Economia e Gestão do Setor Público Prof. Fabio Uchôas de Lima Caderno 2 Este material foi produzido com o intuito de fornecer melhores subsídios aos alunos dos diversos cursos, tomando como base informações contidas em diversos livros, periódicos e sites da Internet, preferencialmente àqueles indicados no programa do curso, reunindo várias pesquisas e conhecimentos adquiridos ao longo da vida acadêmica. Quero esclarecer que este material não possui nenhum vínculo com as Instituições de Ensino onde atuo, nem nenhuma forma de comércio autorizada. Peço apenas a gentileza de não fazer nenhum uso comercial ou inserção em livros, periódicos, ou quaisquer outras mídias sem minha expressa autorização, garantida pela Lei 9610/98. Quaisquer críticas ou sugestões serão muito bem recebidas e podem ser enviadas ao meu e-mail ([email protected]). Periodicamente faço uma revisão do material de modo a aprimorá-lo, e agradeço as colaborações recebidas. São Paulo – Out 2011 Economia e Gestão do Setor Público Cad. 2 Sumário 1. Gasto Público................................................................................................................ 3 Divisão de Funções entre os Diferentes Níveis de Governo ............................................ 4 No Brasil ....................................................................................................................... 4 2. O Caso Brasil ................................................................................................................ 5 As Fontes de Dados ................................................................................................... 5 3. Conceitos Relevantes ................................................................................................... 7 “Caixa” versus “Competência” ................................................................................ 7 4. O Setor Público............................................................................................................. 8 Formas de Ação Econômica do Setor Público ............................................................. 8 5. Política Fiscal ............................................................................................................. 11 Função Alocativa ....................................................................................................... 11 Função Distributiva ................................................................................................... 13 Função Estabilizadora................................................................................................ 13 6. Orçamento Público ..................................................................................................... 16 Regras de organização do Orçamento Público ........................................................... 16 Práticas Orçamentárias Participativas ........................................................................ 16 A Lei de responsabilidade Fiscal ................................................................................ 17 7. Corrupção no Brasil .................................................................................................... 18 Efeitos da crise financeira global de 2008 .............................................................. 18 Combate aos efeitos da crise e retomada da popularidade ..................................... 18 Combate .................................................................................................................. 19 Escândalos de 2010 .................................................................................................... 19 Prof. Fabio Uchôas de Lima 2 Economia e Gestão do Setor Público Cad. 2 1. Gasto Público O gasto do governo afeta uma gama diversa de atividades, algumas das quais, em algum momento teve, ou terá algo a ver com a vida de cada um de nós. O administrador público, no ato de selecionar as atividades prioritárias, deve fazer escolhas difíceis e, provavelmente, deixará algum grupo insatisfeito. Deve ele: Cortar verba para melhorar o controle de fronteiras? Como fica o combate ao contrabando? Cortar verba para combater a seca ? Como fica a situação dos habitantes dessas regiões ? Realizar empréstimo externo para viabilizar uma rodovia interestadual ? Como fica a dívida externa ? Devemos ter a consciência de que o governo não é uma “abstração”, devido às críticas: 1. 2. 3. 4. 5. 6. da mídia; dos políticos; dos empresários; dos trabalhadores; dos candidatos a cargo público; do Público em geral. O governo é visto como uma entidade distante, que “suga os recursos do povo”. O governo é uma entidade que coleta recursos através dos impostos cobrados de uma parte da população, para transferir esses recursos para outra parte da população. Ele transfere recursos da população contribuinte para a população não contribuinte. Onde o governo gasta os recursos ? Há algumas funções que são “típicas de governo”. Se o governo não assumir essas funções, ninguém irá fazê-lo, ou irá fazê-lo de modo parcial ou insatisfatório, por se tratar de oferta de bens públicos. As funções mais importantes são as ligadas à: Saúde - educação - defesa nacional - policiamento - regulação - justiça assistencialismo. Sendo a saúde e a educação, fornecidas pelo setor privado, é possível que os preços cobrados sejam tais que impeçam o acesso de uma parcela expressiva da população (pertencente a faixas mais baixas de renda). SAÚDE / ENSINO - A existência de instituições de saúde e ensino público ou subsidiado é necessária em termos de justiça social principalmente em países com alta concentração de renda. Não há nenhuma razão para que o Estado se preocupe, por exemplo com a oferta de batatas, mas tem a responsabilidade de zelar para que a população seja atendida nos hospitais e para que tenha boas escolas a seu dispor. Encontra-se aí externalidades positivas uma vez que uma população sadia e instruída é igual a uma população mais preparada para contribuir para o desenvolvimento e crescimento do país. Prof. Fabio Uchôas de Lima 3 Economia e Gestão do Setor Público Cad. 2 APOSENTADORIA / PENSÕES - vem se tornando um dos componentes mais importantes do gasto público, em crescente número de países. Estas responsabilidades / funções do governo representam uma fração muito importante da economia. Em alguns países correspondem a mais de 40% do PIB, em outros a mais de 50 % do PIB. Divisão de Funções entre os Diferentes Níveis de Governo Governo Nacional – responsável pelas atividades nas quais há uma economia de escala na oferta da função. Governo Estadual / local – responsável pelas tarefas que estão sujeitas a uma cobrança / fiscalização maior por parte da população. Por exemplo: - não é aceitável que a Prefeitura zele pela defesa nacional. - não é aceitável que o governo Federal cuide das praças de uma cidade. No Brasil Governo Federal - responsável pelo ensino de nível superior (atenção existem algumas instituições estaduais) e pela defesa e segurança pública nacional. Governo Estadual - responsável pelo ensino de nível médio e pela segurança a nível estadual. Governo Municipal - responsável pelo ensino de nível primário pela segurança do patrimônio público e pela limpeza urbana. Governo Estadual e Municipal - são responsáveis pelo saneamento. A Saúde de divide entre as três esferas de Governo. Transporte 1. é de responsabilidade da União as maiores rodovias do país e as rodovias interestaduais. 2. é de responsabilidade dos Estados as rodovias estaduais. 3. é de responsabilidade dos Municípios o transporte urbano. Prof. Fabio Uchôas de Lima 4 Economia e Gestão do Setor Público Cad. 2 2. O Caso Brasil No final dos anos 1970/início dos anos 1980, não se sabia sequer com precisão qual era o déficit! Embora, até o final dos anos 1990, o efeito desse melhor conhecimento ainda não tenha chegado a se refletir em um controle definitivo do déficit público, tivemos uma grande evolução da qualidade dos indicadores de aferição da situação fiscal ao longo das duas últimas décadas. As Fontes de Dados Na maioria dos países do mundo, há pelo menos duas instituições que divulgam estatísticas acerca da situação fiscal. Uma delas é o órgão encarregado de elaborar as Contas Nacionais (CN). A outra é a responsável pelas estatísticas mais corriqueiras sobre o desempenho das contas do setor público, mês a mês, o que cabe, em geral, ao ministério de economia do país ou ao seu Banco Central (BC). No Brasil, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) é encarregado da apuração das CN e, nesse sentido, foi durante muitos anos uma fonte importante de informação para a avaliação da nossa situação fiscal. Ao poucos seus dados foram deixando de ser uma referência no debate sobre o tema, por três motivos: 1. devido a um série de discrepâncias entre a tendência dos dados fiscais das CN e os do BC; 2. pelo fato de se tratar de dados: a) anuais; b) divulgados com bastante defasagem – geralmente, no segundo semestre do ano posterior ao de referência; c) sujeitos a revisões importantes. Esses fatores conspiraram contra o uso de uma informação relevante para a análise da conjuntura econômica. 3. porque na revisão metodológica realizada em 1997, o IBGE não informou os dados do quadro correspondente à formação de poupança do governo, que era a informação mais importante, em termos fiscais, por ele divulgada até então. Conseqüentemente, depois disso, os dados do IBGE deixaram de ser uma referência para o debate fiscal. Prof. Fabio Uchôas de Lima 5 Economia e Gestão do Setor Público Cad. 2 O resultado fiscal por excelência – ou seja, o que todos os analistas interpretam com sendo o resultado fiscal – é apurado pelo BC e corresponde às denominadas “necessidades de financiamento do setor público” (NFSP). Os dados divulgados pelo Banco Central abrangem três itens: 1. o governo central, que corresponde à soma das contas do governo federal, do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) e do próprio BC; 2. os estados e municípios; 3. as empresas estatais, que incluem tanto as empresas federais quanto as estaduais e municipais de propriedade dos governos estaduais e locais. As NFSP representam apenas o resultado da diferença entre despesas e receitas, sem que o dado divulgado pelo BC permita saber o que está causando o desequilíbrio entre as variáveis. Para isso, é necessário se valer de estatísticas apuradas por outros órgãos. Nesse sentido, as informações primárias são: • da Secretaria da Receita Federal (SRF), que apura a receita do governo federal; • da Secretaria do Tesouro Nacional (STN), que consolida o dados da receita e da execução da despesa do Tesouro Nacional; • do INSS, que tem o levantamento das receitas e despesas referentes à previdência social da responsabilidade desse mesmo órgão. A Secretaria de Política Econômica (SPE) divulga uma estatística que consolida essas informações e apresenta um quadro relativamente desagregado das receitas e despesas do governo central. Recentemente, a STN é quem passou a divulgar mensalmente esses dados, incluindo o resultado do INSS. Adicionalmente, a Secretaria Especial de Controle das Empresas Estatais (SEST) acompanha a execução financeira das empresas federais. Prof. Fabio Uchôas de Lima 6 Economia e Gestão do Setor Público Cad. 2 3. Conceitos Relevantes “Caixa” versus “Competência” No início de 1995 o governo, pressionado por uma situação conjuntural difícil, decidiu adiar o pagamento de 70 % do salário do funcionalismo para o mês seguinte, foi comum ler na imprensa a avaliação de que “o governo está apenas melhorando o seu desempenho de caixa, mas isso não altera o déficit pelo critério de competência”. O conceito de “caixa” significa que as despesas são consideradas nas estatísticas como tendo ocorrido no momento ou período em que são de fato pagas. O conceito de “competência” está associado ao momento ou período em que a despesa é gerada, mesmo que não tenha sido paga. No exemplo acima mencionado se a folha mensal do funcionalismo era de R$ 2 bilhões e o governo adiou o pagamento de 70 % para o mês seguinte (t+1), no mês em que isso foi feito a despesa de caixa terá sido de 30 %de R$ 2 bilhões, ou R$ 0,6 bilhão, sem afetar, porém a despesa no critério de competência, já que a “geração” da despesa – ou seja, o ato jurídico que estabelece a obrigatoriedade de pagamento do empregador em relação ao seu empregado – se deu integralmente no mês (t). No Brasil, as necessidades de financiamento são apuradas pelo conceito de caixa, exceto pelas despesas de juros, apuradas pelo conceito de competência contábil. De um lado, isso visa evitar que, se o governo emite títulos de prazo mais longo, com pagamentos concentrados no tempo, o déficit seja artificialmente baixo durante algum tempo e depois “estoure” no momento do vencimento. Ao apropriar os juros pelo conceito de competência, o BC torna a despesa de juros mais regular ao longo do tempo – a não ser que a taxa de juros mude muito de um mês para outro. De outro, o critério de competência para o cálculo dos juros é consistente com a apuração da dívida do setor público junto ao sistema financeiro. Prof. Fabio Uchôas de Lima 7 Economia e Gestão do Setor Público Cad. 2 4. O Setor Público O Governo, um dos três elementos que entram na formação do Estado, ao lado da população e do território, incorpora a autoridade capaz de organizar a sociedade e dirigila. Em sentido amplo, o Governo compreende um conjunto de órgãos e funções por meio do qual a autoridade dirige e regula, através de normas, as atividades dos cidadãos. A presença do Governo no processo econômico vem modificando-se ao longo do tempo. Assim, há algumas décadas, seu papel limitava-se às atividades fundamentais, voltadas para a segurança e defesa dos cidadãos e de seu limite de propriedade. Compete ao Estado, naqueles tempos, o fornecimento de uma base jurídicoinstitucional; por sua vez, os indivíduos e os grupos particulares proveriam a substância econômica do sistema. Quando Keynes publica a Teoria geral da moeda, do juro e do emprego, em 1936, ele evidencia o desequilíbrio intrínseco do sistema capitalista, sujeito a crises profundas. E oferece como solução para a minimização das conseqüências das crises econômicas a intervenção do Estado na economia. Cabe ao Estado controlar o fluxo de investimentos e de consumo, para evitar as crises e a inflação: • As crises, como decorrência de perspectivas pessimistas por parte dos empresários quanto à sua taxa de lucro futura, o que acabaria por provocar redução no volume de investimento, vale dizer, na acumulação de capital. • A inflação, por sua vez, seria decorrente, conforme a explicação Keynesiana não somente de um excesso de moeda, mas também de um excesso de procura agregada. Ao regular o dispêndio, o Estado controla a renda total, via mecanismo do multiplicador; a renda seria, por seu turno, determinada pelo investimento, este sim, o componente estratégico da equação. A política econômica ditada pelo Estado é que irá determinar o nível dos investimentos, do qual resultarão a taxa de poupança e o volume de lucros gerados pelo sistema econômico. Ocorre, assim, a transformação do papel do Estado na economia: passa a ser conforme autores contemporâneos, o Estado Regulador. Ele entra em ação na esfera econômica a fim de resolver problemas criados pelo desenvolvimento do capitalismo. Formas de Ação Econômica do Setor Público A participação do Estado enquanto ente regulador da atividade econômica é exercida através de ações como: Prof. Fabio Uchôas de Lima 8 Economia e Gestão do Setor Público - Cad. 2 Os seus gastos; As suas fontes de receita; Os controles e a produção de bens e serviços. O dispêndio governamental, ou os gastos do Governo, quer seja para consumo ou investimento, tem a característica de promover a atividade econômica: quando o Governo está consumindo ou investindo, alguém está fornecendo-lhe bens ou serviços. Os impostos, fonte de receitas por excelência, sevem para cobrir as despesas governamentais e também para estabelecer ou modificar o perfil de consumo de determinados bens, além de servirem de ferramental para a distribuição de renda. Os controles, exercidos sobre a atividade produtiva através de normas de segurança, por exemplo, se estendem às permissões para as importações de insumo e outros bens e mesmo exportação de certos produtos básicos, passando ainda pelo controle de preços de venda ao consumidor final de enorme variedade de bens, de forma mais ou menos intensa e abrangente, sob dependência do nível de inflação que esteja vigorando. O Governo é, ainda, responsável pela fixação da renda de parcela significativa da população brasileira, ao estabelecer o valor do salário mínimo e a própria política salarial que orienta as correções dos rendimentos do trabalho assalariado, pela transferência de parte dos ganhos de produtividade do setor ou da economia como um todo, ou ao possibilitar uma recomposição do poder aquisitivo com os índices reais de inflação. A participação do Governo na condução da atividade econômica significa o próprio controle operacional do setor privado. Esta responsabilidade e influência crescem e se revigoram à medida que o Governo toma para si as preocupações com: a) manutenção do pleno emprego (utilização de todos os recursos e fatores de produção) e estabilidade de preços (ausência de inflação ou, no máximo, uma inflação “rastejante“); os instrumentos para tal consistem na adoção de uma política fiscal e monetária coerente com as reais necessidades da economia, ou seja, via controle coordenado de seus gastos, financiamento destes gastos através de meios não inflacionários e controle da dívida pública; b) motivação do investimento em áreas – nordeste do país, por exemplo – ou setores – informática, por exemplo – considerados prioritários do ponto de vista da política e estratégia econômica; a concessão de incentivos fiscais, via redução ou isenção de impostos, visando estimular a produção de certos tipos de bens; c) modificação da distribuição “natural“ de renda do setor privado, por meio de impostos do tipo progressivo (que pesam mais sobre níveis de renda mais elevados, por exemplo), distribuição indireta de renda (via oferecimento de serviços de saúde, seguro social, educação escolar), fornecimento de bens e serviços (casas populares e assistência médica) às camadas da população de baixa renda a preços inferiores aos de mercado; Prof. Fabio Uchôas de Lima 9 Economia e Gestão do Setor Público Cad. 2 d) suprimento de bens e serviços que não seriam fornecidos pelo setor privado, como defesas e manutenção da escritura institucional do Estado. As três primeiras atribuições governamentais surgiram da própria constatação de que o setor privado não operaria em plena capacidade de maneira automática, não distribuiria eficientemente os recursos, não produziria a gama de produto socialmente desejável e não propiciaria distribuição de renda aceitável. A quarta atribuição constitui o papel histórico fundamental do Governo. Prof. Fabio Uchôas de Lima 10 Economia e Gestão do Setor Público Cad. 2 5. Política Fiscal A ação do governo através da política fiscal abrange três funções básicas: 1. A função alocativa - diz respeito ao fornecimento de bens públicos; 2. A função distributiva - está associada a ajustes na distribuição de renda que permitam que a distribuição prevalecente seja aquela considerada justa pela sociedade; 3. A função estabilizadora - tem como objetivo o uso da política econômica visando a um alto nível de emprego, à estabilidade dos preços e à obtenção de uma taxa apropriada de crescimento econômico. Função Alocativa Os bens públicos não podem ser fornecidos de forma compatível com as necessidades da sociedade através do sistema de mercado. O fato de os benefícios gerados pelos bens públicos estarem disponíveis para todos os consumidores faz com que não haja pagamentos voluntários aos fornecedores desses bens. Sendo assim, perde-se o vínculo entre produtores e consumidores, o que leva à necessidade de intervenção do governo para garantir o fornecimento de bens públicos. Assim sendo, o governo deve: a) determinar o tipo e a quantidade de bens públicos a serem ofertados; b) calcular o nível de contribuição de cada consumidor. Em relação ao item “b)”, um determinado consumidor não tem motivos para se “apresentar” ao governo e declarar o valor “justo” que ele atribui aos serviços prestados pelo setor público, a não ser que tenha de que os demais indivíduos beneficiados pelo fornecimento dos bens públicos façam o mesmo. Dessa forma, o financiamento da produção dos bens públicos não pode dar-se de forma voluntária. O financiamento da produção de bens públicos depende da obtenção compulsória de recursos, através de impostos. É neste sentido que o processo político surge como substituto do mecanismo do sistema de mercado. A decisão por um determinado governante através do processo eleitoral funciona como uma espécie de revelação de preferências por parte da sociedade. De forma indireta, a eleição mostra não apenas quais bens públicos são considerados prioritários, como o quanto os indivíduos estarão dispostos a contribuir sob a forma de impostos para o financiamento da oferta de bens públicos. Prof. Fabio Uchôas de Lima 11 Economia e Gestão do Setor Público Cad. 2 Por exemplo: uma sociedade que esteja buscando uma redução da violência, tenderá a eleger um candidato que tenha como prioridade o aumento da segurança das ruas, ainda que isto signifique, necessariamente um aumento dos impostos para arcar com o aumento do contingente de policiais. Neste caso seria revelada, ainda que de forma indireta, uma preferência pelo bem público “segurança”. É importante destacar a distinção entre os conceitos de produção e de provisão de bens ou serviços públicos. Fazendo um paralelo com a oferta de tomates, ninguém vai reclamar com o governo se esse produto faltar na prateleira do supermercado, o próprio funcionamento do sistema de preços se encarregará de que essa oferta seja normalizada rapidamente. Entretanto, se um bairro ficar sem luz ou se os telefones de uma cidade não funcionarem direito, muito provavelmente a irritação da população vai se manifestar em críticas ao governo, independentemente das empresas fornecedoras dos serviços serem públicas ou privadas, isto pelo fato: o serviço é público. Isto quer dizer, há atividades em relação às quais, mesmo que o Estado deixe de ser responsável pela produção de um bem ou serviço, ele é intrinsecamente responsável pela sua provisão, ou seja, deve zelar – diretamente ou através de órgãos reguladores – para que a população seja adequadamente servida em termos da oferta e da qualidade de certos bens e serviços. Devemos destacar também a importância da provisão por parte do setor público dos chamados bens semi-públicos ou meritórios, que constituem um caso intermediário entre os bens privados e os bens públicos. Apesar de poderem ser submetidos ao princípio da exclusão e desta forma, serem explorados pelo setor privado, o fato de gerarem altos benefícios sociais e externalidades positivas justifica a produção total ou parcial dos bens meritórios pelo setor público. Os principais exemplos são os serviços de educação e saúde. Da mesma forma que no caso dos bens públicos, os recursos necessários para a produção desses bens são obtidos compulsoriamente, através da tributação. Em muitos países também foi importante a ação do “Estado empresário” na promoção do crescimento econômico. Neste caso, a intervenção direta do setor público na produção de bens e serviços privados justificou-se, em um determinado momento histórico, pela insuficiência do setor privado em mobilizar recursos para o desenvolvimento de projetos de grande porte, principalmente nos setores de infraestrutura. Além da necessidade de um montante considerável de recursos para o seu financiamento, os investimentos nestes setores também tinham um longo prazo de maturação, o que levava a uma demora na geração dos lucros e desestimulava, desta forma, o investimento privado. Prof. Fabio Uchôas de Lima 12 Economia e Gestão do Setor Público Cad. 2 Função Distributiva A distribuição de renda resultante das dotações dos fatores de produção – capital,, trabalho e terra – no mercado pode não ser a desejada pela sociedade. Cabe então alguns ajustes distributivos feitos pelo governo, no sentido de promover uma distribuição considerada justa pela sociedade. Para isso o governo se utiliza de alguns instrumentos principais: 1. as transferências; 2. os impostos; 3. os subsídios. De fato, esses três instrumentos estão estreitamente relacionados, havendo várias formas de promover uma redistribuição de renda. TRANSFERÊNCIAS - Através do esquema de transferência o governo pode promover uma redistribuição direta de renda, tributando em maior medida os indivíduos pertencentes às camadas de renda mais alta, e subsidiando os indivíduos de baixa renda (Bolsa família). IMPOSTOS - os recursos captados pela tributação dos indivíduos de renda mais alta podem ser utilizados para o financiamento de programas voltados para a parcela da população de baixa renda, como a construção de moradias populares. SUBSÍDIOS - o governo pode impor alíquotas de impostos mais altas aos bens considerados de “luxo” ou “supérfluos”, consumidos pelos indivíduos de renda mais alta, e cobrar alíquotas mais baixas do bens que compõem a cesta básica, subsidiando, desta forma a produção dos bens de primeira necessidade, com alta participação no consumo da população de baixa renda. Os recursos captados pelo sistema e aplicados em hospitais públicos promovem uma redistribuição de renda da parcela da população de renda mais alta para a de renda mais baixa. cuja participação no consumo é preponderante da população de baixa renda. Desta forma subsidiando a cesta básica, a telefonia (?), a energia. O sistema de seguridade social, os benefícios assistenciais e outras ajudas, como remédio popular, uniforme, transporte etc. Função Estabilizadora A importância da função estabilizadora do Estado passou a ser defendida a partir da publicação do livro “Teoria geral do Juro, do Emprego e da Moeda” em 1936, de autoria de John Maynard Keynes. Prof. Fabio Uchôas de Lima 13 Economia e Gestão do Setor Público Cad. 2 Até então, acreditava-se que o mercado tinha uma capacidade de se auto-ajustar ao nível de pleno emprego da economia. A flexibilidade de preços e salários garantiria este equilíbrio: a existência de desemprego só seria explicada, por um nível de salários reais acima daquele que equilibraria a demanda e a oferta de trabalho, o que poderia ocorrer em razão da ação dos sindicatos. Keynes, ao contrário, apontava que o limite ao emprego era dado pelo nível de demanda: as firmas só estariam dispostas a empregar determinada quantidade de trabalho conforme as expectativas de venda de seus produtos. Dessa forma, tudo que pudesse ser feito para aumentar a quantidade de gastos na economia contribuiria para uma redução da taxa de desemprego da economia. Neste sentido, Keynes deu ênfase ao papel do Estado mediante as políticas monetárias e, principalmente, fiscais para promover um alto nível de emprego na economia. Supondo que as flutuações da economia decorram de uma insuficiência ou de excesso de demanda, o controle da demanda é a forma de intervenção do governo mais indicada para garantir a estabilidade do sistema econômico. A política fiscal pode se manifestar diretamente, através da variação dos gastos públicos em consumo e investimentos, ou indiretamente, pela redução das alíquotas de impostos, que eleva a renda disponível do setor privado. Por ex: em uma situação recessiva, o governo pode promover um crescimento de seus gastos em consumo e / ou investimento e com isso incentivar um aumento da demanda, tendo como resultado um maior nível de emprego e da renda da economia. Alternativamente, o governo pode reduzir as alíquotas de impostos, aumentando, desta forma, o multiplicador de renda da economia. Na existência de um alto nível de inflação decorrente de um excesso de demanda, o governo pode agir deforma inversa ao caso anterior, promovendo uma redução da demanda através da diminuição de seus gastos e / ou do aumento das alíquotas dos impostos – que reduziria a renda disponível e, conseqüentemente, o nível de consumo da economia. O governo pode preferir agir sobre a demanda da economia através da política monetária. Em casos de recessão ou desaceleração do crescimento econômico, o governo pode promover uma redução das taxas de juros, estimulando desta forma o aumento dos investimentos e, conseqüentemente, o crescimento da demanda e da renda nacional. Alternativamente, em uma situação de excesso de demanda com impactos inflacionários, o governo pode aumentar as taxas de juros, reduzindo a demanda da economia. POLÍTICA FISCAL > é praticada, diretamente, através da variação dos gastos públicos em consumo e investimento; indiretamente, pela redução ou elevação das alíquotas de impostos. POLÍTICA MONETÁRIA > é praticada com a redução ou aumento das taxas de juros, melhorando ou reduzindo a liquidez do sistema, como formas de aumentar os investimentos, aumentar a renda e o consumo ou conter a inflação e o consumo. Prof. Fabio Uchôas de Lima 14 Economia e Gestão do Setor Público Cad. 2 Para se atingir as prioridades da política econômica, o mais comum, na prática, é uma ação combinada das políticas fiscal e monetária por parte do governo. Prof. Fabio Uchôas de Lima 15 Economia e Gestão do Setor Público Cad. 2 6. Orçamento Público O Orçamento Público pode ser definido como o documento composto da previsão de receitas e autorização de despesas a serem realizadas no período financeiro que deve servir de programa diretor de toda a atividade governamental. Regras de organização do Orçamento Público A organização do orçamento público está sujeita a certas regras ou princípios. Os principais são os seguintes: a) UNIDADE – em princípio, um único documento deveria apresentar todas as contas de receitas e despesas do setor público. b) ESPECIFICAÇÃO – as receitas e despesas devem ser discriminadas c) UNIVERSALIDADE e ORÇAMENTO BRUTO – o orçamento deve abranger a totalidade das contas, que devem constar por seu valor bruto. d) NÃO AFETAÇÃO ou NÃO-VINCULAÇÃO de RECEITAS – o conjunto das receitas deve ser utilizado para financiar o conjunto das despesas. e) LEGALIDADE – o orçamento deve ser estabelecido por lei. f) PERIODICIDADE ou ANUALIDADE – o orçamento refere-se a determinado período, normalmente um ano. g) EXCLUSIVIDADE – o orçamento não pode tratar de assuntos estranhos à previsão da receita e à fixação da despesa. h) PUBLICIDADE – o conteúdo do orçamento deve ser do conhecimento da população. Práticas Orçamentárias Participativas Podem ser definidas como “práticas orçamentárias em que as decisões quanto à alocação dos recursos (receitas e despesas) são tomadas levando-se em consideração a opinião direta da população e não apenas a opinião de seus representantes legais”. Prof. Fabio Uchôas de Lima 16 Economia e Gestão do Setor Público Cad. 2 A manifestação direta da população a respeito do orçamento público constitui um aprofundamento da democratização das decisões públicas. Na busca de maior transparência, a população é levada a participar mais diretamente e a fiscalizar as obras e serviços públicos. A forma institucional mais comum de participação são os conselhos comunitários. A Lei de responsabilidade Fiscal A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) é um importante instrumento de política fiscal implementado a partir de 1998, cujo objetivo é o de proporcionar o equilíbrio orçamentário do setor público. A Lei de Responsabilidade Fiscal estabelece o seguinte: • Limite para as despesas com o funcionalismo público: de 50%, para a União; de 60%, para Estados e Municípios; • proibição de socorros financeiros entre União, Estados e Municípios; • limite de despesas feitas pelos administradores em final de mandato; • limites de endividamento para União, Estados e Municípios, por meio do Senado. As administrações que não cumprirem a lei perdem o direito de repasse voluntário de verba da União (por exemplo, o repasse de parte do IPI e IR arrecadado pela União aos Estados e Municípios). Além disso, os responsáveis podem sofrer sanções por crime de responsabilidade fiscal. Com a Lei de Responsabilidade Fiscal, ganhou-se maior eficiência na ação governamental, obrigando Estados e Municípios a explorar mais as receitas próprias, contribuindo decisivamente para o ajuste fiscal. Prof. Fabio Uchôas de Lima 17 Economia e Gestão do Setor Público Cad. 2 7. Corrupção no Brasil O Brasil é percebido como o 75º país menos corrupto do mundo, perdendo para Romênia, Grécia, Macedônia e Bulgária por apenas um décimo. O país está empatado com os países sul-americanos da Colômbia, do Peru e do Suriname, e ganha da Argentina (106°), da Bolívia (120°), da Guiana (126°), do Equador (146°), do Paraguai (154°) e da Venezuela (162°) na região. O Brasil ainda está em situação melhor que todos os outros países do BRIC. A China se encontra 80º lugar, a Índia em 84° e a Rússia em 146°. Efeitos da crise financeira global de 2008 Em 2008, quando o aquecimento da demanda e da atividade econômica nacional já geravam preocupações para o cumprimento das metas de inflação e obrigavam o Banco Central a apertar a política monetária por meio do aumento da taxa básica de juros, a crise financeira mundial originada nos Estados Unidos atingiu o Brasil no último trimestre. Mas, como o primeiro semestre ainda havia apresentado um desempenho econômico forte, o PIB nacional terminou o ano com uma taxa de expansão de 5,1%. Já sob influência dos impactos da crise financeira global especialmente no aumento do desemprego no País no primeiro bimestre de 2009, a aprovação do governo Lula, que, em dezembro de 2008, havia batido novo recorde, ao atingir, segundo a Pesquisa Datafolha, a marca de 70% de avaliação de "ótimo" ou "bom", sofreu queda em março de 2009, para 65%. Foi a primeira redução observada no segundo mandato do presidente. Combate aos efeitos da crise e retomada da popularidade A queda na avaliação positiva foi bastante efêmera, já que, logo no mês de maio de 2009, pesquisas voltaram a trazer crescimento na aprovação do governo, também em consequência da estabilidade do Brasil frente à crise econômica internacional. Na Pesquisa Datafolha publicada em 31 de maio do mesmo ano, a avaliação positiva voltou ao patamar de novembro, quando a taxa de aprovação do governo chegou ao recorde de 70%. Colhendo os frutos desta popularidade, Lula foi considerado pela Revista Época um dos 100 brasileiros mais influentes do ano de 2009. Em março de 2010, pesquisa Datafolha publicada no jornal Folha de São Paulo constatou que a popularidade de Lula atingiu seu melhor valor desde 2003. 76% dos pesquisados apontaram o governo como ótimo ou bom e 4% acharam o governo ruim ou péssimo. Um dos principais problemas que dificultam o combate à corrupção é a cultura de impunidade ainda vigente no país. A justiça é morosa, e aqueles que podem pagar bons advogados dificilmente passam muito tempo na cadeia ou mesmo são punidos. Além disso, o fato de os políticos gozarem de direitos como o foro privilegiado e serem julgados de maneira diferente da do cidadão comum também contribui para a Prof. Fabio Uchôas de Lima 18 Economia e Gestão do Setor Público Cad. 2 impunidade. Segundo o advogado e político brasileiro Tarso Genro, "a demora no processo está vinculada à natureza contenciosa, que assegura direitos para as partes de moverem até o último recurso." Em estudo divulgado pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), foi revelado que entre 1988 e 2007, isto é, um período de dezoito anos, nenhum agente político foi condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Durante este período, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) condenou apenas cinco autoridades. Combate Por parte da sociedade civil, instituições como a Transparência Brasil fazem o seu papel de denunciar e combater as manifestações de corrupção. Outro instrumento eficaz no combate à corrupção é a transparência. Conforme indica o economista Marcos Fernandes da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, "para combater a corrupção, é preciso ter políticas de longo prazo, preventivas, é preciso fazer uma reforma administrativa(...). Disseminar a bolsa eletrônica de compras, informatizar os processos de gestão, permitir que o cidadão fiscalize a execução orçamentária online". Escândalos de 2010 1.Governador do Rio de Janeiro dá dispensa remunerada aos servidores estaduais para protestar 2.Senado autoriza parlamentares a utilizarem "passagens extras" em 2010 3.Tribunais Eleitorais não seguem a lei punindo os candidatos que já começaram a fazer campanha 4.Deputado Ernandes Amorim (PTB-RO) pede que a Câmara compre um jatinho para deputados 5.Gasto com publicidade de senadores cresce 52% em véspera de ano eleitoral 6.Senadores ganham diárias para ficar em casa 7.Deputados repassaram verbas públicas para empresas doadoras de campanha 8.Senado gasta R$ 6,4 milhões com despesas médicas de ex-senadores 9.2 mil faltas a mais na Câmara em 2009 10.Senado libera 274 funcionários de registrar presença 11.Fraude desvia R$ 2 milhões na Câmara 12.Deputado Waldemir Moka (PMDB-MS) pede voto com dinheiro público da Câmara 13.Deputado Sandro Mabel (PR-GO) diz ter ajudado a pagar carro para acusado de praticar golpe da creche na Câmara 14.Senado abona 8 de cada 10 faltas dos senadores 15.Câmara paga R$ 390 mil em horas extras no recesso 16.Senador Renan Calheiros (PMDB-AL) contratou "fantasma" exonerada por Sarney 17.Deputados eleitos presidentes de comissões são alvo no STF 18.Agaciel Maia, pivô do escândalo dos atos secretos, não é demitido Prof. Fabio Uchôas de Lima 19 Economia e Gestão do Setor Público Cad. 2 Referências BIDERMAN, C. e ARVATE, P. Economia do Setor Público no Brasil. Rio de Janeiro:Campus/Elsevier, 2005. GIAMBIAGI, F. e ALÉM, A. Finanças Públicas: Teoria e Prática no Brasil. 2ª ed., Rio de Janeiro. Campus/Elsevier, 2008. MARTINS, P.E.M. e PIERANTI, O. P. Estado e Gestão Pública: visões do Brasil contemporâneo. 2ªed., Rio de Janeiro: Editora FGV, 2006. MATIAS PEREIRA, José. Finanças Públicas: A Política Orçamentária no Brasil. 3ª ed. São Paulo: Ed. Atlas, 2006. PINHO, D. B.; VASCONCELLOS, M. A S de (orgs). Manual de economia: equipe de professores da USP. Editora Saraiva, SP, 2006. VARIAN, H. R. Microeconomia: Princípios Básicos. 7ª ed., Rio de Janeiro: Ed.Campus/Elsevier, 2006. Prof. Fabio Uchôas de Lima 20