Grupo Otimismo de Apoio ao Portador de Hepatite

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Grupo Otimismo de Apoio ao Portador de Hepatite
ONG - Registro n°.: 176.655 - RCPJ-RJ - CNPJ: 06.294.240/0001-22 - Rio de Janeiro - RJ
Rio de Janeiro (21) 4063.4567 - São Paulo (11) 3522.3154 (das 11.00 às 15.00 horas)
e-mail: [email protected] - Internet: www.hepato.com
World Hepatitis
Alliance
AUDIÊNCIA NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
PLACAR FINAL DA DISCUSSÃO (Conforme minha interpretação pessoal)
A FAVOR DOS PACIENTES:
1) Adib Domingos Jatene, Ex-Ministro da Saúde e Diretor-Geral do Hospital do
Coração em São Paulo
2) Agnaldo Gomes da Costa - Secretário de saúde do estado do Amazonas
3) André da Silva Ordacgy - Defensoria Pública-Geral da União
4) Antonio Barbosa da Silva, representante do Instituto de Defesa dos Usuários de
Medicamentos
5) Antônio Fernando Souza - Procurador-geral da República– MPF
6) Cátia Gisele Martins Vergara, Promotora de Justiça do Ministério Público do Distrito
Federal e representante da Associação Nacional do Ministério Público de Contas
7) Ciro Mortella, presidente da Federação Brasileira da Indústria Farmacêutica
8) Débora Diniz, Fundadora do Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero ANIS
9) Flávio Pansieri - Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)
10) Francisco Batista Júnior - Conselho Nacional de Saúde (CNS)
11) Geraldo Guedes, Representante do Conselho Federal de Medicina
12) Heloisa Machado de Almeida, representante da ONG Conectas Direitos Humanos
13) Ingo W. Sarlet - Universidade de Munique
14) Jorge André de Carvalho Mendonça, juiz da 5ª Vara Federal de Recife
15) José Aristodemo Pinotti, Professor Titular Emérito da USP e Unicamp, Ex-Reitor da
Unicamp e Ex-Secretário de Saúde do Estado de São Paulo
16) José Getulio Martins Segalla, Presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia
Clínica
17) Josué Félix de Araújo, presidente da Associação Brasileira de
Mucopolissacaridoses
18) Leonardo Bandarra, presidente do Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais de
Justiça do ministério Público dos Estados e da União
19) Leonardo Lourea Mattar - Defensor público geral da União em exercício,
20) Luís Roberto Barroso, representante do Colégio Nacional de Procuradores dos
Estados e do Distrito Federal e Territórios
21) Luiz Alberto Simões Volpe, Fundador do Grupo Hipupiara Integração e Vida
22) Marcos Sales - Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB)
23) Paulo Marcelo Gehm Hoff, representante da Secretaria de Saúde do Estado de
São Paulo, do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo e da Faculdade de
Medicina da USP
24) Paulo Menezes, presidente da Associação Brasileira de Amigos e Familiares de
Portadores de Hipertensão Arterial Pulmonar
25) Sérgio Henrique Sampaio, presidente da Associação Brasileira de Assistência à
Mucoviscidose
26) Valderilio Feijó Azevedo, representante da Associação Brasileira de Grupos de
Pacientes Reumáticos
27) Vitore André Zílio Maximiano, Defensoria Pública do Estado de São Paulo
CONTRA AS AÇÕES – CONTRA OS PACIENTES:
1) Alberto Beltrame - Secretário de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde
2) Alexandre Sampaio Zakir, representante da Secretaria de Segurança Pública e do
Governo de São Paulo
3) Ana Beatriz Pinto de Almeida Vasconcellos, Gerente de Projeto da Coordenação
Geral da Política de Alimentos e Nutrição do Departamento de Atenção Básica do
Ministério da Saúde
4) Antônio Figueiredo Nardi - Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde
(CONASEMS)
5) Cleusa da Silveira Bernardo, Diretora do Departamento de Regulação, Avaliação e
Controle de Sistemas do Ministério da Saúde
6) Edelberto Luiz da Silva - Consultor jurídico do Ministério da Saúde
7) Janaína Barbier Gonçalves, Procuradora do Estado do Rio Grande do Sul
8) José Antônio Dias Toffoli - Advogado-geral da União
9) José Antônio Rosa - Fórum Nacional dos Procuradores-Gerais das Capitais
Brasileiras
10) José Gomes Temporão, ministro da Saúde
11) Osmar Gasparini Terra, Presidente do Conselho Nacional de Secretários da Saúde
- CONASS
12) Paulo Dornelles Picon, representante da Universidade Federal do Rio Grande do
Sul e do Hospital de Clínicas de Porto Alegre
13) Reinaldo Felipe Nery Guimarães, secretário de Ciência e Teconologia do Ministério
da Saúde
14) Rodrigo Mascarenhas, Subprocurador-geral do estado do Rio de Janeiro
SEM POSICIONAMENTO DEFINIDO (ou defendendo temas fora da pauta):
1) Claudio Maierovitch Pessanha Henrique, Coordenador da Comissão de
Incorporação de tecnologia do Ministério da Saúde
2) Dirceu Raposo de Mello, Diretor-Presidente da ANVISA
3) Jairo Bisol, Presidente da Associação Nacional do Ministério Público de Defesa da
Saúde
4) Maria Helena Barros de Oliveira - Representante da Fundação Oswaldo Cruz
(Fiocruz)
5) Maria Inês Pordeus Gadelha, consultora da Coordenação Geral de Alta
Complexidade do Departamento de Atenção Especializada do Ministério da Saúde
6) Paulo Ziulkoski, Presidente da Confederação Nacional dos Municípios
7) Sueli Gandolfi Dallari, representante do Centro de Estudos e Pesquisa de Direito
Sanitário
Aos interessados no que aconteceu na audiência no STF, a defesa de cada indicado pode
ser vista na nossa página acessando www.hepato.com/p_geral/stf_audiencia.doc
Agora resta somente esperar a interpretação que os ministros do STF farão da audiência.
O resultado e imprevisível, pois placar ou torcida a favor ao influem em decisões judiciais.
Carlos Varaldo
Grupo Otimismo
O Grupo Otimismo e afiliado a AIGA - ALIANÇA INDEPENDENTE DOS GRUPOS DE APOIO - www.aigabrasil.org
Argumentos apresentados por cada indicado:
Segunda-feira 27 de abril - O ACESSO ÀS PRESTAÇÕES DE SAÚDE NO
BRASIL – DESAFIOS AO PODER JUDICIÁRIO
Ministro Gilmar Mendes abre audiência pública falando de “situações trágicas” da
saúde pública brasileira
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, abriu na
manhã desta segunda-feira (27) a audiência pública da Saúde dizendo que o Poder
Judiciário, que não pode deixar sem resposta os casos submetidos à sua apreciação,
“vem se deparando com situações trágicas no julgamento do pedido de cada cidadão que
reclama um serviço ou um bem de saúde muitas vezes extremamente urgente e
imprescindível”.
Ele disse que já tramitam na Corte a Proposta de Súmula Vinculante (PSV) 4 –
apresentada pela Defensoria Pública Geral da União –, que busca tornar expressa a
responsabilidade solidária dos entes da federação no que concerne ao fornecimento de
medicamentos e tratamentos e até a possibilidade de bloqueio de valores públicos para o
fornecimento de medicamento e tratamento.
O Supremo já reconheceu a repercussão geral de um Recurso Extraordinário (RE
566471) que questiona se a situação individual pode, sob o ângulo do alto custo, colocar
em risco a assistência global da saúde para toda a sociedade. No concreto, trata-se de
um paciente que precisa de medicamento de hipertensão pulmonar, não previsto na
relação de remédios de alto custo fornecidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
O ministro deu outros exemplos de julgamentos complexos na área da Saúde. O Agravo
de Instrumento no pedido de Suspensão de Tutela Antecipada (STA) 223 foi provido por
maioria e a Corte determinou que o estado de Pernambuco pagasse uma operação de
implante de aparelho de marca-passo num cidadão vítima de assalto. Ele também citou a
gravidade de casos de falta de leitos e de medicamentos de alto custo. “Esses casos
exemplificam os dilemas enfrentados pelos magistrados, especialmente os que estão na
primeira instância, que são colocados diante de situações de vida ou morte.”
Gilmar Mendes afirmou que as considerações a serem apresentadas na audiência
interessam, de diferentes formas, aos jurisdicionados e a todo o Poder Judiciário do país.
“Elas poderão ser utilizadas para a instrução de qualquer processo no âmbito do STF”,
destacou. Essas considerações estarão disponíveis aos juízos e tribunais que as
solicitarem.
Estão presentes na mesa da audiência o procurador-geral da República, Antônio
Fernando Souza; o advogado-geral da União, José Antônio Dias Toffoli; o subdefensor
público-geral da União, Leonardo Lourea Mattar; o secretário de Atenção à Saúde do
Ministério da Saúde, Alberto Beltrame; o representante do Conselho Federal da Ordem
dos Advogados do Brasil (OAB), Flávio Pansieri; o representante da Associação dos
Magistrados Brasileiros (AMB), Marcos Sales; e o juiz e doutor da Universidade de
Munique, Ingo W. Sarlet.
A audiência atraiu a atenção de diversas pessoas. Tanto o auditório da Primeira Turma,
onde acontece o evento, como da Segunda Turma, em que foi instalado telão com
transmissão em tempo real das palestras, estão com os lugares ocupados.
Poder Judiciário é imprescindível para garantir acesso à saúde, diz MPF
Em sua participação na primeira parte da audiência pública realizada no Supremo
Tribunal Federal (STF) sobre o Sistema Único de Saúde (SUS), o procurador-geral da
República, Antônio Fernando Souza, afirmou que o Poder Judiciário é imprescindível para
garantir o direito à saúde nos casos concretos diante da omissão do Estado.
Isso porque o cidadão, quando não atendido pelo Estado, recorre à Justiça para obter seu
direito, conforme garante a Constituição Federal. Segundo o artigo 196, o acesso à saúde
é um direito de todos e dever do Estado.
Antônio Fernando destacou que as políticas sociais e econômicas com o objetivo de
garantir esse direito e também a redução do risco de doença e o acesso universal
igualitário é uma das preocupações do Ministério Público Federal (MPF).
Para isso, a instituição tem no âmbito da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão
um grupo de trabalho dedicado ao tema, principalmente diante da judicialização das
questões da saúde.
O procurador-geral geral falou sobre a relevância da audiência pública realizada no STF,
considerando a importância do direito de saúde para toda sociedade e a complexidade
dos temas e afirmou que “em alguns casos há política pública não respeitada, em outros a
política pública é inadequada e, finalmente, há casos em que não há política pública
definida”.
Ele fez considerações sobre diversas questões relativas ao tema, entre elas a
competência de cada ente da federação responsável por determinadas políticas. Sua
opinião é de que, quando não for possível identificar se a responsabilidade pelo
cumprimento de determinado direito cabe à União, aos estados ou aos municípios, a
divisão de tarefas e o cumprimento delas é de responsabilidade solidária dos entes
federativos pelas prestações necessárias para assegurar o direito à saúde dos usuários
do SUS.
A expectativa do procurador-geral é de que esta audiência forneça contribuições
importantes para a concretização do direito a saúde, que, para ele, deve ser considerado
um direito social e não individual.
Judicializar saúde é risco para políticas públicas da área, afirma AGU
O advogado-geral da União, José Antônio Dias Toffoli, afirmou na manhã desta segundafeira (27) que a interferência do Judiciário no tema da saúde, com a judicialização
indiscriminada da matéria, poderá gerar sérios riscos para as políticas públicas
desenvolvidas na área.
Toffoli foi a terceira autoridade a falar durante o primeiro dia da audiência pública que
discute o direito à saúde no Supremo Tribunal Federal (STF). Ele expôs seus argumentos
após o presidente da Corte, ministro Gilmar Mendes, abrir o evento, e o procurador-geral
da República, Antonio Fernando Souza, falar favoravelmente à intervenção do Judiciário
na área da saúde.
Toffoli, ao contrário, alega que a “complexidade da questão é muito maior do que se tem
discutido em juízo”, e que o direito à saúde para toda a sociedade não significa somente o
acesso a todo e qualquer tratamento ou medicamento.
Segundo o advogado-geral, a preocupação é com relação a decisões judiciais que
determinam o bloqueio de verbas da área da saúde para beneficiar alguns indivíduos em
detrimento de toda a coletividade. Ele citou o exemplo de um prefeito do estado de São
Paulo que, após cumprir uma decisão judicial, entregou as “chaves da cidade” para o juiz
sob o argumento de ter gasto toda a verba de saúde para cumprir a sentença.
“A elaboração de políticas públicas pressupõe o estabelecimento de escolhas”, afirmou,
complementando que, por isso, o poder público tem de determinar quais tratamentos e
medicamentos serão garantidos a toda a sociedade. “Isso não é inviabilizar o direito a
saúde”, garantiu.
Para o advogado-geral, atualmente as decisões judiciais que garantem fornecimento de
medicamentos e tratamentos a indivíduos cria um “sistema de saúde paralelo ao SUS
[Sistema Único de Saúde], priorizando a atendimento a pessoas que muitas vezes sequer
procuraram o sistema”.
Ele afirmou que ano a ano a União aporta mais recursos para a saúde e que o governo
tem de lançar mão da “reserva do financeiramente possível” para garantir o máximo de
acesso à saúde para todos os cidadãos brasileiros.
Representante do Ministério da Saúde critica o pagamento de tratamentos
experimentais
O secretário de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde, Alberto Beltrame, afirmou
hoje na audiência sobre a saúde pública realizada no STF que o pagamento, pelo Estado,
de tratamentos experimentais cujos resultados não são comprovados ou não
incorporados pelo Sistema Único de Saúde gera desperdício de recursos públicos e pode
colocar a saúde do paciente em maior risco ainda. “Nenhum sistema de saúde do mundo
incorpora todas as alternativas terapêuticas existentes no seu mercado”, destacou.
Ele disse que sistemas de saúde universais, como o brasileiro, precisam se ater aos
tratamentos e remédios que comprovadamente surtem efeito. “É preciso evitar que um
objeto de pesquisa ou uma hipótese sejam antecipados como conhecimento científico e
tornem-se condutas utilizadas antes das verificações necessárias”, declarou.
Segundo o representante do ministério da Saúde, diante do limite financeiro do Estado é
preciso “determinar prioridades e como as ações e serviços de saúde serão realizados em
observância aos princípios constitucionais e do próprio SUS”. Ele explicou, por exemplo,
que o registro de um medicamento na Anvisa não representa, necessariamente a sua
incorporação compulsória ao SUS.
Beltrame criticou as decisões judiciais que obrigam o atendimento por médico alheio ao
quadro do SUS ou sem que o pedido tenha sido feito administrativamente. “Isso traz como
consequência a quebra de princípios do SUS, da integralidade assistencial e do acesso
com justiça”, lamentou.
Para DPU, Judiciário só intervém na saúde quando há falha do Estado
“A intervenção judicial [na área da saúde] somente ocorre quando há um déficit na
prestação do serviço”, afirmou o defensor público geral da União em exercício, Leonardo
Lourea Mattar, na manhã desta segunda-feira (27), durante o primeiro dia da audiência
pública que discute o direito à saúde. O evento ocorre no Supremo Tribunal Federal (STF)
e será realizado durante seis dias, de hoje até 29 de abril e 4, 6 e 7 de maio.
Para Mattar, se em 1988 a preocupação centrava-se em garantir direitos para a
população, hoje o que a sociedade espera é a efetividade dos direitos previstos na
Constituição da República. “Argumentos contrários ao reconhecimento da garantia ao
direito à saúde a cada um dos brasileiros não deve ser acolhido”, afirmou. Segundo ele, o
Judiciário deve intervir da melhor maneira possível quando a administração pública não
cumprir o seu dever constitucional de garantir o acesso à saúde a todos, seja quando a
falha reside na prestação de um serviço específico ou quando há lacuna na área de
políticas públicas.
O defensor público geral da União em exercício disse concordar com o argumento de que
“tudo para todos pela via judicial inviabiliza o SUS [Sistema Único de Saúde]”, mas
argumentou que essa não é a situação do país diante de decisões judiciais na área da
saúde. Segundo ele, a discussão gira em torno da possibilidade de o Judiciário intervir em
situações específicas para corrigir defeitos isolados na garantia do direito à saúde e,
nesses casos, o Judiciário pode e deve intervir. Para Mattar, a excepcionalidade não pode
indicar quais regras devem ser aplicadas a todo o sistema de saúde.
Ele argumentou ainda que há um “efeito pedagógico” nas decisões que garantem o amplo
acesso à saúde aos indivíduos que recorrem ao Judiciário, já que elas farão com que
governantes, em um futuro próximo, aloquem mais recursos para a rubrica. Lembrou
ainda que a credibilidade do Judiciário também está em questão caso o Poder “não
reafirme que o direito à saúde é devido a toda a população brasileira”.
O defensor público também lembrou que a Defensoria Pública Geral da União apresentou
uma Proposta de Súmula Vinculante (PSV) que busca tornar expressa a responsabilidade
solidária dos entes da federação no que concerne ao fornecimento de medicamentos e
tratamentos e até a possibilidade de bloqueio de valores públicos para o fornecimento de
medicamento e tratamento. É a PSV número 4.
Representante dos magistrados diz que Judiciário tem legitimidade para decidir
casos de saúde pública
O representante da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) na audiência pública
sobre saúde, Marcos Sales, sustentou nesta segunda-feira (27) que o Poder Judiciário
tem tanta legitimidade constitucional quanto os poderes Executivo e Legislativo para
debater e decidir casos que envolvem o exercício do direito universal à saúde pública.
“O SUS é o maior plano de saúde do mundo, e por ser o maior, é preciso que a gente lute
para que seja o melhor, corrigindo imperfeições”, afirmou. Marcos Sales destacou que a
categoria dos juízes não deseja ter de escolher quem vai viver e quem vai morrer nem ser
gestora de uma imensa “farmácia”. “Mas queremos assegurar ao cidadão brasileiro a
dignidade que a Constituição assegura”, resumiu.
Segundo ele, a saúde pública brasileira teve dois momentos cujo marco divisório foi a
Constituição de 1988. Sales explicou que, antes da Carta, o cidadão que precisava de
tratamento pagava por ele. Depois da promulgação, passou a existir a saúde pública,
coletiva e de aspecto sanitarista calcada no princípio da dignidade humana estendido a
todos, igualmente.
O representante da AMB sintetizou as aspirações da categoria sobre a saúde pública
citando: a legitimidade do Poder Judiciário nacional para assegurar políticas públicas no
tocante ao direito à saúde amparado por preceitos e valores constitucionais; a
necessidade da existência de comissões técnicas no âmbito do SUS, dos estados e dos
municípios com a finalidade de detectar irregularidades na distribuição de medicamentos
e outras ações como insumos, próteses, órteses e tratamentos; a regulamentação de
recursos de saúde para subfinanciamento do setor; a possibilidade de participação, de
controle social e de fiscalização dos recursos públicos; e a garantia de que os gestores
proporcionem total atenção à saúde por meio de responsabilidade sanitária e
administrativa sob pena de incorrer em ato de improbidade administrativa.
Representante da OAB fala sobre dever do estado e atuação do STF na garantia à
saúde
Em nome do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o palestrante
Flávio Pansieri ressaltou a importância da audiência pública realizada pelo Supremo
Tribunal Federal (STF) que, segundo ele, revela o comprometimento do Tribunal com o
debate democrático e aberto com toda a sociedade brasileira. Para ele, a iniciativa firma a
legitimidade das decisões do Supremo.
O Poder Judiciário, segundo o advogado, não deve atuar na definição de políticas
públicas na área de saúde, mas tem a função de “salvaguarda do indivíduo”.
Pansieri destacou em sua apresentação que erradicar a pobreza e reduzir a
marginalização é uma obrigação do Estado, que tem como objetivo garantir a reprodução
da vida humana com dignidade. Assim, só se considera livre aquele que participa da
sociedade, que pode estar inserido como ator desta e, portanto, os que estão à margem
ou que não têm acesso aos bens mínimos de saúde, moradia, entre outros, não poderão
ser considerados cidadãos livres.
Para ele, a maior relevância da audiência pública é mostrar que o Poder Judiciário deve
estar atento a procedimentos clínicos adequados, a um sistema de verificação da
necessidade desse atendimento por meios confiáveis.
“Defender a saúde é defender a própria existência da vida digna, buscando em primeiro
lugar o atendimento coletivo, mas sem desproteger o indivíduo”, afirmou.
Juiz pede que STF não “feche as portas” para Judiciário na área da saúde
Ao se classificar como um adepto à judicialização do direito à saúde, o juiz e doutor pela
Universidade de Munique Ingo W. Sarlet afirmou ser necessário “superar a era dos
extremos” na área. Segundo ele, é preciso rejeitar a impossibilidade de a magistratura
decidir casos concretos relacionados ao direito à saúde, mas que também é essencial
controlar o “famoso pediu levou”, em que o magistrado não se atenha para as
consequências da decisão judicial.
Sarlet foi o sétimo e último convidado a falar durante o primeiro dia de audiência pública
que discute, no Supremo Tribunal Federal (STF), o direito à saúde e a intervenção do
Poder Judiciário na área.
Entres as possíveis redefinições de estratégias por parte do Poder Judiciário em relação
ao direito à saúde, Sarlet citou a possibilidade de se criar assessorias técnicas na área
para balizar as decisões. Por um lado, ele foi enfático ao expressar a preocupação de que
o poder do juiz para decidir na área não seja esvaziado. Por outro, disse que se deve
cobrar dos magistrados a responsabilidade de se fazer um exame criterioso dos casos
concretos.
Para Sarlet, o sistema Judiciário deve minimizar os efeitos colaterais de decisões que, por
ventura, venham a gerar um efeito discriminatório ou anti-isonômico, mas que isso não
pode inviabilizar a intervenção da magistratura na área.
“O que me preocupa aqui é a dupla exclusão”, afirmou, referindo-se àqueles que não
recebem tratamento do SUS [Sistema Único de Saúde] e ficariam impedidos de encontrar
a solução por via judicial. “Se se for avançar com a edição de uma súmula vinculante,
espera-se que o STF não feche as portas para o exame responsável dos casos
concretos”, concluiu.
O ministro Carlos Alberto Menezes Direito aproveitou a ocasião para também reforçar a
importância do juiz de primeiro grau e expressar sua preocupação com a situação deles
diante da necessidade de decidir, muitas vezes de forma urgente, sobre situações
dramáticas que envolvem casos de vida ou morte.
Segundo Menezes Direito, essa situação concreta do juiz é que deve ser avaliada para
que o STF possa adotar alguma orientação na área. “Nós não podemos deixar de
considerar a realidade concreta da demanda que é feita ao juiz de primeiro grau. É muito
fácil nós teorizarmos, mas muito fácil mesmo. O difícil é saber, naquele momento, que
decisão tomar diante da realidade que se apresenta”, ponderou.
O ministro avaliou que uma possível solução, já em prática em alguns estados, é a
realização de reuniões periódicas de juízes com as autoridades de saúde do estado de
modo a estabelecer um critério razoável de atendimento, mesmo que a medicação ou
tratamento não estejam incluídos na lista de disponibilidade do estado.
“Mas, de todos os modos, é preciso resguardar permanentemente a situação e a natureza
da função jurisdicional, particularmente daqueles extraordinários juízes de primeiro grau
que, ao longo de todo este Brasil, cumprem o seu dever, muitas vezes com enorme
dificuldade”, concluiu.
Presidente encerra 1º dia da audiência pública destacando diálogo entre Poderes
Foi encerrado há pouco o primeiro dia de audiência pública sobre saúde no Supremo
Tribunal Federal. O presidente da Corte, ministro Gilmar Mendes, destacou que os casos
de omissão na saúde pública não podem ser resolvidos apenas com uma ação isolada de
um único ente, eventualmente do Judiciário, e por isso é preciso existir diálogo como o
iniciado nesta segunda-feira.
Para ele, a audiência demonstra a humildade do Judiciário na tentativa de buscar
soluções para os principais problemas da saúde. “Não há nenhuma pretensão de o
Judiciário usurpar as devidas competências do Congresso Nacional. Antes, esse é o
chamamento a um diálogo institucional responsável”, ressaltou.
A audiência continuará amanhã, terça-feira (28), e na quarta (29). Na próxima semana, o
evento prossegue nos dias 4,6 e 7 de maio – sempre de 9h a 12h, com transmissão ao
vivo na TV Justiça e na Rádio Justiça, e informações no Portal do STF.
Terça-feira 28 de abril - RESPONSABILIDADE DOS ENTES DA
FEDERAÇÃO E FINANCIAMENTO DO SUS
Procurador reclama de decisões judiciais nas quais os gestores não são ouvidos
O representante do Fórum Nacional dos Procuradores-Gerais das Capitais Brasileiras,
José Antônio Rosa, criticou nesta terça-feira, durante a audiência pública sobre a saúde,
decisões nas quais os juízes não ouvem os gestores de saúde antes de determinar
procedimentos cirúrgicos e compra de remédios não disponíveis no Sistema Único de
Saúde (SUS).
Ele pediu mais cautela a magistrados que proferem sentenças favoráveis a pacientes sem
antes levar em conta os limites da administração. Como exemplo, José Antônio Rosa
ressaltou determinações judiciais que ordenam ao SUS a instalação da estrutura
hospitalar em domicílios, conhecida como homecare, quando os recursos para tal, na
maioria das vezes, são inexistentes. “Certamente um gestor público não tem como
cumprir uma decisão dessas”, concluiu.
O porta-voz dos procuradores-gerais das capitais lamentou a prisão do secretário de
saúde do Espírito Santo por não ter conseguido um medicamento para um determinado
paciente que não corria risco de morte. Da mesma forma, repudiou a prisão do secretário
municipal de saúde de Cuiabá por haver contrariado o juiz da vara pública do estado do
MT que havia ordenado uma cirurgia imediata. Segundo os médicos da rede, a operação
na coluna no paciente não era recomendável sem que antes ele passasse por um
tratamento de reequilíbrio da coluna.
“Nenhum gestor municipal ou estadual está lá para não fazer aquilo que é a sua
obrigação. Temos vivenciado nos municípios brasileiros, principalmente nas capitais,
algumas decisões judiciais de 1º grau determinando todo e qualquer tipo de inversão da
ordem pública estabelecida e da legislação”, denunciou. Ele deu exemplos de decisões de
compra de medicamentos específicos – tantos quanto forem necessários ao atendimento
do paciente, independentemente de haver no estoque ou na lista do SUS – mesmo que a
compra se dê sem licitação pública. Para garantir isso, alguns juízes bloqueiam contas
municipais que têm recurso destinado para programas do governo, e ordenam que o
dinheiro seja usado no cumprimento da decisão.
Ele comentou a determinação de bloqueio de uma conta da cidade de Maceió de R$ 6
milhões para compra de medicamentos, com previsão de multa de R$ 50 mil reais por dia
de atraso a ser destinada ao paciente caso não houvesse a entrega do remédio.
“Precisamos dar um basta nisso. É preciso que haja decisão judicial sim, mas é preciso
cautela, bom-senso e razoabilidade para ouvir o gestor, o médico e os operadores do
sistema”, destacou.
Francisco Batista Júnior fala sobre o SUS
“Vivemos o que se convencionou chamar de prefeiturização do SUS [Sistema Único de
Saúde], com a desresponsabilização dos entes federais e estaduais na área da saúde e a
sobrecarga nos municípios”, disse o presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS),
Francisco Batista Júnior.
O presidente do CNS apontou ainda o descompasso entre a legislação brasileira na área
da saúde, que classificou como a mais avançada no mundo, e a realidade do SUS.
Segundo ele, a alta burocratização na forma de financiamento do SUS, a
descentralização inconsequente, com a desresponsabilização dos entes federal e
estaduais, e a sobrecarga nos municípios, a lógica assistencialista do sistema e a sua
excessiva privatização impedem a concretização da legislação da área. “Queremos um
sistema de saúde e não um sistema de tratamento de doença”, disse.
Tanto o presidente do CNS afirmou que a solução mais urgente é a regulamentação da
Emenda Constitucional 29, que prevê o repasse de recursos da contribuição social para a
saúde. O objetivo seria equacionar e racionalizar o financiamento entre os entes
federados. “Deixar a saúde à mercê de um financiamento global, na disputa com outras
áreas, inviabiliza o sistema”, alertou Batista Júnior.
Como crítica ao sistema, ele afirmou que é necessário que o SUS incorpore
medicamentos e tratamentos novos de forma mais ágil, o que permitiria ampliar o alcance
do sistema, beneficiando mais pessoas.
Defensor público oferece soluções para o cumprimento das sentenças favoráveis
aos pacientes do SUS
O representante da Defensoria Pública-Geral da União, André da Silva Ordacgy, sugeriu
nesta terça-feira (28) formas de garantir a solidariedade jurídica e a reserva do possível
financeiro para o estado quando a Justiça determina o pagamento de remédios ou
tratamentos de alto custo não incluídos na lista do Sistema Único de Saúde.
Ele sugeriu a existência de um sistema de compensação financeira para o ente da
federação que arcar com o medicamento ou o tratamento, em relação aos demais entes –
co-responsáveis pelo fornecimento.
Ordacgy também citou o artigo 33 da Lei 8.080/90 (Lei do SUS), que prevê o Fundo
Nacional da Saúde, administrado pelo Ministério da Saúde. “A verba pode ser deduzida
daí, para efeito de posterior repasse”, opinou. Outra sugestão feita pelo defensor foi o
controle informatizado da saída de medicamentos, para que o beneficiado não receba em
duplicidade, cada vez de um dos entes federativos.
Ao falar sobre a reserva do possível financeiro, ele comparou os gastos do SUS com
medicamentos e tratamentos ordenados pela Justiça com os da propaganda
governamental. Ordacgy citou que o jornal Valor Econômico estimou em R$ 48 milhões os
gastos do governo federal em cumprimento das decisões judiciais na área de saúde
pública em favor dos pacientes no ano passado. Segundo o palestrante, o gasto em
propaganda foi de R$ 400 milhões no mesmo período, de acordo com o jornal O Globo.
“Quando se pegam os dados financeiros se percebe que não há toda essa discrepância
de valores, sem contar que nem tudo o que é destinado à saúde é efetivamente gasto, e
uma parte retorna aos cofres públicos”, disse.
Ainda entre as sugestões que ele fez está a de tentar conciliação do paciente com o
Estado para evitar o ajuizamento de ações e obrigar a ampliação do leque de cobertura
dos planos de saúde para evitar que quem tem plano recorra ao SUS para tratamentos
não cobertos – geralmente os mais caros. Ele citou que a Argentina, por exemplo, já
obrigou a hemodiálise como parte da oferta de tratamentos dos planos de saúde.
Política de Estado
O secretário de saúde do estado do Amazonas, Agnaldo Gomes da Costa, disse que o
SUS é uma política de Estado que reconhece o direito de todos os brasileiros à saúde,
mas admite que há uma grave necessidade de acesso da população ao serviço.
Segundo ele, a aquisição de remédios é feita de forma descentralizada pelas 27
secretarias de saúde existentes no Brasil, sendo que apenas alguns medicamentos
passaram a ser adquiridos pelo Ministério da Saúde a partir de 2004. Ocorre que as
secretarias obtêm preços com variação significativa, principalmente nas regiões Norte,
Nordeste e Centro-Oeste, o que, segundo ele, "tem provocado sérios problemas para os
gestores estaduais”.
Costa afirmou que uma solução para isso seria a compra centralizada dos medicamentos
– a exemplo dos medicamentos contra a Aids, programa que alcançou enorme sucesso.
O secretário citou outros programas como o de transplantes, que coloca o Brasil em
segundo lugar em todo o mundo com 18.989 transplantes realizados em 2008. Desses,
92% foram feitos pelo SUS. Além disso, o Brasil é reconhecido internacionalmente por ter
um dos programas de imunização mais completos e mais bem sucedidos do mundo.
Outro exemplo é o programa de saúde da família, elogiado pela Organização Mundial de
Saúde e indicado a outros países.
De acordo com Agnaldo Costa, os argumentos apresentados nas ações que chegam ao
Poder Judiciário são tecnicamente “questionáveis e sem sustentação científica robusta”.
Isso porque muitos solicitam medicamentos sem comprovação de eficácia e eficiência,
sem a adequada relação custo-benefício e sem o reconhecimento do Conselho Federal
de Medicina. Ainda assim o Judiciário, segundo ele, acaba por conceder o acesso
obrigando o gestor a fornecê-lo mediante punições. Sua proposta para solucionar o
problema é adoção de prova técnica em que haja manifestação das esferas de gestão do
SUS que fornecerá subsídios para fundamentar a decisão do Judiciário.
“Afinal de contas, somos igualmente movidos pelo mesmo objetivo: a preservação da vida
de cada um e de todos nós”, argumentou.
As decisões judiciais no sentido de obrigar os órgãos de saúde a fornecer
medicamentos e tratamentos têm contribuído para tumultuar o SUS
O consultor jurídico do Ministério da Saúde Edelberto Luiz da Silva disse que as decisões
judiciais no sentido de obrigar os órgãos de saúde a fornecer medicamentos e
tratamentos têm contribuído para tumultuar o cumprimento da ordem ao invés de apressálo. Para ele, a carga de intimidação que sofrem os secretários e até mesmo o ministro da
saúde dificulta o cumprimento das determinações da Justiça e gera graves
conseqüências.
Ele disse que o financiamento do SUS não é de responsabilidade exclusiva da União,
mas também de estados e municípios – cujas parcelas de participação serão
estabelecidas em lei complementar que ainda tramitam no Congresso Nacional. Para ele,
é necessário apressar a aprovação dessas leis.
O consultor é otimista quanto à discussão do assunto e aponta que a realização da
audiência pública contribuirá para encontrar o caminho.
Não existe, em nenhum país do mundo, um sistema que admita todo e qualquer
tratamento
O subprocurador-geral do estado do Rio de Janeiro Rodrigo Mascarenhas destacou o
número de ações em matéria de medicamentos que, segundo ele, “tem alcançado níveis
extremamente preocupantes”. Na Procuradoria-Geral do Rio de Janeiro são recebidas,
em média, cerca de 40 novas ações sobre medicamentos por dia. Apenas em 2008, a
Secretaria teria gasto R$ 29 milhões com cumprimento de decisões judiciais.
Há uma dificuldade, de acordo com Mascarenhas, no cumprimento dessas decisões
inclusive por parte dos juízes de primeira instância. Os juízes têm um sentimento de
frustração e se vêem tentados a tomar medidas que acabam dificultando e prejudicando a
gestão do sistema. As conseqüências disso, segundo ele, são o seqüestro de verba
pública, o seqüestro de verbas na conta do próprio secretário, as ameaças de prisão a
secretários de saúde, entre outros problemas.
Mascarenhas destacou, ainda, que nenhum terço das ações de medicamentos envolvem
risco de morte ou emergência que justifique a decisão judicial. Dois terços das ações se
referem a medicamentos de uso contínuo ou exames, e ainda fraldas, suplementos
alimentares, leite e outros insumos.
“Ora, se então o argumento do respeito à vida é aquele que permite o afastamento de
normas do SUS, que ele seja ao menos usado quando efetivamente o direito à vida está
sendo ameaçado”, defendeu.
Outro problema apontado por ele são os pedidos em aberto de medicamentos. Decisões
judiciais dizem que devem ser entregues quaisquer medicamentos necessários ao longo
do tratamento e, na opinião do subprocurador-geral, essa abertura gera execuções que
não terminam, já que esse cidadão terá mais direitos do que os outros porque pode pedir
todo e qualquer medicamento ainda que não mencionado especificamente na sentença.
“Isso viola o Código de Processo Civil, que exige que os pedidos sejam concretos, e é um
problema que tem crescido e que merece atenção”, advertiu.
Destacou ainda que não existe, em nenhum país do mundo, um sistema que admita todo
e qualquer tratamento, todo e qualquer insumo, todo e qualquer medicamento, não
importa o seu custo. “Se essa questão não for enfrentada, o SUS, sem a menor dúvida,
correrá risco. Cada vez mais, mais recursos orçamentários serão destinados a menos
pessoas que têm o acesso à Justiça”, previu.
Ao final, reconheceu a necessidade de ampliação periódica das listas de medicamentos
oferecidos pelo SUS e sugeriu que a relevância da medicação seja avaliada no seu
conjunto para toda a sociedade, e não apenas na dramaticidade do caso individual.
Pesquisadora da Fiocruz pede mais diálogo sobre saúde pública entre Executivo e
Judiciário
A pesquisadora Maria Helena Barros de Oliveira, representante da Fundação Oswaldo
Cruz (Fiocruz) na audiência pública da saúde, pediu mais diálogo entre Executivo e
Judiciário nos assuntos que envolvem saúde pública. Ela também sugeriu, em sua
intervenção, a existência de espaços e consensos. “Ainda não existe um diálogo
permanente um diálogo entre o Executivo e o Judiciário em relação à saúde”, lamentou.
Ela disse que a prática do Judiciário no atendimento às demandas da sociedade por
vezes é qualificada de interventora e os magistrados são acusados de exercerem a
função executiva das políticas de saúde. “Por outro lado, coloca-se o SUS (Sistema Único
de Saúde) como ineficaz e ineficiente em seu papel de executor da política de saúde”,
acrescentou, mostrando que a saúde pública se desenvolveu bastante após a
Constituição de 1988. Ela repudiou a redução do conceito de saúde às problemáticas de
liberação de medicamentos e de determinados procedimentos médicos.
Maria Helena Oliveira, que coordena um grupo de direitos humanos e saúde da Escola
Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, também propôs na audiência a reestruturação
dos recursos humanos da saúde e das ciências jurídicas nos cursos acadêmicos. “Não
podemos ignorar a interseção entre direito e saúde”, sintetizou.
A pesquisadora reforçou o papel da Fiocruz – que há mais de 100 anos trabalha com
saúde pública e pesquisa para formar pessoas e produzir medicamentos que atendem ao
SUS.
Quarta-feira 29 de abril - GESTÃO DO SUS – LEGISLAÇÃO DO SUS E
UNIVERSALIDADE DO SISTEMA
Adib Jatene propõe edição de súmula vinculante para diminuir ações na Justiça
O primeiro palestrante do terceiro dia da audiência pública sobre Saúde no Supremo
Tribunal Federal foi o ex-ministro da Saúde e diretor-geral do Hospital do Coração em São
Paulo, Adib Domingos Jatene. Ele defendeu propostas para diminuir o número de ações
sobre saúde na Justiça, dentre as quais a edição de uma súmula vinculante para que todo
pleito de solicitação de liminar para fornecimento de medicamentos, produtos, insumos ou
procedimentos venha acompanhado da recusa da autoridade em atender o pedido.
Considerando seu acompanhamento da evolução do sistema de saúde no Brasil há 60
anos, ele trouxe números para mostrar a assimetria dos recursos no setor saúde,
segundo estudo que realizou em 1999 na cidade de São Paulo procurando analisar a
distribuição dos leitos. “Encontrei 25 distritos com 1,8 milhão de pessoas, que têm de 10 a
46 leitos por mil habitantes, média de 13 leitos/mil habitantes. Temos 71 distritos com 8,2
milhões que têm 0,5 leitos por mil habitantes, e dos quais 39 distritos com 40 milhões de
habitantes não têm um leito sequer”, citou.
Para o ex-ministro, depois que se decidiu por um sistema universal de saúde, formaramse dois sistemas. “Um público responsável por vigilância sanitária, epidemiológica,
controle de alimentos, medicamentos, imunizações, combate às endemias e assistência
médica hospitalar e ambulatorial; e um privado, responsável apenas por assistência
médica hospitalar e ambulatorial”, explicou.
Segundo Jatene, quando os problemas na área de saúde não têm solução, recorre-se ao
Judiciário, frequentemente sem audiência prévia dos gestores da saúde e sem considerar
as políticas públicas que buscam equacionar a maior eficiência diante das limitações dos
recursos. “Não há no orçamento um fundo para atender eventuais demandas judiciais,
nem a área econômica socorre o setor da saúde com aporte financeiro capaz de atender
a determinação judicial”, alertou.
De acordo com ele, a consequência é o comprometimento de programas, com prejuízo
para número significativamente maior de pessoas que, sem recursos, dependem dos
programas do SUS. “Só em São Paulo, a Secretaria de Saúde dispendeu no ano passado
mais de R$ 1,2 bilhão com essas questões. Acresce que as demandas são geralmente
feitas por quem está vinculado ao sistema privado, que dispõe para o atendimento médico
hospitalar e ambulatorial mais de cinco vezes o que o SUS dispõe para o mesmo tipo de
atendimento”, afirmou. Segundo o médico, as pessoas vão ao Judiciário sem verificar se o
seu pleito se enquadra nas prioridades das políticas do SUS.
Adib Jatene fez propostas, considerando ter acompanhado as dificuldades na Secretaria
de Saúde de São Paulo e verificado que perto de 60% dos pleitos não necessitariam da
demanda ao Judiciário. “Quanto aos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas, que
consideramos essenciais para adequada assistência, propomos atualizar os já existentes
e elaborar novos protocolos atualizando-os a cada dois anos; quanto à incorporação de
novas tecnologias, insumos e medicamentos, propomos o aperfeiçoamento da Comissão
de Incorporação de Tecnologia do Ministério da Saúde, ampliando sua composição,
agilizando suas decisões, tornando seu funcionamento mais transparente”, explicou.
Outra proposta foi pelo aperfeiçoamento da organização da pesquisa em rede de centros
de referência para estabelecer nacionalmente resultados. Quanto às ações judiciais,
propôs que fossem criados mecanismos necessários para oferecer ao Judiciário
assessoria técnica em Centros de Referência por profissionais ad hoc sem conflito de
interesse e sem relação com assistência e prescrição dos pacientes.
Por fim, Jatene propôs a edição de uma súmula vinculante para que todo pleito de
solicitação de liminar para fornecimento de medicamentos, produtos, insumos ou
procedimentos venha acompanhado da recusa da autoridade em atender o pedido. “Isto
significa que a reivindicação foi apresentada e não atendida, assim a decisão do juiz seria
sobre uma recusa do gestor do SUS e também as razões da recusa seriam consideradas
na decisão”, defendeu. Para ele, essa medida pode diminuir o número de ações, evitar
fraudes e trazer decisões mais adequadas, levando a um estímulo da administração no
aprimoramento de seus protocolos em benefício dos pacientes.
Conass defende o uso racional de recursos públicos no fornecimento de
medicamentos
O presidente do Conselho Nacional de Secretários da Saúde (Conass), Osmar Gasparini
Terra, foi o segundo palestrante de hoje (29). O tema debatido neste terceiro dia da
audiência pública é a “Gestão do SUS – Legislação e Universalidade do Sistema”.
De acordo com ele, o Conass, como representante dos gestores estaduais, procura criar,
de alguma forma, metodologia que permite garantir o direito da população ao atendimento
integral à saúde em todos os seus níveis, em parceria com os municípios e com o
governo federal.
Para o presidente do Conass, o objetivo da ação estatal deve abranger medidas que
garantam uma oferta adequada de medicamentos em termos de quantidade, qualidade e
eficácia. “Deve-se garantir o efeito do medicamento, a melhoria do paciente, respeitando
o recurso público que irá render mais em benefício da população”, disse.
Números
Osmar Terra observou que, entre os anos 2000 e 2007, a União reduziu seus
investimentos de 60% para 45% do total de gastos com ações e serviços de saúde,
enquanto que os estados aumentaram de 19% para 27%, e os municípios de 22% para
28%. “É preciso que a Emenda Constitucional nº 29 seja regulamentada o mais urgente
possível para que se garanta, efetivamente, os cumprimentos dos serviços e ações de
saúde”, disse.
Segundo estimativas da Organização Mundial de Saúde (OMS), em 2005 foram gastos
em saúde no Brasil 7,9% do PIB, sendo 44% de gastos públicos e 55,9% de gasto
privado. O presidente do Conass informou que, atualmente, os estados e o Distrito
Federal são os responsáveis pela programação, aquisição, armazenamento e distribuição
desses medicamentos aos pacientes cadastrados de acordo com os protocolos clínicos e
diretrizes terapêuticas estabelecidos pelo Ministério da Saúde.
Estima-se que em 2008 foram gastos mais de R$ 3 bilhões só na área dos medicamentos
excepcionais. Este valor chega a um custo próximo aos R$ 6 bilhões por ano se somados
os medicamentos estratégicos e, conforme Osmar, aumenta muito ano a ano.
Exemplos mundiais de acesso a medicamentos
No Reino Unido, é o instituto nacional de saúde e excelência clínica que aprova os
medicamentos aos quais os pacientes terão acesso. A Inglaterra foi um dos primeiros
países a adotar a relação custo/efetividade para decidir quanto pagar por determinado
medicamento.
Na Alemanha, o governo define os tratamentos e os medicamentos que são
reembolsáveis. Na Espanha, a legislação sanitária de 2006 definiu os serviços de saúde a
partir dos critérios de eficácia, eficiência, efetividade, segurança e utilidade terapêutica,
bem como vantagens e alternativas essenciais, além de cuidados aos grupos menos
protegidos ou de risco, levando-se em consideração as necessidades sociais e os
impactos econômicos e de organização.
“Nesses países há preocupação com a existência de evidências científicas que
justifiquem a utilização dos medicamentos cujos custos sejam reembolsáveis no todo ou
em parte”, disse Osmar Terra, ressaltando que nos países que dispõem de sistemas
públicos de saúde, com cobertura universal, a questão do acesso ao medicamento é um
problema de difícil solução com variadas formas de abordagem.
Conclusões
Os secretários estaduais de saúde consideram que proporcionar o acesso ao
medicamento necessário aos seus usuários deve ser um compromisso das três esferas
de gestão do SUS. Segundo o presidente do Conass, devem ser observadas “as
competências e os impactos estabelecidos quanto ao acesso de medicamentos, desde
que estes estejam registrados na Anvisa e que sua indicação esteja em conformidade
com o registro, incluído nos protocolos do Ministério da Saúde, “ficando excluído o
fornecimento de medicamentos em fase de experimentação, e cuja indicação tenha
caráter experimental”.
Dessa forma, Osmar Terra salientou ser compromisso dos gestores do SUS a oferta de
procedimentos diagnósticos e terapêuticos que apresentem comprovada eficácia e que
não tenham caráter nem indicação experimental. “Os secretários entendem imprescindível
que o Ministério da Saúde mantenha atualizados os protocolos clínicos e diretrizes
terapêuticas com revisão periódica e que a inclusão de novos procedimentos diagnósticos
e terapêuticos do SUS seja precedida de criterioso processo de avaliação”, disse.
Por fim, reconheceu a necessidade de regulamentação das obrigações do SUS em
relação à oferta e ao acesso de procedimentos diagnósticos terapêuticos e medicamentos
por meio de lei complementar que defina, inclusive, as competências e responsabilidades
das diferentes esferas de governo. Propôs, ainda, a instituição de um colegiado em
âmbito nacional de caráter permanente e autônomo para assessoramento direto ao
Ministério da Saúde na definição de inclusão e exclusões de tecnologias do SUS. Sua
composição deverá incluir representantes do Ministério da Saúde, Anvisa, ANS,
CONASS, CONASENs, Conselho Nacional de Saúde e entidades científicas.
“Embora haja um longo e difícil caminho a ser percorrido muito tem sido feito.
Significativos desafios colocam os gestores do SUS na tarefa de assegurar o cuidado
efetivo de qualidade de todos os cidadãos brasileiros”, ressaltou, finalizando que o
Conass não é contra as ações judiciais, mas, sim, a desorganização do sistema com o
aumento de despesas de medicamentos que não fazem efeitos.
Presidente da Ampasa critica política atual do SUS e defende atuação conjunta dos
Três Poderes
No terceiro dia da audiência pública que discute o Sistema Único de Saúde (SUS), o
presidente da Associação Nacional do Ministério Público de Defesa da Saúde (Ampasa),
Jairo Bisol, fez duras críticas à atual política do SUS e defendeu que os poderes
Judiciário, Legislativo e Executivo devem atuar juntos na busca de uma solução que,
segundo ele, é fazer com que o sistema de saúde cumpra o que a Constituição Federal
definiu.
Ele lembrou que o SUS é criação permanente da cidadania brasileira com forte
participação da sociedade civil organizada, mas ponderou que não é possível fazer um
sistema abrangente e universal de saúde com 230 dólares per capta ao ano. Segundo
Bisol, o SUS está “sendo construído em cima de um modelo de ofertas oriundas do
complexo industrial de grupos corporativos e dos planos privados de saúde e não das
demandas da população”. Dessa forma, segue uma lógica “assistencialista subvertendo
suas diretrizes e princípios constitucionais, especialmente o da integralidade”.
Ele criticou a falta de investimento e controle do SUS, que virou alvo, em muitos setores,
de fraudes e desvios de recurso públicos decorrentes do “apagamento deliberado da linha
limítrofe entre o interesse público e o interesse privado, induzindo uma relação promíscua
entre ambos. Em sua opinião, é a falta de transparência que atinge o sistema.
Fez críticas também às privatizações e terceirizações, que em sua opinião ofendem a
Constituição Federal e atropelam o domínio estatal, gerando a “irracionalidade imposta
pela lógica do lucro”.
Bisol defende que o SUS não pode ser confundido como um mega plano de saúde para
pobres e que a lógica da saúde é pública e não privada. “A saúde não é e nem pode ser
tratada como uma mercadoria. O titular do direito à saúde é o cidadão, e não o
consumidor”.
O presidente da Ampasa defende a aprovação da Emenda Constitucional 29, que traria
mais recursos para o sistema e defendeu que o STF inaugure um movimento de
aproximação dos poderes porque, para ele, as questões estruturais do sistema não vão
ser resolvidas num único poder. “É preciso abrir um diálogo mais amplo, mais intenso”,
afirmou.
Defensoria Pública de São Paulo reduziu em 90% ações por medicamentos na
Justiça
Ainda durante o terceiro dia da Audiência Pública sobre Saúde, o defensor público Vitore
André Zílio Maximiano, da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, falou sobre a
experiência da instituição na cidade de São Paulo que trouxe diminuição em cerca de
90% do número de ações por medicamentos na Justiça. Segundo explicou, a Defensoria
firmou parceria com a Secretaria de Estado de Saúde para que as pessoas que
necessitam de medicamentos, sejam oficiais ou excepcionais, sejam atendidas por
técnicos que indicam como podem ser obtidos.
De acordo com Vitore Maximiano, com a evolução da tecnologia e da ciência, muitas das
patologias hoje são passíveis de um enfrentamento digno no que toca ao tratamento e à
medicação. Mas, para ele, da mesma forma que há muito a comemorar, a questão se
torna dramática quando alguém se depara com uma patologia e percebe que sua limitada
capacidade financeira a impedirá de receber tratamento ou a medicação correta. Para o
defensor, é neste momento que o Estado cumpre seu papel determinante de oferecer o
tratamento digno, mas muitas vezes faltam recursos para a área.
Vitore Maximiano afirmou que a defensoria traz o olhar da pessoa carente, daqueles que,
até pela falta de cultura, têm dificuldade em buscar qual o local adequado para obter
medicamentos que constam das listas oficiais. Para ele, mesmo quando essas pessoas
chegam aos locais onde, em tese, há distribuição, esses medicamentos não estão à
disposição naquele momento por falta de planejamento, mesmo sendo vitais para
sobrevida, recuperação, cura ou acompanhamento de uma patologia.
O defensor explicou o trabalho desenvolvido em parceria com a Secretaria de Saúde, em
São Paulo, iniciado há cerca de um ano. “Temos hoje realizado uma solução
administrativa para a dispensa de medicamentos, quer das listas oficiais quer também dos
chamados medicamentos excepcionais”, disse. De acordo com ele, as pessoas que
procuram a Defensoria Pública na cidade de São Paulo são encaminhadas a um
atendimento por técnicos da Secretaria de Saúde, que se localizam fisicamente dentro do
prédio da Defensoria. Segundo afirma, esses atendimentos ocorrem terças e quintas e
não há filas.
Maximiano informou que, em se tratando de medicamento da lista oficial, a que por
ventura não teve acesso em razão das dificuldades de logística na distribuição, este
paciente já receberá a indicação precisa de qual o local onde o medicamento está à
disposição, para onde é imediatamente encaminhado para retirada, sem qualquer
burocracia.
Em relação aos medicamentos tidos como excepcionais, o defensor explicou que é
inaugurado um procedimento administrativo, no âmbito da Secretaria. De acordo com ele,
o paciente é submetido à avaliação de um médico para confirmação do diagnóstico
através da exibição dos próprios exames, confirmando-se a patologia e a combinação
com a medicação prescrita, e esta medicação, estando inscrita na Anvisa, é entregue ao
paciente num período médio de 30 a 40 dias. “Os casos excepcionais, diante da
gravidade da patologia, são tratados também de forma excepcional, com prazo bastante
exíguo”, informou.
Segundo o defensor, essa experiência produziu um resultado bastante positivo. “Nós
temos na Defensoria Pública de São Paulo uma unidade específica para mover ações
contra a Fazenda Pública municipal ou estadual. Na área de medicamentos nosso volume
era de aproximadamente 150 a 180 ações por mês na cidade de São Paulo, hoje este
número é de aproximadamente 15 a 18 ações”, comemorou. Segundo conta, o esforço
conjunto, por meio da Secretaria de Saúde, Defensoria Pública e diversos
parceiros, reduziu em cerca de 90% a judicialização das ações referentes ao fornecimento
de medicamentos. “Isso fundamentalmente conseguindo atender ao paciente, que é a
razão de ser da Defensoria Pública, do próprio Estado”, concluiu.
Vitore Maximiano explicou ainda que esta experiência da capital está sendo estendida, a
partir de maio, a toda a grande São Paulo, onde há um bolsão de pobreza e também um
grande volume de ações. De acordo com ele, a logística indica agora que o atendimento
ocorra em um único local, para facilitar compras e a distribuição, mas o fato é que o
Estado assume o seu papel determinante no fornecimento de medicamentos. Segundo o
defensor, as questões que não são resolvidas pela via administrativa são levadas ao
Judiciário. “Não queremos com a busca de uma solução alternativa diminuir a importância
da judicialização”, finalizou.
Paulo Ziulkoski diz que municípios são prejudicados no financiamento à saúde
Em nome dos 5.563 municípios brasileiros, Paulo Ziulkoski, presidente da Confederação
Nacional dos Municípios (CNM), participou da audiência pública sobre o Sistema Único de
Saúde (SUS) e protestou contra a demora do Congresso Nacional em criar uma lei
complementar que define o regime comum de competência. A Constituição Federal de
1988 determinou em seu artigo 23 que a responsabilidade dos estados, municípios e da
União no SUS seria definida por uma lei complementar. Ziulkoski disse que é
“vergonhoso” saber que vinte anos depois ainda não existe sequer o início dessa
discussão.
Ele afirmou que os municípios são prejudicados quando o Congresso Nacional cria
contribuições que não são partilhadas e, dessa forma, mantém a arrecadação nacional
nas mãos da União.
Ele mostrou dados para comprovar que os municípios estão investindo em saúde, em
média, 30% a mais do mínimo determinado pela Emenda Constitucional e com isso
afirmou que o subfinanciamento da saúde tem que ser creditado à União e aos estados, e
não aos municípios. Disse também que os municípios são mais cobrados que os estados,
pois se não cumprem a aplicação do percentual em saúde, têm suas contas reprovadas,
enquanto os estados não.
Um exemplo da dificuldade apontada por ele é o programa Saúde da Família, que tem 30
mil equipes em todo o Brasil. A União remete para os municípios R$ 5.400 por mês para
manter um médico, enfermeiro e auxiliar de enfermagem. No entanto, na prática, o
município gasta de R$ 23 a 43 mil por equipe. Ele diz que o programa é bom, mas que o
dinheiro repassado não é suficiente.
Assim, direcionou um pedido ao Supremo para que, ao apreciar a proposta de súmula
vinculante – apresentada nesta manhã pelo ex-ministro da Saúde Adib Jatene –, “olhe
com muito carinho a questão do financiamento”, porque se não os municípios serão mais
uma vez colocados em igualdade com União e estados de forma injusta.
Presidente do STF faz balanço dos primeiros três dias de audiência pública sobre o
SUS
Ao encerrar a sessão desta quarta-feira da audiência pública sobre o Sistema Único de
Saúde (SUS), o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes,
verificou a existência de um consenso básico entre os diversos setores da sociedade
ouvidos durante os três primeiros dias de debates. Segundo ele, todos defendem o
direito à saúde e a necessidade de constituição de novos parâmetros para a resolução
dos conflitos.
“Nós já temos um excesso de judicialização no que concerne ao contexto geral”, disse o
ministro ao divulgar que, atualmente, tramitam no Brasil 67 milhões de processos. “É um
número que refoge a qualquer paradigma considerado razoável no mundo, daí a
necessidade de que nós busquemos alternativas a fim de realizar o direito com menor
intervenção judicial”, afirmou.
O presidente do STF citou a experiência das Defensorias Públicas dos estados do Rio de
Janeiro e São Paulo, que mostram a possibilidade viável de diminuição significativa do
número de ações ajuizadas sobre o direito à saúde. Conforme o ministro, a busca da
conciliação prévia e discussões alternativas no plano administrativo, principalmente nos
casos de direito reconhecido por políticas públicas existentes no SUS, não significa,
necessariamente, uma diminuição da importância do papel do Poder Judiciário, mas antes
viabiliza indiretamente a redução do próprio gasto com a saúde. "A judicialização dos
conflitos tem também o seu preço, o seu custo, que muitas vezes nós não estimamos”.
Ele revelou que a insegurança jurídica também é resultado de uma excessiva
judicialização do direito à saúde. “Sabemos que em alguns casos, a solução judicial pode
não se mostrar a mais eficiente, como foi aqui demonstrado”, disse.
Para Gilmar Mendes, já se pode chegar a um entendimento no sentido de que os
problemas da eficácia social do direito à saúde devem-se mais às questões ligadas à
implementação e manutenção das políticas públicas já existentes, do que à falta de
legislação específica. Assim, de acordo com ele, o problema muitas vezes não é de
inexistência, mas de execução das políticas de saúde.
“Nessa perspectiva, talvez seja necessário redimensionar a questão da judicialização dos
direitos sociais no Brasil. Isto porque na maioria dos casos a intervenção judicial não
ocorre tendo em vista uma omissão legislativa absoluta em matéria de políticas públicas
voltadas à proteção do direito de saúde, mas em razão da necessidade de determinação
judicial para o cumprimento de políticas já estabelecidas”, ressaltou o ministro.
Ele salientou que é preciso refletir sobre a normatização e, portanto, sobre “a definição de
marcos legais precisos para as políticas públicas de saúde”, além da necessidade de se
assegurar a ampla informação a respeito das normas e procedimentos do SUS. “A
efetividade do direito à saúde é indissociável do grau de conhecimento do cidadão das
políticas existentes. Sem informação não há exercício pleno desse direito”, concluiu,
destacando que a realização dessa audiência pública contribuirá para esses objetivos.
“O material aqui colhido já está sendo objeto de ampla divulgação por diversos meios, de
forma a alcançar o maior número possível de segmentos da sociedade civil e de cidadãos
em geral”, finalizou.
Especialistas do Ministério da Saúde traçam quadro das ações judiciais na área de
alimentos e tratamento médico
Especialistas do Ministério da Saúde apresentaram um levantamento sobre as ações
judiciais na área de alimentos e de tratamento médico durante esta quarta-feira (29). Elas
participaram como palestrantes no terceiro dia da audiência pública realizada pelo
Supremo Tribunal Federal (STF) para discutir o direito à saúde.
A coordenadora-geral da Política de Alimentos e Nutrição do Departamento de Atenção
Básica do Ministério da Saúde, Ana Beatriz Pinto de Almeida Vasconcelos, informou que
há atualmente 113 ações judiciais que envolvem consultas do órgão a pedido de gestores
municipais do Sistema Único de Saúde (SUS).
Segundo ela, essas ações judiciais “estão apoiadas apenas na prescrição de alimentos
especiais sem a associação com avaliações da saúde, de nutrição, como determina a boa
prática da nutrição clinica”.
Ela acrescentou ainda que esses processos são caracterizados pelo pouco detalhamento
do diagnóstico, pela falta de informação referente ao quadro da evolução nutricional do
paciente e pela prescrição de alimentos especiais com base tão-somente na marca dos
produtos, sem indicação de condutas alternativas.
Dados do primeiro semestre deste ano mostram que 75% dos processos versam sobre
alergia alimentar, seguidos de casos sobre doenças do trato gastrointestinal.
Tratamento no exterior
Já a diretora do Departamento de Regulação, Avaliação e Controle de Sistema da
Secretaria de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde, Cleusa da Silveira Bernardo, fez
um apelo ao Poder Judiciário.
“Quero solicitar desta Corte que nossas insuficiências não sejam utilizadas no sentido de
comprometer essa organização que a gente levou tanto tempo para construir”, disse, ao
se referir à organização do SUS.
Segundo ela, um trabalho realizado pelo Ministério da Saúde em conjunto com o Poder
Judiciário, com a Advocacia Geral da União (AGU) e Colégio Brasileiro de Oftalmologia
permitiu praticamente zerar o número de ações em um dos temas mais judicializados na
área da saúde: o encaminhamento de pacientes ao exterior.
De acordo com ela, pedidos judiciais para tratamento em Cuba de uma doença rara
chamada retinose pigmentar, que leva à perda progressiva da visão, predominavam entre
os processos desse tipo.
“Gastávamos verdadeiras fortunas encaminhando esses pacientes a Cuba, sem a
comprovação cientifica da sua cura”, afirmou. Segundo ela, muitos pacientes tratados
foram, posteriormente, diagnosticados com graves lesões oculares.
Dados do Ministério da Saúde indicam que, entre 2003 e 2005, foram gastos em torno de
U$ 1 milhão com esse tratamento. De 1995 a 2005, 950 pacientes foram encaminhados a
Cuba a um custo médio de R$ 20 milhões, valor suficiente para operar 3.800 pacientes
com catarata.
Cleusa chamou a atenção para um outro tipo de ação judicial que prepondera na área da
saúde: o tratamento fora do domicílio. Segundo ela, a solução desses casos deve levar
em conta critérios diversos, como, por exemplo, o esgotamento da possibilidade de ser
atendido onde reside, o que nem sempre ocorre.
O especialista alertou que muitos pacientes beneficiados por decisões judiciais para
tratamento fora do domicilio “furam” a fila do SUS, prejudicando outros pacientes e
gerando desigualdade nos atendimentos.
Experiência da saúde no DF é abordada por representantes da Associação Nacional
do Ministério Público de Contas
Representantes da Associação Nacional do Ministério Público de Contas, em parceria
com o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, participaram da audiência
pública sobre Saúde, nesta quarta-feira (29), no Supremo Tribunal Federal. Falaram
a procuradora do MP de Contas do DF Cláudia Fernanda de Oliveira Pereira e a
promotora de justiça do MPDFT Cátia Gisele Martins Vergara.
A explanação, realizada com base na experiência do Distrito Federal, foi dividida em duas
partes. A primeira abordou a questão orçamentária legal e a segunda as ações judiciais.
Orçamento
Segundo Cláudia Pereira, o Tribunal de Contas da União entende que a situação do
desabastecimento de medicamentos na área da saúde do Distrito Federal não se origina
da falta de liberação de recursos federais do Ministério da Saúde para a Secretaria de
Estado do Distrito Federal. “As causas vão desde as aquisições anti-econômicas de
medicamentos, sem o compromisso com a busca do melhor custo/benefício até a forma
inadequada de gestão administrativa dos recursos repassados”, disse.
Em 2006, quando era severo o desabastecimento no DF, o Ministério Público verificou
que pelo menos 90% dos recursos para essas aquisições vieram da União. Desses
recursos havia R$ 8 milhões parados em conta. “É que o sistema de liberação de cotas
financeiras deixa parte da saúde dependente, ainda que os recursos da União sejam
corretamente liberados para o Distrito Federal”, explicou.
Em 2007, foram investidos na capital, em medicamentos excepcionais, R$ 59,7 milhões.
Já em 2008, houve uma redução de 50% do valor total em relação ao ano anterior.
Apesar de a União manter o valor dos repasses, o DF aportou 66% a menos que em
2007.
A procuradora informou que o orçamento do DF para saúde, em 2008, foi de R$ 1,7
bilhões, ou seja, o programa de aquisição de medicamentos excepcionais representa
apenas 1,8% de todo o orçamento da saúde local. Ela também revelou que no mesmo
ano foram gastos com publicidade, somente na administração direta distrital, R$ 144
milhões.
“A partir desse diagnóstico no DF, o Ministério Público de contas do Distrito Federal e o
MPDFT entendem que a tentativa de solucionar esta questão está condicionada a uma
regulação com base em marcos legais precisos, os quais não reflitam apenas a posição
do poder público, mas de todos os atores do processo, profissionais de saúde, cidadãos,
enfim, a sociedade”, salientou.
Gestão e ações judiciais
A promotora de Justiça Cátia Vergara ressaltou que a maioria das ações judiciais sobre o
tema pretendem ver cumpridas políticas públicas existentes, ou minoradas as
conseqüências da sua não execução. “Podemos afirmar que, ao menos no Distrito
Federal, o Judiciário não está a criar ou a redefinir políticas públicas, embora esse seja o
argumento frequentemente utilizado pelo Poder Executivo nas contestações judiciais”,
afirmou.
“O que se busca é que o Executivo cumpra os compromissos assumidos nas próprias
políticas que estabeleceu”, frisou. Ela completou sua participação na audiência
destacando que seria necessário evitar doenças, mas a sociedade está pagando um alto
preço pela falta de prevenção. “Esse custo poderia em grande parte ser evitado se
houvesse a reorganização do modelo de assistência à saúde e a porta de entrada do
sistema passasse a ser a atenção básica e preventiva”, disse.
Governo de SP mapeou fraudes em processos para fornecimento de medicamentos
Último a se pronunciar na sessão desta quarta-feira na audiência pública sobre saúde, no
Supremo Tribunal Federal, o representante da Secretaria de Segurança Pública e do
governo de São Paulo, delegado Alexandre Sampaio Zakir, relatou uma experiência do
governo estadual em identificar casos fraudulentos nas demandas judiciais para fornecer
medicamentos.
Ele explicou que, com o número crescente de demandas judiciais, o governo de São
Paulo criou um núcleo de inteligência formado por representantes das secretarias de
Saúde e de Segurança Pública e da Procuradoria Geral do estado para mapear a
“avalanche de ações dos últimos cinco anos”.
O primeiro passo, segundo ele, foi implementar um sistema informatizado com dados de
pessoas envolvidas nas demandas judiciais relativas ao fornecimento de medicamentos.
A partir daí, constatou-se o atendimento, pelo governo, de 31 mil beneficiários das
condenações judiciais. “Esse número salta aos olhos do administrador público, uma vez
que já foram propostas mais de 40 mil ações judiciais contra o estado de São Paulo”.
Segundo ele, os gastos do governo com medicamentos, provocados pelas demandas
judiciais, passam de R$ 400 milhões por ano.
O estudo detalhado dessas informações apontou a coincidência de médicos, advogados,
dirigentes de organizações não governamentais que congregavam pacientes de psoríase,
e medicamentos prescritos por marcas, na maioria das vezes, e de alto valor.
Assim, foi descoberta a atuação de uma organização criminosa constituída para obrigar o
estado a fornecer medicamentos pela via judicial e aumentar as vendas da indústria
farmacêutica. As investigações foram encaminhadas ao Ministério Público, que ofereceu
denúncia contra os investigados que agora respondem a ação penal.
“O maior prejuízo não é o financeiro causado ao tesouro, mas o causado à vítima dessa
organização criminosa, o paciente, que muitas sequer era portador de psoríase ou, se a
portava, não era em grau que justificasse a ministração de medicação tão forte, expondo
a risco de morte essas pessoas”, ressaltou Zakir.
O delegado informou, ainda, que o trabalho do núcleo de inteligência serviu de base para
aproximadamente 40 inquéritos em que foi confirmada a mesma forma de agir e que o
grupo governamental, ainda em atividade, já detectou outras modalidades de fraude.
04/05/2009 REGISTRO NA ANVISA E PROTOCOLOS E DIRETRIZES TERAPÊUTICAS
DO SUS
Critérios para fornecimento de medicamentos pelo SUS em debate na audiência
pública de hoje
Na abertura da segunda semana da audiência pública realizada no Supremo Tribunal
Federal (STF) para discutir a saúde pública no Brasil, o presidente do Tribunal, ministro
Gilmar Mendes, lembrou que o objetivo é ouvir o depoimento de pessoas com experiência
e autoridade em matéria do Sistema Único de Saúde (SUS) e que os debates deverão
esclarecer questões técnicas científicas, administrativas, políticas, econômicas e jurídicas
relativas às ações de prestação de saúde do SUS.
Ele lembrou que muitos cidadãos buscam garantir na Justiça o acesso a medicamentos e
outras prestações de saúde prescritas por médicos credenciados junto ao SUS, mas
ainda não registrados na ANVISA ou não recomendados pelos protocolos do sistema.
Essas ações no Judiciário deram impulso à realização da audiência e o ministro espera
que os conhecimentos técnicos e as experiências práticas expostas nesta segunda-feira
(4) contribuam para o esclarecimento das razões que levam, em alguns casos, ao
descompasso entre os protocolos e diretrizes terapêuticas do SUS e o tratamento
prescrito para algumas doenças.
Medicamentos não registrados pela ANVISA
O diretor-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), Dirceu
Raposo de Mello, explicou os critérios para que um medicamento seja registrado pela
entidade e todo o processo necessário para tanto. Ele disse que o tema é regulamentado
pela Lei 6.360/76 e que nenhum dos produtos de que trata a lei, inclusive importados,
poderá ser industrializado, posto à venda ou entregue ao consumo antes de registrado no
Ministério da Saúde. Assim, os técnicos da agência se debruçam para constatar a
segurança, eficácia e qualidade farmacotécnica do produto.
No caso de medicamentos inovadores, ele explicou que a entrada de produtos novos no
mercado é massiva e tem uma velocidade de inovação muito rápida, portanto é
fundamental que se faça um olhar sobre a sua incorporação observando o uso racional
desses produtos.
Os pré-requisitos da ANVISA para a aprovação de um medicamento passa por uma
avaliação da eficácia e observação do desfecho clínico para conceder ou não o registro. A
agência observa a segurança e bem estar do sujeito da pesquisa e atualmente tem
trabalhado na criação e ampliação de um ambiente propício para desenvolvimento com
segurança de estudos clínicos no Brasil.
Ele observou que as indústrias farmacêuticas sabem muito mais do que o usuário de
medicamentos, então, a informação dos profissionais de saúde e a busca por essa
informação é muito importante para a decisão da prescrição dos produtos.
Conselho Federal de Medicina
Em seguida, falou o representante do Conselho Federal de Medicina Geraldo Guedes. Ele
afirmou que a contribuição do conselho é essencialmente quanto à garantia do direito à
saúde e suas repercussões no Judiciário quando esses direitos não se efetivam.
O médico afirmou que está claro que se os problemas do SUS fossem simples de resolver
não seria necessária a realização da audiência pública. Ele observou que 40 milhões de
brasileiros têm planos de saúde porque não se sentem seguros no sistema e protestou
contra o sub-financiamento do SUS. Afirmou que o Brasil aparece em penúltimo lugar,
numa comparação entre doze países da América, em investimento público na saúde.
“Este aporte ainda precário de recursos públicos para a saúde é o fato mais grave a
induzir um lento desenvolvimento do SUS, penalizando as populações mais carentes e
condenando-as a iniquidade de acesso ao sistema”, disse.
Defendeu ainda um plano de carreira para os médicos e salários justos para a categoria e
expôs que a sociedade reage com violência contra o bem público e os profissionais de
saúde quando não é atendida, bem como recorre ao Judiciário para ver garantido seu
direito à saúde.
Depoimento
Também contribuiu na audiência o fundador do grupo Hipupiara Integração e Vida, Luiz
Alberto Simões Volpe. Ele é portador do vírus HIV, já recorreu diversas vezes ao
Judiciário para garantir os medicamentos e disse que, graças à integralidade do
tratamento que recebeu, é que está vivo.
A instituição que dirige atende mais de 200 pessoas com HIV e ele pediu equilíbrio aos
ministros do STF ao julgarem a questão da integralidade do fornecimento de remédios.
Ele defende que os medicamentos experimentais devem continuar sendo custeados pelos
laboratórios responsáveis pelos estudos e que os medicamentos não licitados e que não
fazem parte da lista do SUS, mas certificados internacionalmente, devem ser
disponibilizados administrativamente sem necessidade de intervenção judicial.
Defendeu também a desburocratização na importação dos medicamentos que, para ele,
não deve obedecer aos mesmos critérios que automóveis, por exemplo.
Participação popular
Sueli Gandolfi Dallari, representante do Centro de Estudos e Pesquisa de Direito Sanitário
da Universidade de São Paulo (USP), sustentou que o direito à saúde, em virtude de sua
grande complexidade – e nele incluído o direito a medicamentos –, exige uma efetiva
participação popular na definição das políticas públicas para o setor. “Impossível defini-la
em última instância num gabinete”, afirmou. “É necessário que o povo diga o que entende
por saúde e por políticas de saúde”.
Segundo Sueli Dallari, deve haver o controle judicial em todas as fases de definição das
políticas de saúde. Entretanto, “não se deve transformar o juiz em médico ou gestor
público. Ele deve, sim, observar os protocolos clínicos e as diretrizes do Ministério da
Saúde”.
Problemas no RS
A procuradora do Estado do Rio Grande do Sul Janaína Barbier Gonçalves afirmou que a
jurisprudência brasileira tem entendido que o direito à saúde, estabelecido no artigo 196
da Constituição Federal (CF), “é um direito ilimitado que implica a obrigação do poder
público de fornecer todo e qualquer medicamento”.
Entretanto, como ela observou, este dispositivo é restritivo, pois condiciona o seu
cumprimento a políticas sociais e econômicas. Portanto, segundo ela, esse atendimento
dever ser global e submeter-se aos planos orçamentários do respectivo órgão público.
Ela disse que a Procuradoria Geral do Rio Grande do Sul não contesta as ações em que
são demandados medicamentos excepcionais prescritos de acordo com os protocolos do
Ministério da Saúde. Entretanto, segundo ela, a maioria das ações judiciais propostas no
país reclamando o fornecimento de medicamentos excepcionais não observa esses
protocolos.
Ela informou que os gastos com decisões judiciais vêm sendo vertiginosos, no Rio
Grande do Sul. Dados da Secretaria de Saúde do estado por ela citados indicam que,
atualmente, 41% do orçamento daquele órgão são gastos com a política de assistência
farmacêutica. Há, segundo tais dados, 87.966 pacientes atendidos pela via administrativa
e 20.497 pela via judicial. “Portanto, 18,92% da assistência farmacêutica do estado estão
sendo administrados pelo Judiciário”, observou a procuradora.
Ainda segundo ela, embora houvesse, em 2008, acréscimo de 40% na aquisição de
medicamentos pela via administrativa, isso não diminuiu o número de ações judiciais, que
cresceram 16%, no ano passado em relação a 2007.
Ela ressaltou que, na via judicial, apenas 14,31% dos processos envolvem demanda de
medicamentos especiais e 9,4% de excepcionais, prescritos de acordo com os protocolos
do Ministério da Saúde, que são os medicamentos cujo fornecimento compete ao estado.
Enquanto isso, 76,23% das demandas judiciais contra o estado abrangem medicamentos
que não são de sua competência, sendo que 18,25% são relativas a medicamentos
prescritos em desacordo com os protocolos clínicos e 46,84% a produtos que não são
fornecidos pelo SUS, entre eles medicamentos importados e sem registro na Anvisa.
Além disso, 66% dos medicamentos excepcionais fornecidos por via judicial não atendem
aos protocolos clínicos e às diretrizes terapêuticas do Ministério da Saúde, observou.
Em razão das decisões judiciais, o estado é obrigado a fornecer 3.300 apresentações
farmacêuticas, das quais somente cerca de 500 fazem parte dos elencos atendidos
administrativamente e 2.800 são fornecidos por força de decisões judiciais, em
antecipação de tutela para fornecimento em 48 ou 72 horas, sob pena de bloqueio de
verbas orçamentárias.
Assim, segundo a procuradora, “a intervenção judicial é um dos óbices a que o estado do
Rio Grande do Sul cumpra regularmente suas obrigações de fornecimento de
medicamentos na via administrativa”.
Ela propôs que só seja permitido o acesso a medicamento pela via judicial quando o
produto for registrado na Anvisa e que, fora da lista do SUS ou com registro na Anvisa, só
se determine o fornecimento em casos muito excepcionais e somente em sentença final.
Especialistas defendem estudo de eficácia de medicações e tratamentos antes de
incorporação pelo SUS
Representantes de universidades públicas, do Ministério da Saúde e da Secretaria de
Saúde do estado de São Paulo ressaltaram a importância dos estudos controlados de
novos medicamentos e tratamentos antes de sua incorporação pelo Sistema Único de
Saúde (SUS) durante o início da segunda semana da audiência pública que discute o
direito à saúde no Supremo Tribunal Federal (STF).
O representante da Secretaria de Saúde do estado de São Paulo, Paulo Marcelo Gehm
Hoff, falou da experiência local para incorporar medicações ainda não padronizadas pelo
SUS. Para tanto, a secretaria realiza um programa que discute com especialistas da área
o uso da drogas e requer um determinado nível de evidência para adoção do
medicamento.
“É obrigação atender às necessidades de saúde da população, mas estado não é
farmácia e o tratamento deve ser um atendimento integral”, disse Gehm Hoff ao defender
um controle bem determinado para o uso de medicações. “Isso permite que os recursos
sejam direcionados para tratamentos realmente importantes”, concluiu.
Especialista em câncer, Gehm Hoff também integra o Instituto do Câncer do Estado de
São Paulo e a Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo). Segundo ele,
concentrar a incorporação de medicações não padronizados em centros de excelência
permitirá acompanhar os pacientes periodicamente para avaliar eficácia dos tratamentos.
“Avanços tecnológicos têm de ser incorporados de maneira ágil [ao sistema de saúde
pública], porém criteriosa”, afirmou.
Gehm Hoff comparou os números do programa realizado em São Paulo com os gastos
gerados por determinações judiciais no estado. Segundo ele, em 2008, o programa
gastou R$ 1,125 bilhão para atender 450 mil pessoas, enquanto o dispêndio com
determinações judiciais foi de R$ 350 milhões para atender 33 mil pessoas. Isso significa
que o custo médio no programa por paciente gira em torno de R$ 2.500,00 por ano,
enquanto o gasto gerado por decisões judiciais é de R$ 10.600,00 por paciente/ano.
Uso racional de medicamentos
Representante da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e do Hospital de Clínicas
de Porto Alegre, Paulo Dornelles Picon propôs a construção de uma nova forma de
avaliação criteriosa de medicamentos e tratamentos, com a criação de centros de
medicinas regionais que aplicariam a chamada “medicina baseada em evidência”.
Esses centros, a exemplo do que já vem sendo implantado no Rio Grande do Sul,
funcionariam com a presença de um fórum deliberativo composto pelas várias instâncias
representativas da sociedade civil organizada, dos usuários, do governo, das áreas da
Justiça, entre outros.
“É uma proposta inovadora, que talvez possa dirimir questões que estão na Justiça, a
incorporação de tratamentos médicos e a qualificação e a assistência [aos usuários do
SUS]”, afirmou.
Picon também falou da importância da medicina baseada em protocolos clínicos e da
necessidade de que magistrados tenham conhecimento desses protocolos. Ele citou
trabalho realizado entre a comunidade científica e o Tribunal de Justiça do Rio Grande do
sul exatamente no sentido de levar essas informações aos juízes do estado.
Novas tecnologias
O coordenador da Comissão de Incorporação de Tecnologia do Ministério da Saúde,
Claudio Maierovitch Pessanha Henrique, afirmou que o desafio atual da comissão é
“inverter o enfoque tradicional na adoção de novas tecnologias”. Segundo ele, 86% das
propostas de incorporação de tecnologias submetidas ao Ministério da Saúde são de
indústrias, a maior parte sobre medicamento. Daí a necessidade de se subordinar a
análise desses produtos ao interesse público, e não ao interesse de terceiros no
fornecimento de medicamentos e de tecnologias desenvolvidos pelas empresas. “O
grande desafio colocado a gestores públicos é criar instrumentos para identifica técnicas
científicas mais duradouras”, disse o coordenador.
Prejuízos
O último conferencista, Leonardo Bandarra, presidente do Conselho Nacional dos
Procuradores-Gerais de Justiça do Ministério Público dos Estados e da União, observou
que atendimentos individuais caros prejudicam a assistência universalizada de
populações vítimas de doenças endêmicas como hanseníase, malária e tuberculose, por
exemplo.
Mas ponderou, por outro lado, que “políticas públicas pobres tendem a ser pobres” e disse
que é preciso agilidade do poder público na elaboração de novos protocolos e diretrizes
que permitam à Anvisa incorporar novos e mais eficazes medicamentos para tratamento
de casos excepcionais.
Também observou que a situação criada se deve, em parte, a políticas públicas
insuficientes e descartou a prioridade de aspectos econômicos por ocasião da elaboração
dos orçamentos do poder público em detrimento da saúde.
Ele observou, no entanto, que a atual política farmacêutica do país foi conquistada com
importante participação do Poder Judiciário. E, nesse contexto, destacou que “a política
de saúde pública deve ser compelida a superar dificuldades”.
Propostas
Bandarra propôs que os juízes, ao decidir demandas sobre o fornecimento de fármacos,
admitam o fornecimento de medicamentos experimentais somente quando suas
pesquisas já estiverem adiantadas e obedeçam as regras legais no sentido de que os
laboratórios que usam seres humanos como cobaias devem continuar dando assistência
a eles quando concluída a pesquisa, sem que esse ônus recaia sobre o Poder Público.
Ele propôs, também, que os protocolos clínicos sejam elemento preferencial nas
decisões, mas que possam ser excepcionados medicamentos já aprovados pela Anvisa.
Isso porque, segundo ele, não é aceitável a concessão de tratamentos com
medicamentos não registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
Quarta-feira, 06 de Maio - POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE – INTEGRALIDADE DO
SISTEMA
Especialista do Ministério da Saúde afirma que investimento em tratamentos de
câncer cresce no Brasil
Nos últimos dez anos, os gastos do Sistema Único de Saúde (SUS) com medicamentos
para tratamento de câncer passou de R$ 300 milhões para mais de R$ 1 bilhão. A
informação foi dada pela consultora Maria Inês Pordeus Gadelha, que trabalha na
Coordenação Geral de Alta Complexidade do Departamento de Atenção Especializada do
Ministério da Saúde (MS). Ela abriu os debates na manhã desta quarta-feira (6), no
Supremo Tribunal Federal (STF), durante o quinto dia de audiência pública que discute o
direito à saúde.
Segundo Gadelha, desde 1988, quando o SUS foi criado, houve uma progressiva inclusão
de pacientes com câncer no sistema e um aumento de investimento nessa área, sendo
que o ministério absorve a maior parte dos dispêndios com a manutenção de
equipamentos. Atualmente, 160 mil pacientes fazem tratamento de quimioterapia no SUS.
A cobertura para atendimento é composta, principalmente, por hospitais e clínicas
particulares, e somente o estado de Roraima não tem uma rede consolidada para
oferecer tratamento na área. “Todo o tipo [de tratamento de] câncer está contemplado
pelo SUS”, afirmou.
Para a consultora, “o grande desafio para se alcançar integralidade do sistema é a
autoridade pública, gestora do SUS, ter condições de articular interesses tão diversos,
públicos e privados”, harmonizando não só a assistência, mas ações, atividades e
políticas de promoção à saúde e de prevenção ao câncer. Ela destacou que a
complexidade dessa área de tratamento exige a integração de procedimentos clínicos e
cirúrgicos, bem como de áreas especificas de conhecimento e inúmeros profissionais e
especialidades, com atenção especial para o momento do diagnóstico e para os cuidados
paliativos.
Gadelha explicou que os hospitais e clínicas que atendem no sistema têm, na área de
tratamento de câncer, grande liberdade para determinar o tratamento, fazer a prescrição
dos cuidados médicos e determinar o fornecimento dos medicamentos, que é de
responsabilidade direta da unidade onde se faz o tratamento. “Quanto mais ágil, oportuno
e direto for o fornecimento [do medicamento], maior é a qualidade do serviço”, alertou a
consultora.
Segundo ela, essa liberdade também é necessária porque um mesmo tumor pode ser
tratado com os mesmos medicamentos em várias combinações e uma demora no
tratamento pode fazer o câncer ganhar resistência.
Representantes de pacientes defendem o fornecimento de medicamentos pelo
Estado
A audiência pública que acontece no Supremo Tribunal Federal (STF) para reunir
informações sobre o Sistema Único de Saúde (SUS) recebeu na manhã de hoje (6)
contribuição de três entidades que representam pacientes beneficiários do sistema.
Uma delas foi a Associação Nacional de Grupos de Pacientes Reumáticos (Anapar)
fundada em 2006 e representada pelo médico e professor da Universidade Federal do
Paraná (UFPR) Valderilio Feijó Azevedo.
A entidade apóia políticas de acesso e promoção de saúde de pacientes reumáticos.
Segundo o doutor Azevedo, dados estimam que existem entre 25 e 30 milhões de
pacientes no Brasil que sofrem de enfermidades reumáticas, sendo mais de 100 doenças
incluídas nesse grupo.
Os portadores dessas doenças que dependem do SUS demoram de seis a sete meses
para conseguir uma consulta o que prejudica o tratamento, uma vez que o diagnóstico
precoce é fundamental para os casos. Além disso, o acesso aos remédios relacionados à
doença são decisivos no tratamento.
Em sua exposição, ele mostrou exemplos de pacientes prejudicados por causa do tempo
perdido para o diagnóstico e, consequentemente, para o tratamento da doença.
Patente de medicamentos
Também falou em nome de pacientes a doutora Heloísa Machado de Almeida,
representante da Organização Não-Governamental (ONG) Conectas Direitos Humanos.
Ela questionou o motivo dos altos preços cobrados por medicamentos especiais e o
impacto que a proteção à propriedade intelectual traz para o acesso a medicamentos. A
proteção de patente de medicamentos ocorre no Brasil desde 1996 com a edição da Lei
9279/96 – Lei de Propriedade Industrial – e, de acordo com Heloísa, “o sistema de
proteção a propriedade intelectual é contrário ao princípio da livre concorrência, pois
autoriza o privilégio da exploração em monopólio em oposição a terceiros”.
Heloísa explicou que assim que a patente expira, o preço cai vertiginosamente e,
portanto, enquanto vige a patente o medicamento é mais caro. Exemplos apresentados
por ela mostram que a entrada de concorrentes genéricos no sistema reduz o preço em
até 99% em alguns casos. “A proteção intelectual impacta o preço do medicamento e o
preço do medicamento impacta o seu acesso”, afirmou.
A representante da ONG citou a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) em que o STF
deverá se manifestar sobre a legalidade das patentes “pipeline”. A ação foi ajuizada pelo
procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, que questiona os dispositivos da
Lei de Propriedade Intelectual em relação ao mecanismo que visa conceder patente a
produtos que não eram patenteáveis antes da lei de 1996 e que já estavam no domínio
público brasileiro. A ADI é relatada pela ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha e será
julgada pelo Plenário do Tribunal diretamente no mérito.
Na opinião de Heloísa, “o Judiciário ativo, independente e transparente, uma vez
desafiado a pronunciar-se sobre essas questões não deve se furtar a fazer valer a
Constituição para todos e para cada um, impondo aos gestores públicos o dever ou ao
menos o constrangimento e o desafio de analisar o tema do acesso a medicamentos em
sua completude, adotando não só políticas de saúde, mas políticas industriais e
econômicas que façam dos direitos sociais algo mais que um mero enunciado ou
promessa constitucional inconsequente”.
Atuação do Judiciário
Em seguida, falou o presidente da Associação Brasileira de Amigos e Familiares de
Portadores de Hipertensão Arterial Pulmonar (Abraf), Paulo Menezes. Ele trouxe
informações sobre a hipertensão pulmonar que ocorre nas artérias dos pulmões e de
acordo com ele, é a que merece maior preocupação. Este tipo de hipertensão é diferente
da hipertensão sistêmica, que é mais comum e afeta as artérias do coração, mas é de
fácil diagnóstico e tratamento relativamente simples mediante alimentação adequada e
medicamento barato.
Segundo Paulo Menezes, “lamentavelmente os medicamentos não estão na lista do SUS
e só são conseguidos graças ao Poder Judiciário que compele o estado a cumprir o seu
dever constitucional e ético de garantir a vida de seus concidadãos”.
Ele mostrou preocupação quanto à possibilidade de o STF limitar o dever do Estado de
fornecer os medicamentos listados em portaria do Governo, pois a consequência seria
que os responsáveis pela área de saúde nos estados, sob a alegação de não ter
recursos, suspendessem o fornecimento “decretando a morte” de milhares de pessoas
sob o argumento de estar cumprindo decisão do Supremo.
Ao finalizar, disse que pede a Deus que ilumine os ministros no momento que forem
tomar decisão de tal importância. Para ele, a decisão dos ministros poderá assegurar a
vida, mas também poderá decretar a morte de inúmeras pessoas. Em contrapartida, se
disse esperançoso e convicto de que a decisão do Supremo será “pautado pelo mais
profundo sentimento de justiça e irá assegurar o direito de recorrer a vida judicial, onde
ainda e felizmente pode-se encontrar uma análise isenta para o seu desesperado pleito
de obter a medicação que lhes assegure o direito à vida e para o qual, lamentavelmente,
a burocracia governamental é insensível”.
Juiz faz defesa da magistratura de primeira instância durante audiência pública
sobre saúde
O juiz da 5ª Vara Federal de Recife (PE) Jorge André de Carvalho Mendonça afirmou hoje
(6) no Supremo Tribunal Federal (STF) que a situação na área de saúde no Brasil é
dramática. “O Judiciário não está fazendo drama onde o drama não existe”, disse, ao ser
referir a decisões judiciais de primeira instância que obrigam a administração pública a
fornecer remédios ou tratamentos a pacientes.
Segundo ele, dados empíricos demonstram que são falsas as afirmações no sentido de
que juízes de primeiro grau sempre decidem a favor dos pacientes em causas sobre
saúde. De acordo com o juiz, nos casos em que há concessão de liminares, a regra é
essa decisão ser confirmada pela segunda instância e até mesmo pelo STF. “Não
podemos dizer, portanto, que a primeira instância do Judiciário vem sendo irresponsável
quanto ao tema.”
Carvalho Mendonça também fez críticas com relação aos argumentos no sentido de que
as classes abastadas da sociedade brasileira são as que mais se beneficiam das
decisões judiciais na área da saúde. Segundo ele, no Nordeste, maioria das ações é
ajuizada pela Defensoria Pública e pelo Ministério Público, que antes de entrar com o
pedido verifica se a pessoa tem ou não condições de arcar com os custos processuais.
Outra crítica dele foi com relação aos argumentos da insuficiência de recursos e da
reserva do possível, segundo os quais não há dinheiro público suficiente para custear o
que foi determinado em dada decisão judicial. “Muitas vezes o ente público não traz
evidência dessa insuficiência”, disse, ao se referir a casos em que gastos públicos com
áreas menos prioritárias são maiores do que com a saúde.
Equilíbrio
Ao mesmo tempo, Carvalho Mendonça defendeu um equilíbrio da magistratura ao
analisar os pedidos dos pacientes, mas sempre com atenção ao chamado “mínimo
existencial”, que leva em consideração o risco iminente ou não de morte da pessoa.
Quando não há esse risco, ele afirma que os magistrados devem levar em considerações
diversos fatores antes de decidir. “Temos de priorizar a política administrativa do SUS,
mas o Judiciário não tem como negar o direito à saúde, previsto na Constituição, e o
direito à vida”, ponderou.
Para que o magistrado possa fazer isso, informações técnicas são necessárias e,
segundo Carvalho Mendonça, é nesse ponto que a administração pública é falha, por
apresentar somente argumentos jurídicos, deixando de lado os dados mais importantes,
que são os técnicos.
Ele exemplificou que a administração pública peca ao não demonstrar tecnicamente que
medicamentos mais baratos produzem o mesmo efeito de outros mais caros, postulados
judicialmente, ou que determinado procedimento é meramente experimental. “É evidente
que o Judiciário não quer causar prejuízo à administração pública”, afirmou.
Constitucionalista propõe soluções para racionalizar judicialização da saúde no
Brasil
O constitucionalista Luís Roberto Barroso afirmou nesta quarta-feira (6) que a
judicialização de matérias diversas é um fato consumado no país, que resulta do modelo
constitucional brasileiro. Diante desse quadro, ele propôs algumas soluções no sentido de
racionalizar essa realidade em processos sobre saúde. Barroso participou da audiência
pública sobre o tema, promovida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), como
representante do Colégio Nacional de Procuradores dos Estados e do Distrito Federal e
Territórios.
Entre as propostas do constitucionalista, está a de definir de antemão qual ente federado
deve figurar como réu nas demandas por prestação de saúde. Segundo ele, a
jurisprudência que domina hoje, em que a solidariedade entre todos os entes federativos
prepondera, cria dificuldades do ponto de vista prático e causa dispêndio de recursos.
Isso ocorre porque as três esferas da federação acabam tendo de atuar em juízo em
defesa da Fazenda Pública.
Para Barroso, o réu da ação deve ser a entidade estatal diretamente responsável pela
prestação do serviço e, quando há duvida razoável sobre quem é responsável, aí sim vale
a solidariedade.
Outra proposta apresentada pelo constitucionalista foi no sentido de o Judiciário buscar
mecanismos de transformar postulações individuais em coletivas, de forma a levar a
questão a debate, permitindo que o Poder Público defenda a sua política pública na área
ou até mesmo pressionando o governo a criar uma política pública ainda inexistente no
sistema de saúde.
Uma das idéias de Barroso é que o Judiciário oficie ao Ministério Público nesses casos,
que pode transformar a demanda individual em coletiva. Ou o próprio Judiciário pode agir
nesse sentido, intimando órgãos e entidades com interesse na causa a participar dos
debates. “Isso realiza a ideia de universalização e igualdade, deixando de lado o
atendimento lotérico, a varejo de prestações individuais”, afirmou.
Para o constitucionalista, “a cultura brasileira ainda hoje é a da busca do privilégio e não
do direito”, situação que “favorece quem tem mais informação e acesso a advogado ou a
defensor público”. Segundo ele, essa realidade “favorece os menos pobres”.
Orçamento
Ao defender que a judicialização não pode ser vista como meio natural de se definir
políticas públicas, Barroso lembrou que o debate sobre o orçamento é o fórum principal
para se discutir políticas públicas, fórum esse sempre negligenciado pelos setores
envolvidos na área.
“Parte da energia que está sendo canalizada para o debate acerca da judicialização
deveria ser investida no debate acerca da elaboração do orçamento. É aí que se fazem as
escolhas em uma sociedade democrática. As escolhas boas e as escolhas trágicas”,
avaliou.
Segundo Barroso, “a elaboração do orçamento, no Brasil, é um grande espaço
democrático negligenciado” e, por outro lado, há uma indiferença política em relação a
seu cumprimento.
“Este fenômeno é potencializado pela competência discricionária que se tem reconhecido
ao Executivo de fazer contingenciamentos, isto é, de não se aplicar efetivamente o
dinheiro alocado em determinada rubrica”, alertou Barroso.
QUINTA-FEIRA 7 DE MAIO - ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA DO SUS
Hoje 70% dos brasileiros dependem de remédios do SUS, diz representante do MS
O secretário de Ciência e Tecnologia e de Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde,
médico Reinaldo Felipe Nery Guimarães, disse durante audiência pública sobre saúde
promovida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que 70% dos brasileiros, ou 130 milhões
de pessoas, dependem do Sistema Único de Saúde (SUS) para ter acesso à assistência
farmacêutica.
Por essa razão, ele sustentou que é a medicina baseada em evidências de grande
repercussão, inclusive mundial, que deve balizar os gastos na incorporação de novos
medicamentos à lista de fármacos do SUS. Além disso, afora a comprovada eficiência e
registro da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), esses medicamentos
devem apresentar, também, uma relação aceitável entre seu custo e sua eficácia.
Ele ressaltou que, hoje, 30% de todos os casos de intoxicação registrados no país
decorrem do uso inadequado de medicamentos, seja por automedicação, seja pelo uso
de medicamentos não registrados na ANVISA que não tenham eficiência comprovada.
Diante disso, ele observou que não faz sentido uma ordem judicial que determine o
fornecimento de medicamentos não registrados pela ANVISA.
Avaliação
Respondendo a críticas de que o sistema público de saúde brasileiro não possui centros
de pesquisa clínica, ele disse que, desde 2004, vêm sendo criados, sim, tais centros em
hospitais para avaliar a eficácia de medicamentos e disse que está em estudos a criação
de um órgão de avaliação fora do Ministério.
Reinaldo Guimarães destacou que, em 2008, o Ministério da Saúde despendeu cerca de
R$ 6 bilhões na assistência farmacêutica, o que representa 14% de todo o orçamento do
Ministério, ante 6% há dez anos.
Ele ressaltou, também, o avanço alcançado com a introdução dos medicamentos
genéricos na lista do SUS, que, segundo ele, permitiu uma economia de R$ 10,5 bilhões
nos últimos dez anos
Usuários
Na sexta e última sessão da série de audiências públicas sobre saúde, hoje enfocando a
assistência farmacêutica do SUS, Antonio Barbosa da Silva, representante do Instituto de
Defesa dos Usuários de Medicamentos e autor de um dicionário de medicamentos,
reclamou o estabelecimentos de uma política de medicamentos para o país.
“Não temos uma política de medicamentos, discutida com a sociedade e com o
Congresso Nacional”, afirmou. Segundo ele, existem apenas diretrizes, que variam de
governo para governo. “Há programas, que funcionam à base de portarias”, observou.
Ele apontou o superfaturamento dos preços dos remédios nas licitações públicas, a
maquiagem de remédios, a falta de planejamento e a estocagem inadequada, entre
outros, para a situação atual, em que, com frequência, faltam medicamentos da própria
lista do SUS.
Internações
Em virtude dessa situação, ele afirmou que 30% das internações de pacientes em
hospitais públicos brasileiros decorrem, hoje, da não conclusão de tratamento dos
pacientes, por falta de medicamentos do SUS. E ratificou a informação antes fornecida
pelo representante do Ministério da Saúde de que 30% das intoxicações ocorrem por uso
inadequado de medicamentos.
Ele disse que muitos estados desprezam o princípio da economicidade nas licitações,
afirmando que, ainda recentemente, isso ocorreu em São Paulo e Minas Gerais. Segundo
ele, o superfaturamento dos remédios aumenta seu custo em 50%. Portanto, por
analogia, isto significa que o SUS poderia disponibilizar mais 50% de remédios, se o
poder público conseguisse evitar o superfaturamento. Prova disso segundo ele, é que os
genéricos, com princípios ativos iguais, são comercializados a preço 50% menor.
“Se fossem fiscalizadas as notas fiscais de saída dos laboratórios e comparadas com as
notas fiscais emitidas no varejo, esta superfaturamento seria constatado”, afirmou.
Ele disse também que alterações na legislação existente, por meio de decretos que se
sobrepõem a leis, acabam facilitando a maquiagem de produtos. Da mesma forma,
segundo ele, é desrespeitada a lei que proíbe a existência de medicamentos com nome
igual, porém, com princípio ativo diferente.
Por fim, ele reclamou uma atuação mais efetiva do governo na fiscalização do registro de
patentes, inclusive no plano internacional. “Se o metal mais precioso custa R$ 100,00 o
miligrama, como pode um miligrama de princípio ativo de um medicamento (no caso, o
Interferon), custar R$ 15 mil a R$ 20 mil”? questionou.
Segundo ele, “a indústria dita os preços e o mercado, as regras, para facilitar o lucro, e
não para beneficiar o paciente”. E isto, observou, gera a exclusão de pacientes, o que, em
seu entender, seria “uma nova forma de genocídio”.
Associação afirma que programa do Ministério da Saúde para doenças raras está
desatualizado
O presidente da Associação Brasileira de Assistência à Mucoviscidose, Sérgio Henrique
Sampaio, afirmou na manhã desta quinta-feira (7) que o programa de medicamentos
excepcionais do Ministério da Saúde é desatualizado e inclui somente 105 medicamentos
capazes de tratar 62 doenças.
“O programa é restritivo e desatualizado, ficando quatro anos, três meses e sete dias sem
qualquer atualização”, alertou. Segundo ele, quando foi revisto, o programa limitou ainda
mais a oferta das dosagens das medicações. “Isso fere o princípio da proibição do
retrocesso social”, disse.
A mucoviscidose, também conhecida como fibrose cística, é uma enfermidade hereditária
que causa o mau funcionamento de certas glândulas do corpo e dos sistemas respiratório
e digestivo. Sampaio tem um filho com a doença e alega que passou por “anos de lutas e
humilhações na busca do direito constitucional [de acesso pleno à saúde]”.
Ele denuncia uma “manobra do Poder Executivo” que, ao limitar a integralidade e a
universidade do acesso à saúde da população brasileira, obriga os pacientes a apelar ao
Judiciário. Segundo Sampaio, o real motivo do esgotamento do sistema de saúde não é a
chamada judicialização do tema, mas sim os decréscimos e desvios de finalidade do
Sistema Único de Saúde (SUS), além de gastos exagerados em publicidade e
propaganda.
“A judicialização não se iniciou por iniciativa da sociedade civil brasileira para obter
vantagens e benefícios, mas para a preservação da vida. Foi a mão da Justiça que até o
presente momento evitou a morte de muitos inocentes condenados pelo Estado
brasileiro”, afirmou.
Protocolos
O presidente da Associação Brasileira de Assistência à Mucoviscidose também denunciou
a falta de edição de protocolos clínicos pelo Ministério da Saúde. Segundo ele, existem
atualmente somente 42 protocolos clínicos para doenças contempladas na portaria de
medicamentos excepcionais do governo federal. Desse total, 31 foram elaborados até
2002.
Os protocolos clínicos são um consenso sobre a condução da terapêutica para
determinada patologia. Eles se destinam a orientar o tratamento da doença e criar
mecanismos para a garantia da prescrição segura e eficaz.
“Ficamos quatro anos sem a edição de nenhum protocolo de diretrizes terapêuticas como
programa de saúde. O Executivo alega que não estabelece a padronização de
medicamento para doenças graves e raras porque não existem protocolos de diretrizes
terapêuticas, mas é o Executivo que tem de criar os protocolos”, disse.
Como solução para esse problema, ele ressaltou que protocolos clínicos de diretrizes
terapêuticas devem ser criados com legitimidade e tendo por objetivo primeiro a garantia
da manutenção da vida dos cidadãos.
Representante de associação denuncia ausência de políticas públicas para
tratamento de doenças raras
O presidente da Associação Brasileira de Mucopolissacaridoses (APMPS), Josué Félix de
Araújo, denunciou na manhã desta quinta-feira (7) a ausência de políticas públicas para
tratamento de doenças raras no Brasil. Araújo é profissional da saúde e pai de duas
crianças com mucopolissacaridose, uma rara doença metabólica causada por deficiência
enzimática. Ele foi o primeiro participante do sexto e último dia da audiência pública
realizada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para debater o direito à saúde.
Segundo Josué, o SUS adota hoje uma “política excludente de extermínio” no que
concerne a doenças raras, que exigem sempre a administração de drogas de alto custo.
“A ausência de políticas públicas para as doenças raras deixam as famílias à mercê da
indústria farmacêutica, da prescrição não baseada em evidência e da chamada
judicialização, cujo termo tem sido utilizado de forma pejorativa recentemente”, disse o
presidente da APMPS.
Ele pediu uma retratação pública de um dos palestrantes no evento, o presidente do
Conselho Nacional de Secretários da Saúde (Conass), Osmar Terra, que teria dito que os
medicamentos usados para tratar a mucopolissacaridose ainda estão em fase
experimental. De acordo com Josué, esses medicamentos já foram aprovados por
protocolos internacionais e nacionais e não são experimentais. “O alto custo da
medicação não deveria justificar a sua exclusão da lista do SU”, disse.
“Fala-se que ações judiciais têm promovido a aplicação inadequada de recursos públicos.
Então por que, para acabar com isso, o SUS não elabora uma política para doenças raras
e para medicamentos excepcionais? Por que o SUS insiste em desobedecer o texto
constitucional? Quantas crianças mais terão de morrer?”, questionou
Representante das indústrias farmacêuticas pede atenção à incorporação de novas
tecnologias
O presidente da Federação Brasileira da Indústria Farmacêutica, Ciro Mortella, disse hoje
(7) na audiência pública sobre saúde, no Supremo Tribunal Federal (STF), que a
incorporação de novas tecnologias em relação aos medicamentos precisa de urgentes
melhoras quanto à sua operacionalização. Segundo ele, várias doenças já têm aprovado
um protocolo clínico – os procedimentos sobre a condução terapêutica de determinada
doença –, porém desatualizado, como em casos da oncologia, osteoporose, hepatite B e
doenças renais.
Ele ressaltou que, em outros países, a avaliação de novas tecnologias leva de 20 a 30
semanas e que “no Brasil há pedidos sem definição há mais de 4 anos”.
Representante de 230 empresas do setor, Ciro Mortella expôs, também, o
posicionamento da indústria em alguns pontos relativos ao fornecimento de
medicamentos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O SUS, de acordo com o palestrante,
deve dar cobertura apenas aos medicamentos registrados pela Anvisa, não cabendo a
distribuição de produtos experimentais.
Mortella explicou que a regulação de estudos clínicos inclui todo um conjunto de normas
para a realização de pesquisa e análise pela Comissão de Ética e Pesquisa do Conselho
Nacional de Saúde. “Não há motivo para se misturar inovação, pesquisa e fornecimento
ao SUS”, disse.
Em sua fala, o presidente da federação enfatizou que as empresas que estão instaladas
no país não vendem produtos em fase de experimentação e não podem fabricá-los, a não
ser para finalidade de estudo clínico previamente aprovado.
Por fim, apontou como relevante a questão econômica, uma vez que “nenhuma empresa
farmacêutica no Brasil tem liberdade para fixar seus preços”. Ciro Mortella explicou que as
empresas precisam solicitar às autoridades regulatórias a aprovação do valor, cumprindose a exigência de que seja menor que o vigente em nove países. “Julgamos que é preciso
cautela e melhores informações no trato com a questão econômica envolvendo a
indústria”, concluiu.
Temporão: decisões judiciais não podem quebrar limites técnicos e éticos do SUS
O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, disse hoje na audiência pública sobre
saúde, promovida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que é justo acionar na Justiça o
gestor público omisso que não provê, dentro de sua competência e responsabilidade, os
bens e serviços de saúde disponibilizados no Sistema Único de Saúde (SUS). Mas
observou que “a via judicial não pode se constituir em meio de quebrar os limites técnicos
e éticos que sustentam o sistema”.
Segundo o ministro, a Justiça não pode “impor o uso de tecnologias, insumos ou
medicamentos, desorganizando a administração e deslocando recursos de destinações
planejadas e prioritárias e – o que surpreende muitas vezes –, com isso colocando em
risco e trazendo prejuízo à vida das pessoas”.
Por isso, Temporão se comprometeu a criar mecanismos que ofereçam aos juízes que se
defrontarem com ações pleiteando benefícios do SUS, sobretudo referentes a
medicamentos, assessoria técnica para subsidiar suas decisões.
Nesse sentido, ele propôs a realização, dentro do mais breve prazo possível, de uma
reunião congregando representantes do Judiciário, do Ministério Público, das Defensorias
Públicas, da Advocacia Geral da União, dos Conselhos Nacionais de Saúde, de
secretários estaduais de Saúde e de secretários municipais de Saúde, das Procuradorias
Gerais dos Estados e do Ministério da Saúde, para debater a definição de formas e meios
para dar consequência prática à proposta feita por ele.
Defesa do SUS
Durante sua palestra, o ministro fez uma firme defesa do SUS, que ele classificou como
um dos mais amplos sistemas públicos de assistência à saúde existentes no mundo. Ele
lembrou que, no Brasil, o perfil de morbidade e mortalidade da população somente
começou a se reduzir a partir dos anos 40 do século passado, graças à ampliação do
acesso aos serviços públicos de saúde e ao estabelecimento de políticos e programas
continuados, como os de vacinação em massa e combate da mortalidade infantil, por
exemplo.
Ele ressaltou, porém, que o Brasil convive, simultaneamente, com doenças do
desenvolvimento e do subdesenvolvimento e disse que ações isoladas não mudarão a
realidade do país, o que somente pode ocorrer com planos públicos estruturados.
O ministro disse que, dentro dos conflitos que se travam no âmbito do SUS entre as
demandas dos pacientes, as possibilidades do sistema e as pressões dos laboratórios
para incorporar novos medicamentos à lista do SUS, é preciso estabelecer limites. E isto
é interpretado por muitos como insensibilidade com os que sofrem e necessitam do
sistema, ou como prova de omissão.
Entretanto, segundo ele, essa interpretação é errônea. Para exemplificar essa afirmação,
ele informou que o Ministério da Saúde aumentou, de R$ 28 bilhões em fevereiro de 2002
para R$ 46 bilhões em março de 2009, os recursos para ações e serviços de saúde. E,
exclusivamente com medicamentos de dispêndio excepcional, os recursos se elevaram
de R$ 450 milhões em 2002 – quando se formalizaram os protocolos clínicos e as
diretrizes terapêuticas para licenciamento e utilização de medicamentos no país – para R$
2 bilhões em 2009.
Já na assistência farmacêutica como um todo, o valor dos dispêndios se elevou de R$ 2
bilhões em 2002 para R$ 6 bilhões em 2009.
Decisões judiciais
O ministro da Saúde lamentou os gastos em função de decisões judiciais, com
procedimentos e medicamentos ainda não experimentados ou sem a necessária
comprovação de efetividade e custo-benefício.
“Não se pode resolver questões eminentemente técnicas e científicas por meios
administrativos ou judiciais”, sustentou. “Porque, o que à primeira vista parece solução
pode, na verdade, ser o contrato formal de futuros problemas”, observou.
“Por isso, fazemos corpo contra a utilização, ex abrupto, de procedimentos ou
medicamentos ainda sob experimentação ou não registrados, sem validade demonstrada
pelas medidas padronizadas para determinação de segurança, efetividade, custoefetividade, custo-benefício e custo-utilidade”, afirmou.
Segundo o ministro, “essas medidas não são de conhecimento corriqueiro, fáceis de
entender e de interpretar, mesmo para farmacêuticos e médicos. Pelo contrário,
exatamente por isso são facilmente manipuláveis e utilizáveis para propaganda e
marketing dos produtos”.
“Não se pode impor, como conduta real, o que ainda está sendo pesquisado. Pois, se
resultados de estudos de investigação científica pudessem ser antecipados, o método
científico seria uma falácia”, afirmou
Compromissos
Em sua palestra, o ministro assumiu mais quatro compromissos, além do de criar
mecanismos para subsidiar o Judiciário no julgamento de ações pleiteando benefícios do
SUS.
Ele prometeu agilizar os procedimentos clínicos e diretrizes terapêuticas, mediante
atualização dos já existentes e elaboração de novos protocolos, atualizando-os
periodicamente, sempre com base na melhor evidência científica disponível.
Assumiu, também, o compromisso de incorporar ao SUS novas tecnologias de insumos e
medicamentos, mediante fortalecimento da Comissão de Incorporação de Tecnologias do
Ministério a Saúde.
Propôs-se, ainda, a aperfeiçoar as pesquisas e, quanto à prescrição de medicamentos,
sobretudo dos de alto custo, fortalecer os centros de referência para melhorar a
assistência aos usuários desses fármacos.
Após ouvir 49 especialistas, audiência pública sobre saúde é encerrada no STF
Foi encerrada nesta quinta-feira (7) a audiência pública promovida pelo Supremo Tribunal
Federal (STF) para debater o direito à saúde no Brasil. Ao todo, foram ouvidos 49
especialistas de diversos segmentos da sociedade, do Executivo e do Judiciário, além de
oito autoridades convidadas.
O presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, disse acreditar que já no próximo mês será
possível levar ao Plenário alguns dos vários processos em trâmite na Corte que tratam
sobre o tema de acesso pleno à saúde, seja para fornecimento de medicamentos ou
tratamento.
Ainda segundo ele, os compromissos firmados pelo ministro da Saúde, José Gomes
Temporão, ao final da audiência pública, revelam os efeitos práticos da iniciativa do
Supremo. Entre esses compromissos, está criar mecanismos que ofereçam a juízes
assessoria técnica para subsidiar decisões judiciais e atualização mais rápida dos
protocolos clínicos para análise de novos medicamentos e tratamentos.
Mendes ponderou ainda que os especialistas que participaram do evento expuseram
como sendo passível de solução as principais queixas dos pacientes, como a falta de
atualização da lista do SUS, o não reconhecimento de determinados procedimentos e a
demora de registro pela Anvisa.
“Algumas das queixas comumente feitas ao Poder Judiciário poderão ser solucionadas a
partir desse novo posicionamento das autoridades responsáveis pela condução desse
sistema de saúde”, afirmou.
O ministro da Saúde classificou a iniciativa do Supremo como “um momento ímpar no
sistema de saúde”, que permitiu a médicos, governos e entidades que defendem os
direitos dos pacientes expor suas visões “de maneira absolutamente democrática e
transparente”.
Para Temporão, a princípio parece haver muita divergência entre os diferentes segmentos
da sociedade que participaram da audiência, mas os pontos de convergência os
aproximam e permitem encontrar soluções. “Temos de sentar todos juntos e procurar uma
saída que, de um lado, atenda às demandas das pessoas dentro de uma racionalidade
que é a da segurança, da efetividade.”
O ministro da Saúde avaliou que, para muitos pacientes, o maior problema do Sistema
Único de Saúde [SUS] reside atualmente na questão das terapias experimentais e nos
produtos não registrados no Brasil.
Segundo ele, isso pode ser resolvido por meio do estabelecimento de “regras claras que
sejam construídas de maneira democrática”, ou seja, com a participação das entidades
que defendem os pacientes, médicos, Judiciário e Executivo.
“Juntos poderemos dar uma virada, porque a situação do jeito que está invibializa o SUS”,
afirmou ao se referir à necessidade de se atender a decisões judiciais retirando recursos
de alguma política pública de saúde.
Pesquisadora sugere transparência para evitar a judicialização da saúde
A fundadora do Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero (ANIS), pesquisadora
Débora Diniz, atribui a “judicialização” da saúde no Brasil, particularmente no tocante ao
fornecimento de assistência farmacêutica pelo Sistema Único de Saúde (SUS), à
ausência de transparência nas decisões que levam à inclusão de produtos na lista de
medicamentos do SUS.
“Na ausência de critérios explícitos e na falta de transparência sobre as justificações de
inclusão ou não de um novo produto na política de assistência farmacêutica, a
judicialização cresce em nome do princípio da precaução do direito à vida”, afirmou ela,
na última sessão da audiência pública sobre direito à saúde promovida pelo Supremo
Tribunal Federal (STF).
“Portanto, a qualificação desse movimento de judicialização não se constrói pela restrição
de direitos, mas apenas pelo aprimoramento e fortalecimento das instituições que regulam
a política de saúde, no caso específico naquelas de assistência farmacêutica”, observou.
Ela ponderou, no entanto, que a Comissão de Incorporação de Tecnologias (CITEC) do
Ministério da Saúde, incumbida de definir as diretrizes da política de assistência
farmacêutica e de incorporação de novas tecnologias ao SUS, foi criada em outubro de
2008 e, portanto, é um fato recente, que pode contribuir para redução essa chamada
“judicialização” da saúde.
Justo em saúde
Débora Diniz sustentou que o debate sobre o justo em saúde deve enfrentar as diretrizes
e os resultados da aplicação de uma política de saúde para os casos concretos.
Para tanto, segundo ela, é preciso fortalecer as instituições responsáveis pela regulação,
registro e incorporação de novos produtos ao Sistema Único de Saúde (SUS) e promover
a participação de diferentes setores científicos e de controle social nessas instituições.
Ela sustentou, também, que é preciso transparência nos critérios e diretrizes técnicas e
éticas para incorporação de um novo produto ao Sistema Único de Saúde e celeridade na
atuação das instâncias regulatórias para incorporação e registro de um novo produto no
sistema.
Débora Diniz defendeu o que chamou de “publicização” das deliberações das instâncias
regulatórias sobre incorporação ou não de um novo produto no SUS, com especial ênfase
às razões que justifiquem a não incorporação e o não registro. Por fim, preconizou o
estabelecimento de uma instância recursal das decisões regulatórias da política de
assistência farmacêutica no âmbito do SUS.
Médico diz que SUS não custeia tratamento oncológico mais sofisticado
O presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica, José Getulio Martins Segalla,
disse hoje (7), na audiência pública sobre saúde promovida pelo Supremo Tribunal
Federal (STF), que os valores para tratamentos de câncer nos hospitais estão defasados
e não cobrem os custos dos serviços e dos medicamentos.
Sem citar nominalmente a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, ele lembrou que,
recentemente, “uma figura o alto escalão do governo” foi diagnosticada com linfoma de
célula B, fez exame e iniciou tratamento quimioterápico com uma droga que garante 20%
a mais de chance de não-volta da doença, sendo que seu plano de saúde cobriu todos os
procedimentos.
“Se fossem realizados pelo SUS, não os faria, o que hoje é a triste realidade para a maior
parte da população brasileira”, afirmou.
Problemas
Martins Segalla apontou uma série de problemas que, segundo ele, dificultam o
tratamento dos doentes de câncer nos hospitais conveniados com o SUS. Para começar,
ele disse que a oncologia, no SUS não dispõe de diretrizes clínicas nem protocolos
terapêuticos, salvo raras exceções. Segundo o médico, a forma de tratamento baseia-se
em códigos de intenção de tratamento, com valores que deveriam cobrir o custo de um
mês de tratamento, sem especificação dos medicamentos e esquemas terapêuticos que
podem ser utilizados.
Além disso, observou, a tabela de procedimentos em vigor é a mesma desde 1998, sem
atualizações periódicas nem acréscimos de novos procedimentos. E os valores
financeiros são os mesmos da época, apesar de a inflação no período ter alcançado 80%
e os custos de instalação e manutenção do setor terem triplicado por força de exigências
da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e do aumento da complexidade dos
serviços.
Assim, segundo Segalla, se o prestador de serviço entender que deve, por exemplo,
utilizar um medicamento mais eficiente, que custe R$ 6.000,00 por mês, o SUS só cobre
R$ 350,00.
O médico disse que a última inclusão de novos procedimentos oncológicos no SUS
ocorreu em 2002, mas enquanto o valor dos serviços ficou congelado, o do medicamento
foi reajustado a cada ano. Assim, o prejuízo bancado pelos hospitais alcança R$ 1.000,00
por paciente com esse tratamento.
Ele reclamou que faz nove anos que vem levando, sem sucesso, ao Ministério da Saúde
estudos técnicos elaborados pela entidade por ele presidida com objetivo de atualizar a
tabela do SUS e incluir novos procedimentos. Disse que a área financeira do Ministério da
Saúde alega não ter verbas para isso.
Reclamou, também, que o Ministério da Saúde não financia pesquisas clínicas no SUS,
nem para incorporar novas drogas, nem para avaliar tratamentos do ponto de vista
fármaco-econômico, nem para estudos de custo-efetividade ou custo-utilidade. “Desta
forma, aos centros de referência só resta a opção de participar de estudos multicêntricos
patrocinados pelos laboratórios internacionais”, afirmou. “Não há como desenvolver
pesquisas voltadas para realidades nacional e regionais”.
Propostas
Para remediar pelo menos alguns dos problemas apontados, o oncologista propôs a
criação de uma comissão de especialistas, nomeados pelo Ministério da Saúde, para
redigir protocolos e diretrizes para os procedimentos para todos os tipos de câncer.
Propôs, também, a revisão periódica – no máximo a cada dois anos – de todas as tabelas
de procedimentos cirúrgicos, rádio e quimioterápicos para análise real de custos;
ampliação da participação da Comissão de Ciência e Tecnologia (CITEC) do Ministério da
Saúde, com inclusão das sociedades médicas especializadas; implantação de uma
metodologia de análise, com estabelecimento de prazos do processo na CITEC e criação,
com verbas do Ministério de Ciência e Tecnologia e dos laboratórios privados, de um
fundo de pesquisa clínica no SUS.
Propôs, por fim, a fiscalização da eficácia e do custo-efetividade de todo medicamento
novo aprovado pela Anvisa para inclusão no SUS e início de pesquisa de eficácia e
toxicidade para todos os genéricos e similares existentes no mercado
A SUPREMA CORTE E A SAÚDE DOS BRASILEIROS
JOSÉ ARISTODEMO PINOTTI, 74, Secretário Municipal da Mulher, Professor Emérito
da USP e da Unicamp, Membro da Academia Nacional de Medicina. Foi Secretário
de Saúde e Educação do Estado de São Paulo. Presidente da Federação
Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (1986-1992) e Reitor da Unicamp (198286).
O Ministro José Gomes Temporão, a quem aprecio pela visão de uma saúde
equitativa e por ter sido discípulo do meu amigo Sérgio Arouca, publica na Folha de S.
Paulo, de 26/ 04, artigo esperançoso de que o Supremo Tribunal Federal (STF) possa
solucionar a questão da judicialização dos medicamentos, incômoda à magistratura e
aos cofres da saúde. Isso será feito, mais uma vez, na vicariância de um legislativo
inerte e gestão eficiente. Mas o STF foi mais longe e inquiriu sobre o direito do
cidadão à saúde, fraudes e distorções do Sistema e desvios constitucionais. Acertou,
pois é disso que estamos necessitando. Convidaram-me, irei , mas quero iniciar aqui,
com um histórico da nossa Saúde e suas principais e intocáveis mega fraudes, que se
acumulam.
Após a Segunda Grande Guerra, estabeleceu-se um antissistema de Saúde:
Santas Casas ajudadas pela comunidade e médicos, atendendo a desvalidos;
Ministério da Saúde e Estados, fazendo “saúde pública” com programas
verticalizados de Doenças Infecciosas e o INAMPS, que congregou os inúmeros IAPs
e cuidava do diagnóstico e tratamento, tudo sem integração e com resultados
pobres.
Nos anos 80, com o enfraquecimento do regime militar, os ventos que
sopraram do Welfare State europeu e seus sistemas nacionais de saúde, os
pensadores de saúde brasileiros ganharam força para defender um Sistema Nacional
equitativo e, desde o início do Governo Sarney foi possível implantar modelos nessa
direção, como o SUDS em São Paulo e outros, cujos resultados de cobertura, acesso,
acolhimento foram excelentes e começaram a se multiplicar no País. Realizada a 8º.
Conferência Nacional de Saúde, o SUS entrou na Constituição e seus princípios para a
prática. Foi a década mais rica e produtiva.
A partir dos anos 90, inicia-se esse processo entrópico, monetarista,
neoliberal, que estoura, agora, nesta crise econômica que vivemos. No seu bojo a
intenção clara de privatizar, com objetivos de lucro, as grandes políticas públicas
como: Educação, Previdência e Saúde. As emendas constitucionais são aprovadas,
resistindo a da Saúde, a única derrubada, mas não se consegue resistir às pressões. A
contra-reforma privatizante é avassaladora. O Congresso aprovou em 1.996, com
total apoio do Governo, a malfadada Lei das Patentes, razão fundamental desse
processo de judicialização, sem as salvaguardas recomendadas internacionalmente,
de fabricação local e interregno, destruindo a indústria farmoquímica brasileira e nos
tornando dependentes. Hoje compramos produtos da Índia, com mais de 1.200
indústrias farmoquímicas.
A saúde pública se privatiza legal e ilegalmente, criando o que existe hoje:
uma saúde pobre para os pobres remanescentes do SUS e uma saúde no mercado
para quem tem 4 centavos para pagá-la e fugir das filas, da espera e dos maus tratos;
a maior propaganda para a aquisição dos planos de saúde, comprados por 45
milhões de brasileiros. Os Governos tentam escamotear politicamente, citando
grandes números de atendimento, retornando às formas campanhistas demagógicas,
falando de mortalidade infantil que cai inercialmente, sem compará-la com os
demais países da América Latina, que a têm 30% menor, escondendo a mortalidade
materna, 20 vezes maior que a dos países que cuidam da sua saúde, e aproveitandose
da retirada total da classe média do SUS, que tinha controle social sobre o mesmo,
pois os que lá ficaram ainda entendem a saúde como favor e não um direito. E mais,
os que dirigem o Sistema, não o utilizam. O Governo, o Legislativo, as Estatais
compram para si Planos de Saúde e gastam com isso (só o Federal e sete estatais)
mais de 10 bilhões de reais/ ano. A ANS e o Congresso permitem, há dez anos, ao
arrepio da Constituição e da Lei Nº. 9.656, que os planos cobrem do usuário e
utilizem, para procedimentos mais caros, o Sistema Público, sem ressarci-lo, furto
comprovado com auditorias repetidas do Tribunal de Contas da União, que chegam a
dois bilhões de reais por ano. Por dentro do SUS, nessa ânsia de parasitar e transferir
dinheiro público para o setor privado, terceiriza-se tudo, desde lavanderia, cozinha,
segurança, até serviços especializados de anestesia, diálise, clínica médica, cirúrgica
e a própria direção de hospitais, sangrando o público e abandonando a possibilidade
de uma Política de Estado da Saúde, base estratégica de um Sistema único e
equitativo, que, em análises internacionais consistentes, tem sido os de melhores
resultados e custo/ benefício. Cito Inglaterra, Canadá e Taiwan, países
absolutamente capitalistas, com Sistemas de Saúde Socialistas e excelentes
resultados.
É a hora da verdade, aberta ao País pela nossa Suprema Corte. Vamos
aproveitá-la.
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