Kant - A Capacidade de Conhecer - KANT - Mistral

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KANT: A CAPACIDADE DE CONHECER
Gilberto Cotrim
(Do Livro: Fundamentos de Filosofia, Ed. Saraiva,
Gilberto Cotrim, SP, ano 2000, pág. 174-176)
Nascido em Konigsberg, pequena cidade da Alemanha, Kant (l724-1804) teve uma vida longa e tranqüila, dedicada
ao ensino e à investigação filosófica. Homem metódico e de hábitos arraigados, lecionou durante quarenta anos na
universidade de Konigsberg somente deixando o magistério por problemas de saúde. Morreu aos 80 anos, sem nunca
ter se afastado das imediações de sua pequena cidade natal.
Kant é o maior filósofo do Iluminismo alemão. Em seu texto O que é a ilustração, o filósofo sintetiza o otimismo
iluminista em relação à possibilidade de o homem se guiar por sua própria razão, sem se deixar enganar pelas crenças,
tradições e opiniões alheias.
Ele apresenta o processo de ilustração como sendo "a saída do homem de sua menoridade" e a tomada de consciência
por ele da autonomia da razão na fundamentação do agir humano.
O ser humano, como ser dotado de razão e liberdade, é o centro da filosofia kantiana. Kant afirma que a filosofia deve
responder a quatro questões fundamentais:
O que posso saber? Como devo agir? O que posso esperar? O que é o ser humano?
Tentando responder a essas questões, ele desenvolveu um exame crítico da razão, a fim de investigar as condições
nas quais se dá o conhecimento humano. Esse exame está contido em sua obra mais célebre, Crítica da razão pura.
Sua investigação acerca do agir humano está reunida nos textos Crítica da razão pratica, Fundamentação da
metafísica dos costumes e Metafísica dos costumes. Outro aspecto importante da obra de Kant são suas reflexões a
respeito da estética, presentes na Crítica da faculdade de julgar.
Vejamos um pouco sobre algumas dessas questões tratadas por Kant.
A capacidade de conhecer
Como já foi dito, uma das mais importantes questões que dominam o pensamento de Kant é o problema do
conhecimento humano, a questão do saber. Na Crítica da razão pura, ele distingue duas formas básicas do ato de
conhecer:
1.
2.
o conhecimento empírico (a posteriori) - aquele que se refere aos dados fornecidos pelos sentidos, isto é, que é
posterior à experiência. Exemplo: Este livro tem a capa verde.
O conhecimento puro (a priori) - aquele que não depende de quaisquer dados dos sentidos, ou seja, que é
anterior à experiência. Nasce puramente de uma operação racional. Exemplo: duas linhas paralelas jamais se
encontram no espaço. Essa firmação (juízo) não se refere a esta ou àquela linha paralela, mas a todas. É uma
afirmação universal. Além disso, é uma afirmação que, para ser válida, não depende de nenhuma condição
específica. Trata-se de uma afirmação necessária.
O conhecimento puro, portanto, conduz a juízos universais e necessários, enquanto o conhecimento empírico não
possui essas características.
Os juízos, por sua vez, são classificados por Kant em dois tipos: os analíticos e os sintéticos.
O juízo analítico é aquele em que o predicado já está contido no sujeito. Ou seja, basta analisarmos o sujeito para
deduzirmos o predicado. Exemplo: o quadrado tem quatro lados. Analisando o sujeito quadrado, concluímos,
necessariamente, o predicado: tem quatro lados.
O juízo sintético é aquele em que predicado não está contido no sujeito. Nesses juízos, acrescenta-se ao sujeito algo
de novo, que é o predicado. Assim, os juízos sintéticos enriquecem nossas informações e ampliam o
conhecimento. Exemplo: Os corpos se movimentam. Por mais que analisemos o conceito corpo (sujeito) não
extrairemos a informação representada pelo predicado se movimentam.
Por fim, analisando o valor de cada juízo, Kant chega à seguinte classificação:
a)
juízo analítico - serve apenas para tornar mais claro, para explicitar aquilo que já se conhece do sujeito. Não
dependendo da experiência sensorial, o juízo analítico é universal e necessário. Mas, a rigor, é pouco útil, no
sentido de que não conduz a conhecimentos novos;
b) juízo sintético a posteriori - está diretamente ligado a nossa experiência sensorial. Tem uma validade sempre
condicionada ao tempo e ao espaço em que se deu a experiência. Não produz, portanto, conhecimentos universais
e necessários.
* Exemplo: "Os nativos da aldeia X medem mais de 1,90" é sintético (o predicado não está incluído na noção do
sujeito) e é a posteriori ( a sua verdade só pode ser conhecida empiricamente. Não é universal e não é necessário, ou
seja, é contingente (é possível alguma exceção).
c) juízo sintético a priori - é o mais importante por dois motivos:
-
não estando limitado pela experiência, é universal e necessário;
seu predicado acrescenta novas informações ao sujeito, possibilitando uma ampliação do conhecimento.
Segundo Kant, a matemática e a física são disciplinas científicas por trabalharem com juízos sintéticos a priori.
** Exemplo na Matemática: "A reta é a distância mais curta entre dois pontos". Este exemplo não é juízo analítico
pois o predicado não está contido na noção do sujeito; no conceito de linha reta, não entra necessariamente a idéia de
distância. É portanto sintético. Não é juízo a posteriori pois conhecemos a sua verdade sem precisar medir a distância
entre dois pontos. E é estritamente universal e necessário (não há exceções). Logo é a priori.
Outro exemplo, agora na Física: "Tudo o que começa a existir tem causa".
Como se formam os juízos sintéticos a priori?
De acordo com Kant, esses juízos se fundamentam nos dados captados pelos sentidos e na organização mental desses
dados, seguindo categorias apriorísticas do nosso entendimento... O conhecimento, portanto, é o resultado de uma
síntese entre o sujeito que conhece e o objeto conhecido.
Segundo Kant é impossível conhecermos as coisas em si mesmas (o ser em si). Só conhecemos as coisas tal como as
percebemos (o ser para nós).
Essa posição epistemológica de Kant significa uma síntese entre idealismo e realismo, pois, para ele, o conhecimento
não é dado nem pelo sujeito nem pelo objeto, mas pela relação que se estabelece entre esses dois pólos. O que podemos
conhecer são apenas os fenômenos, ou seja, os objetos tais como eles aparecem para nós, mas não como eles são em
si mesmos.
Mas por que não podemos conhecer as coisas em si?
Kant dirá que é porque nós percebemos a realidade a partir das formas a priori da sensibilidade: o tempo e o
espaço. Com isso ele quer dizer que a nossa capacidade de representar as coisas se dá sempre no tempo e no
espaço. Essas noções são "intuições puras", existem como representações básicas na nossa sensibilidade.
De forma semelhante, os dados que são captados por nossa sensibilidade são organizados pelo entendimento de acordo
com categorias, que são "conceitos puros" existentes a priori no entendimento, tais como o conceito de causa, de
necessidade e outros, que servirão de base para a emissão de juízos sobre a realidade.
Uma nova "revolução copernicana"
Quando a teoria geocêntrica não mais conseguia explicar o conjunto de movimentos dos astros, Copérnico vislumbrou
a necessidade de tirar-nos do centro do Universo. E, lançando o modelo heliocêntrico, ele resolveu todos os impasses
da astronomia da época.
Da mesma forma, invertendo a questão tradicional do conhecimento, o papel que Kant atribuiu ao sujeito representou
para a filosofia uma revolução comparável à de Copérnico na astronomia.
Antes de Kant, afirmava-se que a função de nossa mente era assimilar a realidade do mundo. Nessa operação, alguns
filósofos só consideravam importante a atividade mental do sujeito (Racionalismo dogmático), enquanto outros
ressaltavam o papel determinante do objeto real exterior (empirismo).
Através de seu racionalismo crítico, Kant tentou formular a síntese entre sujeito e objeto, entre racionalismo dogmático
e empirismo, mostrando que, ao conhecermos a realidade do mundo, participamos de sua cosntrução mental, ou seja:
"das coisas conhecemos a priori só que nós mesmos colocamos nelas".
-------------* Esta parte foi acrescentada pelo prof. Laerte e se inspirou no livro: História da Filosofia, Edições 70, Juan Manuel
Navarro, Portugal, 1995)
** Idem
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 KANT, Immanuel. Resposta à pergunta o que é Iluminismo (1784).pdf (86 KB)
 KANT - O SUMO BEM.pdf (1341 KB)
 Kant, Immanuel - Crítica del juicio.pdf (2733 KB)
 Kant - Revista Studia Kantiana2008_6e7.pdf (1588 KB)
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