa média de 10,2% ao ano entre 1967 e 1973 o produto per capita cresceu a taxa média de 7,2% ao ano. dados da PNAD de 1968 a 1973 indicam um crescimento das pessoas ocupadas à média de 4,3% ao ano. todas as metas estabelecidas pelo governo foram alcançadas. a inflação permaneceu boa parte do período contida, mas em 1973 já apresentava sinais de aceleração. Balanço de Pagamentos: ampliação das importações de bens de capital e matérias-primas industriais de 7 a 9% ao ano. as exportações cresceram a taxa elevada mas não impediu o aumento do endividamento bem além das necessidades reais do país em termos de reservas reais. inflação e dívida externa: problemas potencialmente crescentes. característica da política econômica: extremamente autoritária. Governo federal reduziu Fundo de Participação, controlava emissão de títulos estaduais e controlava as relações trabalhistas. os trabalhadores não se beneficiaram do crescimento da renda real do país de forma proporcional a sua evolução. 36 CAPÍTULO 11 - CRISE E ESPERANÇA: 1974-1980 Dionísio Dias Carneiro (Gustavo de Britto Rocha) 1. Introdução O ano de 1973 foi um ano de muitos acontecimentos importantes no cenário internacional. A economia mundial vinha apresentando altas taxas de crescimento (em torno de 7%) e as pressões sobre a demanda, fruto dos grandes gastos dos EUA com a guerra do Vietnã era acompanhada por pressões por aumentos salariais e à desvalorização do dólar em 1971. Havia grande disponibilidade de divisas para empréstimos, especialmente devido ao aumento dos mecanismos financeiros e à formação do Euromarket. Nos países desenvolvidos os efeitos da instabilidade do dólar e da escalada da inflação se faziam sentir. As economias emergentes, onde a integração com o comércio internacional havia se acentuado fortemente desde 1966, observava-se em geral altas taxas de crescimento do produto e da indústria. Em um clima de crescimento generalizado, a inflação crescente era vista como sendo fruto da defesa das taxas de câmbio fixas e como sendo o preço a pagar pelas altas taxas de crescimento. Contudo, os fatos mais marcantes desse ano podem ser considerados o fracasso da reforma do sistema monetário internacional e o primeiro choque do petróleo, em que, frente ao aumento da demanda, os países da OPEP quadruplicaram seus preços, causando a transferência de 2% da renda mundial para si. Na economia brasileira, a crise internacional não parecia causar espanto sobre os formuladores da política econômica, e a economia crescia a taxas duas vezes maiores a sua média histórica. A crise do petróleo atingiu a economia brasileira em meio a uma sucessão presidencial, com um novo governo que representava uma corrente contrária ao governo que saía. As sérias limitações externas impostas à economia brasileira encerraram o período do milagre, que foi acompanhado por inquietações sociais contra a ditadura. 2. Condicionantes Externos e Internos da Política Econômica Os grandes desequilíbrios internos e externos que marcaram o período se refletiram de maneira marcante na orientação da política econômica do governo Geisel. Frente à sua proposta de distensão (abertura) política, a dualidade da política econômica já pode ser verificada na composição do novo Ministério. Na fazenda Delfin Netto deu lugar a Simonsen, que mostrou desde o início, a preocupação de ajustar a economia à crise e combater a inflação. No Planejamento assumiu João Paulo Velloso, com a preocupação de retomar as taxas de crescimento do período anterior. A política econômica adotada sugeria que as autoridades não deram a atenção merecida à crise internacional, e a economia sofreu uma forte desaceleração em 1974. Contudo não se pode atribuir os rumos da política apenas aos erros de avaliação da equipe econômica, sendo que os condicionantes dessa podem ser atribuídos em um maior grau a fatores internos. A distensão política tinha uma fraca base de sustentação militar nos primeiros anos, e poderia se enfraquecer ainda mais se o desempenho da economia apresentasse um grande contraste com o governo Médici. Dessa forma a implementação de um plano de ajuste econômico com características recessivas logo no início do governo não teria apoio do Presidente, mesmo que essa fosse a opinião da equipe econômica. Dessa forma, o discurso contracionista de Simonsen parece Ter origem muito mais no descontrole monetário legado pelo governo anterior do que propriamente na constatação da necessidade de uma desaceleração da economia frente aos desequilíbrios do BP (Balaço de Pagamentos). Essa posição dual imposta pelas condições internas encontraram apoio no fato de que a abundância de liquidez internacional permitia o financiamento dos déficits em conta corrente via endividamento. Juntamente com a existência de diversos mecanismos de indexação, essa facilidade de financiamento provocou uma certa tolerância à inflação, conduzindo a política econômica ao caminho “menos doloroso”. 3. Opções para o Ajuste de Curto Prazo e as causas do Fracasso Parece haver consenso em torno da afirmação de que a dimensão do choque do petróleo não foi percebida de imediato no Brasil, o que implicou em uma desvalorização das exportações brasileiras frente às importações, de maneira que uma quantidade maior de exportações teria que ser feita para importar a mesma quantidade de produtos. Diante disso, o governo possuía duas alternativas para fazer frente ao desequilíbrio de preços relativos. A primeira consistia em uma desvalorização imediata do câmbio, alterando rapidamente os preços relativos, adotando paralelamente medidas de contenção da demanda, impedindo que o superaquecimento proveniente do período do milagre se traduzisse em um choque inflacionário. Essa alternativa implicaria inevitavelmente em uma 37 recessão, com o risco dessa se prolongar além do necessário. A Segunda opção seria optar por um ajuste de preços relativos mais gradual, utilizando a abundância de recursos externos para financiar os déficits. Dessa forma o governo ganharia tempo para ajustar a oferta ao crescimento mais rápido. Nesse caso, a opção por não incorrer em recessão implica em se aceitar taxas de inflação mais elevadas. Os erros de avaliação da crise e a visão “curtoprazista” da economia conduziram à segunda alternativa, causando sérias implicações de médio e longo prazo sobre a economia brasileira A política de curto prazo do governo Geisel foi marcada por quatro decisões importantes. A primeira foi a remoção dos mecanismos artificiais de controle de preços herdados do governo Médici, o que provocou um descontrole inflacionário. Após um período inicial de “inflação corretiva”, o governo reformulou os mecanismos de controle de preços agrícolas e industriais. A Segunda medida foi a oficialização de uma fórmula para a correção monetária, visando proporcionar maior clareza às regras de indexação. A política monetária foi ficou restrita ao controle de liquidez real, uma vez que o governo descartou o uso dos preços relativos. Com as taxas de juros sob controle a oferta monetária se torna essencialmente endógena, sendo determinada pelas reservas internacionais e pelos empréstimos do BACEN. A visão simplista do governo acerca da política monetária fica aí explicitada, uma vez que esse se restringiu ao controle da liquidez. Esse fato fica ainda mais evidente na terceira medida tomada pelo governo, que foi a intervenção no banco Halles, o quarto maior banco comercial brasileiro. A crise bancária desencadeada por essa intervenção fez com que o Banco Central aumentasse o financiamento aos bancos através do redesconto, com o intuito de minimizar os efeitos da crise. Como resultado, no ano de 1974 houve expansão da base monetária, mesmo com a perda de reservas provocada pelo desequilíbrio na BC (Balança Comercial). Apesar do governo ter conseguido diminuir a liquidez real da economia há dúvidas a respeito do grau de aperto da política monetária nesse ano. Para agravar o descontrole inflacionário, soma-se às medidas anteriores o fato de o governo ter reavaliado a política de reajuste do salário mínimo, pressionado pelas críticas a respeito do caráter de arrocho da antiga correção, que teria piorado a distribuição de renda. Dessa forma o governo adiciona à formula anterior de recomposição salarial com base nos 12 meses anteriores um mecanismo de correção caso a inflação tenha sido subestimada. Na política creditícia o BACEN e o BB (Baco do Brasil) se transformaram em banco de fomento, expandindo o crédito a vários programas, fato que atuava em direção oposta tentativa de estabilizar a economia. Como conseqüência, o ritmo do crescimento caiu, reflexo da queda da atividade econômica. Esse desaquecimento se somou à crescente crise financeira , o que forçava o governo a tomar uma decisão quanto ao rumo da política econômica: estabilizar a economia ou priorizar o crescimento. A decisão do governo em direção ao crescimento veio com o resultado das eleições parlamentares, que teve como resultado a vitória da oposição (MDB), que intensificou seus protestos contra o governo. A derrota do governo se refletiu imediatamente sobre a política de contenção da demanda no ano de 1975, que foi relaxada, assim como a monetária, ficando apenas a política fiscal com características verdadeiramente restritivas. No ano de 1975, três fatos marcaram a economia. O primeiro consistiu no agravamento da crise financeira, o que mostrava a incapacidade do governo em reduzir a inflação e o caráter duvidoso da política monetária, mesmo com a liquidez real em queda. Logo no início do ano, houve uma perda de US$ 500 mi, o que significava uma contração monetária, que poderia intensificar a recessão. Em contrapartida, o governo adota um mecanismo compensatório que prevê, em caso dos meios de pagamento caírem a baio do nível previsto, a adoção de redesconto invertido, com o governo emprestando fundos aos bancos comerciais. Várias instituições financeiras adotaram mecanismos de especulação com letras de câmbio e certificados de depósitos, vendendo-os com uma carta de garantia de recompra no futuro. A redução da taxa de correção monetária que se seguiu provocou a instabilização de várias instituições, forçando o governo a socorrê-las com emissão monetária. Se havia dúvidas quanto ao contracionismo monetário em 74, havia certeza de expansão em 75. O segundo fato marcante foi a ocorrência, paralelamente ao desajuste interno, do desequilíbrio nas contas externas forçando o aumento da dívida externa bruta de US$ 12mi para US$ 21mi nos primeiros dois anos do governo Geisel. O terceiro fato foi a aprovação do II PND, que consolidou a posição do governo pela tentativa de um ajuste estrutural com o objetivo de retomada do crescimento, utilizando financiamento externo e com alguma tolerância às taxas elevadas de inflação, configurando a dominância da SEPLAN sobre o Ministério da Fazenda. O descontrole observado no ano de 1975 faz com que, já no início de 1976 o governo buscasse de maneira mais efetiva o controle monetário. Para isso o governo atuou explicitamente no sentido de conter os empréstimos do BB, o que permitiu uma mudança efetiva na orientação da política monetária. Apesar da economia ter se recuperado (crescimento de 9,8% em 76 contra 4,6% em 75), a possibilidade de recessão ainda impedia a adoção de medidas efetivas de controle da demanda. Em 1977 o governo promove uma política monetária mais restritiva, com desaceleração dos meios de pagamento e empréstimos, além da instituição de uma taxa de juros real positiva (o que não ocorria desde 71). Contudo, à medida que se aproximava o final do mandato de Geisel, a oposição interna aumentava, diminuindo o espaço político da tentativa de redução inflacionária. Em 1978, se consolida a candidatura do general Figueiredo, e o governo passa a priorizar a acumulação de reservas e a continuidade da distensão política. Contudo as contas públicas voltam a piorar no final do ano com quebra da safra, provocada pela forte seca que assolou o centro sul, que obrigou a importação de mais de US$ 1 bi em alimentos. 38 Em 1979, assume a presidência o general Figueiredo, e Simonsen é deslocado para a SEPLAN, assumindo Karlos Riscbiter no Ministério da Fazenda. A prioridade da SEPLAN passou a ser o controle fiscal, através do corte de investimentos públicos, com vistas a melhorar o BP e reduzir o endividamento externo. Contudo no final do ano os conflitos de política voltaram a se evidenciar, no momento em que Delfin Netto, no Ministério da Fazenda, consegue aprovar a correção dos preços mínimos para a safra a uma taxa 30% superior à inflação. A política monetária restritiva dessa forma só dura té agosto. A partir desse mês até 1980, o governo decide novamente ignorar a crise externa, que se agrava com o segundo choque do petróleo. A política adotada se baseia no controle dos juros, indexação salarial, desvalorização cambial. Ao mesmo tempo o governo não consegue convencer os seus credores a financiar essa política heterodoxa, o que faz com que as reservas se esgotem rapidamente, o que se soma à explosão do consumo na deterioração do BP. 4. A Natureza do Ajuste de Longo Prazo: o Crescimento com Endividamento Crescimento com Dívida Entre 74 e 79 a dívida externa aumenta em US$ 20 bi e os juros de US$ 500 mi no governo Geisel, para 4,3 bi no primeiro ano do governo Figueiredo. O crescimento do endividamento se deve essencialmente à natureza do ajustamento de longo prazo, ou seja, às premissas do II PND. Seus formuladores partiram do pressuposto de que o país poderia sustentar taxas de crescimento de 10% a.a. entre 74-77. Assim, as bases do programa consistiam em: (i) dar ênfase às indústrias básicas (bens de K, e eletrônica pesada), substituindo importações; (ii) reforçar a política de energia, aumentando os investimentos em prospecção de petróleo, e aumento de 60% no fornecimento de energia elétrica. Foi feita a opção por não se utilizar a política cambial para redirecionar a demanda, dando preferência à utilização da política comercial para conter as importações. Essa opção reduziu efetivamente o coeficiente importado durante o período, reduzindo as importações como proporção do PIB de 12% em 74 para 7,25% em 78. Na tentativa de promover o crescimento à taxa de 10% o governo só consegue 7%, com as projeções de endividamento rapidamente extrapoladas, pois o relativo sucesso conseguido da BC não pode fazer frente ao crescimento rápido do déficit em CC (Conta Corrente). Na composição do produto, a indústria seguiu como setor líder, com destaque para as indústrias de transformação e construção. Política Industrial A base da política industrial do Governo Geisel foi a substituição de importações de bens de capital e insumos básicos para a indústria, além da promoção do aumento da produção de petróleo. Para isso o governo fez uso de vários instrumentos, como subsídios, crédito de IPI e depreciação acelerada de equipamentos nacionais e política de preços, que foram implementados pelo BNDE, Conselho de Política Aduaneira, CACEX e Conselho Interministerial de Preços. A tentativa de retorno à política de substituição de importações recebeu muitas críticas, especialmente no sentido de que o governo estaria superestimando o mercado interno para tais bens. Contudo a análise da eficácia dessa estratégia sugere que os objetivos gerais de reestruturação da oferta foram alcançados, mesmo que fora do cronograma. A substituição logrou êxito em internalizar os gastos as despesas com investimento, reduzindo a participação das importações de bens de K no total das despesas com máquinas e equipamentos de 25,6% em 72 para 9% em 82. Em parte o sucesso da política de substituição de importações nesse período se deve ao fato de que paralelamente a ela o governo manteve a política de promoção de exportações, que cresceram durante o período. Contudo a manutenção da política de estímulos fiscais, creditício e cambiais teve custos pesados sobre a deterioração financeira do Estado ao longo da década de 70, resultando na fadiga dos instrumentos de ação do governo sobre a economia na década de 80. 5. Resultados e Conseqüências No início do governo Figueiredo houve a tentativa de ajustar os programas de investimento do II PND com as restrições de refinanciamento da dívida externa, de forma que durante um curto período ocorreu um esforço positivo na contenção do déficit público. Ao longo do período Simonsen tentou convencer seus colegas de gabinete e o Presidente da República da ameaça inflacionária representada por esses gastos, contudo a estrutura de repressão a preços, de incentivos fiscais, utilização das estatais como instrumento de captação de empréstimos externos, subsídios não seria desmontada de forma fácil. Nesse quadro os conflitos políticos internos desempenharam um papel fundamental na opção por “dar prioridade ao crescimento”. A decisão de não utilização da política cambial significou a opção pela intervenção direta na economia (incentivos fiscais e creditícios) no processo de reorientação da oferta. Essa opção significou a deterioração mais rápida das receita públicas, sem a contrapartida de um aumento de arrecadação. 39 Nesse período, os erros de avaliação mais graves foram aqueles relacionados ao tempo de mudança de oferta, comportamento da taxa de juros e do comércio internacional. Ajustes maiores na economia frente a esses fatores, bem como a menor ênfase em programas desastrosos (como o nuclear) teriam permitido um maior equilíbrio nas contas públicas para o novo governo que assumiria. Outro problema no período foi a mudança no perfil da dívida externa, que é progressivamente estatizada, passando de 45% correspondente ao setor privado em 74, para 22% em 1980, o que implicaria, em meados da década de 80, na incapacidade de financiamento do setor público. A principal crítica a esse movimento ataca o fato de não ter ocorrido paralelamente um aumento da renda disponível do setor público. Pelo contrário, entre 73 e 83 a renda disponível cai de 16,8% para 8,67% do PIB. Fica claro o caráter precário da articulação da política econômica após o primeiro choque do petróleo. Essa falta de articulação deixou como legado para os anos 80 sérias dificuldades para o setor público, entre elas a necessidade de promover um aumento na arrecadação tributária que interrompesse o processo inadequado de financiamento. 40 ÍNDICE CRONOLÓGICO 1974-78 Presidente: General Ernesto Geisel Ministro do Planejamento: João Paulo Velloso Ministro da Fazenda: Mário Henrique Simonsen Casa Civil: General Golbery do Couto e Silva 1973 Preços do petróleo são quadruplicados pelos membros da OPEP 1974 Simonsen assume o Ministério da Fazenda, substituindo Delfin; Remoção dos controles de preços; Oficialização de uma fórmula de correção monetária; Mudança na fórmula de reajuste salarial, reduzindo as perdas em caso de subestimação da inflação; MDB vence as eleições parlamentares, aumentando a força da oposição BACEN intervém no quarto maior banco comercial 1975 - Aprovação do II PND 1976 Aprovação da Resolução 389 que liberou o controle das taxas de juros dos bancos comerciais 1978 O general Figueiredo se consolida como principal candidato à sucessão presidencial 1979-80 Presidente: General João Batista Figueiredo Ministro do Planejamento: : Mário Henrique Simonsen Ministério da Fazenda: Karlos Riscbiter Ministério da Agricultura: Delfin Netto 1979 - Segundo choque do petróleo e explosão da taxa de juros dos EUA Governo retoma uma política econômica mais heterodoxa Política Monetária 1974: Ao contrário do discurso da equipe econômica, foi expansionista devido à expansão dos créditos concedidos pelo Banco do Brasil 1975: Expansionista devido ao socorro do governo aos bancos comerciais 1976: Contracionista, marcando uma reversão da tendência desde o milagre 1977: Restritiva, com a fixação da taxa de juros básica positiva em termos reais, o que não acontecia desde 71 1978: expansionista, ignorando a crise mundial, Política Fiscal 1974: Política fiscal ainda expansionista, apesar da tentativa de contenção 1975: Levemente contracionista 1976: Levemente contracionista 1977: Contracionista 1978: expansionista, devido à importação de alimentos decorrente da seca 1979: expansionista, concessão de subsídios e incentivos fiscais Política Creditícia 1974: expansionista 1975: expansionista 1976: restritiva, devido à resolução 389 1977: restritiva 1978: restritiva 1979: expansionista 1980: expansionista 41 42 CAPÍTULO 12 – AJUSTE EXTERNO E DESEQUILÍBRIO INTERNO: 1980-1984 Dionísio Dias Carneiro e Eduardo Modiano (Maria Fernanda Diamante Basques) O Brasil sofreu um ajuste da oferta doméstica, afetada pelo forte aumento dos preços do petróleo e da elevação das taxas de juros internacionais no final da década de 70. Por isso, foi um processo longo e bastante custoso, iniciado em meados de 1980, quando também notava-se uma escassez de financiamento externo para enfrentar os desequilíbrios das contas externas. A comunidade internacional perdia cada vez mais a confiança nas políticas expansionistas brasileiras adotadas a partir de 1979, com a posse do ministro Delfim Netto, gerando ainda mais dificuldades na contratação de empréstimos externos. Como resultado, o déficit em CC (conta corrente) atingiu U$ 2,8 bilhões e as reservas cambiais caíram drasticamente. Assim, entre o final de 1980 e o ano de 1984, a política macroeconômica foi determinada pela possibilidade de financiamento externo ao país. Em 1980 cai a margem de manobra da política econômica do governo conseguida no ano anterior. São anunciados cortes nos gastos públicos. Em contraposição, no entanto, é lançado também o III PND, no qual uma das prioridades é a continuidade dos incentivos governamentais à substituição das importações de petróleo através de investimentos e às exportações em geral, além de dar prosseguimento aos programas de alternativas de energia e substituição de importações em insumos básicos. As tentativas de combate à inflação adotadas em 1979 se viram fracassadas. A confiança na economia, no curto prazo, se perde. O governo dá demonstrações de ortodoxia para acabar com a inflação, controlando a demanda através de política monetária tradicional e queda no crescimento do crédito. No entanto, encontrou a resistência de uma economia indexada. As preocupações com a dimensão da base monetária e o aumento da taxa de juros para impedir a tomada de empréstimos externos privados fez com que o financiamento do setor público atingisse volumosas emissões de títulos. O período caracteriza-se por uma complexa transição no início do governo Figueiredo e termina com explosão de desequilíbrios internos que coincidiu com o fim do governo militar. A política macroeconômica de 1981-82 direcionava-se para a redução da necessidade de divisas estrangeiras, através do controle da absorção interna. Estimulava-se a queda da demanda de modo que as exportações tornassem mais atraentes e as importações fossem reduzidas — o que, no entanto, depende do grau de recessão. Era preciso reorientar as despesas. Não eram possíveis substanciais desvalorizações reais na taxa de câmbio como estímulo às exportações pois o país ainda valia-se da frustrada experiência de desvalorização de 1979 e enfrentava a limitação da recessão mundial. Assim, a reorientação dependeria dos investimentos do governo e da disponibilidade de financiamento de agências governamentais, como o BNDE. A política restritiva de outubro de 1980 se deu através de contenção salarial, controle dos gastos do governo, aumento da arrecadação, da taxa de juros, contração da liquidez real e um tratamento especial a ser dado às exportações, energia, agricultura e pequenas empresas. Caem as correções cambial e monetária pré fixadas. As correções passam a ser pelo diferencial entre taxas de inflação interna e externa (cambial) e pelo INPC do IBGE (monetária). É modificada a política salarial, com perda maior para as faixas salariais mais altas. A política fiscal centrou-se no controle das despesas, através da limitação do crescimento nominal do investimento das estatais em 66%, centralização da administração dos recursos orçamentários e maior controle das diversas contas governamentais. Aumenta a tributação pela correção do imposto de renda em 55% (abaixo do nível da inflação), aumento do IOF para operações de câmbio para importações (de 15 para 25%) e criação de IOF (15%) para importações da Zona Franca de Manaus. Atuando ao contrário, foi restabelecido o incentivo fiscal do crédito-prêmio para exportação de manufaturados. Houve liberação de taxa de juros para empréstimos dos bancos comerciais (a exceção de crédito agrícola e para exportação) e implantação de teto de 50% para expansão nominal de empréstimos ao setor privado e dos meios de pagamento e base monetária. No primeiro trimestre de 1981 os limites são ainda mais restritivos. A agricultura e as pequenas empresas, no entanto, recebem aumento da oferta de crédito rural e para financiamento de capital de giro. Os efeitos dessas políticas restritivas sobre a inflação foi quase nulo. A rigidez inflacionária de 1981 reforçaria a tese inercialista. Os índices de preços aceleraram até o pico de 120% em meados de 1981, caindo para 100% ao final desse ano. Essa queda foi parcialmente devido ao choque agrícola, decorrente de aumento da safra para produtos de abastecimento internos e queda do preço dos produtos exportáveis. Em 1981, apesar de uma deterioração nos termos de troca graças a um incremento de 19% no preço do petróleo, verificou-se uma reversão da BC (balança comercial) para um superávit de U$ 1,2 bilhões. As exportações aumentaram, enquanto caiu o coeficiente importador. No entanto, a elevação das taxas de juros internacionais determinou aumento do pagamento de juros da dívida, que atingia 40% da receita com exportações. A captação externa aumenta e, com isso, crescem as dívidas de médio e longo prazos, mas permite um aumento nas reservas de U$ 600 milhões. Em 1981, verifica-se uma queda de 10% no produto industrial e queda real do PIB brasileiro. Questionase a funcionalidade da recessão provocada enquanto o capital estrangeiro torna-se escasso. Foi demonstrado que a recessão fora iniciada no primeiro semestre daquele ano, portanto, não decorrente do aperto monetário de 1979. 43 Talvez tenha sido devido aos limites à concessão de crédito e às mudanças na política salarial, resultantes em queda da demanda por bens duráveis. O governo não recorreu ao FMI para ajuda financeira, argumentando temer às exigências e diminuição da liberdade de se conduzir a política econômica. Porém, a razão pode ter sido a não demonstração de fraqueza pela ditadura militar, o que acarretou em um alto custo ao governo. O ano de 1982 apresenta uma queda considerável das exportações e importações brasileiras. A primeira foi decorrente da forte recessão mundial, enquanto a segunda foi conseguida graças à substituição de importações de bens intermediários e à queda da demanda por bens de capital, induzida pela recessão. No entanto, sobem os pagamentos de juros da dívida externa, o que leva à independência do déficit em CC da absorção interna. Esse fato, juntamente com o pedido de moratória pelo México em agosto, levam a uma restrição ao crescimento econômico. Assim, em setembro de 1982, iniciam-se as conversas com o FMI na tentativa de se atrair recursos de agências multilaterais. A tentativa foi fracassada. Nas eleições desse ano, o governo tentava convencer o país de que não valia a pena recorrer ao fundo, afinal o déficit em CC atingia U$ 16,3 bilhões. Porém, a incerteza, as condições internas e o ajustamento frustrado determinaram a derrota governista. O financiamento do balanço de pagamentos para o fim de 1982 e 1983 foi uma operação de emergência acordada com o FMI e credores internacionais, evitando suspensão de pagamento por falta de divisas. O “Programa para o Setor Externo em 1983” era um compromisso formal de austeridade de forma a gerar um superávit de U$ 6 bilhões em 1983 e base para um acordo com o FMI. Em 20 de novembro de 1983, foi anunciada oficialmente a submissão de um programa ao fundo. O maior desafio dos negociadores dos empréstimos foi a submissão das políticas macroeconômicas e comerciais. O ano fechou com um crescimento de apenas 1,1% do PIB, queda da produção agrícola, estagnação do produto industrial. A taxa inflacionária não se alterou. Em 6 de janeiro de 1983 foi submetida ao FMI a primeira carta de intenções (seriam sete em dois anos). O Brasil, porém, apresentou muitas dificuldades na adaptação às exigências pois era uma economia em desenvolvimento, altamente indexada e tinha no setor público o principal investidor ou financiador. Mesmo assim, as metas eram: déficit em CC até o limite de U$6,9 bilhões, portanto, as exportações deveriam crescer em 12% e as importações cair em U$2,5 bilhões (saldo de U$6 bilhões). A inflação anual deveria atingir 78%, através da contração de gastos públicos. Desvalorização do câmbio real de forma gradual e redução drástica nos gastos das estatais para que as restrições afetassem menos o setor privado. Os resultados desfavoráveis da BC nos dois primeiros meses de 1983, aliados a dificuldades prática de se implantar o gradualismo na correção cambial determinaram uma maxidesvalorização de 30% em março. Uma segunda carta de intenções é levada ao fundo, contento um novo pacote de medidas, como estímulo às exportações e facilidades para substituição de importações. Houve desindexação salarial parcial como forma de evitar a neutralização da maxidesvalorização, porém não totalmente aprovada pelo congresso — resultou em perda de 15% no poder de compra dos salários. Quase todas as metas traçadas para 83, relacionadas com as contas externas, foram alcançadas. Esse resultado deve-se a um conjunto de fatores: recessão interna; queda do salário real; desvalorização cambial; queda dos preços do petróleo e da taxa de juros internacional, alem da recuperação dos EUA. A BC, assim como o saldo em CC, superou as expectativas, mas os pagamentos de juros atrasaram. A entrada de capitais prevista não se materializou. Contribuiu para o excepcional desempenho comercial a entrada em operação dos projetos iniciados após 1975, reduzindo definitivamente o coeficiente importado. A queda das importações contaram também com a baixa produção doméstica e o efeito renda. As negociações com o FMI, no entanto, permaneciam complexas no tocante a metas internas (controle da inflação), principalmente após os choques desfavoráveis da maxidesvalorização e elevação dos preços agrícolas — venda de produtos não disponíveis e agravados pelo impacto da maxidesvalorização sobre os insumos importados e transporte, além do controle das importações, modificações no crédito rural e quebra de safras. A expansão das culturas de exportação determinaram o crescimento de 1,7% da agricultura. A inflação projetada para o ano foi desacreditada. A indexação do serviço da dívida tornava impossível uma redução das necessidades nominais de financiamento do setor público. O FMI suspende desembolso de recursos pelo fracasso brasileiro em reduzir os déficits nominais. Iniciaram-se negociações com o fundo na tentativa de adaptação das medidas ao caso brasileiro, prejudicado pois a variável fiscal utilizada era extremamente sensível à inflação. A quarta carta ao fundo inclui novo critério de desempenho fiscal, retirando as parcelas referentes às correções do estoque da dívida das necessidades nominais de financiamento do setor público — o déficit cai de 6,2% do PIB em 1982 para 3% em 1983. As finanças públicas sofrem cortes significativos e a taxa de investimento cai dos 20% vigentes até 1982 para 14,3% do PIB em 1983. As incertezas quanto aos frutos das negociações com o FMI, aliadas ao nível negativo das reservas cambiais, instauram um aumento da demanda por ativos cotados em dólar. Um severo controle do câmbio e os títulos indexados à variação cambial impediram uma fuga maciça de capitais. No auge da especulação, em meados de 1983, as diferenças entre o dólar oficial e paralelo chegava a 100%. A queda desse diferencial ocorre logo em seguida com a melhoria gradual da BC, menor rigor das regras do fundo e perdas significativas das carteiras em dólar dos intermediários financeiros domésticos. No primeiro trimestre de 1984, com a confiança na política cambial e o fim da especulação, o governo socorre o sistema financeiro fragilizado pelos ataques à moeda. 44 O ano de 1983 representou a maior recessão enfrentada pelo setor industrial. O produção industrial caiu 5,2% e atingiu todas as categorias de uso. A queda mais acentuada foi a de bens de capital (queda acumulada de 55% entre 81 e 83), acompanhando a queda na taxa de investimento. O melhor desempenho dos bens intermediários relativamente à recessão de 1981 deveu-se à expansão de suas exportações. O emprego industrial contraiu 7,5% e os setores mais atingidos foram aqueles considerados dinâmicos como material elétrico e comunicações, mecânica e química. Houve uma recuperação moderada ao final do ano graças ao aumento vigoroso da demanda por exportações. Acompanhando a industria, o PIB cai 2,8% em termos reais e a renda per capita a preços constantes declina 11% entre o pico de 1980 e 1983. Os segmentos mais conservadores da sociedade pediam o sucateamento do complexo industrial. O grande impulso da demanda por exportações determina uma recuperação industrial vigorosa no primeiro semestre de 1984. Em 1984, pela primeira vez desde 1979, a restrição externa mostrou sinais de relaxamento, principalmente graças à recuperação dos EUA, elevando as exportações brasileiras em 40% no primeiro semestre. A exportação de manufaturados responderam bem ao reaquecimento do comércio internacional, que também estimulou a demanda geral. A atividade industrial apresentou recuperação. A economia brasileira não cumpriu diversos critérios de desempenho em decorrência da interrupção da entrada de recursos externos por vários meses, por interrupção do acordo com o fundo, e demora em se obter financiamento externo adicional para 1983. Assim, foi possível um espaço para negociação de metas domésticas mais flexíveis através da quinta carta de intenções (que vigorou pelo prazo recorde de seis meses). Porém, essa carta incorporava uma expectativa de inflação equivalente à metade daquela verificada no ano de 1983, sendo necessária a solicitação de uma sexta carta, para alteração desses tetos. Segundo o IBGE, a produção industrial cresceu 7% em 1984. A indústria de transformação cresceu 6,1%, enquanto a extrativa mineral, 27,3%. Esse alto desempenho da indústria extrativa mineral decorreu, basicamente, da expansão da produção nacional de petróleo. Essa, aliada à queda nos preços internacionais do produto, permitiu uma redução nas despesas de importações da ordem de U$4 bilhões no período. A indústria de transformação teve o seu crescimento proporcionado pela elevação das vendas externas e ao setor agrícola. O incremento da demanda ocorreu graças à recomposição da renda rural, devido à expansão da agricultura de exportação e a preços relativos mais favoráveis. A renda rural se propagou para a renda urbana, também impulsionada pelos reajustes salariais acima das taxas prescritas. O consumo foi, ainda, impulsionado pela exacerbação das expectativas inflacionárias em função da própria demanda de recomposição salarial; do boom do mercado financeiro; da política monetária frouxa; dos reajustes das tarifas públicas. O alto consumo ajudou na disseminação da recuperação dos setores industriais — quase todos os setores exibiram taxas positivas de crescimento em 1984. Apesar da recuperação econômica, a categoria de bens de consumo duráveis ainda apresentou queda no ano (7,5%), enquanto os bens de consumo não duráveis observaram um pequeno crescimento, decorrente da recomposição salarial. Já os bens de capital, representaram a maior alta (14,8%), após três anos de quedas, devido à demanda agrícola e de produtos para exportação. O PIB, impulsionado pela retomada industrial, cresceu 5,7% em termos reais, interrompendo o processo de encolhimento da renda per capita observado desde 1981 — com contribuição da recuperação das lavouras. Porém, o processo inflacionário não se alterou. A insensibilidade das taxas de inflação ao aumento da oferta agrícola era apenas mais um sintoma da alta indexação da economia. A inflação em 1984 acumulou 223,8%, refletindo razoável estabilidade em relação ao ano anterior. Os índices de preços alternativos, altamente divergentes em 1983, apresentaram uma convergência em relação ao índice oficial. O caráter inercial do processo inflacionário e a relativa invariância ao nível de atividade eram reforçados pela estabilidade das inflações mensais. Observaram o aparecimento de sugestões de políticas econômicas visando estabilização. A tese da “Moeda Indexada” de Arida e Resende (1985) pretendia atingir a desindexação através da indexação plena da economia com a circulação paralela de uma moeda com paridade fixa com a ORTN. Já a tese do “Choque Heterodoxo” propunha a eliminação imediata e total de todas as formas de indexação e congelamento temporário de preços, salários e taxa de câmbio — posteriormente incorporou novo padrão monetário. Em ambos os casos, pressupunham resolvidos os conflitos distributivos através do controle da inflação e requeriam aceitação pacífica de um padrão distributivo pré-determinado. Vale notar que essas propostas surgem juntamente com a defesa do ‘pacto social’ por Tancredo Neves, candidato da oposição à presidência da república. No último trimestre de 1984, a inflação apresentou uma aceleração devido às expectativas negativas quanto às safras agrícolas, efeitos sobre custos dos reajustes salariais e a recuperação das margens de lucro, favorecida pelo aumento da demanda. Assim, o governo viu-se forçado a adiar reajustes de alguns preços-chaves da economia, provocando uma inflação artificialmente baixa nos dois primeiros meses de 1985. Em março, primeiro mês da Nova República, a taxa foi por demais sobrecarregada. No BP, o aumento das exportações e nova queda das importações geraram um superávit de U$13,1 bilhões em 1984, superando, pela primeira vez, em U$3 bilhões a conta líquida de juros acordada com o FMI. O saldo em CC estava praticamente equilibrado e as reservas foram incrementadas. O crescimento da dívida externa líquida foi bem mais moderados que nos anos anteriores. Esse bom resultado comprovou algumas teses acerca do ajustamento externo: (i) importância do comportamento da demanda por exportações para um ajustamento não recessivo; (ii) os custos envolvidos na reversão do endividamento externo explosivo em condições normais de comércio internacional: encolhimento da capacidade produtiva e transferência ao exterior de 4% do PIB; (iii) 45 estratégia de longo prazo determinou o crescimento substancial do PIB em 1984, com queda do coeficiente de importação e aumento do de exportação. O país parecia crescer, apesar da crise da dívida. As novas perspectivas de crescimento da economia brasileira modificaram o padrão de negociações com o FMI. A sétima carta de intenções buscava uma estratégia de acordo para o reescalonamento das amortizações, como o México. A partir de 1985 tornam-se mais difíceis os acordos com o FMI. O apoio interno era questionável pois não eram demandados recursos externos para financiamento do BP. Mas os credores consideravam fundamental o monitoramento do fundo para reescalonamento da dívida. O ponto vulnerável desse impasse era, evidentemente, a taxa inflacionária de 250% ao ano. A estabilização esbarrava na necessidade de manter os projetos de investimentos de longo prazo. Os conflitos distributivos de renda eram continuamente agravados e a transferência de perdas ao governo levou as finanças públicas a um estado tal de desordem que atingiu até as empresas estatais de forma profunda. Ajustamento externo da economia foi bem sucedido no sentido de geração de vultuosos superávits comerciais e reequilíbrio da CC. Porém, fora muito limitado. O plano trienal do FMI promoveu um ajustamento recessivo, sem consideração ao papel da recessão internacional na redução das exportações e sem atenção dirigida ao papel da indexação na economia. Os desequilíbrios internos e a inflação foram tratados com tolerância ou complacência passiva. Todas essas condições aumentaram ainda mais o custo do processo de ajustamento e as políticas econômicas adotadas contribuíram para aumentar os conflitos internos e agravar os efeitos inflacionários. ÍNDICE CRONOLÓGICO Presidente: João Baptista Figueiredo Ministro da Fazenda: Ernane Galvêas Ministro do Planejamento: Antônio Delfim Netto * 1980 - políticas restritivas. Lançamento do III PND. Política macroeconômica ditadas pela disponibilidade de financiamento externo. Déficit comercial de U$2.8 bilhões. * 1981 - primeira queda real do PIB brasileiro no pós-guerra. Política macro orientada para redução das necessidades de divisas estrangeiras. Inflação de 120% no meio do ano e 100% no final. Superávit de U$1.2 bilhões. Pagamento de juros da dívida comprometeu 40% da receita com exportações. Queda de 10% no produto industrial. * 1982 - frustração do ajuste externo e início dos acordos com o FMI. Recessão mundial. Novas restrições com a moratória do México. Falta de progresso nas condições internas. Derrota do governo nas eleições gerais. Lançado o “Programa para o Setor Externo em 1983”. * 1983 - sucesso do ajuste externo. Desequilíbrios internos. Negociações difíceis com o FMI. Dificuldades de adaptação ao receituário do FMI — era uma economia em desenvolvimento altamente indexada e com forte participação do governo no setor produtivo. 20/11/83 – anúncio oficial de submissão de programas ao FMI. Estagnação da economia e da taxa de inflação. Recessão interna, desvalorização cambial, queda do salário real, queda dos preços do petróleo e das taxas de juros internacionais, recuperação da economia norte americana levaram ao cumprimento de quase todas as metas externas. Superávit comercial de U$ 6,5 bilhões, déficit em CC de U$ 6,2 bilhões, mas atrasos de pagamentos de juros por falta de capitais no país. Entrada em operação de vários projetos iniciados em 1975 e queda permanente do coeficiente importador. Déficit público cai para 3% do PIB. Tentativas de especulação contra o cruzeiro. Melhora gradual da BC. * 1984 - relaxamento da restrição externa. Recuperação da economia através da atividade industrial. Tentativa de definição de metas menos restritivas com o FMI. Recomposição das rendas rural e urbana. Superávit comercial acumulado em U$ 13,1 bilhões. Saldo em CC equilibrado. Reservas incrementadas. Sugestões de política monetária: teses da “Moeda Indexada” e “Choque Heterodoxo”. Tancredo Neves e o discurso sobre ‘pacto social’. Política Monetária: 1981: elevação das taxas de juros internas e contração da liquidez real. Abolição da pré-fixação da correção monetária. Correção pelo INPC. Liberação das taxas de juros dos empréstimos dos bancos. Limitação da expansão dos meios de pagamento e da base monetária em 50%. 1982: compromisso formal de austeridade para o ano seguinte. Submissão de políticas ao crivo do FMI. 1984: política monetária frouxa. Política Fiscal: 1981: controle dos gastos do governo. Aumento da arrecadação. Limitação do investimento das estatais, centralização da administração dos recursos orçamentários, controle maior dos saldos das contas do governo. Elevação da carga tributária: IR, IOF e IOF para a Zona Franca de Manaus. Restabelecido o incentivo fiscal do crédito-prêmio. Submissão de políticas ao crivo do FMI. 1983: taxa de inflação prédeterminada, com cortes nos gastos do governo e redução drástica nos gastos das estatais. Impossibilidade de 46 redução das necessidades nominais de empréstimos do setor público pela alta indexação. 1984: Reajustes de tarifas públicas. Não cumprimento de metas das necessidades nominais de financiamento do setor público. Política Cambial/Comercial: 1981: abolição da pré-fixação da correção cambial. Correção pelo diferencial inflacionário. Queda do coeficiente de importação. Submissão de políticas ao crivo do FMI. 1983: Teto de U$ 6,9 bilhões para o déficit em CC, requerendo superávit comercial de U$ 6 bilhões, aumento de 12% nas exportações e corte de U$ 2,5 bilhões. Desvalorizações graduais, 1% acima da inflação. 21/02/83 – maxidesvalorização de 30%. Correção cambial até o final do ano não poderia ultrapassar a inflação. Severo controle do câmbio para impedir prosseguimento da especulação. Política Creditícia: 1981: manutenção das taxas de juros para o crédito à agricultura e linhas especiais de crédito para exportações. Restrição do crédito ao consumidor. 1983: novos programas de crédito na carta ao FMI, na tentativa de se estimular exportações e facilitar substituição de importações. Políticas diversas: 1981: contenção salarial, com perda maior para as faixas mais altas. Tratamento especial às atividades de exportação, energia, agricultura e pequenas empresas. 1983: desindexação parcial dos salários. 1984: reajustes salariais acima das taxas prescritas. Controles de preços. 47 CAPÍTULO 13 - “A ÓPERA DOS TRÊS CRUZADOS: 1985-1989” Eduardo Modiano (Janete Duarte) Durante a 2ª metade da década de 80, a política econômica brasileira concentrou-se no combate à inflação: os planos de estabilização ortodoxa, adotados no período de 1981-84, promoveram o ajustamento externo da economia, mas não conseguiram evitar a escalada inflacionária. Portanto, fazia-se necessário priorizar a desindexação da economia, o que produziria uma queda mais rápida da inflação do que a contração da demanda agregada, com custos menores em termos de recessão e desemprego. Este capítulo analisa as diversas políticas de combate à inflação adotadas no período 1985-89: estas variam de acordo com o tema, da ortodoxia à heterodoxia, e segundo o ritmo, do gradualismo ao choque. A Nova República instalou-se em março de 1985 e o novo governo deu início à gestão da política econômica com anúncio apenas de medidas de austeridade fiscal e monetária. Um congelamento de preços foi determinado pelo ministro da Fazenda, Francisco Dorneles, para o mês de abril3. Além disso, visando amortecer a aceleração da inflação, as fórmulas de cálculo da correção monetária e das desvalorizações cambiais foram modificadas, estendendo a “memória” do processo inflacionário de um para três meses. O mês de junho marcou o início de descompressão dos controles sobre os preços privados e de descongelamento dos preços públicos. A recomposição dos preços apenas começava quando a economia sofreu um violento choque de oferta agrícola, com os preços dos gêneros alimentícios no atacado aumentando, “puxando” para cima a inflação. O fracasso do pacote antiinflacionário marcou, com a substituição do ministro da fazenda, o final da 1ª fase da política econômica da Nova República. O novo ministro, Dílson Funaro, anuncia uma meta antiinflacionária mais modesta: estabilização à taxa de 10% ao mês e, as correções monetárias e cambial voltariam a ser norteadas pela inflação do próprio mês em curso. A nova política econômica daria menor ênfase ao controle da base monetária - objeto permanente de preocupação da equipe anterior -, e assim, a taxa de juros real, que subira vertiginosamente durante o período de abril a julho de 85, declinaria como resultado de uma política monetária menos restritiva, tornando-se mais compatível com a recuperação econômica. A mudança da fórmula de correção e a conseqüente redução da memória inflacionária, sugeriam que a economia estava caminhando na direção da indexação plena, e neste caminho, preços, taxa de câmbio e ativos financeiros tornavam-se crescentemente atrelados à variações mensais da ORT. No entanto, não havia uma regra clara e amplamente aceita para a indexação dos salários. A inflação reprimida, aliada a um novo choque de oferta agrícola, levou o Índice Geral de Preços (IGPDI) da FGV a registrar elevação de 15% em novembro/85. A desindexação seguiu, então, um caminho alternativo: o índice que media oficialmente a inflação deixou de ser o IGP-DI da FGV e passou a ser o índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do IBGE - este último registrava uma taxa de inflação de apenas de 11,1% em nov./85. A principal vantagem do IPCA sobre os outros índices seria sua menor sensibilidade a choques de oferta agrícola e cambial, o que ajudaria a amortecer o aumento previsto das taxas de inflação para os meses subsequentes, ainda em função da estiagem nas lavouras. Este ganho teria que compensar o fato dos preços ao consumidor serem mais difíceis de controlar do que os preços por atacado, que representavam 60% do IGP-DI. Não havia dúvidas que, com a indexação generalizada da economia, a taxa de inflação tenderia rapidamente para o novo patamar de 400% a 500% a.a.. Nestas condições, o governo não seria capaz de manter os registros salariais na freqüência semestral, o que poderia resultar em outra pressão de custos, colocando a economia na rota da hiperinflação. Assim, o fracasso do gradualismo em produzir sequer a estabilidade das taxas mensais de inflação, encerra a 2ª fase da política econômica da Nova República. O programa brasileiro de estabilização de 28 de fevereiro de 1986 promoveu uma reforma monetária que estabeleceu o “Cruzado” (Cz$) como padrão monetário nacional. A taxa de conversão foi fixada em mil cruzeiros por cruzado. Os salários foram convertidos em cruzados, tomando como base o poder de compra médio dos últimos 6 meses, mas não foram congelados, ao contrário dos preços ( com exceção das tarifas industriais de energia elétrica), que foram congelados por tempo indeterminado, sem qualquer compensação pela inflação passada, nem tampouco pela perda futura. O Plano Cruzado deslocou a base do IPCA para 28 de fevereiro de 1986. O novo índice, denominado Índice de Preços ao Consumidor (IPC), manteria as mesmas ponderações do IPCA 4. 3 O governo decidiu, posteriormente, estender a duração do congelamento de preços. O deslocamento de base se justificava, já que, com preços medidos como médias diárias ou semanais, o IPCA registraria uma inflação positiva no 1º mês do congelamento (março/86), ainda que os preços permanecessem estáveis ao longo do mês. 4 48 A taxa de câmbio foi fixada em cruzados no nível vigente em 27 de fevereiro de 1986 : a cômoda posição externa da economia brasileira e a recente desvalorização do dólar americano, ao qual o cruzeiro estava atrelado, em relação às moedas européias e ao iene japonês, não sugeriram a necessidade de uma maxidesvalorização compensatória ou defensiva do cruzado. O Plano Cruzado não estabeleceu regras ou metas para as políticas monetária ou fiscal. O objetivo implícito da política monetária durante os primeiros meses do Plano era acomodar o incremento na demanda de moeda que resultaria de uma mudança de carteira em favor da moeda estável, `a medida em que este movimento era percebido como não inflacionário. Com respeito à política fiscal, o governo havia anunciado em dezembro de 1985, um pacote fiscal que tinha como objetivo eliminar as necessidades de financiamento do setor público. Entretanto, os ganhos projetados de receita, que dependiam da continuidade do processo inflacionário - “imposto inflacionário”- não se materializariam com a queda das taxas de inflação. A análise dos resultados do Plano Cruzado pode ser dividida em 3 períodos: março a junho de 1986, que é caracterizado por uma queda substancial da inflação e também pelos primeiros indícios da existência de excesso de demanda na economia; julho a outubro de 1986, identificado pela total imobilidade do governo ante o agravamento da escassez de produtos e à deterioração das contas externas e, novembro/86 a junho/87, o fracasso do Plano Cruzado, com o retorno das altas taxas de inflação. No 1º período de análise, o aumento de poder de compra dos salários, a despoupança voluntária causada pela ilusão monetária, o declínio do recolhimento do imposto de renda para pessoas físicas, a redução das taxas de juros nominais, o consumo reprimido durante os anos de recessão e o congelamento de alguns preços em níveis defasados em relação a seus custos, detonaram conjuntamente uma explosão do consumo. Concomitantemente, o governo foi tomando consciência da magnitude do desequilíbrio fiscal. Assim, ou decretava-se o fim do congelamento de preços ou desacelerava o crescimento do produto através de um rápido e severo corte na demanda agregada. Mas, como tanto a inflação quanto a recessão tinham custos políticos, o governo acaba optando por um modesto ajuste fiscal: entra em cena o “Cruzadinho”. O “Cruzadinho” foi anunciado n dia 24 de julho/86: tratava-se de um tímido pacote fiscal para desaquecer o consumo. Envolvia basicamente a criação de um sistema de empréstimos compulsórios : novos impostos indiretos na aquisição de gasolina e automóveis que seriam restituídos após 3 anos, e ainda a criação de impostos não-restituíveis sobre a compra de moedas estrangeiras para viagem e passagens aéreas internacionais. Como era de se esperar, o “Cruzadinho” teve pouca eficácia na contenção do consumo, ao contrário, a expectativa do descongelamento deu um novo impulso à demanda. Uma semana após a vitória maciça do partido do governo (PMDB) nas eleições, o “Cruzado II” - 3º período de análise - foi anunciado. Tratava-se de um “pacote fiscal” que objetivava aumentar a arrecadação do governo através de alguns preços públicos5 e do aumento de impostos indiretos6. O “Cruzado II” determinava que os aumentos de preços dos automóveis, cigarros e bebidas deveriam ser expurgados do IPC, visando retardar o 1º disparo do “gatilho salarial”. A reação da população, com o apoio de alguns novos governadores e congressistas, forçou o governo a recuar na proposta de expurgo. O governo apenas substituiu as ponderações do IPC que eram originadas do IPCA, pelas ponderações do INPC, que atribuía menores pesos aos preços majorados pelo “Cruzado II”. Na mesma ocasião, foi regulamentada a escala móvel dos salários: os reajustes acionados pelo “gatilho” ficariam limitados a 20%, com o resíduo inflacionário sendo carregado para o gatilho seguinte. A taxa de inflação atingiu 16,8% em janeiro, significando que o 1º reajuste salarial de 20% reporia pouco mais do que a perda de poder incorrida durante o próprio mês. Contando com a retração da demanda para amortecer a aceleração inflacionária, o governo cedeu às pressões pela liberalização dos preços, suspendendo abruptamente quase todos os controles em fevereiro de 1987. As vendas caíram em conseqüência da queda do salário real, da elevação das taxas de juros e do aumento da incerteza e, do lado da oferta, foram impostos novos limites às importações de matérias-primas essenciais e produtos intermediários, devido à escassez de reservas cambiais. Em abril de 1987, com a taxa de inflação ultrapassando o patamar de 20% ao mês, o ministro Dílson Funaro deixou o cargo. O novo ministro, Bresser Pereira, iniciou sua gestão anunciando uma meta para taxa de crescimento do PIB de 3,5% e demonstrou disposição de voltar a dialogar com o FMI (pois em fevereiro/87 o governo decidiu suspender por tempo indeterminado os pagamentos da dívida externa). O Plano Bresser de 12 de junho/87 foi apresentado à população como um programa de estabilização híbrido, contendo elementos tanto ortodoxos quanto heterodoxos para o combate à inflação. O novo programa não tinha como meta a “inflação zero”, nem tampouco tencionava eliminar a indexação da economia. Pretendia apenas promover um choque deflacionário com a supressão da escala móvel salarial e sustentar as taxas de inflação mais baixas com redução do déficit público. 5 6 Gasolina, energia elétrica, telefone e tarifas postais. Automóveis, cigarros e bebidas. 49 Os salários foram congelados por um prazo máximo de 3 meses, nos níveis prevalecentes em 12 de junho de 1987. O Plano Bresser instituía também uma nova base de indexação salarial para vigorar após o congelamento: a Unidade de Referência de Preços (URP)7. Os preços também foram congelados pelo prazo máximo de 3 meses, porém, antes foram anunciados diversos aumentos para os preços públicos e administrados8 e, a exemplo do Plano Cruzado, a base do IPC foi deslocada para o início da vigência do congelamento: 15 de junho de 1987. A taxa de câmbio não foi congelada e, quanto a adoção de políticas monetária e fiscal, o governo praticaria taxas de juros reais positivas, a curto prazo, com o intuito de inibir a especulação com estoques e, no que tange à política fiscal, seriam adotadas medidas que visassem reduzir o déficit público em 1987. A evolução da política econômica, após o lançamento do 2º programa de estabilização, pode ser subdividida em dois períodos: julho a dezembro/87, inclui as fases de congelamento e flexibilização do Plano Bresser, configurando o sucesso inicial e o posterior fracasso; e janeiro a dezembro/88, que é caracterizado por um renascimento da ortodoxia e por uma retomada do gradualismo no combate à inflação. No 1º período, a perda de poder aquisitivo dos salários e a prática de taxas de juros reais positivas durante a fase do congelamento tiveram reflexos negativos nas vendas e no ritmo de produção industrial. Assim, em contraste com o Plano Cruzado, a inflação do congelamento não podia ser atribuída a pressões de demanda e sim de um conflito distributivo de rendas no setor privado e entre os setores privado e público 9. As pressões inflacionárias levaram o governo, já em agosto, a reduzir o leque dos preços controlados e a permitir alguns reajustes de preços. Essas medidas abalaram ainda a credibilidade do programa em duas frentes: o congelamento e a URP. Com a inflação oficial no patamar de 14% em dezembro, sob uma onda de rumores de um iminente novo congelamento, e diante do desgaste provocado pelas resistências a sua proposta de uma reforma tributária progressista, o ministro Bresser Pereira pediu demissão. Quanto ao 2º período, também conhecido como a política do “Feijão -com -arroz”, marca a gestão do novo ministro da Fazenda, Mailson da Nóbrega, que rejeita a alternativa do “choque heterodoxo” e anuncia metas mais modestas10. O sucesso da política do “Feijão -com -arroz” consistiu em evitar, a curto prazo, uma explosão inflacionária, embora se configurasse o retorno da taxa de inflação ao patamar anterior ao lançamento do Plano Bresser. Em outubro de 1988 foi promulgada a nova Constituição Brasileira, que transferiu para o Congresso uma parcela da responsabilidade pela condução da política econômica. De acordo com o governo, as dificuldades para a execução de um ajuste fiscal no âmbito de um programa de estabilização foram agravadas pela Nova Constituição, uma vez que 92% da receita da União estaria comprometida com as transferências a estados e municípios, pessoal, encargos da dívida e outras vinculações. Em novembro de 1988 foi assinado um acordo inédito entre governo, empresários e trabalhadores, estabelecendo uma espécie de redutor, através da pré-fixação dos reajustes de preços: nascia o “pacto social”, cujo principal mérito consistiu em conter, temporariamente, a ameaça da hiperinflação. Em janeiro de 1989, o governo lança mão de mais um programa de estabilização: o Plano Verão! O Plano Verão de 14 de janeiro de 1989 promoveu uma nova reforma monetária, instituindo o Cruzado Novo (NCz$) - correspondendo a mil cruzados _ como a nova unidade básica do sistema monetário. Foi anunciado também como um plano híbrido: do lado ortodoxo, o Plano pretendia promover uma contração da demanda agregada a curto prazo11 e, do lado heterodoxo, extinguir todos os mecanismos de realimentação da inflação, promovendo inclusive o fim da URP salarial. Os preços foram congelados por tempo indeterminado; porém, na véspera do anúncio do congelamento, foram autorizados aumentos para os preços públicos e administrados. Além de recompor eventuais defasagens em relação aos custos de produção, o alinhamento dos preços, a exemplo do Plano Bresser, deveria gerar uma margem de folga para suportar o congelamento. 7 De acordo com o novo esquema, a cada 3 meses seriam pré-fixados os percentuais de reajuste para os 3 meses subsequentes, com base na taxa de inflação média (geométrica) dos 3 meses precedentes. Ampliava-se, porém, com a pré-fixação dos reajustes a cada 3 meses, a defasagem entre a observação da taxa de inflação e seu repasse aos salários. 8 É importante frisar que a falta de um realinhamento de preços públicos e administrados na véspera do congelamento fora apontada como uma das falhas do Plano Cruzado. 9 A flexibilidade do novo congelamento permitiu que os aumentos de preços decretados na véspera do Plano Bresser fossem repassados aos outros preços da economia, gerando inflação e neutralizando parcialmente a transferência de renda para o setor público. 10 Estabilização da inflação em 15% ao mês e redução gradual do déficit público. 11 Anunciando a prática de taxas de juros reais elevadas para inibir a especulação com estoques e moeda estrangeira e também promovendo cortes nas despesas públicas. 50 A cotação do dólar norte-americano foi fixada em NCz$ 1 : acreditava-se que a relação unitária entre o cruzado novo e o dólar teria um efeito psicológico positivo, na medida em que fosse percebida como um indicador da disposição efetiva do governo em combater a inflação doméstica e, assim, sustentar a nova paridade a médio prazo12. O ajuste fiscal proposto pelo governo junto com o Plano Verão deveria atuar em 4 frentes: redução das despesas de custeio através de uma ampla reforma administrativa; redução das despesas de pessoal através da demissão de funcionários públicos; redução do setor produtivo estatal através de um amplo programa de privatização; rigidez na programação e execução financeira do Tesouro através de limitações à emissão de títulos da dívida pública. No que tange à política monetária, seriam utilizados 3 instrumentos básicos: aumento da taxa de juros real de curto prazo de tal forma a inibir movimentos especulativos; controle do crédito ao setor privado através de limitações de crédito, alteração do limite dos cheques especiais, redução dos prazos de financiamento e do pagamento de cartões de crédito; e redução das pressões das operações com moeda estrangeira através da suspensão dos leilões mensais de conversão da dívida externa em capital de risco. Como na prática a política fiscal não fora efetivada, o governo se viu obrigado a manter as taxas de juros excessivamente elevadas por um período mais longo do que previsto, agravando o desequilíbrio fiscal e tendo um efeito perverso sobre o consumo: os ganhos proporcionados pelas elevadas taxas de juros reais aumentaram a renda disponível, impulsionando o consumo; assim, a recessão que o Plano Verão admitia provocar, não se materializou. Em relação aos salários, após o fracasso das negociações com empresários e trabalhadores, o governo determinou, em fins de abril, uma reposição salarial que não satisfez a classe trabalhadora, intensificando, dessa forma, o movimento grevista. Em fins de abril, o governo deu os primeiros passos na reindexação da economia: criou-se o BTN (Bônus do Tesouro Nacional) que só poderia ser utilizado em novos contratos, com prazo mínimo de 90 dias, e estabeleceu as regras do descongelamento, onde após a 1ª revisão dos preços, os reajustes só poderiam ocorrer em intervalos de 90 dias. A transposição para o caso brasileiro do fracasso do Plano Primavera argentino, e da conseqüente entrada da economia argentina numa trajetória hiperinflacionária, alimentou as especulações acerca do fracasso do Plano Verão e de suas conseqüências econômicas, políticas e sociais. Na tentativa de conter a especulação, o governo promoveu uma minidesvalorização do Cruzado Novo de 4,5% e definiu novas regras para a correção cambial: equiparação à variação mensal do IGP-DI da FGV através de até 6 minidesvalorizações mensais sem data marcada. Passados apenas 5 meses desde o lançamento do Plano Verão, pode-se afirmar que seu principal mérito residiu na interrupção de uma rota hiperinflacionária. No entanto, o descongelamento de preços no contexto de taxas de juros decrescentes, as defasagens apontadas para os preços públicos e administrados, as indefinições ainda existentes quanto à reindexação da economia, a precariedade do ajuste fiscal e uma expansão monetária nos últimos 12 meses da ordem de 1000% a.a., traçam cenários inquietantes para a inflação a curto prazo, colocando em discussão a necessidade de um novo programa de estabilização diante da proximidade das eleições presidenciais de 15/11/1989. Conclusão Os Planos Cruzado, Bresser e Verão não produziram mais do que um represamento temporário da inflação, uma vez que: i) não foram solucionados quaisquer dos conflitos distributivos de renda ou atacados os desequilíbrios estruturais da economia, que poderiam ser considerados focos de pressão inflacionária a médio prazo; ii) o desequilíbrio das contas do governo se agravou; iii) a política monetária foi predominantemente acomodatícia; iv) o setor empresarial passou a se defender com maior presteza e eficácia de quaisquer defasagens dos preços em relação aos custos; e v) os trabalhadores manifestaram com veemência crescente sua insatisfação quanto ao poder de compra dos salários. Assim, restou apenas ao governo promover desindexações e, em seguida, administrar as inevitáveis acelerações da inflação. A desaceleração do crescimento na década de 80 foi comandada pela indústria - cujo produto real cresceu apenas 1,8% a.a. entre 1980 e 1988 -, não abrindo espaço para a retomada da taxa histórica de crescimento, uma vez que os desequilíbrios tanto externos quanto internos da economia não foram equacionados de forma definitiva. Por este motivo, a década de 80 poder ser caracterizada como uma “década perdida”. Um dos principais empecilhos para a retomada de uma taxa de investimento que garantisse um crescimento auto-sustentado do produto da ordem de 6% a.a. decorre da insuficiência de poupança para seu financiamento. A poupança externa virtualmente desapareceu a partir de 1984; a poupança nacional também caiu devido à redução da poupança pública que se tornou negativa a partir de 1982. A carga tributária líquida do governo caiu de 15% do PIB (década de 70), para 10% (1ª metade da década de 80) e para menos de 10% a partir 12 A taxa de câmbio permaneceria fixa por tempo indeterminado. 51 de 1985. A recuperação do investimento passa assim, necessariamente, por uma recomposição da carga tributária líquida e, consequentemente, da poupança do governo. A baixa taxa média de crescimento na economia brasileira no período 1985-89, aliada a termos de trocas mais favoráveis e por um crescimento mais acentuado do comércio mundial, elevaram os superávits comerciais, verificando em 1988 uma redução do estoque da dívida externa, o que tende a se repetir nos anos posteriores, sob hipótese de crescimento moderado do produto. Ironicamente, a falta de uma solução para os desequilíbrios internos, herdados do início dos anos 80, ao não permitir uma retomada vigorosa do crescimento econômico, reforçou e prolongou o ajuste recessivo do desequilíbrio externo, que caracterizou a política econômica da 1ª metade da década. ÍNDICE CRONOLÓGICO: março/85: instala-se a “Nova República” e o ministro da Fazenda, Francisco Dorneles, anuncia o 1º pacote antiinflacionário do governo; junho/85: início do processo de descompressão dos controles sobre os preços privados e de descongelamento dos preços públicos; agosto/85 :- violento choque de oferta agrícola, pressionando os preços dos gêneros alimentícios; -toma posse o novo ministro da Fazenda : Dílson Funaro; setembro/85: novo pacote antiinflacionário; novembro/85: novo indexador da economia: IPCA (IBGE), em substituição ao IGP-DI (FGV); dezembro/85: o governo anuncia um “pacote fiscal”; fevereiro/86: no dia 28 de fevereiro de 1986 instala-se o “Plano Cruzado”; março a junho/86: período caracterizado por uma queda substancial da inflação e também pelos primeiros indícios da existência de excesso da demanda na economia; julho/86: o governo anuncia, em 24/07/86, o “Cruzadinho”; novembro/86: o governo anuncia o “Cruzado II” (que vai até junho/87); fevereiro/87: no dia 20/02/87, o governo decreta a moratória; abril/87: Dílson Funaro deixa o cargo e Bresser Pereira inicia a sua gestão; junho/87: “Plano Bresser” é apresentado à população no dia 12/96/87; julho a dezembro/87: fase de congelamento e flexibilidade do Plano Bresser; julho/87: o governo anuncia seu “Plano de controle Macroeconômico”; dezembro/87: Bresser Pereira pede demissão; janeiro/88: -o novo ministro, Mailson da Nóbrega, anuncia a nova política econômica, conhecida como “Feijão-com-arroz”; -suspensão da moratória dos juros da dívida externa; outubro/88: promulgada a Nova Constituição Brasileira; novembro/88: assinado o “pacto social”; janeiro/89: anunciado o Plano Verão, em 14/01/89, que institui o Cruzado Novo como a nova unidade básica do sistema monetário brasileiro; março/89: greve geral; abril/89: criado o BTN, sucedâneo da extinta OTN. POLÍTICAS ECONÔMICAS: PLANO CRUZADO: o Plano Cruzado não estabeleceu metas para as políticas monetária e fiscal para complementar o programa de estabilização: foram políticas inteiramente acomodatícias; PLANO BRESSER: políticas monetária e fiscal ativas (ver resumo); PLANO VERÃO: no que tange à política fiscal, esta deveria atuar em 4 frentes: redução das despesas de custeio, redução das despesas de pessoal redução do setor produtivo estatal e rigidez na programação e execução financeira do Tesouro; e, em relação à política monetária: seriam utilizados 3 instrumentos básicos: aumento da taxa de juros real de CP, controle do crédito ao setor privado e redução das pressões das operações com moeda estrangeira. 52