INSUFICIÊNCIA RENAL AGUDA E TERAPIAS SUBSTITUTIVAS RENAL CONTÍNUA A insuficiência renal sobrevém quando os rins não conseguem remover os resíduos metabólicos do corpo nem realizar as funções reguladoras. As substâncias normalmente eliminadas na urina acumulam-se nos líquidos corporais em conseqüência da excreção renal prejudicada, levando a uma ruptura nas funções metabólicas e endócrinas bem como a distúrbios hídricos, eletrolíticos, e ácido-básicos (BRUNNER, 2006). Segundo Luna ( ) a insuficiência renal aguda (IRA) é uma síndrome clínica em que o organismo perde sua capacidade de excreção metabólica através da urina devido a uma rápida e acentuada deterioração da função renal. A IRA poderia ser definida como perda abrupta da capacidade orgânica de manter a homeostasia do seu “meio interior”. Dada a forma abrupta de sua instalação, nem os rins nem os outros sistemas metabólicos do organismo tem como desenvolver adaptações fisiológicas suficientes para corrigir as novas condições metabólicas que ameaçam a vida do indivíduo, se não forem corrigidas a tempo. EPIDEMIOLOGIA A insuficiência renal aguda (IRA), geralmente, é considerada como uma doença do paciente hospitalizado. A incidência pode variar entre 2 a 5%. As Unidades de Terapia Intensiva têm uma incidência elevada de IRA, podendo, em alguns casos, chegar a 23%. A mortalidade é alta, especialmente nos casos em que há necessidade de diálise, com índices que variam de 37 a 88%. (COSTA, 1998) CLASSIFICAÇÃO Três importantes categorias de condições provocam a IRA: Pré-Renal (hipoperfusão do rim), Renal (lesão real do tecido renal) e Pós-Renal (obstrução do fluxo urinário). As condições pré-renais acontecem em consequência do fluxo sanguíneo prejudicado que leva a hipoperfusão do rim e a uma queda na TFG (taxa de filtração glomerular). As situações clínicas comuns são os estados de depressão de volume (hemorragias, perdas GI e perdas renais), desempenho cardíaco prejudicado (infarto do miocárdio, insuficiência cardíaca congestiva ou choque cardiogênico) e vasodilatação periférica (sepse, anafilaxia, medicamentos anti-hipertensivos ou vasodilatadores). Segundo Knobel (2006), a IRA Renal causada por fatores intrínsecos ao rim, é classificado de acordo com o principal local afetado: Túbulos, Interstício, vasos ou glomérulos. A causa mais comum de dano tubular é de origem isquêmica ou tóxica. A Necrose Tubular Isquêmica pode ter origem pré-renal como consequência da redução do fluxo sanguíneo especialmente se houver comprometimento suficiente para provoca a morte das células tubulares. O aparecimento de necrose cortical irreversível pode ocorrer na isquemia grave. As nefrotoxinas representam, depois da isquemia, a causa mais freqüente da IRA. Antibióticos aminoglicosídeos, contrastes radiológicos e quimioterápicos estão entre as drogas que podem causar dano tubular diretamente. A IRA Pós-Renal ocorre na vigência da obstrução das vias urinárias, acarretando o aumento da pressão nos túbulos renais e, consequentemente, a diminuição da TFG. A obstrução pode se dar através de cálculos (litíase), tumores, hiperplasia benigna da próstata, estenoses e coágulos sanguíneos. FATORES DE RISCO Segundo Knobel (2006) as Nefrotoxinas representam, depois da isquemia, a causa mais freqüente de IRA. Pacientes graves, em especial submetidos à terapia intensiva, estão expostos à grandes doses de drogas que sobrecarregam a função renal. Antibióticos aminoglicosídicos, contrastes radiológicos e quimioterápicos estão entre as drogas que podem causar dano tubular diretamente. Por outro lado, drogas imunossupressoras como Ciclosporina e Tacrolimor, inibidores da enzima de conversão da angiotensina e drogas antiinflamatórias não esteroidais, podem causar IRA ou induzir preponderantemente modificações hemodinâmicas. A IRA devida à Nefrite Intersticial é mais frequentemente causada por reações alérgicas a drogas. As causas menos freqüentes incluem doenças autoimunes (Lupus Eritematoso) e agentes infecciosos. Pacientes pós-cirúrgicos apresentam como fator de risco para IRA, a hipovolemia e hipotensão. Se apresentando também como fator de risco para IRA, estão pacientes em idade avançada, Doença Renal Prévia, Icterícia, ICC, Hepatopatias (Cirrose) e Diabetes (aumento da Creatina). DIAGNÓSTICO DA IRA O diagnóstico da IRA é feito através da anamnese e exame físico, avaliação da urina, índices de função tubular, imagem renal e biópsia renal. As primeiras avaliações devem ser consideradas no intuito de diferenciar IRA de IRC e determinar se a azotemia é devida a um fator prontamente remediável (depleção de volume, obstrução urinária) ou em decorrência de uma situação clínica intercorrente com IRA já estabelecida. No momento da anamnese é importante colher a história clínica do paciente, atentando para doenças relacionadas bem como fatores de risco já mencionados. Durante o exame físico deve-se avaliar adequadamente o estado de hidratação, através de peso corpóreo, turgor cutâneo, alterações posturais de pulso e pressão arterial, membranas, mucosas e pressão intraocular. Entretanto lembrar que as situações clínicas (Cirrose, ICC e Síndrome Nefrótica) em que o volume extracelular está normal ou aumentado, porém com diminuição do volume sanguíneo efetivo acarretando uma hioperfusão renal e conseqüente IRA pré-renal (RIELLA, 1996). A diminuição do fluxo urinário a valores inferiores à 400 ml / dia (oligúria), níveis de creatinina plasmática acima de 1,5 mg/dL, e proteinúria maciça secundário ao uso de drogas ou Glomerulonefrite sugerem IRA. Vale ressaltar que volume urinário superior a 400 ml / dia não exclui o diagnóstico da IRA. A função renal apresenta maior dano quando os túbulos começam a ser atingidos e perdem a sua função reabsortiva, gerando urinas diluídas e com alto conteúdo de sódio. Segundo Barros et al (1999) as imagens renais tem como objetivos avaliar o tamanho e a forma dos rins, número e simetria dos rins (rins únicos são sugestivos à IRA por obstrução ou comprometimento vascular). O mais simples procedimento de imagem é a ultrassonografia. Esta, além de fornecer o tamanho renal, dá informações a respeito de obstruções nas vias urinárias, presença ou não de cálculos, bem como avaliação do parênquima renal. Portanto é possível diferenciar IRA de IRC e, adicionalmente, pela diferenciação da relação parênquima/sinusal e tamanho cortical, sugerir IRC com os rins de tamanho normal (Diabetes, Mieloma). A Biópsia Renal precoce (um a cinco dias) está indicada quando há suspeita de IRA ser decorrente de uma doença sistêmica (como vasculite), de uma glomerulonefrite aguda (como o Lúpus), de uma nefrite intersticial aguda quando houver suspeita de necrose cortical bilateral, ou na ausência de diagnóstico clínico provável. A biopsia fornecerá bases para justificar uma terapêutica mais agressiva (corticóides, agentes citotóxicos, plasmaférese e fibróticos (KNOBEL, 2006). MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS DA IRA Na unidade de tratamento intensivo, usualmente suspeita-se de IRA quando o quadro clinico apresenta hipovolemia (IRA pré-renal) ou Hipervolemia; Oligúria ou Anúria; Urina escura, Hematúrica ou acastanhada, contendo sedimento visível espesso, escuro; sinais de acidose; manifestações de uremia (vômitos, tremores, asterixe, diminuição do sensório). Na IRA as manifestações neurológicas predominam pelo quadro metabólico provocado pela uremia aguda: letargia, confusão, estupor, coma, agitação, psicose, asterixe, tremor , fibrilação muscular e convulsões. As manifestações gastrintestinais incluem: Anorexia, náuseas, vômitos, distensão abdominal, Íleo e sangramento digestivo. Hipervolemia e edema por retenção hidrossalina são manifestações comuns mesmo no paciente não-oligúrico. Pode associar-se a edema pulmonar ou cerebral, derrames em cavidades serosas e hipertensão arterial sistêmica. (BARROS, 1999) Cerca de 1 a 5% dos pacientes com IRA jamais recuperam a função renal, evoluindo para IRC terminal. MÉTODOS DIALÍTICOS Os métodos dialíticos são empregados nos pacientes com IRA com o objetivo de depurar as diferentes substâncias que são acumuladas no organismo em decorrência, ou mesmo causa, da falência da função renal. Genericamente, o termo diálise se refere ao movimento de moléculas através de uma membrana semi-permeável. Clinicamente, esse princípio é aplicado para promover a saída e/ ou a entrada de moléculas presentes no sangue. De acordo com a modalidade de diálise escolhida, ela obedece a princípios fisiológicos e fisico-químicos que empregam processos de difusão, osmose, ultrafiltração e convecção. A critério do nefrologista o método dialítico apropriado para cada situação clínica é selecionado entra as técnicas de depuração intracorpórea (utiliza o peritônio com membrana de trocas feitas entre o sangue a solução de diálise, que é introduzida na cavidade peritoneal) e extracorpórea (requerem a implantação de acessos vasculares temporários). No Quadro 28.1 estão listados os critérios mais utilizados para indicação de diálise. As intracorpóreas incluem os procedimentos de diálise peritoneal nas seguintes modalidades: Diálise Peritoneal Intermitente, Diálise Peritoneal Contínua e Diálise Peritoneal Contínua Automatizada. As complicações mais importantes da daiálise peritoneal, no contexto de um paciente criticamente enfermo, estão descritas no Quadro 28.2. As técnicas de diálise extracorpóreas exigem o emprego de circulação sanguínea extracorpórea, em que diversas modalidades de depuração extra-renal podem ser praticadas através de membranas artificiais. Segundo Brunner (2006) o método de diálise mais comumente utilizado é a Hemodiálise. Esta se subdivide em Hemodiálise Interminente (indicada em todos os pacientes com IRA que se apresentam hemodinamicamente estáveis e pode ser feita diariamente ou em dias alternados para manter o balanço hídrico e controlar a geração de uréia, naqueles pacientes que estão evoluindo com hipercatabolismo) e Hemodiálise Convencional Prolongada (duração de 8 a 12h diárias) que está indicada em pacientes hemodinamicamente instáveis, hipercatabólicos ou com acidose refratária, e/ou em casos de encefalopatia hepática. TERAPIAS DE SUBSTITUIÇÃO RENAL CONTINUAS Pacientes criticamente enfermos portadores de IRA são frequentemente instáveis do ponto de vista clínico e podem não suportar um procedimento de hemodiálise convencional. Esses pacientes podem necessitar da adoção de procedimentos de depuração extracorpórea que envolvam um processo lento e contínuo, chamados terapia contínua de substituição renal. (LUNA, 2006) Vários tipos de terapia de substituição renal contínua (CRRT) estão disponíveis e são amplamente utilizados em unidades de terapia crítica. A CRRT pode estar indicada para pacientes que apresentam insuficiência renal aguda ou crônica e que estão muito instáveis clinicamente para hemodiálise tradicional; para pacientes com sobrecarga hídrica secundária à insuficiência renal oligúrica (baixo débito urinário); e para paciente cujos rins não podem manusear suas necessidades nutricionais ou metabólicas agudamente elevadas. A CRRT não produz deslocamentos rápidos de líquidos, não requer aparelho de diálise nem profissionais de diálise para realizar os procedimentos, e pode ser rapidamente iniciada nos hospitais sem instalação para diálise. Os métodos de CRRT são semelhantes aos métodos de hemodiálise pelo fato de que eles exigem acesso à circulação e que o sangue atravesse um filtro artificial. Um hemofiltro (um filtro sanguíneo extremamente poroso que contém uma membrana semipermeável) é utilizado em todos os métodos de CRRT (BRUNNER, 2005). MÉTODOS DE DEPURAÇÃO ARTÉRIO-VENOSO O circuito de sangue com o hemofiltro é inserido entre os cateteres arterial e venoso e o fluxo de sangue é determinado pela pressão arterial sistêmica do paciente. Esse processo não utiliza máquina de diálise, dispensa o emprego de bombas de sangue e monitoração para detecção de bolhas e, sobretudo, não produz instabilidade hemodinâmica. As taxas de ultrafiltração nos métodos arteriovenosos são baixos, sendo determinadas apenas pela força gravitacional que é aplicada ao sistema, variando com a altura da bolsa coletora do ultrafiltrado em relação ao solo. 1. Hemofiltração Arteriovenosa Contínua (HAVC)