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As fusões bancárias e o Cade
O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) julgou mais de 600 fusões
e aquisições desde que esse controle foi instituído no Brasil, em 1994. O amplo
leque de setores sob a jurisdição do Cade inclui pasta de dentes, seguros,
telecomunicações e cervejas, entre outros. No entanto nenhuma das várias
aquisições e fusões de bancos foi apreciada pelo Cade.
Em um momento em que a legislação antitruste está sendo revista e em que se
preparam operações importantes, como a privatização do Banespa, parece
oportuno discutir a aplicabilidade do controle de fusões no setor bancário.
Não há consenso no governo ou fora dele acerca da competência do Cade para
apreciar fusões ou aquisições bancárias. No entanto, do ponto de vista jurídico, a
lei 8.884/94, que regula a Constituição em matéria de defesa da concorrência, não
abre nenhum tipo de exceção. Segundo o artigo 54, da referida lei, todos os
segmentos estão sujeitos a controle de atos de concentração, inclusive os bancos.
Do ponto de vista econômico, o setor bancário apresenta peculiaridades. A exemplo
de outros segmentos, cada operação requer exame minucioso sobre potenciais
danos à concorrência, comparativamente a seus benefícios. Porém destacam-se
entre esses últimos os efeitos sobre a solidez financeira; importa saber, por
exemplo, os impactos de uma fusão sobre a qualidade dos ativos, como o
percentual que os créditos em atraso e em liquidação representam do total de
empréstimos.
Com a globalização e a Internet, o conceito de mercado geográfico para serviços
bancários tende a mudar radicalmente. Observa-se um aumento das opções por
parte dos consumidores e uma crescente concorrência por parte de instituições
não-bancárias em ampla gama de produtos. No entanto, para os clientes menores,
o leque de alternativas continua reduzido e o custo de troca de um banco por
instituição concorrente é elevado. Assim as principais preocupações das autoridades
antitruste de diferentes países têm sido o eventual efeito negativo de uma fusão
bancária sobre a oferta de crédito ao pequeno e médio tomador de crédito, com
ênfase em mercados regionais específicos.
Diversas jurisdições mantêm controle regular de fusões bancárias, como os EUA, a
União Européia e o Canadá. Na maioria dos países da OCDE, a análise de operações
bancárias é realizada conjuntamente entre os bancos centrais e as autoridades de
defesa da concorrência.
Na prática, a implementação desse tipo de controle requer precondições ainda
inexistentes no Brasil. Uma fusão bancária coloca problemas distintos de uma
operação no setor real. Em primeiro lugar, o respeito ao sigilo e à confidencialidade
de informações é crucial. Um vazamento indevido de informações ou a discussão
pública de determinados pontos podem gerar expectativas pessimistas em relação
a essa ou aquela instituição e colocar em risco sua existência antes mesmo que
qualquer apreciação de mérito tenha sido realizada.
Em segundo lugar, a mera demora burocrática, ainda comum nos órgãos
brasileiros, pode gerar tamanha incerteza no mercado acerca da possibilidade de
sobrevivência de uma instituição que o próprio exame da fusão pode perder objeto.
Em terceiro lugar, o controle de fusões bancárias exige regulamentação específica
que permita contemplar certas variáveis. Assim, a concentração de mercado em
termos de faturamento ou de capacidade produtiva, conforme usualmente
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mensurada em outros segmentos, tende a ser substituída pela participação nos
depósitos à vista ou no patrimônio líquido.
Tais dificuldades operacionais explicam, em parte, por que o controle de fusões não
foi aplicado para o setor bancário nos primeiros seis anos da lei 8.884. O efeito
dessa lacuna na implementação da legislação antitruste não foi tão grave, pois as
operações que ocorreram até agora não acarretaram concentração significativa do
mercado. Bancos estrangeiros que não operavam no Brasil adquiriram participações
e elevaram o potencial de rivalidade doméstica; de 6% do patrimônio líquido antes
do Plano Real, os bancos com participação estrangeira passaram a deter cerca de
20% ao final dos anos 90. Dados do Banco Central sugerem, por sua vez, que a
participação das três maiores instituições no patrimônio total declinou nos anos 90.
Futuras operações podem, no entanto, alterar o equilíbrio de forças e ter impactos
negativos sobre a concorrência. Além disso, em persistindo a indefinição atual
acerca da competência do Cade para examinar fusões bancárias, mantém-se
indesejável elemento de incerteza _mais um_ para os agentes privados. Eis um
tema para ser tratado com coragem e realismo na reforma da defesa da
concorrência do país.
Fonte
OLIVEIRA, Gesner. As fusões bancárias e o Cade. Disponível em:
<http://www.goassociados.com.br/FSP/2000/09_2000/300900.htm>. Acesso em:
02 out. 2006.
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