Inquérito Policial No 121 / 97 - Centro de Apoio Operacional das

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA VARA
CÍVEL DA COMARCA DE IBIPORÃ-PR
“É preferível antecipar a esperança da vida
do que abreviar o caminho da morte”
(Rel. Des. Gaspar Rubik Ag.Ins. 9872/TJSC)
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO
PARANÁ, por sua agente ao final subscrito, em exercício junto à 2a
Promotoria de Justiça de Ibiporã, cujo endereço consta no rodapé
desta peça, onde pode ser pessoalmente intimada, agindo na tutela
de interesse indisponível de ELTON JÚNIOR TEIXEIRA,
brasileiro, técnico de informática, solteiro, nascido em 11 de julho de
1983, natural de Toledo-PR, filho de José Evaristo Teixeira e
Aparecida Foschiani Teixeira, residente na Rua Olavo Bilac, 76,
Centro, Ibiporã-PR, telefones: (043) 3258 3594/3258 4350, vem à
presença de Vossa Excelência, com fundamento nos artigos 1º, inciso
III, 5°, caput e incisos XXXV, 6°, caput, 196, caput, 197, caput, da
Constituição Federal; 120, inciso II, da Constituição do Estado do
Paraná; 1º, 27 e 32, inciso I, da Lei Federal nº 8.625/93; 1º e 67, § 1º,
inciso I, da Lei Complementar nº 85/99; 1º, 2º, 5º, 12, inciso XVIII, 38,
inciso IV, da Lei Estadual nº 13.331/01; 2°, 4°, 5°, 6º, inciso I, alínea
‘d’, 7°, 15, 43 da Lei Federal n° 8.080/90 e ainda 2º, parágrafo único,
alínea ‘d’, da Lei Federal nº 8.212/91, propor
______________________________________________________________________
AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE
TUTELA E MULTA COMINATÓRIA em face do
ESTADO DO PARANÁ, pessoa jurídica de direito
público interno ora representado pelo senhor Procurador-Geral do
Estado, Dra. Jozélia Nogueira Broliani, com endereço na Rua
Conselheiro Laurindo, n.º 561, CEP 80.060-100, Centro, Curitiba-PR,
pelos motivos de fato e de direito que, a seguir, deduz;
I - LEGITIMIDADE PROCESSUAL ATIVA DO
MINISTÉRIO PÚBLICO
I.I Relevância pública dos serviços de saúde
A Constituição Federal ampliou o campo de atuação do
Ministério Público, atribuindo-lhe, no art. 127, a incumbência da
defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses
sociais e individuais indisponíveis. Em seu art. 129, elencou as
funções institucionais do parquet, entre as quais:
“Art. 129 - São funções institucionais do
Ministério Público:
I – (...)
II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes
Públicos e dos serviços de relevância pública
aos direitos assegurados na Constituição,
promovendo as medidas necessárias a sua
garantia;
(...)
III – promover o inquérito civil público e a
ação civil pública, para a proteção do
patrimônio público e social, do meio ambiente
______________________________________________________________________
e de outros interesses difusos e coletivos;
(...)”
O art. 120 da Constituição do Estado do Paraná, por sua
vez, reproduz o acima enunciado nos incisos II e III, acrescendo ao
rol de atividades do MP o contido no inciso XI:
“Art. 120 - São funções institucionais do
Ministério Público:
(...)
XI
–
receber
petições,
reclamações,
representação ou queixas de qualquer pessoa
por desrespeito aos direitos assegurados na
Constituição Federal e nesta, promovendo as
medidas necessárias à sua garantia;
(...)
No mesmo sentido, tem-se a incumbência conferida ao
Parquet pelo art. 57, V, da Lei Complementar n.º 85/99 (Lei Orgânica
do Ministério Público do Paraná):
“Além das funções previstas na Constituição
Federal, na Lei Orgânica Nacional do
Ministério Público, na Constituição Estadual e
em outras leis, incumbe, ainda, ao Ministério
Público:
(...)
V – promover a defesa dos direitos
constitucionais do cidadão para a garantia do
efetivo respeito pelos Poderes Públicos e pelos
prestadores de serviços de relevância
pública...;”
É importantíssimo recordar que a Carta da República
______________________________________________________________________
faz apenas uma única alusão expressa a serviços de relevância
pública, e o faz no art. 197 que trata justamente das ações e serviços
públicos de saúde.
A Carta Federal não deixa qualquer dúvida, também, a
respeito da natureza jurídica da saúde, um direito social (art. 6°),
definindo-a expressamente, ainda, como um serviço de relevância
pública (art. 197), cujo traço distintivo em face de qualquer outro,
sem tal qualificação, repousa basicamente na essencialidade do seu
objeto.
Em se tratando de saúde, tal objeto liga-se
visceralmente à existência e sobrevivência humanas e é daí,
precisamente, que exsurge para o Estado, o dever-poder de prestá-lo
e garantí-lo, no interesse de cada um e da sociedade como um todo,
que lhe atribui importância diferenciada.
A análise semântica das palavras que compõem a
expressão “relevância pública”, permite afirmar que relevância é a
qualidade do que releva, ou seja, indica tudo “aquilo que se destaca
em escala comparativa ou de valores; importância ou relevo”; e
público, por sua vez, diz-se, entre outras coisas, do que é “relativo ou
pertencente a um povo, a uma coletividade”. Logo, da simples
combinação gramatical dos termos sob análise, pode-se concluir que
relevância pública refere-se, grosso modo, a tudo o que uma
determinada comunidade exalta como sendo algo de extremo
significado, com elevado grau de importância e estima para o
conjunto de seus membros.
Albergando tal raciocínio no contexto constitucional,
percebe-se que a CF contém inúmeros princípios jurídicos (implícitos
e explícitos) que, sob a perspectiva que aqui interessa, nada mais
representam do que a juridicização dos valores considerados mais
meritórios pela síntese da vontade nacional, expressa na própria
______________________________________________________________________
Carta Federal, e que reclamam especial atenção e proteção do Estado,
com o intuito de possibilitar a conquista dos objetivos traçados para a
República Federativa do Brasil (art. 3°, CF). Muitos dos serviços que
visam a dar concretude aos valores destacados pela ordem
constitucional não são, entretanto, expressamente qualificados como
de relevância pública, mas nem por isso deixam de caracterizar-se
como essenciais e determinantes na formulação e execução das
denominadas políticas públicas, além do que implicam, por
conseguinte, no respectivo dever de zelo que ao Ministério Público
foi atribuído pelo art. 129, II da CF.
Antonio Augusto Mello de CAMARGO FERRAZ e
Antonio Herman de Vasconcelos e BENJAMIN, no artigo intitulado
“O conceito de relevância pública na Constituição Federal” (In: Série
Direito e Saúde/OPAS/OMS. N. 1, Brasília: OPAS, 1992. P. 29-39)
apresentam uma síntese interessante acerca do significado da
expressão “relevância pública”, inserta na CF:
“... pensamos que seja possível desde logo
estabelecer que a expressão “relevância
pública” nos arts. 129, II e 197 da Constituição
Federal está a significar: a qualidade de
“função pública”, como verdadeiro deverpoder, que regra a garantia da saúde pelo
Estado; a natureza jurídica de direito público
subjetivo da saúde, criando uma série de
interesses na sua realização – públicos,
difusos, coletivos e individuais homogêneos; o
limite da indisponibilidade, tanto pelo prisma
do Estado como do próprio indivíduo, do
direito à saúde; a idéia de que, em sede do art.
197, o interesse primário do Estado
corresponde à garantia plena do direito à
saúde e as suas ações e serviços, sempre
______________________________________________________________________
secundários, só serão legítimas quando
imbuídas de tal espírito; o traço de
essencialidade que marca as ações e serviços
de saúde.”
Vê-se, então, que o fato das ações e serviços de saúde
terem sido explicitamente qualificados como de relevância pública na
CF, não deixa espaço para qualquer discussão acerca de sua
essencialidade e, da mesma forma, impõe aos agentes do Estado que
atuem diligentemente na prestação de tais atividades, a fim de que
sejam aptas, em quantidade e qualidade, a realizar o direito subjetivo
que lhe corresponde.
O contexto apresentado permite evidenciar, portanto,
que o Ministério Público é o responsável em promover as medidas
necessárias para a restauração do respeito dos poderes públicos aos
direitos constitucionalmente assegurados, de forma que clara é sua
legitimidade postulatória nos casos em que o próprio poder público
figura como patrocinador de lesão a interesse social e/ou individual
indisponível, o que faz por meio do instrumento processual que se
apresente como mais adequado para o caso, dada a redação aberta da
norma inserta no art. 127 da Carta Federal.
I.II O direito à saúde como interesse indisponível
Além de configurar prestação de serviço de relevância
pública, o que por si só já justificaria a atuação do Ministério Público,
ainda é de se notar que a saúde é direito indisponível do cidadão. A
saúde é elemento essencial ao gozo da vida e seria difícil vivê-la na
doença.
A Magna Carta em vigor, ampliando o campo de
atuação do Ministério Público, atribuiu-lhe a incumbência da defesa
da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e
individuais indisponíveis (art. 127, caput), ao mesmo tempo em
______________________________________________________________________
que, dentre outras funções institucionais, confiou-lhe o zelo pelo
efetivo respeito dos poderes públicos e dos serviços de relevância
pública aos direitos nela assegurados, promovendo as medidas
necessárias à sua garantia (art. 129, inciso II). No mesmo sentido é o
art. 120, inciso II, da Constituição Estadual.
Diante desse contexto constitucional, extrai-se que o
parquet, de modo genérico, pode e deve promover todas as medidas
necessárias – administrativas e/ou jurídicas - para a restauração do
respeito dos poderes públicos aos direitos constitucionalmente
assegurados aos cidadãos – mormente os direitos fundamentais –
mesmo que no plano individual, desde que se trate de direito
indisponível.
A vida e a saúde são os direitos mais elementares do
ser humano, pressupostos de existência dos demais direitos,
adequando-se na categoria de direitos individuais indisponíveis,
razão pela qual merece especial cuidado, sobretudo no caso sub judice
– quando se trata de recusa de fornecimento de medicamento - que
atinge diretamente a saúde do favorecido, até a sua vida,
comprometendo-a sobremaneira.
Com estas considerações, conclui-se que compete ao
Ministério Público a defesa dos interesses individuais indisponíveis.
A prestação de saúde ao cidadão é dever do Estado e constitui direito
indisponível, sendo pressuposto indissociável ao direito máximo de
todo o cidadão, a vida. Mesmo que se entender como interesse
disponível, a prestação de meios à manutenção da saúde, incluindose aí o fornecimento de remédios, é um serviço público essencial
(muito mais do que relevante) assegurado constitucionalmente, e por
isto, deve ser tutelado pelo Ministério Público por imposição do
artigo 129, inciso II, da Constituição Federal.
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II - DA LEGITIMIDADE PASSIVA / DA RESPONSABILIDADE
DO GESTOR ESTADUAL NO ÂMBITO DO SUS
A Política Nacional de Medicamentos disciplina que a
competência para o fornecimento de medicamentos os divide em
básicos, excepcionais e especiais. Os primeiros cabem ao Município,
que recebe por cada habitante o repasse do Ministério da Saúde para
aquisição de uma lista mínima de 40 medicamentos básicos, afetos à
atenção básica, porém cabe ao Município, com seus próprios
recursos, ampliar a referida lista considerando sua habilitação no
sistema e o perfil epidemiológico de seus munícipes.
Os medicamentos excepcionais, da competência do
Estado, são tidos como medicamentos de uso contínuo e
ininterrupto, afetos às clínicas especializadas e evidentemente mais
caros. Por fim, os medicamentos especiais, da competência da
União, cujo exemplo clássico é a lista de medicamentos para
imunodeficiência primária adquirida – AIDS.
Os medicamentos excepcionais e especiais são
adquiridos pelas instâncias competentes e remetidas aos Municípios
e às Delegacias Regionais de Saúde, das Secretarias Estaduais de
Saúde, após solicitação planejada e formalizada.
Aqueles prescritos ao tratamento da Hepatite B são
todos excepcionais e, conseqüentemente, hão de ser fornecidos pela
Secretaria de Estado da Saúde.
É todo irrelevante o fato de os medicamentos
reclamados pelo doente não constarem do rol de programa instituído
pelo Ministério da Saúde, em especial a Portaria 2.577/GM/2006. Se o
Estado tem um elenco de medicamentos a fornecer, é porque
reconhece seu dever assistencial, não lhe sendo lícito, como é
curial, limitar a assistência apenas aos casos antes programados.
______________________________________________________________________
Surgindo nova necessidade de salvar a espécie, claro está que o
Estado tem o dever de atualizar seus programas assistenciais, para
inclusão do novo atendimento que se mostre relevante e necessário.
Não obstante entender o Ministério Público que o
Sistema Único de Saúde é um sistema em construção, com pouco
mais de 12 anos de vida, que ocupa posição de vanguarda na
estrutura da administração pública e muito aparece nos meios de
comunicação pelo que deixa de fazer e não pelo muito que faz e
salva, é inexorável que há medidas que não podem esperar: há
doentes que esperam medicamentos ainda não existentes (e lutam
contra o tempo!) e há aqueles que esperam medicamentos não
contemplados em Protocolos.
Ademais, conforme disciplinado na Lei n.º 8.080/90,
cabe à direção estadual do SUS, em caráter suplementar, formular,
executar, acompanhar e avaliar a política de insumos e equipamentos
para a saúde.
Nesse sentido, a Política Nacional de Medicamentos,
aprovada pela Portaria n.º 3.916, de 30 de outubro de 1998
(documento n.º 07), estabelece como responsabilidades da esfera
estadual, dentre outras:
“assegurar a adequada dispensação dos
medicamentos promovendo o treinamentos
dos recursos humanos e a aplicação das
normas pertinentes
definir elenco de medicamentos que serão
adquiridos diretamente pelo estado, inclusive
os de dispensação em caráter excepcional,
tendo por base critérios técnicos e
administrativos referidos no capítulo 3, “
Diretrizes”, tópico 3.3, deste documento, e
destinando orçamento adequado a sua
______________________________________________________________________
aquisição.”
Da mesma forma, a Portaria nº 2.577/GM, de 27 de
outubro de 2.006 prevê em seu anexo, no itens 25, 26 e 29:
“25. A execução do Componente de
Medicamentos de Dispensação Excepcional é
descentralizada aos gestores estaduais do
SUS, sendo a aquisição e a dispensação dos
medicamentos de responsabilidade das
Secretarias Estaduais de Saúde, salvo nos
casos a seguir explicitados.
26. A dispensação dos medicamentos
excepcionais deverá ocorrer somente em
serviços de farmácia vinculados às unidades
públicas designadas pelos gestores estaduais.
[...]
29. O financiamento para aquisição dos
medicamentos
do
Componente
de
Medicamentos de Dispensação Excepcional é
da responsabilidade do Ministério da Saúde e
dos Estados, conforme pactuação na Comissão
Intergestores Tripartite.”
Com efeito, torna-se possível afirmar que na seara
Estadual, o Sistema Único de Saúde é gerido pela Secretaria de Estado
da Saúde, tendo esse órgão autonomia para conduzi-lo em seu
território, sendo que, mesmo que o medicamento não esteja no rol de
fármacos indicados em Programa de Medicamentos Excepcionais, a
responsabilidade pelo seu fornecimento ainda assim recai sobre o Réu,
em obediência ao regramento criado para a estruturação do SUS.
______________________________________________________________________
Reforçando esse entendimento, a NOAS-SUS nº 01/2002
(Norma Operacional da Assistência à Saúde), em seu Capítulo III, item
57, alíneas “g” e “h”, define claramente a responsabilidade ora imputada
ao Estado, tendo em vista dispor competir-lhe: “Gestão das atividades
referentes
a:
Tratamento
Fora
de
Domicílio
para
Referência
Interestadual, Medicamentos Excepcionais, Central de Transplantes”,
bem como “a formulação e execução da política estadual de
assistência farmacêutica, de acordo com a política nacional” (grifo
nosso).
Mais recentemente, a Portaria GM/MS nº 399/06, que instituiu o
Pacto
pela
Saúde,
sacramentou
no
item
3.1,
alínea
“d”
que:
“a
responsabilidade pelo financiamento e aquisição dos medicamentos de
dispensação excepcional é do Ministério da Saúde e dos Estados,
conforme pactuação, e a dispensação é responsabilidade do Estado.
Portanto, cabe ao Estado do Paraná arcar com o ônus
de prestar o atendimento à população na assistência à saúde,
fornecendo, pois, todos os medicamentos para tratamento da
hepatite B, por serem tidos como medicamentos excepcionais.
Inegável se torna sua legitimidade passiva ad causam.
III – ADEQUAÇÃO DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA
Poder-se-ia cogitar que a Ação Civil Pública não seria
instrumento adequado à tutela de interesse individual indisponível,
mas tão somente às questões de cunho coletivo.
A ação civil pública não se destina exclusivamente à
tutela de interesses coletivos.
______________________________________________________________________
A lei 8.625/93, Lei Orgânica do Ministério Público
Nacional, preceitua em seu artigo 25, inciso IV, letra “a”que:
IV - promover o inquérito civil e a ação civil
pública, na forma da lei:
a) para a proteção, prevenção e reparação dos
danos causados ao meio ambiente, ao
consumidor, aos bens e direitos de valor
artístico, estético, histórico, turístico e
paisagístico, e a outros interesses difusos,
coletivos e individuais indisponíveis e
homogêneos;
Em comento ao art. 25 da Lei n.º 8.625, de 12.02.1993,
que preconiza ser função do Ministério Público promover o inquérito
civil e a ação civil pública para proteção a interesses individuais
indisponíveis, preleciona o preclaro prof. PEDRO ROBERTO
DECOMAIN, in verbis:
... a legitimação do Ministério Público para
defesa judicial de interesses individuais
indisponíveis, isto é, interesse de cuja
satisfação o titular respectivo não está
legalmente autorizado a abrir mão, assim
como não o está qualquer representante legal
seu, resulta até mesmo de dispositivo
constitucional. Realmente o artigo 127 da
Constituição Federal, ao tempo em que
considera o Ministério Público como
instituição permanente e essencial à função
jurisdicional do Estado, lhe atribui também a
defesa da ordem jurídica, do regime
democrático e dos interesses sociais e
______________________________________________________________________
individuais indisponíveis.1
Afora a subsunção legal, a tese defendida neste capítulo
ainda é recepcionada pelo Superior Tribunal de Justiça, órgão
constitucionalmente incumbido da pacificação da interpretação
infraconstitucional do direito brasileiro, conforme o seguinte arresto,
cujo caso concreto tratava exatamente do fornecimento de
medicamento a hipossuficiente:
PROCESSUAL CIVIL E CONSTITUCIONAL.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CASSAÇÃO DE
LIMINAR. EXTINÇÃO DO PROCESSO
POR
ILEGITIMIDADE
ATIVA.
FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO,
PELO
ESTADO,
À
CRIANÇA
HIPOSSUFICIENTE, PORTADORA DE
DOENÇA GRAVE. OBRIGATORIEDADE.
AFASTAMENTO DAS DELIMITAÇÕES.
PROTEÇÃO
A
DIREITOS
FUNDAMENTAIS. DIREITO À VIDA E À
SAÚDE. DEVER CONSTITUCIONAL. ART.
7º, C/C OS ARTS. 98, I, E 101, V, DO
ESTATUTO
DA
CRIANÇA
E
DO
ADOLESCENTE. ARTS. 5º, CAPUT, 6º, 196 E
227, DA CF/1988. PRECEDENTES DESTA
CORTE SUPERIOR E DO COLENDO STF.
1. Recurso especial contra acórdão que
extinguiu o processo, sem julgamento do
mérito, em face da ilegitimidade ativa do
Ministério Público do Estado do Rio Grande
do Sul, o qual ajuizou ação civil pública
objetivando a proteção de interesses
1
DECOMAIN, Pedro Roberto. Comentários à lei orgânica nacional do ministério público. Ed. Obra
Jurídica. 1996, p. 150.
______________________________________________________________________
individuais indisponíveis (direito à vida e à
saúde de criança ou adolescente), com pedido
liminar para fornecimento de medicação
(hormônio do crescimento recombinante TTO)
por parte do Estado.
2. O art. 7º, c/c os arts. 98, I, e 101, IV, do
Estatuto da Criança e do Adolescente, dão
plena eficácia ao direito consagrado na Carta
Magna (arts. 196 e 227), a inibir a omissão do
ente público (União, Estados, Distrito Federal
e Municípios) em garantir o efetivo
tratamento médico a menor necessitado,
inclusive com o fornecimento, se necessário,
de medicamentos de forma gratuita para o
tratamento, cuja medida, no caso dos autos,
impõe-se de modo imediato, em face da
urgência e conseqüências que possam
acarretar a não-realização.
3. Pela peculiaridade do caso e, em face da sua
urgência, há que se afastarem delimitações na
efetivação
da
medida
sócio-protetiva
pleiteada, não padecendo de qualquer
ilegalidade a decisão que ordena que a
Administração Pública dê continuidade a
tratamento
médico,
psiquiátrico
e/ou
psicológico de menor.
4. O poder geral de cautela há que ser
entendido com uma amplitude compatível
com a sua finalidade primeira, que é a de
assegurar a perfeita eficácia da função
jurisdicional. Insere-se, aí, sem dúvida, a
garantia da efetividade da decisão a ser
proferida. A adoção de medidas cautelares
(inclusive as liminares inaudita altera pars) é
______________________________________________________________________
crucial para o próprio exercício da função
jurisdicional, não devendo encontrar óbices,
salvo no ordenamento jurídico.
5. O provimento cautelar tem pressupostos
específicos para sua concessão. São eles: o
risco de ineficácia do provimento principal e a
plausibilidade do direito alegado (periculum
in mora e fumus boni iuris), que, presentes,
determinam a necessidade da tutela cautelar e
a inexorabilidade de sua concessão, para que
se protejam aqueles bens ou direitos de modo
a se garantir a produção de efeitos concretos
do provimento jurisdicional principal.
6. A verossimilhança faz-se presente (as
determinações preconizadas no Estatuto da
Criança com o do Adolescente – Lei nº
8.069/90, em seus arts. 7º, 98, I, e 101, V, em
combinação com atestado médico indicando a
necessidade do tratamento postergado).
Constatação, também, da presença do
periculum in mora (a manutenção do decisum
a quo, determinando-se a suspensão do
tratamento (fornecimento do medicamento),
com risco de dano irreparável à saúde do
menor). Se acaso a presente medida não for
outorgada, poderá não mais ter sentido a sua
concessão, haja vista a possibilidade de danos
irreparáveis e irreversíveis ao menor.
7. Prejuízos irá ter o menor beneficiário se não
lhe for concedida a liminar, visto que estará
sendo usurpado no direito constitucional à
saúde, com a cumplicidade do Poder
Judiciário. A busca pela entrega da prestação
jurisdicional deve ser prestigiada pelo juiz, de
______________________________________________________________________
modo que o cidadão tenha, cada vez mais
facilitada, com a contribuição do Poder
Judiciário, a sua atuação em sociedade, quer
nas relações jurídicas de direito privado, quer
nas de direito público.
8. Precedentes desta Corte Superior e do
colendo STF.
9. Recurso provido.(STJ, RESP 662033 / RS; 1a
Turma, rel. Ministro JOSÉ DELGADO, DJ
08.11.2004 p. 191)(grifo nosso)
Ao examinar a possibilidade de utilização da ação civil
pública para tutelar a saúde, frente a interesse individual indisponível,
Marlon Alberto Weichert assinala:
“A ação civil pública é, por excelência, a ferramenta de
promoção e defesa judicial, pelo Ministério Público, do direito
à saúde. Em função da nota constitucional, seu uso deve ser
admitido – sem a possibilidade de barreiras legais – para a
defesa dos interesses coletivos e indisponíveis, de modo
amplo.”2
Com estas considerações, denota-se a aptidão da Ação
Civil Pública como instrumento para tutelar interesses indisponíveis,
ainda que de natureza individual.
IV - A SAÚDE COMO
DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
COROLÁRIO
DA
2
WEICHERT, Marlon Alberto. A saúde como serviço de relevância pública e a ação civil pública em sua defesa. in Ação civil
Pública: 20 anos da Lei n. 7347/85. ROCHA, João Carlos de Carvalho, HENRIQUES FILHO, Tarcísio Humberto Parreira e
CAZZETA, Ubiratan (orgs). Belo Horizonte: Del Rey, 2005. p. 525.
______________________________________________________________________
A Carta Federal proclama que a República Federativa
do Brasil, enquanto Estado Democrático de Direito, tem como
fundamento a dignidade da pessoa humana.
A expressão “dignidade da pessoa humana” - princípio
jurídico essencial contido no art. 1º, III, da CF - já se encontrava
inserta na Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, na
qual se assevera que o reconhecimento da “dignidade inerente a
todos os membros da família humana é o fundamento da liberdade,
da justiça e da paz no mundo”.
O art. 1° desse diploma internacional ressalta:
“Todos os homens nascem livres e iguais em
dignidade e direitos. São dotados de razão e
consciência e devem agir em relação uns aos
outros com espírito de fraternidade”.
Karl LARENZ3, instado a pronunciar-se sobre o
personalismo ético da pessoa no direito privado, reconhece na
dignidade pessoal a prerrogativa de todo ser humano em ser
respeitado como pessoa, de não ser prejudicado em sua existência (a
vida, o corpo e a saúde) e de fruir de um âmbito existencial próprio.
Isso significa dizer, então, que a pessoa humana é um bem, e a
dignidade, o seu valor.
Mas o direito do século XXI não se contenta com
conceitos axiológicos formais, que podem ser usados retoricamente
para qualquer tese. Demanda, sim, o aprofundamento dos mesmos e
especialmente, neste caso, da idéia que o princípio jurídico da
dignidade contempla.
3
LARENZ, Karl. Derecho civil: parte general. Madri: Editoriales de Derecho Reunidas, 1978. p. 46.
______________________________________________________________________
Como o próprio nome revela, o princípio da dignidade
da pessoa fundamenta-se na essência da pessoa humana e esta, por
sua vez, pressupõe, antes de mais nada, na presença de uma
condição objetiva: a própria vida. Considerando-se cada indivíduo
em si mesmo, tem-se que a vida é condição necessária da própria
existência. Logo, a dignidade do ser humano impõe um primeiro
dever básico, que é, justamente, o de reconhecer a intangibilidade da
vida, e esse pressuposto configura-se como um preceito jurídico
absoluto - um imperativo jurídico categórico - do qual decorre,
logicamente e como conseqüência do respeito à vida, o fato da
dignidade dar embasamento jurídico para se exigir o respeito à
integridade física e psíquica (condições naturais) e aos meios
mínimos para o exercício da própria vida (condições materiais)4.
Como fundamento primeiro da República, o princípio
jurídico da dignidade tem, portanto, a proteção e a defesa da vida
humana como pressuposto, pois sem vida não há pessoa, e sem
pessoa, não há que se falar em dignidade. Trata-se de preceito
absoluto, que não comporta exceção e está, de resto, ratificado pelo
caput do art. 5º da CF.
Essa tese é reconhecida, acima de todas as outras
(inclusive as de ordem econômico-financeiras), pelos nossos
Tribunais, como se lê no seguinte pronunciamento do STF:
“Entre proteger a inviolabilidade do direito à
vida, que se qualifica como direito subjetivo
inalienável
assegurado
pela
própria
Constituição da República (art. 5º, caput), ou
fazer prevalecer, contra essa prerrogativa
AZEVEDO, Antonio Junqueira de. Caracterização jurídica da dignidade da pessoa humana. RT , v. 797, ano 91, p. 11-26,
mar. 2002.
4
______________________________________________________________________
fundamental, um interesse financeiro e
secundário do Estado, entendendo — uma vez
configurado esse dilema — que razões de
ordem ético-jurídica impõem ao julgador uma
só e possível opção: o respeito indeclinável à
vida.” (STF– Petição n.º 1246-1-SC - MIN.
CELSO DE MELLO).
Ora, se o direito à vida está intrinsecamente ligado à
idéia de dignidade humana, como visto, tem-se que o seu corolário
necessário - o direito à saúde – também o está, uma vez que este (a
saúde), na sua essência, cuida da preservação daquela (a vida).
A saúde, concebida como o “estado completo de bemestar físico, mental e social e não simplesmente como a ausência de
doença ou enfermidade”5 é, pois, direito humano fundamental,
oponível ao Estado nos termos do art. 196 da CF, que viabiliza e
garante a própria vida, pressuposto da dignidade da pessoa humana
e, como tal, deve ser incansavelmente protegido e respeitado, sendo
inadmissível qualquer conduta comissiva ou omissiva, especialmente
da Administração Pública, tendente a ameaçá-lo ou frustrá-lo.
5
Conceito da Organização Mundial da Saúde
______________________________________________________________________
V - A ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA
A Lei Orgânica da Saúde (Lei Federal n° 8.080, de 19 de
setembro de 1990) estabelece:
Art. 2°. A saúde é um direito fundamental do
ser humano, devendo o Estado prover as
condições indispensáveis ao seu pleno
exercício.
§ 1°. O dever do Estado de garantir a saúde
consiste na formulação e execução de políticas
econômicas e sociais que visem à redução de
riscos de doença e de outros agravos e no
estabelecimento de condições que assegurem
acesso universal e igualitário às ações e aos
serviços para a sua promoção, proteção e
recuperação.
Art. 6°. Estão incluídas ainda no campo de
atuação do Sistema Único de Saúde - SUS:
I - a execução de ações:
... (omissis)
d) de assistência terapêutica
inclusive farmacêutica.
integral,
Art. 7°. As ações e serviços públicos de saúde
e os serviços privados contratados ou
conveniados que integram o Sistema Único de
Saúde - SUS são desenvolvidos de acordo com
as diretrizes previstas no artigo 198 da
______________________________________________________________________
Constituição Federal, obedecendo ainda aos
seguintes princípios:
I - universalidade de acesso aos serviços de
saúde em todos os níveis de assistência;
II - integralidade de assistência, entendida
como um conjunto articulado e contínuo das
ações e serviços preventivos e curativos,
individuais e coletivos, exigidos para cada
caso em todos os níveis de complexidade do
sistema.
Art. 43. A gratuidade das ações e serviços de
saúde fica preservada nos serviços públicos e
privados contratados, ressalvando-se as
cláusulas ou convênios estabelecidos com as
entidades privadas.
Logo, sendo a saúde um direito público subjetivo do
cidadão e dever do Estado, cuja efetivação constitui interesse
primário, há de ser ele satisfeito de modo integral, resolutivo e
gratuito (artigos 198, inciso II, da Constituição Federal, artigos 7º, inc.
XII e 43, ambos da Lei Orgânica da Saúde), inclusive com a adequada
assistência farmacêutica - artigo 6º, inciso I, alínea ‘d’, da LOS.
A ”integralidade da assistência terapêutica, inclusive
farmacêutica” abarca como se sabe, de forma harmônica e igualitária,
as ações e serviços de saúde preventivos e curativos (ou
assistenciais), implicando em atenção individualizada, para cada
caso, segundo as suas exigências, em todos os níveis de
complexidade do sistema (federal, estadual, e municipal). Diz-se
assistência farmacêutica na lei, pois é evidentemente impossível ao
______________________________________________________________________
Estado dar saúde diretamente aos seus cidadãos, cabendo-lhe, assim,
fornecer-lhes todos os insumos medicamentosos para que seja ela
recuperada.
Desse princípio é possível confirmar-se, uma vez mais,
o direito dos usuários na obtenção de medicamentos das mãos do
Estado, medicamentos este adequados à preservação de sua saúde,
direito este que encontra guarida, inclusive, na Lei Orgânica da
Seguridade Social (Lei Federal nº 8.212/1991):
Art. 2º. A saúde é direito de todos e dever do
Estado, garantido mediante políticas sociais e
econômicas que visem à redução do risco de
doença e de outros agravos e ao acesso
universal e igualitário às ações e serviços para
sua promoção, proteção e recuperação.
Parágrafo único. As atividades de saúde são
de relevância pública e sua organização
obedecerá aos seguintes princípios e
diretrizes:
(...)
d) atendimento integral, com prioridade para
as atividades preventivas;
O artigo 7º, inciso XII, da LOS, prevê
expressamente
o
princípio
resolutivo,
conforme se vislumbra da transcrição abaixo:
Art. 7. As ações e serviços públicos de saúde e
os serviços privados contratados ou
______________________________________________________________________
conveniados que integram o Sistema Único de
Saúde – SUS são desenvolvidos de acordo
com as diretrizes previstas no artigo 198 da
Constituição Federal, obedecendo ainda aos
seguintes princípios:
(...)
XII – capacidade de resolução dos serviços em
todos os níveis de assistência.
Na lição de GUIDO IVAN DE CARVALHO e LENIR
SANTOS:
“(...) o ‘princípio resolutivo’ das ações e
serviços de saúde ‘é aquele que resolve o
problema trazido ou apresentado pelo
paciente, seja mediante a aplicação, no ato, de
um medicamento resolutivo, seja mediante a
prescrição terapêutica que vai resolver,
gradualmente, o problema, ou seja ainda
mediante a indicação de uma cirurgia, a
recomendação de uma órtese ou de mudança
de estilo de vida’”.6
Vale repisar, portanto, que a saúde não é apenas
uma contraprestação de serviços devida pelo Estado ao cidadão, mas
sim um direito fundamental do ser humano, devendo, por isso
mesmo, ser universal, igualitário e integral, não se podendo prestar
soluções parciais, como pretendem alguns, sem com isso negar o
6
in Comentários à Lei Orgânica de Saúde, 2ª edição, atualizada e ampliada. Editora Hucitec - São Paulo,
1995, pág.88.
______________________________________________________________________
direito à saúde.
Frise-se, assim, que o direito de Elton Junior Teixeira
aqui defendido não se limita simplesmente à obtenção de qualquer
remédio. É necessário, portanto, que seja exatamente aquele que
venha a solucionar a enfermidade apresentada, ou mesmo a
estabilizá-la, proporcionando-lhe uma melhor qualidade de vida.
Desta forma, não só pelo fato dos precários recursos do
beneficiado, o que dramatiza, sobremaneira o seu quadro, mas,
principalmente, por se tratar de um direito líquido e certo que está
sendo violado, expondo seu titular a risco de vida pela evolução da
doença da qual é portadora (hepatite B), é que se busca a garantia da
devida prestação por parte do Estado, obrigação esta definida no
Sistema Único de Saúde, consoante prevê a NOAS – SUS n. 01/2002,
n. 57, Responsabilidades, ‘h’ e ‘i’ e reforçada pelo inciso XVIII do art.
12, do Código de Saúde do Estado (Lei Estadual nº 13/331/01).
Diante disso, a disponibilização do medicamento
ADEFOVIR 10 mg, adequado ao tratamento do paciente Elton
Teixeira Junior, conforme será relatado no próximo capítulo, deve se
dar de modo imediato, sem que seja admitida qualquer espécie de
escusa ou justificativa.
VI - PATOLOGIA DO CIDADÃO ELTON JUNIOR
TEIXEIRA
Conceito e informações básicas sobre a doença.7
A Hepatite B é definida como inflamação do fígado
causada por uma infecção pelo Vírus da Hepatite B (HBV), um
7
site http://www.aids.gov.br/assistencia/manual_dst/hepatite.htm.
______________________________________________________________________
vírus DNA, da família Hepdnaviridae.
Do ponto de vista epidemiológico a transmissão sexual
de agentes infecciosos causadores de hepatite ocorre mais
freqüentemente com os vírus das hepatites tipos A, B, C e Delta. Os
tipos B e C podem evoluir para doença hepática crônica, e têm sido
associados com carcinoma hepatocelular primário.
Dentre os fatores que influenciam o risco de infecção
pelo HBV citamos: número de parceiros, freqüência das relações
sexuais, tipo de prática sexual (...), associação com uso comum de
seringas e agulhas, concomitância de outras DST (...).
No Brasil, estudos de prevalência do HBV detectaram
índice de infecção médio de 8,0% na região da Amazônia legal, de
2,5% nas regiões Centro-Oeste e Nordeste, de 2,0% na região Sudeste
e de 1,0% na região Sul.
Quadro clínico
O período de incubação da Hepatite B aguda situa-se
entre 45 e 180 dias e a transmissão é usualmente por via parenteral
embora outras vias (oral, sexual e vertical8) foram demonstradas.
Nos pacientes sintomáticos, a hepatite B, usualmente
evolui nas seguintes fases:
 fase prodrômica: sintomas inespecíficos de anorexia, náuseas e
vômitos, alterações do olfato e paladar, cansaço, mal-estar,
artralgia, mialgias, cefaléia e febre baixa.
 fase ictérica: inicia-se após 5 a 10 dias da fase prodrômica,
caracterizando-se pela redução na intensidade destes sintomas
e a ocorrência de icterícia. Colúria precede esta fase por 2 ou 3
8
Que é a situação do beneficiado, conforme relatório médico de 30.05.2005 – docs. 51/52.
______________________________________________________________________

dias.
fase
de
convalescença:
a
sintomatologia
gradativamente, geralmente em 2 a 12 semanas.
desaparece
A Hepatite B pode evoluir cronicamente, o que se
demonstra pelos marcadores laboratoriais, testes de função
hepática e histologia anormais, e doença persistente por mais de
seis meses.


A Hepatite B crônica pode evoluir de forma:
persistente: de bom prognóstico, em que a arquitetura do lóbulo
hepático é preservada.
ativa: caracterizada por necrose hepática, que pode evoluir
para cirrose hepática ou para câncer.
Diagnóstico: laboratorial
Realiza-se por meio dos marcadores sorológicos do
vírus da Hepatite B:
 o antígeno de superfície da Hepatite B (HBsAg) é o primeiro
marcador a aparecer, geralmente precede a hepatite
clinicamente evidente, e também está presente no portador
crônico; (conforme exame do micropar laboratório de
06.08.2003 – docs. anexo)
 o antígeno HBe (HBeAg) é detectado logo após o aparecimento
do HBsAg, sua presença indica replicação viral ativa. Sua
positividade por 8 a 12 semanas indica o desenvolvimento de
hepatite crônica B;
 o anticorpo contra o antígeno central da Hepatite B tipo IgM
(anti-HBc IgM) é um marcador da replicação virótica, aparece
no início da hepatite clínica e pode ser o único marcador
sorológico do tipo agudo presente em alguns pacientes (o
paciente com Hepatite crônica B pode apresentar o anti-HBc
IgM em baixa concentração no soro, não sendo detectado
______________________________________________________________________
nestas circunstâncias, de modo que o resultado pode ser
positivo na Hepatite aguda B, e negativo, na Hepatite crônica
B);
 o anticorpo superficial da Hepatite B (anti-HBs) pode aparecer
tardiamente na fase convalescente, e sua presença indica
imunidade.
Outros testes refletem a lesão hepatocelular na hepatite
viral aguda:
 as aminotransferases (alanina aminotransferase /ALT e a
aspartato aminotransferase /AST), previamente denominadas
transaminases (respectivamente, TGP e TGO) geralmente
encontram-se acima de 500 U.I./L
 a bilirrubina total se eleva, podendo alcançar níveis entre 5 e 20
mg %.
 a fosfatase alcalina geralmente está aumentada.
 o leucograma geralmente revela neutropenia com linfocitose
relativa.
Na hepatite crônica, a biópsia hepática definirá o
diagnóstico histológico e permitirá avaliação da atividade da doença.
(Ver docs. em anexo)
Tratamento
De modo genérico, o indivíduo com hepatite viral
aguda, independentemente do tipo viral que o acometeu, deve ser
acompanhado ambulatorialmente, na rede de assistência médica.
Basicamente o tratamento consiste em manter repouso domiciliar
relativo, até que a sensação de bem-estar retorne e os níveis das
aminotransferases (transaminases) voltem aos valores normais. Em
média, este período dura quatro semanas. Não há nenhuma restrição
de alimentos no período de doença. É desaconselhável a ingestão de
bebidas alcoólicas.
______________________________________________________________________
Os pacientes com hepatite causada pelo HBV poderão
evoluir para estado crônico e deverão ser acompanhados com
pesquisa de marcadores sorológicos (HBsAg e Anti-HBs) por um
período mínimo de 6 a 12 meses. Aqueles casos definidos como
portadores crônicos, pela complexidade do tratamento, deverão ser
encaminhados para serviços de atendimento médico especializados.
A falta do medicamento recomendado pelo médico do
beneficiado, pode trazer-lhe conseqüências gravosas, conforme já
exposto, pois a hepatite “B”, se não combatida com eficácia pode
provocar cirrose e neoplasia hepática.
As vias administrativas foram esgotadas da seguinte
forma. Após receber a prescrição médica o usuário se dirigiu à 17 a
Regional de Saúde a fim de solicitar o medicamento. Informalmente,
os servidores daquela unidade lhe informaram que não havia
disponibilidade do medicamento Adefovir 10 mg, por não fazer parte
da Relação Nacional de Medicamentos Essenciais – RENAME, e não
existir de forma genérica e não seria possível atender o pedido.
Em seguida, esta Promotoria de Justiça, enviou ofício a
17ª Regional de Saúde, juntando a documentação que demonstrava a
necessidade do medicamento, e obteve a mesma resposta. Da mesma
forma, o pedido foi negado. Consta cópia do procedimento em
anexo.
Após esgotar as vias administrativas e verificando que
o Estado do Paraná não se dispõe a adquirir o medicamento em
caráter extraordinário, resta ao Ministério Público, na defesa de
interesse indisponível de usuário do SUS, buscar a via judicial.
Primeiramente, quer-se deixar claro que a presente
ação não tem como objetivo a obrigação do Estado em fornecer
ADEFOVIR 10 mg a todos os portadores de Hepatite B. Outrossim,
o Ministério Público está ciente das repercussões que um acréscimo
______________________________________________________________________
de custos na política farmacêutica representa à administração do
Estado. Em especial, sabe-se perfeitamente que o acréscimo de
gastos leva inexoravelmente à redução da gama de atendimentos.
Em valores de comércio varejista, a aquisição do
ADEFOVIR 10 mg custa cerca de R$ 750,00 ao mês (orçamentos
anexos).
Farmácias:
Hepsera 10mg
(30
comprimidos)
Farmácia
Farmácia Central Líder
Drogamais Center de Ibiporã
Médica
Ibiporã
Ibiporã
R$ 751,72
R$ 751,72
R$ 751,72
Por tais razões, há que se reservar o fornecimento do
ADEFOVIR 10 mg pelo poder público a situações excepcionais.
No caso em apreço, demonstrou-se nos parágrafos
anteriores que o usuário do SUS Elton Junior Teixeira tem drásticos
problemas com a doença, e a administração do medicamento
ADEFOVIR 10 mg comprovadamente lhe conferiria substancial
melhora na qualidade de vida e reduziria o risco à saúde inerente
aos quadros de Hepatite B. É, portanto, uma situação peculiar que
merece a atenção do poder público.
Contudo o medicamento prescrito é produzido no
exterior e possui custo elevadíssimo, tanto que, para obtenção do
orçamento, há bastante dificuldade junto as farmácias, que apenas
fornecem orçamento de forma bastante simples como demonstram os
documentos anexos.
______________________________________________________________________
Mesmo com as vantagens da administração única
diária, o custo-benefício, em termos de administração pública, para
fornecimento do ADEFOVIR 10 mg aos usuários do SUS seria alto.
Em geral, a administração do ADEFOVIR 10 mg controla a hepatite b
e as suas variações. Infelizmente, este não é o caso de Elton Junior
Teixeira. Ele é um indivíduo, com suas características particulares e
merece a atenção e respeito do poder público.
Não há nenhuma pertinência eventual alegação do
Poder Público de insuficiência de recursos. Até porque, em um país
onde a carga tributária supera 35% do PIB9, número equivalente ao
do Reino Unido e 50% superior ao dos Estados Unidos da América, o
Poder Público não conta com qualquer escusa.
Também não mereceria acolhida o argumento de que o
Judiciário não pode se imiscuir na administração pública. Tal
argumento não pode ser aplicado à tutela dos direitos do cidadão,
ainda mais aqueles relativos à vida. Outrossim, sempre é importante
lembrar que "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário
lesão ou ameaça a direito", artigo 5o, inciso XXXV da Constituição
Federal.
Por fim, os critérios de razoabilidade se mostram
justificados na presente ação. Primeiramente, a aquisição do
ADEFOVIR 10 mg representará apenas um acréscimo em relação
àquilo que já é gasto com a aquisição dos demais medicamentos no
tratamento da Hepatite B. Também, por uma postura pessoal do
usuário, as despesas relativas ao monitoramento da Hepatite B (todos
inerentes ao uso do ADEFOVIR 10 mg) estão sendo suportados pelo
próprio usuário e sua família e alcançam cerca de R$ 750,00 mensais.
Ora, o usuário pode simplesmente cessar tais gastos e exigir que o
Estado o faça, o que seria administrativamente deferido. Mas, com a
9
FOLHA DE SÃO PAULO, caderno folha dinheiro, página B1, 30 de janeiro de 2005
______________________________________________________________________
administração do ADEFOVIR 10 mg tais gastos extraordinários
praticamente desaparecem. Inserindo tal fator no custo geral do
tratamento conclui-se que o efetivo acréscimo de despesa é
praticamente nulo. Com a evidente vantagem da qualidade de vida e
redução do risco de vida.
X – INVIABILIDADE
PRÓPRIO USUÁRIO
DE
AQUISIÇÃO
PELO
Em capítulo apropriado foi ressaltada a obrigação do
Estado em garantir a saúde de seus cidadãos, inclusive através do
fornecimento dos medicamentos necessários ao tratamento. Tal
situação, em princípio, independe da condição sócio-econômica do
paciente. Em um país onde a carga tributária consome mais de 1/3 da
riqueza produzida pelos cidadãos, não há justificativa para
diferenciar classes sociais.
Não obstante tal advertência, é importante destacar
que o jovem ELTON JUNIOR TEIXEIRA não possui condições
financeiras de arcar com o custeio do ADEFOVIR 10 mg sem
prejuízo da subsistência própria e de sua família, conforme
comprovante de renda em anexo. Elton é técnico em informática e
recebe cerca de R$ 396,00 mensalmente. Deste modo, torna-se
impossível a aquisição do medicamento. A renda familiar é
complementada pela atividade do pai. Não obstante, felizmente, não
seja uma família em condição de pobreza, a renda do pai é apenas a
suficiente para manter as demais despesas da residência, sem espaço
para qualquer outro investimento.
Nestes termos, é sensato que o Estado venha a assumir
seu papel de redistribuidor de rendas e promova o fornecimento de
medicamentos àqueles que não têm condições de adquiri-lo por
meios próprios.
______________________________________________________________________
XI - ANTECIPAÇÃO DE TUTELA
A assistência e o atendimento de saúde, por guardarem
estreita relação coma manutenção da vida humana, são sempre
relevantes e urgentes. Diante da urgência reclamada pela espécie,
requer-se a concessão liminar da antecipação dos efeitos da tutela
pretendida, nos termos do dispostos nos artigos 273, inciso I, e 461 do
Código de Processo Civil.
O acolhimento liminar dos efeitos da tutela urge e
impera, porquanto o provimento da pretensão, somente ao final,
poderá ser inócuo para prevenir os danos à saúde de Elton Junior
Teixeira ou mesmo para evitar sua morte. Ele há muito vem
suportando sofrimento devido à omissão do Poder Público Estadual,
que lhe nega, sob argumento ilegais, o atendimento integral e
prioritário a que faz jus por força de Lei. Não é possível aquilatar o
alcance dos danos à saúde física e psíquica do usuário do SUS,
podendo ser afirmado, porém, que eles são grandiosos, dramáticos,
presentes e contínuos, os quais devem ser rapidamente afastados
pelo Poder Judiciário.
Relevante é o fundamento da lide, pois pretende-se, em
última análise, a manutenção da vida e da saúde de um ser humano,
um cidadão, trabalhador.
O fumus boni juris está presente, haja vista a existência
de preceito constitucional obrigando o atendimento, somado à
comprovação, médico-técnica do risco de vida por que passa o
paciente, conforme analisado em capítulos específicos.
Da mesma forma, vê-se presente o periculum in mora,
talvez mais gritante ainda, já que o perigo maior a um ser humano é
______________________________________________________________________
a perda de sua vida.
Tendo em conta que após a oitiva preliminar do Estado
do Paraná não cabe oportunidade ao Ministério Público se
manifestar, até porque o trâmite frustraria os critérios de urgência,
por questões de oportunidade cogita-se desde já que o Estado do
Paraná possa alegar que não há urgência na concessão da
antecipação em vista do tempo que o usuária já convive com a
doença.
O fato de Elton conviver com a hepatite b desde 2003
não significa que sua saúde não se degenera e que não há risco de,
subitamente, vir a falecer. Como se ressaltou em capítulo próprio,
os picos da hepatite podem levar a morte a qualquer momento.
Além do risco de uma cirrose ou um câncer, a hepatite b, se não
tratada, dia-a-dia degenera seus órgãos e abrevia sua vitalidade.
Por estas razões, cada dia que passa é de suma
importância ao paciente. Cada dia de não administração do
ADEFOVIR 10 mg representa um risco de vida e uma certeza de
degeneração da saúde. Via de conseqüência, cada dia fazendo o uso
do ADEFOVIR 10 mg representa menos riscos e mais vida.
Consoante o art. 273 do Código de Processo Civil, “o
juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou
parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde
que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da
alegação e (... haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil
reparação ...”
No presente caso o serviço relevante de saúde –
dispensação de medicamentos – não está sendo prestado, ferindo
dispositivos constitucional e legais com grande prejuízo a direito
fundamental – a vida, consubstanciado pela saúde.
______________________________________________________________________
Sustenta o Professor José Afonso da Silva:
“A garantia das garantias consiste na eficácia e
aplicabilidade
imediata
das
normas
constitucionais. Os direitos, liberdades e
prerrogativas consubstanciados no Título II,
caracterizados como direitos fundamentais só
cumprem sua finalidade se as normas que os
expressem tiverem efetividade. (...)
Sua existência só por si, contudo, estabelece
uma ordem aos aplicadores da Constituição
no sentido de que o princípio é o da eficácia
plena e aplicabilidade imediata das normas
definidoras dos direitos fundamentais:
individuais, coletivos, sociais (...)
Por isso, revela-se, por seu alto sentido
político, como eminente garantia política de
defesa da eficácia jurídica e social da
Constituição” (SILVA, José Afonso da. Curso
de Direito Constitucional Positivo. São Paulo:
Malheiros)
De igual forma, não há possibilidade do provimento
antecipado acarretar perigo de irreversibilidade, já que o estado
anterior à antecipação dos efeitos tem amplas condições de voltar a se
constituir, portanto, não há como prevalecerem os argumentos relativos
à eventual inexistência dos requisitos necessários à concessão liminar.
Examinando hipótese semelhante a dos autos, o Egrégio
Tribunal de Justiça deste Estado concluiu que:
______________________________________________________________________
“SUS – Fornecimento de medicamento – Necessidade. A
antecipação de tutela tem por objetivo afastar o perigo da
demora ou do retardamento da providência judicial
definitiva. Na hipótese de o medicamento não ser
adquirido pelo SUS com a presteza e a rapidez
necessárias, a possibilidade de conservação e
recuperação da vida do agravado sofrerá sério e efetivo
dano, não sendo razoável sacrificar a vida e a saúde de
membro da coletividade em razão da obediência estrita a
procedimentos orçamentários.”10
Assim sendo, o Ministério Público requer seja o Estado
do Paraná determinado a fornecer, in limine, observado o prazo de 72
horas, conforme artigo 2º da Lei n.º 8.437/92, para compelir o
requerido, durante o transcorrer da ação e no prazo de 15 dias, a
fornecer à Elton Junior Teixeira ADEFOVIR 10 mg, sob pena de
multa diária de R$ 200,00 (duzentos reais) por dia de atraso no
fornecimento, nos termos do artigo 11 da Lei n.º 7.347/85, em caso de
descumprimento, a ser revertida em prol da paciente, sem prejuízo
de outras providências tendentes ao cumprimento da ordem judicial,
inclusive a responsabilização por ato de improbidade administrativa.
O prazo estabelecido no pedido, para cumprimento da
obrigação de fazer, não deve iludir o julgado quanto ao perigo da
demora. É facilmente perceptível que as providências reclamadas
nesta inicial não se resolvem da noite para o dia. A administração
pública estadual terá de tomar medidas de caráter financeiro e
contábil para viabilizar a aquisição. Talvez necessite adquiri-los
emergentes num primeiro momento e, depois, mediante
procedimentos licitatórios.
Todavia, é perfeitamente justificado o receio de
10
TJMG – MS 1.0024.04.405700-8/001. Rel. Des. Wander Marotta. J. em 16/11/04.
______________________________________________________________________
ineficácia do provimento final, caso a Administração não seja
obrigada, desde já, a tomar as providências que ensejarão a
observância da ordem Judicial no prazo estabelecido na respectiva
Decisão. Esta a razão da necessidade da concessão liminar dos afeitos
da tutela pleiteada. Há risco à vida e à saúde da usuária, facilmente
evitável se o Poder Público Estadual for compelido a atuar desde
agora, com tempo razoável para alcançar o resultado
consubstanciado no pedido desta ação civil pública.
XI.I Tutela Antecipada contra o Poder Público
Embora a nefasta e descomprometida lei 9.494/97 tenha
buscado restringir sensivelmente a possibilidade de concessão de
antecipação de tutela contra o poder público, em uma nítida
manobra corporativista, verifica-se que tal diploma, independente de
sua inconstitucionalidade, não se aplica ao caso em apreço.
Isto porque a vedação alcança basicamente a concessão
de benefícios a servidores públicos, já que faz referência ao artigo
5º11, e seu parágrafo único12, e 7º13 da Lei nº 4.348, de 26 de junho de
1964, ao art. 1º14, e seu § 4º15, da Lei nº 5.021, de 9 de junho de 1966, e
arts. 1º16, 3º17 e 4º18 da Lei nº 8.437, de 30 de junho de 1992.
“não será concedida a medida liminar de mandados de segurança impetrados visando à reclassificação
ou equiparação de servidores públicos, ou à concessão de aumento ou extensão de vantagens.” (grifo
nosso)
12
“os mandados de segurança a que se refere este artigo serão executados depois de transitada em julgado a
respectiva sentença” (grifo nosso)
13
“o recurso voluntário ou ex officio, interposto de decisão concessiva de mandado se segurança que
importe outorga ou adição de vencimento ou ainda reclassificação funcional, terá efeito suspensivo.”
(grifo nosso)
14
“O pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias asseguradas, em sentença concessiva de
mandado de segurança, a servidor público federal, da administração direta ou autárquica, e a
servidor público estadual e municipal, somente será efetuado relativamente às prestações que se
vencerem a contar da data do ajuizamento da inicial” (grifo nosso)
15 “Não se concederá medida liminar para efeito de pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias”
16
“Não será cabível medida liminar contra atos do Poder Público, no procedimento cautelar ou em
quaisquer outras ações de natureza cautelar ou preventiva, toda vez que providência semelhante não
puder ser concedida em ações de mandado de segurança, em virtude de vedação legal.” (grifo nosso)
11
______________________________________________________________________
Mesmo a vedação prevista no artigo 1o da lei 8.437/92,
que se refere exclusivamente a ações de natureza cautelar, que não é
o caso em tela, tem como exceção o parágrafo 2o do próprio artigo
que narra: "O disposto no parágrafo anterior não se aplica aos
processos de ação popular e de ação civil pública."
Tanto assim que a decisão do Supremo Tribunal
Federal proferida nos autos de ADC nº 4-DF se refere exclusivamente
à concessão de liminares em favor de servidores públicos nos feitos
que envolvam questões remuneratórias. Não é o caso dos autos.
Aqui, discute-se a obrigação do Estado em fornecer um medicamento
que é essencial à manutenção da vida de uma usuária do SUS.
Analisando a extensão da decisão proferida na ADC nº
4-DF, o próprio Supremo Tribunal Federal decidiu que o efeito
vinculante de sua decisão se restringe aos feitos que envolvam
questões remuneratórias de servidores. É o que se extrai do seguinte
julgado:
EMENTA: ANTECIPAÇÃO DE TUTELA
CONTRA
A
FAZENDA
PÚBLICA.
ALEGADO DESRESPEITO AO DECIDIDO
PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA
AÇÃO
DECLARATÓRIA
DE
CONSTITUCIONALIDADE N.º 4. Tratandose de decisão antecipatória proferida em ação
de cobrança ajuizada por pessoa jurídica
privada contra o Estado do Piauí, evidente
“O recurso voluntário ou ex officio , interposto contra sentença em processo cautelar, proferida contra
pessoa jurídica de direito público ou seus agentes, que importe em outorga ou adição de vencimentos ou
de reclassificação funcional, terá efeito suspensivo.” (grifo nosso)
18
“Compete ao presidente do tribunal, ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso, suspender,
em despacho fundamentado, a execução da liminar nas ações movidas contra o Poder Público ou seus
agentes, a requerimento do Ministério Público ou da pessoa jurídica de direito público interessada, em caso
de manifesto interesse público ou de flagrante ilegitimidade, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à
segurança e à economia públicas”
17
______________________________________________________________________
não estar caracterizado atentado contra a
mencionada
decisão
do
STF,
que,
reconhecendo
cautelarmente
a
constitucionalidade do art. 1.º da Lei n.º
9.494/97, se restringiu a vedar a concessão de
antecipação de tutela, em favor de servidores,
nos
feitos
que
envolvam
questões
remuneratórias.
Reclamação
julgada
improcedente. (Rcl1073/PE RECLAMAÇÃO;
Relator(a): Min.
ILMAR
GALVÃO;
Julgamento: 25/09/2002 Orgão Julgador:
Tribunal Pleno; Publicação: DJ DATA-31-102002)
Com base neste entendimento, conclui-se que ao
magistrado, em qualquer instância do Poder Judiciário, salvo em se
tratando de matéria referente à remuneração de servidores, é dado
conferir antecipação da tutela pretendida pelo autor.
A única ressalva que se pode fazer é em relação à
condição prevista no artigo 2o da lei 8.437/92 que estabelece a
audiência prévia do Poder Público, no prazo de 72 horas. Tal
providência, embora não seja razoável, está sendo respeitada nesta
peça.
XI.II Precedentes judiciais
O caso em tela não representa nenhuma inovação no
direito brasileiro, constatando-se inclusive precedentes na própria
comarca de Ibiporã.
Também é oportuno destacar que o Tribunal de
Justiça do Estado do Paraná não vem conferindo efeito suspensivo
ou cassando as tutelas antecipadas conferidas pelos juízos de
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primeira instância, conforme se nota no despacho do Juiz
Convocado Eduardo Sarrão.
Estes precedentes demonstram a pertinência da tutela
ora pleiteada e a postura do Judiciário paranaense na garantia da
vida dos seus jurisdicionados.
XII - PEDIDO
Diante de todo o exposto, o Ministério Público do
Estado do Paraná requer:
a) o recebimento e autuação da presente Ação Civil
Pública, independente do depósito de custas
judiciais, conforme prevê o artigo 18 da lei 7.347/85;
b) a intimação do Estado do Paraná, através da
Procuradoria do Estado, em sua unidade sediada em
Ibiporã, para que, no prazo de 72 horas, conforme
artigo 2º da Lei n.º 8.437/92, se manifeste acerca da
antecipação de tutela ora pretendida;
c) a antecipação da tutela jurisdicional, para compelir o
Estado do Paraná, durante o transcorrer da ação e no
prazo máximo de 15 dias, a fornecer à Elton Junior
Teixeira ADEFOVIR 10 mg, em quantidade
compatível com a prescrição médica;
d) a cominação ao requerido, em liminar, de multa
diária, nos termos do art. 11 da Lei n° 7.347/85, no
valor de R$ 200,00 (duzentos reais) por dia de atraso
no fornecimento, nos termos do artigo 11 da Lei n.º
7.347/85, a ser revertida em prol da paciente, sem
prejuízo de outras providências tendentes ao
cumprimento da ordem judicial, inclusive a
responsabilização por ato de improbidade
administrativa;
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e) a citação do ESTADO DO PARANÁ, na pessoa do
Excelentíssimo Procurador-Geral do Estado para,
querendo, contestar no prazo legal a presente ação,
sob pena de suportar os efeitos da revelia;
f) após a instrução, seja julgada procedente o pedido,
para condenar o Estado do Paraná a fornecer à Elton
Junior Teixeira ADEFOVIR 10 mg, em quantidade
compatível com a prescrição médica e pelo período
em que perdurar a prescrição médica de tal
medicamento;
g) a produção de provas, por todos os meios admitidos
em direito, sobretudo pela juntada de novos
documentos e perícias, além de oitiva de
testemunhas e peritos, caso se faça necessário.
Dá-se à causa o valor de R$3.600 (três mil e seiscentos
reais), ainda que inestimável o objeto tutelado.
Ibiporã, 19 de junho de 2017
Révia Aparecida Peixoto de Paula Luna
Promotora de Justiça
Rol de Testemunhas:
1. Dr. Jan Walter Stagmann, Clínico Geral – Infectologia, CRM 6546,
Rua Senador Souza Naves, 1502, Londrina-Pr;
2. Dr. Joaquim Celso Andrade Guimarães, Clínico Geral –
Infectologia, CRM 8275, Av. Bandeirantes, 369, Londrina-Pr;
3. Dr Edson T.Anzai, CRM 10611, Av Bandeirantes, 618, Londrina-Pr
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Relação de Documentos que seguem com a inicial:
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
Solicitação de medicamento excepcional
Exames laboratoriais (HBV quantitativo/carga viral)
Receituário de controle especial;
Atestados
Relatório médico (fls. 08)
Orçamentos da medicação
Documentos pessoais
Olerite
Comprovante de endereço
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