da legitimidade passiva - Centro de Apoio Operacional das

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M I N I S T É RI O P ÚB L I CO F E DE R AL
PROCURADORIA DA REPÚBLICA NO MUNICÍPIO DE PATO BRANCO - PARANÁ
EXCELENTÍSSIMO JUIZ FEDERAL DA VARA ÚNICA DA SUBSEÇÃO
JUDICIÁRIA DE PATO BRANCO – PR
DISTRIBUIÇÃO URGENTE
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por sua agente signatária, com
fulcro nos arts. 127, caput e 129, III, da Constituição da República Federativa do Brasil; e
arts. 5º, III, “e”, e V, “a”, e 6º, VII, “a”, “c” e “d”, da Lei Complementar n° 75/93; e
arts. 4º e 5º, caput, da Lei nº 7.347/85, e com fundamento no Procedimento
Administrativo nº 1.25.014.000033/2005-99 PRM/Pato Branco, vem, respeitosamente,
ante Vossa Excelência propor a presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA
com pedido liminar, em face de
1) UNIÃO FEDERAL, pessoa jurídica de direito público, representada
pela Advocacia-Geral da União, cuja sede responsável por esta região
está localizada na Av. Jorge Schimmelpfeng, nº 265, Centro, Foz do
Iguaçu/PR;
2) ESTADO DO PARANÁ, pessoa jurídica de direito público,
representado pela Procuradoria do Estado, com sede na Rua
Tapajós, nº 150, 11º andar, Centro, Pato Branco/PR.
pelas razões de fato e de direito que a seguir passa a expor.
I - DA LEGITIMIDADE PASSIVA
O art. 198 da Constituição Federal define o SISTEMA ÚNICO DE
SAÚDE – SUS – como as ações e serviços de saúde que integram uma rede regionalizada
e hierarquizada, estabelecendo o princípio da diversidade da base de financiamento
desse Sistema, nos seguintes termos:
IIIIII-
“Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede
regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único,
organizado de acordo com as seguintes diretrizes:
descentralização, com direção única em cada esfera de governo;
atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas,
sem prejuízo dos serviços assistenciais;
participação da comunidade.
Parágrafo único. O sistema único de saúde será financiado,
nos termos do art. 195, com recursos do orçamento da
seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal
e dos Municípios, além de outras fontes” (grifos nossos)
A regra acima é válida tanto para o financiamento do atendimento e
tratamento médicos, quanto para a aquisição dos medicamentos destinados aos pacientes
e usuários do Sistema Único. Assim, os recursos para esse fim têm como fonte de
financiamento, dentre outras, as da seguridade social e as orçamentárias da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, consoante dispõe a Constituição
Federal.
Por
conseguinte,
a
União,
em
cumprimento
ao
seu
dever
constitucional de participar do financiamento do SUS, repassa recursos aos Estados da
Federação e a seus Municípios, sendo de especial interesse para o deslinde da questão em
apreço o repasse de recursos para Estado do Paraná. Isso o faz por diversos mecanismos,
tais como transferência regular e automática fundo a fundo, remuneração direta por
serviços produzidos ou ainda através da celebração de convênios específicos.
No atendimento à diretriz da descentralização insculpida no art. 198,
inciso I da Constituição Federal, as leis e normas infralegais que regem o SUS têm feito
prever diferentes formas de gestão para os Estados e Municípios. A habilitação de tais
entes federativos em formas mais avançadas de gestão impõe à União o ônus de
repassar recursos de maior monta, ficando os Municípios, por sua vez, obrigados a
garantir também um espectro maior de ações e serviços de saúde do rol daqueles devidos
ao cidadão.
Em nenhuma hipótese, entretanto, fica a União dispensada
das suas responsabilidades dentro de um Sistema que é único e hierarquizado.
Sua responsabilidade remanesce, mesmo após repasse de recursos federais, no atinente à
cooperação técnica, prevista no art. 30, VII, da Constituição e à fiscalização do Sistema,
cabendo-lhe ainda atuar supletivamente, em especial na omissão dos demais entes
federativos, bem como expedir normas infralegais que visem à coordenação nacional e ao
perfeito funcionamento do Sistema.
Como se verá, um dos motivos alegados para justificar a
inércia do Poder Público na hipótese vertente consiste exatamente na indefinição
dentro do universo normativo do SUS, por lacuna de pactuação entre gestores das
diferentes esferas, quanto à competência para a aquisição centralizada de medicamento
excepcional: se da União ou do Estado Federado. Indefinição que está a caracterizar
verdadeira omissão desses entes no adimplemento da obrigação que a
Constituição lhes comete, decorrendo daí a necessidade de se recorrer ao Poder
Judiciário.
A matéria já foi objeto de apreciação pelo Superior Tribunal de
Justiça, que, em tal oportunidade, pronunciou-se nos seguintes termos:
“RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. OFENSA AO ART. 535, II, DO
CPC. INEXISTÊNCIA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS PARA
PESSOA CARENTE. LEGITIMIDADE DA UNIÃO, DO ESTADO E DO
MUNICÍPIO PARA FIGURAREM NO PÓLO PASSIVO DA DEMANDA.
1. .... 2. Recurso no qual se discute a legitimidade passiva da União
para figurar em feito cuja pretensão é o fornecimento de medicamentos
imprescindíveis à manutenção de pessoa carente, portadora de atrofia
cerebral gravíssima (ausência de atividade cerebral, coordenação motora e
fala). 3. A Carta Magna de 1988 erige a saúde como um direito de todos e
dever do Estado (art. 196). Daí, a seguinte conclusão: é obrigação do
Estado, no sentido genérico (União, Estados, Distrito Federal e
Municípios), assegurar às pessoas desprovidas de recursos
financeiros o acesso à medicação necessária para a cura de suas
mazelas, em especial, as mais graves. 4. Sendo o SUS composto
pela União, Estados e Municípios, impõe-se a solidariedade dos
três entes federativos no pólo passivo da demanda. 5. Recurso
especial desprovido”. (STJ. REsp 507205/PR. Primeira Turma. Rel. Min.
José Delgado. Julg. 07/10/2003. DJ 17.11.2003, p. 213)
Convém aqui salientar, todavia, que, de acordo com informação
prestada pelo Ministério da Saúde, através da sua Secretária de Ciência, Tecnologia e
Insumos Estratégicos (fls.15/16, do Procedimento Administrativo que instruem a presente
demanda), as atribuições referentes à aquisição e dispensa de medicamento excepcionais
são divididas apenas entre a União e os Estados, vez que compete ao Ministério da Saúde
efetuar o repasse de recursos destinados à aquisição dos suso mencionados
medicamentos, e às Secretarias de Saúde dos Estados assegurar uma contra-partida de
recursos financeiros para a aquisição, seleção, programação e dispensação dos mesmos.
Semelhantes esclarecimentos são corroborados pelo disposto no art.
17, VIII, da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, regulamentado pela Portaria SAS
nº 341, de 22 de agosto de 2001, a qual organiza a aquisição e distribuição de
medicamentos excepcionais.
Resta assim demonstrada a legitimidade passiva da União Federal e
do Estado do Paraná, responsáveis solidários pela adequada prestação do objeto ora
demandado, bem assim justificada a ausência do Município de Pato Branco no pólo
passivo da presente ação coletiva.
II – DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL DE PATO BRANCO
Haja vista as justificativas adrede referidas para a inclusão da União
Federal na demanda em comento, inquestionável é a competência da Justiça Federal para
apreciar o feito, em razão do disposto no artigo 109, inciso I, da Carta Magna.
No tocante ao Órgão da Justiça Federal competente para apreciar a
presente Ação Civil Pública, tem-se que é competente esse Douto Juízo Federal da
Subseção Judiciária de Pato Branco - PR, por perfeita subsunção ao que estatui o artigo 2º
da n.º Lei 7.347/85, quando proclama que: “As ações previstas nesta lei serão propostas
no foro do local onde ocorrer o dano, cujo juízo terá competência funcional para processar
e julgar a causa”.
Com isso se quer dizer que a competência da Justiça Federal de Pato
Branco é cristalina, porquanto o paciente Zádire de Souza Coelho, portador de
Mucopolissacaridose que teve o regular fornecimento da medicação necessária à sua
terapia e sobrevivência negado pelo Poder Público, reside em companhia de seus pais –
Lúcia Aparecida Coelho e Zadir da Silva Coelho – nesta cidade de Pato Branco (fl. 08, do
Procedimento Administrativo em anexo).
Por outro lado, ainda que se entenda que a omissão ora narrada
igualmente atinge áreas abrangidas por outras Subseções Judiciárias Federais, em virtude
da feição coletiva do objeto da Ação ora proposta, ainda assim será competente essa Vara
Federal de Pato Branco, por aplicação do disposto no artigo 106 do Código de Processo
Civil, e parágrafo único do art. 2º, da Lei nº 7.347/85, resolvendo-se a questão pela regra
da prevenção, eis que o objeto da presente não se encontra judicializado em outras
subseções judiciárias federais no Estado.
III - DA LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
A Constituição Federal, em seu artigo 127, caput, delineia o papel do
Ministério Público, atribuindo-lhe a missão de defender a ordem jurídica, o regime
democrático e os interesses sociais e individuais indisponíveis. No art. 129, II, comete-lhe
a função de “zelar pelo efetivo respeito dos poderes públicos e dos serviços de
relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as
medidas necessárias a sua garantia”.
Outrossim, também a Lei Complementar nº 75/93, ditando as
funções institucionais do Ministério Público da União e os seus instrumentos de atuação,
assim estabelece:
“Art. 5º. São funções institucionais do Ministério Público da
União:
(...)
V – zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos da União e dos
serviços de relevância pública quanto:
a) aos direitos assegurados na Constituição Federal relativos às
ações e aos serviços de saúde e à educação.
(...)
Art. 6º . Compete ao Ministério Público da União:
(...)
VII – promover o inquérito civil e a ação civil pública para:
a) a proteção dos direitos constitucionais;
........................ ......................................
c) a proteção dos interesse individuais indisponíveis, difusos e
coletivos, relativos às comunidades indígenas, à família, à criança, ao
adolescente, ao idoso, às minorias étnicas e ao consumidor;
d) outros interesses individuais indisponíveis, homogêneos, sociais,
difusos e coletivos;
(...)
XII – propor ação civil coletiva para defesa de interesses individuais
homogêneos.”
Na presente ação, o Ministério Público Federal busca proteger direito
fundamental à saúde, que, em si, pode ser qualificado como um direito difuso,
dada a permeabilidade no meio social dos agravos à saúde.
Porém, para que não se pretenda afastar a legitimidade ativa do
Parquet, no caso específico, ao argumento de que os direitos que aqui se deduzem
possuem a natureza de direito individual homogêneo, insta observar que, ainda que assim
fosse, restaria preservada aquela legitimidade em face da relevância social e
indisponibilidade do direito protegido, o que o faz transcender aos interesses do grupo
atingido, revestindo-o do caráter de direito social previsto no art. 127 da Constituição
Federal ( nesse sentido, por todos, Teori Albino Zavascki, no brilhante estudo “ O Ministério
Público e a Defesa de Direitos Individuais Homogêneos”, in Revista do Ministério Público
do Rio Grande do Sul, nº 29, págs. 29/40, Porto Alegre, Revista dos Tribunais, 1993).
A par disso, a Constituição, no art. 197, estabelece:
“Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde,
cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua
regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita
diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou
jurídica de direito privado.”
O Ministério Público, ao promover Ação Civil Pública com o
fito de compelir o poder público ao adimplemento das prestações atinentes ao
dever de garantir a saúde a seus cidadãos, de outra atribuição não cuida senão
daquela constitucionalmente assinalada, qual seja, de zelar pelo efetivo
respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos
assegurados na Constituição.
Nesse sentido, clara é a orientação do Pretório Excelso:
“Cumpre assinalar, finalmente, que a essencialidade do direito à saúde
fez com que o legislador constituinte qualificasse, como
prestações de relevância pública, as ações e serviços de saúde
(CF, art. 197), em ordem a legitimar a atuação do Ministério
Público e do Poder Judiciário naquelas hipóteses em que os órgãos
estatais, anomalamente, deixassem de respeitar o mandamento
constitucional, frustrando-lhe, arbitrariamente, a eficácia jurídico-social,
seja por intolerável omissão, seja por qualquer outra inaceitável
modalidade de comportamento governamental desviante”. (trecho do voto
do Min. Celso de Mello no RE nº 273.834-4/RS. 2ª Turma. Julg.
12/09/2000).
Ademais, a proteção pretendida visa atender especificamente a
indivíduos que padecem de doença genética cujos efeitos maléficos se fazem sentir em
tenra infância, fadando seus portadores, na falta de adequado tratamento, a não
atingirem a idade adulta. Assim, em regra, o beneficiário da prestação jurisdicional
pretendida será criança ou adolescente, o que reforça a legitimidade do
Ministério Público para defender o interesse individual indisponível, de que são
titulares os menores portadores de doença genética.
IV- DOS FATOS
Foi instaurado nesta Procuradoria da República o Procedimento
Administrativo nº 1.25.014.000033/2005-99, em face da representação da
Sra Lúcia
Aparecida de Sousa, RG nº 9.457.216-9, CPF nº 667.806.759-20, pretendendo a
dispensação do medicamento LARONIDASE (ALDURAZYME) para seu filho Zádire de
Souza Coellho, portador de Mucopolisacaridose do Tipo I (Síndrome de Hurler), hoje com
18 anos de idade.
A representação, feita verbalmente perante servidor lotado nesta
Procuradoria, foi instruída com: cópia de Receita e Relatório Médico da lavra da
especialista em Genética Clínica do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Dra. Maria
Verônica Muñoz Rojas (CRM/RS
nº 28.469), diagnosticando o paciente Zádire Coelho
como portador de Mucopolissacaridose tipo I (MPS I) – doença genética rara de depósito
lisossômico causada
por deficiência da
enzima lisossômica a-L-idurinidase
- e
prescrevendo a terapia de reposição enzimática com o Medicamento Laronidase
(Aldurazyme ®); cópia do Memorando nº 097/2005 CEMEPAR, datado de 27 de julho de
2005, no qual o Diretor da mencionada Coordenadoria denega o fornecimento do
medicamento Laronidase à 7ª Regional de Saúde, sob a alegação de que o r.
medicamento “não está padronizado no SUS. Não faz pare de medicamento gerenciados
pelos programas CEMEPAR.”
Afirma ainda o Diretor, no mesmo expediente, que o
referido medicamento não possui registro na ANVISA, não podendo, por tal razão, ser
comercializado no Brasil.
Em depoimento tomado aos 23 de janeiro do corrente ano, a Dra.
Lúcia Aparecida declarou que: “seu filho Zádire de Souza Coelho vem tomando o
medicamento Laronidase há aproximadamente 01 (um) ano; que após a administração
medicamentosa o paciente vem experimentando melhoras substanciais (pele, cabelo,
disposição física, inchaço, fígado, baço, coração); que após exames de sangue feitos em
Porto Alegre, tem sido notado evolução no quadro clínico geral do paciente, tal como o
declarado pelo Hospital de Clínicas daquela cidade; que o coração do paciente, que antes
da administração medicamentosa padecia de hipertrofia, teve seu tamanho reduzido; que
os médicos do paciente afirmaram que a interrupção da medicação não pode acontecer
por se tratar de remédio que atua na reposição de enzimas”.
Com a instrução do procedimento foram acostados aos autos (i)
Resolução ANVISA
nº 1995, de 16 de agosto de 2005, na qual a Agência
Nacional de Vigilância Sanitária concede à Genzyme do Brasil Ltda o Registro
de Produto Biológico do Aldurazyme ® (fls. 26 e 74-85); (ii) atos infra-legais que
disciplinam a aquisição e distribuição de medicamentos excepcionais; (iii) cópias de
estudos científicos versando sobre a doença MPS e suas terapias;(iv) relatório médico da
lavra do Dr. Abrão M. Hay Neto (CRM 9964, pediatra), versando sobre as consequências
de eventual descontinuidade do tratamento de reposição enzimática; (v) relatório médico
elaborado pela Maria Verônica Muñoz Rojas, narrando o histórico da evolução do paciente
Zádire, desde a sua inclusão no Programa de tratamento, ilustrado com informações
analíticas e comparativas acerca dos resultados dos exames efetuados no adolescente.
Em atenção ao Ofício nº 155/2005 – PRM/PB, expedido por esta
Procuradoria da República, a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos –
órgão
do
Ministério
da
Saúde,
através
do
já
aludido
Parecer
Técnico
nº
132/2005/CGPAGP/DAF/SCTIE/MS, após prestar alguns eslarecimentos médicos acerca da
doença Mucopolissacaridose (cuja descrição clínica confere com a constante no Laudo
Médico elaborado pela Dra. Maria Verônica Muñoz Rojas), informa que:
“As manifestações clínicas da MPS I mostram um desenvolvimento
crônico e progressivo e são de natureza multissistêmica. Incluem
organomegalia (aumento do fígado e do baço), diostose múltipla e
feições anormais (faces características), afeta a audição, a visão, a
função respiratória (vias aéreas) e a função cardiovascular e
também pode reduzir gravemente a mobilidade das articulações”.
Esclarece, ainda, que “a terapia de reposição enzimática, com uso da
Laronidase (Aldurazyme) é uma das novas terapias causais. Seus
resultados preliminares foram promissores, e esse tratamento, no
início de 2003, foi encaminhado para aprovação pelas autoridades
regulamentares americana e européia. No segundo semestre, o FDA –
US Food and Drug Administration e a União Européia liberaram a
utilização da Laronidase (Aldurazyme) no tratamento da MPS I.”
(pg. 15/16)
O medicamento Laronidade (Aldurazyme) não pertence a nehnuma
lista pactuada de financiamento público, não havendo uma definição clara
da competência do fornecimento dos mesmos. E por se tratar de
medicamento recém registrado no mercado nacional. somado às
pactuações já existentes no intuito de reorganização da Assistência
Farmacêutica, norteada pela diretriz da descentralização, e com os repasses
realizados regularmente entre os níveis de gestão, talvez haja a
possibilidade de, excepcionalmente, o Estado fornecer esse medicamento
para garantia da integralidade de atenção à saúde ao paciente.” (grifos
nossos)
Diante dos fatos, aos 6 de janeiro do corrente ano, foi expedida
Recomendação ao Senhor Secretário de Saúde do Estado do Paraná (fls. 19-23),
no sentido de que fossem adotadas, no prazo improrrogável de 30 dias, medidas
administrativas necessárias à aquisição e regular disponibilização do medicamento
Aldurazyme
para o tratamento de Zádire de Souza Coelho e demais pacientes do
Estado que apresentem idênticos disgnósticos clínicos e prescrições médicas.
Paralelamente, foram empreendidas diligências no intuito de obter informações a respeito
dos exatos valores repassados pelo Governo Federal ao Estado do Paraná, sob a rubrica
“Medicamento Excepcionais”, e dos mecanismos adotados pelo Estado para proceder à
aquisição/distribuição do referido medicamento, bem assim de instruir os autos com
estudos clínicos acerca da eficácia e eventuais efeitos colaterais da terapia em questão.
Em resposta, o Senhor Secretário de Saúde do Estado, em apertada
síntese, aduz que:
(i) o Programa de Medicamentos Excepcionais é originalmente
financiado com recursos federais, todavia, tendo em vista a
defasagem dos valores de ressarcimento (fixados na Tabela
SIA/SUS),
os
Estados
acabam
por
co-financiar
os
medicamentos padronizados pelo Ministério da Saúde;
(ii)
o repasse do Governo Federal ao Governo do Estado do
Paraná, sob a indigitada rubrica, é de R$45.524.956,84, ao
passo que o valor anual aplicado pelo Estado do Paraná na
aquisição
de
medicamentos
excepcionais
é
de
R$
77.267.038,86;
(iii)
a distribuição de medicamentos excepcionais é efetuada
mensalmente com arrimo nos mapas enviados por cada uma
das 22 Regionais de Saúde, os quais contemplam as
necessidades dos pacientes cadastrados no programa;
(iv)
o medicamento Laronidase deveria ter seu Protocolo
Clínico e Diretriz Terapêutica estabelecidos pelo Ministério da
Saúde, de forma a orientar a inclusão do tratamento
medicamentoso no programa de medicamentos excepcionais.
Até a data do ajuizamento da presente demanda, apesar de expirado
o prazo da Recomendação expedida por este parquet, ainda não foi noticiada a adoção de
qualquer medida administrativa no sentido de viabilizar o seu atendimento, tampouco
tendo sido apresentadas eventuais justificativas técnicas para a malsinada omissão.
Cumpre ainda destacar que a genitora do paciente Zádire, conforme
o documentado nos autos, através de seus próprios esforços, logrou a inclusão de seu
filho em estudo clínico levado a cabo no Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Em razão
desse programa, Zádire vem recebendo da Genzyme do Brasil Ltda – laboratório
responsável pela importação e distribuição do Aldurazyme ® no Brasil – há cerca de um
ano, as doses de medicamento necessárias à manutenção do tratamento de Zádire.
Todavia, conforme o certificado às fls. 86, do Procedimento Administrativo em anexo,
foram fornecidas ao paciente em questão, no dia 13.01.2006 doses de Laronidase em
quantidade suficiente para um mês, o que de fato ocorreu, segundo informações
prestadas pela própria mãe de Zadire. Tal fornecimento, todavia, mantido até agora em
caráter precário, e prorrogado sucessivamente, inclusive em atenção aos nossos
insistentes apelos, está em vias de ser interrompido, conforme acusa o Ofício
encaminhado pela Genzyme do Brasil em 03 de fevereiro de 2006 (pgs. 109-110).
Assim, tendo em vista que, não obstante as interpelações deste
órgão ministerial, a Secretaria de Saúde Estadual, até o presente momento, não adotou as
providências necessárias para a regularização do fornecimento do Aldurazyme ®,
quedando-se a União Federal, de igual forma, inerte no trato do problema cuja solução
também se insere na sua esfera de atribuições, ressalvada a intervenção judicial ora
pretendida, o adolescente Zádire receberá a última dose do medicamento no
próximo dia 13 de fevereiro, ficando, a partir de então, sujeito à progressão da
doença, o que fatalmente ocorrerá sem a necessária reposição enzimática,
colocando em risco a sua integridade e sua própria vida.
Conforme o narrado linhas acima, o medicamento Laronidase obteve
recentemente, em 16/08/2005, o seu registro na ANVISA através da Resolução RE nº
1995, publicada no DOU de 22/08/2005, caducando, de tal sorte, o principal fundamento
invocado pelo Gestor Estadual para deixar de fornecer o remédio. Neste particular, gize-se
ainda que, segundo informações veiculadas pela Agência de Vigilância Sanitária, o
procedimento de concessão de registro foi precedido de estudos e análises técnicas, tudo
com vistas a evitar que fosse concedido o aval público para a comercialização de um
produto cuja eficácia da terapia ainda estivesse em fase experimental.
V - DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS
Os óbices opostos pelos Gestores Federal e Estadual do SUS –
responsáveis pelo Programa de Dispensação de Medicamentos em Caráter Excepcional – à
dispensação
imediata
do
medicamento
não
são
aptos
a
afastar
o
dever
constitucionalmente imposto ao Estado, conforme a seguir se demonstrará.
O artigo 196 da Constituição Federal estabelece:
“Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido
mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de
doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e
serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.
Deflui-se desse dispositivo não uma mera ordem programática
despida de conteúdo jurídico obrigacional, mas sim que o Estado está juridicamente
obrigado a garantir o direito à saúde mediante políticas sociais e econômicas, bem como
exercer as ações e serviços de forma a promover, proteger e recuperar a saúde, sendo
que a tal obrigação corresponde o direito subjetivo público de ver tais ações e serviços
implementados.
Nesse sentido, pronunciou-se o Supremo Tribunal Federal:
“EMENTA: PACIENTE COM PARALISIA CEREBRAL E MICROCEFALIA.
PESSOA DESTITUÍDA DE RECURSOS FINANCEIROS. DIREITO À VIDA E À
SAÚDE. FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS E DE
APARELHOS MÉDICOS, DE USO NECESSÁRIO, EM FAVOR DE PESSOA
CARENTE. DEVER CONSTITUCIONAL DO ESTADO (CF, ARTS. 5º, CAPUT, E
196). PRECEDENTES (STF).
- O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa
jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela
própria Constituição da República (art. 196). Traduz bem jurídico
constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira
responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular - e implementar políticas sociais e econômicas que visem a garantir, aos cidadãos, o acesso
universal e igualitário à assistência médico-hospitalar.
- O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta
Política - que tem por destinatários todos os entes políticos que
compõem, no plano institucional, a organização federativa do
Estado brasileiro - não pode converter-se em promessa
constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público,
fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade,
substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu
impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade
governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do
Estado. Precedentes do STF. (STF, RE nº 273.834-4/RS. 2ª Turma. Rel.
Min. Celso de Mello. Julg. 12/09/2000)
Do voto do Min. Celso de Mello:
“Nesse contexto, incide, sobre o Poder Público, a gravíssima
obrigação de tornar efetivas as prestações de saúde, incumbindolhe promover, em favor das pessoas e das comunidades, medidas preventivas e de recuperação - que, fundadas em políticas públicas
idôneas, tenham por finalidade viabilizar e dar concreção ao que prescreve,
em seu art. 196, a Constituição da República“.
“O sentido de fundamentalidade do direito à saúde - que representa,
no contexto da evolução histórica dos direitos básicos da pessoa humana,
uma das expressões mais relevantes das liberdades reais ou concretas impõe ao Poder Público um dever de prestação positiva que
somente se terá por cumprido, pelas instâncias governamentais,
quando estas adotarem providências destinadas a promover, em
plenitude, a satisfação efetiva da determinação ordenada pelo
texto constitucional”.
“Não basta, portanto, que o Estado meramente proclame o reconhecimento
formal de um direito. Torna-se essencial que, para além da simples
declaração constitucional desse direito, seja ele integralmente
respeitado e plenamente garantido, especialmente naqueles casos em
que o direito - como o direito à saúde - se qualifica como
prerrogativa jurídica de que decorre o poder do cidadão de exigir,
do Estado, a implementação de prestações positivas impostas pelo
próprio ordenamento constitucional”.
A legislação infraconstitucional, regulando e estruturando o Sistema
de Saúde constitucionalmente delineado, em atenção ao princípio da integralidade da
assistência, dispôs especificamente sobre o aspecto da Assistência Farmacêutica, na forma
a seguir exposta.
A lei n.º 8.080, de 19 de Setembro de 1990, define em seu artigo 2º
que “a saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as
condições indispensáveis ao seu pleno exercício.”; mais adiante, em seu artigo 6º, inciso I,
alínea d, inclui no campo de atuação do Sistema Único de Saúde (SUS) a “assistência
terapêutica integral, inclusive farmacêutica”;
Dentro da Política Nacional de Medicamentos, Portaria GM/MS nº
3.916, de 30/10/1998, item 5.3, alíneas “d” e “m”, as funções cometidas ao Gestor
Estadual do Sistema Único de Saúde na consecução da Assistência Farmacêutica são,
entre outras, a de “coordenar e executar a assistência farmacêutica no seu
âmbito” e de “definir o elenco de medicamentos que serão adquiridos
diretamente pelo estado, inclusive os de dispensação em caráter excepcional ...
e destinando orçamento adequado à sua aquisição”;
Não se distancia das diretrizes fixadas na retro mencionada Política
Nacional o comando do art. 2º, caput e parágrafo primeiro, da Portaria SAS nº 341, de 22
de agosto de 2001, a qual, consetânea à inarredável garantia constitucional de acesso
universal aos serviços e ações necessários à promoção, proteção e recuperação da
saúde, impõe às Secretarias de Saúde do Estado o dever de distribuir medicamentos
excepcionais mesmo nos casos em que estes não estejam incluídos no Protocolo
de Diretrizes Terapêuticas fixado pela Secretaria de Atenção à Saúde. E não
poderia dispor de outra forma, uma vez que eventual ineficiência do Poder Público em
acompanhar os avanços da medicina não pode, à evidência, ser alegada como escusa
para a negação do direito à saúde e à existência digna dos quais é titular a pessoa
humana.
De outra banda, considerando que o paciente Zádire ainda não saiu
da adolescência, e tendo ainda em vista, ainda, serem em sua grande maioria crianças as
portadoras da MSP I (já que as mesmas, à míngua da terapia causal adequada,
dificilmente atingem a idade adulta), mister se faz ressaltar que os seus direitos à vida, à
saúde e à alimentação devem ser garantidos com absoluta prioridade, conforme previsto
no caput do artigo 227 da Constituição Federal, in verbis:
“Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à
criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à
vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização,
á cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”
(grifado)
“§ 1º - O Estado promoverá programas de assistência integral à
saúde da criança e do adolescente”
Na mesma esteira, o Estatuto da Criança e do Adolescente –
ECA – Lei nº 8.069, de 13 de Julho de 1990, consoante os princípios constitucionais
acima referidos, dispõe no seu art. 7º e 11:
“Art. 7º A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à
saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que
permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso,
em condições dignas de existência.
...
“Art. 11. É assegurado atendimento médico à criança e ao
adolescente, através do Sistema Único de Saúde, garantido o acesso
universal e igualitário às ações e serviços para promoção, proteção e
recuperação da saúde.”
...
“§ 2º Incumbe ao poder público fornecer gratuitamente àqueles
que necessitarem os medicamentos, próteses e outros recursos
relativos ao tratamento, habilitação ou reabilitação.” (grifado).
O Senhor Secretário Estadual de Saúde, ao denegar formalmente o
pedido encaminhado pela 7ª Regional de Saúde, além de invocar como justificativa para
o referido ato a ausência de padronização da Laronidase pelo SUS (argumento cuja
validade esperamos ter afastado com as ponderações lançadas linhas acima), alegou que
o r. medicamento não possuía registro na ANVISA.
Cumpre, todavia, esclarecer que, mesmo à época dessa informação
(27.07.2005), o medicamento já não era experimental, pois os protocolos científicos
voltados a esse fim já haviam sido concluídos em nível internacional, tanto que seus
resultados foram publicados e a comercialização aprovada por aquelas que são as mais
exigentes e respeitadas agências estrangeiras, a norte-americana e a européia. Além
disso, a discussão em torno do registro na ANVISA, de toda forma, encontra-se,
hoje, superada à superveniência, em 16/08/2005, da Resolução nº 1995, de 16
de agosto de 2005 (fls. 74-85). Nesse particular, destacamos, por necessário, que a
indigitada Agência Reguladora, a teor do disposto nos arts. 6º e 7º, IX, da Lei nº 9.782/99
detém a atribuição para controle sanitário da produção e da comercialização de produtos
no Brasil, bem como para conceder e cancelar os registros dos mencionados produtos.
Não há que se opor, de igual forma, à pretensão aqui deduzida,
eventual indisponibilidade do medicamento no mercado interno, o que tornaria necessária
a sua importação. Isto porque o oferecimento de determinado produto no mercado
interno do país é dependente da iniciativa do laboratório produtor, a qual, por sua vez, é
ditada por interesses e conveniências de natureza mercantil, os quais não consultam ao
interesse da atenção em saúde.
As considerações do Senhor Secretario Estadual de Saúde são
ademais afastadas com os argumentos do próprio Ministério da Saúde, que, ao responder
ao ofício ministerial através de sua Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos
Estratégicos, com supedâneo no capítulo 3.3 da Política Nacional de Medicamentos, aduz
que, “ por se tratar (a Laronidase) de medicamento recém registrado no mercado
nacional, somado às pactuações já existentes no intuito de reorganização da Assistência
Farmacêutica, norteada pela diretriz da descentralização, e com os repasses realizados
regularmente entre os níveis de gestão, talvez haja a possibilidade de, excepcionalmente,
o Estado fornecer esse medicamento para garantia da integralidade de atenção á saúde
do paciente”.
De fato, podemos extrair do capítulo da Política Nacional de
Medicamentos, aprovada pela Portaria GM/MS nº 3.916/98:
“O processo de descentralização, no entanto, não exime os
gestores federal e estadual da responsabilidade relativa à
aquisição e distribuição de medicamentos em situações especiais”.
“Inicialmente, a definição de produtos a serem adquiridos e
distribuídos de forma centralizada deverá considerar três pressupostos
básicos, de ordem epidemiológica, a saber”:
a) doenças que configuram problemas de saúde pública, que atingem ou
põem em risco as coletividades, e cuja estratégia de controle
concentra-se no tratamento de seus portadores;
b) doenças consideradas de caráter individual que, a despeito de
atingir número reduzido de pessoas, requerem tratamento
longo ou até permanente, com o uso de medicamentos de
custos elevados;
c) doenças cujo tratamento envolve o uso de medicamentos não
disponíveis no mercado “.
Não se pode descurar, todavia, que o Ministério da Saúde, com as
informações prestadas na mesma oportunidade, ao indicar o Estado do Paraná como
responsável pela aquisição e dispensa de medicamentos não incluídos no Protocolo
Nacional, parece pretender que a responsabilidade da União encerrou-se com a
transferência dos recursos federais, ainda que tais não sejam suficientes para o adequado
atendimento à saúde da população paranaense.
Todavia, o fato é que as regras e mecanismos de pactuação
acordados entre os gestores não podem ser opostos ao cidadão, usuário do
Sistema, com vistas a afastar a assistência que lhe é devida.
A própria Norma Operacional Básica da Saúde, resultante de amplo e
participativo processo de discussão e aprovada pela Portaria GM/MS nº 2.203, de 05 de
novembro de 1996, estatui em seu item 11.2.5 que “O exercício da função gestora no
SUS, em todos os níveis de governo, exige a articulação permanente das ações de
programação, controle, avaliação e auditoria; a integração operacional das unidades
organizacionais, que desempenham estas atividades, no âmbito de cada órgão gestor do
Sistema; e a apropriação dos seus resultados e a identificação de prioridades, no processo
de decisão política da alocação dos recursos”.
Não poderia ser diferente, pois a Constituição comete o dever ao
ESTADO, como gênero. A forma como os entes federativos se consertarão com o
fito de efetivar a prestação é matéria afeta ao planejamento orçamentário, à
logística ou ao exercício da coordenação política entre os Entes Federados.
Deve, todavia, permanecer transparente ao usuário do Sistema, e jamais servir ao
propósito de afastar a prestação devida.
Nesse sentido a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:
“SAÚDE – AQUISIÇÃO E FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. DOENÇA
RARA. Incumbe ao Estado (gênero) proporcionar meios visando a alcançar
a saúde, especialmente quando envolvida criança e adolescente. O
Sistema Único de Saúde torna a responsabilidade linear
alcançando a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios”. (STF, Rext. Nº 195.192-3/RS, Segunda Turma, Relator Min.
Marco Aurélio, julg. 22/02/2000, DJ 31/03/2002).
Do voto:
“[...] O Estado deve assumir as funções que lhe são próprias, sendo certo,
ainda, que problemas orçamentários não podem obstaculizar o implemento
do que previsto constitucionalmente”.
Entretanto, a
providência lógica e
devida da
aquisição do
medicamento e sua destinação ao paciente usuário do SUS que dele necessita vem sendo
negada tanto pelo gestor federal, como pelo gestor estadual, sob os frégeis argumentos
acima declinados, sendo certo que a omissão deste último ente federativo restou
inequivocamente formalizada a partir de sua resistência em cumprir a Recomendação
expedida pela Procuradora da República signatária, (cujo prazo para atendimento expirou
em 6 de fevereiro do corrente)
Não resta, de tal feita, ao Ministério Público Federal, outro recurso
que não o da via jurisdicional, para buscar a efetiva tutela do Direito à Saúde ora
ameaçado de violação.
VI - DO PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA
A teor do artigo 273, do Código de Processo Civil, a antecipação dos
efeitos da tutela é autorizada nos casos em que exista prova inequívoca que convença o
julgador da verossimilhança da alegação, além do fundado receio de dano irreparável ou
de difícil reparação (ou manifesto abuso de direito por parte da defesa).
No caso vertente, encontram-se reunidos todos os requisitos exigidos
pela lei processual para o deferimento da tutela antecipada pleiteada.
Quanto à verossimilhança da alegação, não há o que se questionar
sobre a efetiva realidade dos fatos, pois que são incontroversos, como demonstram os
documentos juntados à inicial. Os próprios demandados oferecem a descrição da
natureza da enfermidade, sua evolução e conseqüências deletérias para a
saúde e qualidade de vida dos indivíduos portadores e reconhecem a eficácia do
tratamento pleiteado. Em relação especificamente ao paciente nominado, há
comprovação do diagnóstico através de laudos de exame e relatório médico, bem como
prescrição médica da droga em questão, além da comprovação da eficácia do tratamento.
De igual forma, incontroversa a resistência dos réus em adimplir com
a sua obrigação de promover a adequada prestação da saúde pública.
O fumus boni iuris encontra-se igualmente presente, assentado
estarem as Acionadas deixando de cumprir obrigações a elas instituídas pela Constituição
e pela Lei, lesando direitos do cidadão em sentido amplo, refletido na coletividade dos
portadores de Mucopolissacaridose residentes no Estado do Paraná e ainda não
diagnosticados ou, no momento, fora do alcance da atenção especializada e,
especificamente, do adolescente Zádire de Souza Coelho.
Há ainda o fundado receio de dano irreparável, uma vez que
a enfermidade que acomete Zádire, de natureza degenerativa, resulta, na
descrição do próprio Ministério da Saúde, do acúmulo de glicosaminoglicanos
no lisossomo, com as conseqüências clínicas já descritas nesta inicial, bem
como nos artigos e monografias científicas e Relatórios Médicos que a instruem
(com especial destaque para o Relatório elaborado pela médica geneticista do
Hospital das Clínica – fls. - documentando a evolução do quadro de Zádire após
o início do tratamento, e Relatório elaborado pelo Dr. Abrãao M. Hay Neto,
prognosticando, inclusive, a possível morte do paciente, em caso de interrupção
da reposição enzimática pleiteada).
Ante o exposto requer o Ministério Público Federal a concessão de
TUTELA ANTECIPADA, para determinar ao Estado do Paraná e à União Federal que
adotem de imediato todas as medidas administrativas necessárias à aquisição,
em caráter de urgência, do medicamento LARONIDASE (ALDURAZYME),
inclusive a eventual importação do mesmol, caso a droga ainda não esteja disponível no
mercado nacional, nos quantitativos que se façam necessários, de acordo com
prescrição médica, e disponibilização imediata e contínua, para tratamento
ambulatorial de Zádire de Souza Coelho e de todos os demais pacientes do Estado
do Paraná que apresentem quadro clínico e prescrições semelhantes, até que transite em
julgado a ação em comento.
Requer, ainda, o Ministério Público Federal, em sede de antecipação
de tutela, com fulcro no art. 11, da Lei nº 7.347/85, a cominação de multa diária, no valor
de R$ 10.000,00 (dez mil reais) ou em valor a ser estipulado segundo o prudente arbítrio
desse Juízo, de molde a desistimular a omissão dos demandados em desatenção à
eventual ordem judiciária concedendo a antecipação ora pleiteada, sempre tendo em
mente o alto custo do medicamento em tela (em média, 600 dólares por ampola, sendo
que, no caso de Zádire, a prescrição médica é de 24 frascos por mês).
VII - DOS PEDIDOS PRINCIPAIS
Por fim, pede o Ministério Público Federal:
(i) sejam ao final julgadas procedentes as pretensões
deduzidas no tópico anterior, confirmando-se, em definitivo,
todos os pedidos requeridos em sede de tutela antecipada e
condenando-se o Estado do Paraná e a União nas
obrigações ali descritas relativamente a todos os portadores da
Mucopolisacaridose do Tipo I, residentes no território deste
Estado que apresentem ou venham a apresentar diagnóstico e
prescrições médicas semelhantes, por tempo indeterminado,
enquanto lhe for indicada semelhante terapia;
(ii) que a União, através do Ministério da Saúde, no papel de
Gestor Federal do SUS, responsável pela elaboração da lista de
medicamentos excepcionais (ver documento de fl. 195/199 do
PA anexo) adote as medidas administrativas necessárias à
inclusão do medicamento LARONIDASE (ALDURAZYME) em
lista pactuada de medicamentos excepcionais, visando a que a
transferência de recursos federais fundo a fundo, dentro do
financiamento específico para o Programa de Dispensação de
Medicamentos em Caráter Excepcional, contemple o encargo
cometido ao Estado-Membro na forma como descrita no item
“i” supra.
Requer, ainda:
a) a citação dos entes demandados, na pessoa de seus
representantes legais, para, querendo, contestar a presente ação e
acompanhá-la em todos os seus termos, sob pena de revelia;
b) a dispensa do pagamento das custas, emolumentos e outros
encargos, em vista do disposto no artigo 18 da Lei n.° 7.347/85; e
c) embora já tenha apresentado o Ministério Público Federal prova
pré-constituída do alegado, protesta, outrossim, pela produção de
prova documental, testemunhal, pericial e demais provas em direito
admitidas que se fizerem necessárias ao pleno conhecimento dos
fatos;
d) a imposição de multa diária no valor de R$ 10.000,00 por
descumprimento de eventual decisão judicial que venha a ser deferida
em acolhida ao pleito ministerial.
Atribui-se à causa, para fins legais, o valor de R$ 30.000,00 (trinta
mil reais).
Termos em que se pede deferimento.
DANIELLA DIAS DE ALMEIDA SUEIRA
Procuradora da República
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