Sargent, Thomas J. & Neil Wallace (1975) “Rational Expectations, the Optimal Monetary Instrument and the Optimal Money Supply Rule”, Journal of Political Economy, 83-2, pp. 241-254 Análise do artigo por: Henrique Sousa nº 040401255 Pedro Rodrigues nº 030401121 Ricardo Silva nº 060401113 Virgínio Mendes nº 070401210 Palavras-Chave: Política Monetária, Oferta de Moeda, Taxa de Juro, Nível Geral de Preços, Inflação, Crítica de Lucas Classificação JEL: E63, E51, E43, E31, E24, E12 Sumário Sargent & Wallace (1975) testa o impacto de dois instrumentos de política monetária (a fixação da taxa de juro nominal e a fixação da taxa de crescimento da quantidade de moeda) em variáveis macroeconómicas reais (i.e., o produto) e nominais (i.e., o nível geral de preços). Critica o uso de expectativas adaptativas estudando as diferenças que resultam de considerar agentes económicos com expectativas adaptativas ou expectativas racionais. Os resultados obtidos demonstram que num contexto de expectativas racionais o instrumento de política monetária que minimiza a função perda social é a taxa de crescimento da quantidade de moeda. Já num contexto de expectativas adaptativas a escolha de um instrumento face ao outro deriva dos parâmetros estruturais que a economia apresenta (e.g, produto natural, capacidade produtiva) não existe neste caso um instrumento que em regra garanta melhores resultados relativamente ao outro. 1. Introdução Em termos metodológicos Sargent & Wallace (1975) utiliza um modelo macroeconómico reduzido (i.e., que não se fundamenta nos pressupostos microeconómicos de que os consumidores maximizam uma função de utilidade sujeitos à restrição orçamental e as empresas maximizam uma função lucro sujeitas à restrição tecnológica e aos preços de mercado). A introdução no modelo de informação imperfeita é conseguida com a inclusão de uma variável aleatória na parte do produtor. Apesar de Sargent & Wallace (1975, p. 241) classificar o modelo utilizado como 1 simples (ad-hoc) justifica a sua utilização por ser o paradigma à época (e.g., Poole 1970). 2. Desenvolvimento O objectivo dos instrumentos (fixação da taxa de juro nominal e fixação da taxa de crescimento da quantidade da moeda) é a estabilização das flutuações ao longo do ciclo económico, todavia, têm implicações diferentes consoante o modo como os agentes económicos formam expectativas quanto aos preços futuros (e o modo como eles percepcionam as flutuações em termos de duração). Poole (1970) demonstra que num contexto de expectativas adaptativas é indiferente o uso de um ou outro instrumento pois produzem o mesmo efeito nas variáveis macroeconómicas (i.e., ambos conseguem afectar o produto e os preços). Sargent & Wallace (1975) demonstra que o mesmo não se verifica se os agentes económicos formarem expectativas racionais. Sob a hipótese de expectativas racionais (em que a expectativa de um agente económico, em média, coincide com o valor esperado futuro da variável, Muth, 1961), o nível do produto embora não seja controlável por qualquer dos instrumentos, a fixação de um determinado valor objectivo para a taxa de juro nominal leva à não existência de um equilíbrio no nível geral de preços, o que em termos empíricos se traduz por uma elevada flutuabilidade de preços o que não ocorre com a fixação da taxa de crescimento da quantidade de moeda. (Sargent & Wallace, 1975, p. 242). Esta conclusão está de acordo com Friedman (1948) que propõe que a autoridade monetária, pelo facto de o timing de aplicação e a magnitude dos seus efeitos serem desconhecidos, deve fixar a variação da quantidade de moeda em X% por ano. Kydland & Prescott (1977) concluiu pela optimalidade das regras fixas em detrimento de políticas discricionárias. (Kydland & Prescott, 1977, p. 474) Esta é a fundamentação usada por Sargent & Wallace (1975) e Friedman (1948) para sustentar o facto de o uso de regras conduzir a melhores resultados que o uso de políticas discricionárias, Kydland & Prescott (1977) prova que se considerarmos que os agentes económicos são racionais, isto é, que têm algum conhecimento acerca da forma como as decisões políticas se irão alterar à medida que as condições económicas se alteram, as políticas monetárias discricionárias conduzem a resultados piores, não irão resultar na maximização do bem-estar social da sociedade, estas políticas terão um carácter sub-óptimo. Isto sucede porque os agentes económicos antecipam uma variação 2 do nível geral de preços neutralizando o efeito que essas políticas podiam ter em termos de produto e de emprego. O que em termos de curto prazo pode aparentar ser a melhor solução pode não constituir a melhor opção no longo prazo. Por exemplo, poderia pensar-se que a eliminação de direitos de propriedade intelectual relativos a patentes constituiria um incentivo a uma mais rápida difusão internacional do conhecimento com os impactos positivos que esta tem no crescimento económico. No entanto tal medida levaria as empresas a não despenderem verbas elevadas em actividades de I&D pois não iriam obter o retorno que assegurasse a viabilidade económica dos projectos, isto teria consequências nefastas em termos de crescimento económico. Posto isto, não existem políticas monetárias óptimas e a escolha de regras fixas que uma autoridade monetária (independente dos Governos) pode adoptar, constitui a forma mais eficiente de condução da política monetária. Sargent & Wallace (1975) estuda o impacto de dois instrumentos a que as autoridades monetárias podem recorrer: a fixação da taxa de juro nominal, que consiste em ceder/absorver liquidez (i.e., moeda) sem limite e que pretende satisfazer a procura de moeda ao valor da taxa de juro que se estabelece, ou a fixação da taxa de crescimento da quantidade de moeda que origine que a taxa de juro formada resultante do equilíbrio entre procura e oferta de fundos no mercado monetário assegure o equilíbrio do sistema, em dois contextos. Num contexto de expectativas adaptativas (backward-looking) em que as expectativas dos agentes económicos relativamente à evolução de certa variável são corrigidas ou adaptadas em função do último erro de previsão observado. O outro contexto estudado é o de expectativas racionais (forward-looking) introduzido na literatura económica por Muth (1961) (em termos de justificação comportamental os agentes económicos tomam em consideração, na formulação de expectativas não só os valores passados e presente da variável mas toda a informação disponível, onde se incluem os modelos de teoria económica relevantes da melhor forma possível). Isto não significa que os agentes não cometam erros de previsão, significa sim, que esses erros não assumirão uma natureza sistemática. Os erros de previsão são aleatórios (white noise), isto significa que se podem enganar algumas pessoas o tempo todo e todas as pessoas algum tempo mas não se podem enganar todas as pessoas todo o tempo (em média)1. 1 Esta expressão da autoria de Abraham Lincoln (ex-presidente dos EUA) num contexto político, foi reutilizada pelos defensores das expectativas racionais uma vez que retrata o efeito da racionalidade nos agentes económicos quando confrontados com a adopção de determinado tipo de políticas. 3 2.1. Modelo Macroeconómico proposto por Sargent & Wallace (1975) Sargent & Wallace (1975) formulam um modelo macroeconómico em que o equilíbrio no mercado de bens e serviços é representado por duas equações: A oferta agregada: y t = a 1 k t 1 + a 2 (p t - t p *t 1 ) + u 1t a i > 0, i = 1, 2; (1) A procura agregada ou curva IS2: y t = b 1 k t 1 + b 2 [r t - ( t 1 * t 1 - t * t 1 )] + b 3 Z t + u 2t b 1 > 0, b 2 < 0; (2) Em que y e p correspondem, respectivamente, ao logaritmo do produto e do nível geral de preços, r corresponde à taxa de juro nominal, kt é uma proxy da capacidade produtiva do país, Zt trata-se de um vector representativo de choques exógenos que leva a que este seja um modelo de informação imperfeita e ut correspondem aos termos de perturbação aleatórios. O equilíbrio no mercado monetário ou curva LM é representado por: m t = p t + c 1 y t + c 2 r t + u 3t c 1 > 0, c 2 < 0 (3) Em que m é o logaritmo da oferta de moeda A capacidade produtiva da economia é representada pela equação: k t = d 1 k t 1 + d 2 [r t - ( t 1 * t 1 -t * t 1 )] + d 3 Z t + u 4t d 2 < 0 (4) Considera-se igualmente as variáveis exógenas a Zt = j 1 j Z t j + t q u it = j 1 ij u i ,t j + i,t Face a este modelo Sargent e Wallace (1975) formulam uma função perda social e testam o impacto da fixação da taxa de juro e da fixação da taxa de crescimento da quantidade de moeda nessa função perda. O instrumento de política monetária que 2 IS significa Investment= Saving 4 minimiza esta função deverá ser aquele que as autoridades monetárias aplicam na condução da política monetária A função perda proposta pelos autores é a seguinte: L = E0 t 1 t 1 [(y t , p t ) K (y t , p t )’ + (y t , p y ) (K 1 , K 2 )’ + K12 K2 + 2 ] 4 4 (5) q Num contexto de expectativas adaptativas (p *t = v i 0 1 i p t 1 ) em que v1 representa um valor fixo, Sargent & Wallace (1975) prova que não existe um instrumento que por si só garanta melhores resultados na minimização da função perda relativamente ao outro. A escolha entre um e outro depende dos parâmetros relativos às características estruturais da economia como, por exemplo, os parâmetros relativos à capacidade produtiva do país. Num contexto de expectativas racionais ( t 1 p *t j = E t j p t 1 ) em que E corresponde ao valor Esperado, a função perda é minimizada quando o instrumento escolhido pela autoridade monetária é a fixação da taxa de crescimento da quantidade de moeda uma vez que a fixação da taxa de juro nominal produz um efeito desestabilizador no nível geral de preços. Esta conclusão é corroborada por outros autores entre os quais Kydland & Prescott (1977) que concluem pela optimalidade da fixação da taxa crescimento da quantidade de moeda em detrimento da fixação da taxa de juro nominal. Os resultados obtidos pelos autores decorrentes da aplicação dos modelos e que se referem a uma análise de curto prazo3 demonstram também que se considerarmos os agentes racionais na tomada de decisões, isto é, pressupondo expectativas racionais, se a política monetária em questão resultar de uma variação da massa monetária4 e tiver um carácter permanente, ela apenas produzirá efeitos no nível geral de preços não se repercutindo no produto. Também, e.g., Lucas (1972) através da proposição da 3 No longo prazo verificam-se os princípios da neutralidade monetária e da dicotomia clássica, isto é, alterações na oferta de moeda afectam todas as variáveis nominais na mesma proporção e a política monetária apenas produz efeitos em variáveis nominais como o nível geral de preços não produzindo quaisquer efeitos em variáveis reais como o produto. 4 Uma variação da massa monetária frequentemente designada por variação da oferta de moeda pode ser obtida por duas vias: variação da base monetária emitida pela autoridade monetária ou variação das reservas legais às quais as OIM (Outras Instituições Monetárias) têm de se submeter, neste caso o aumento da massa monetária ocorre via efeito multiplicador. 5 ineficácia da política macroeconómica (conhecida na literatura económica por crítica de Lucas) refere que a política macroeconómica só terá efeitos no produto se não for antecipada, se for esperada pelos agentes económicos racionais, estes anteciparão de imediato a alteração dos preços e a AS, ou seja, a curva da oferta agregada desloca-se imediatamente da sua posição de curto prazo (SAS) para a sua posição final de longo prazo (LAS). Expectativas Racionais Nível Geral de Preços (P) Produto Real (Y) Fonte: Gordon, Robert J (2006), Capítulo 17 Sargent & Wallace (1975) demonstra que se a política levada a cabo consistir na fixação da taxa de crescimento da quantidade de moeda existe um equilíbrio e que é único, o qual constitui o objectivo que as autoridades monetárias pretendem atingir sob pena de a sua actuação ser ineficiente, ou mais grave, ainda no caso de políticas monetárias expansionistas ocorrer uma situação de oferta de moeda explosiva com os efeitos negativos a ela associados, como a ocorrência de níveis elevados de inflação ou mesmo hiperinflação, (Sargent & Wallace, 1975, p. 250) Por hiperinflação entende-se uma taxa de crescimento mensal do nível geral de preços igual ou superior a 50%, é esta a medida utilizada por Cagan (1956) para descrever situações de hiperinflação ocorridas em diferentes países no passado e propor uma explicação para este fenómeno. Sargent & Wallace (1975) considera igualmente o impacto do outro instrumento à disposição da autoridade monetária em termos da condução da política monetária: a fixação da taxa de juro nominal. Neste caso os agentes económicos esperam face á procura de moeda na economia, que a autoridade monetária acomode essa procura à taxa de juro que fixou como objectivo da política monetária. Esta situação traz como consequência que os agentes interpretem uma variação no nível geral de preços como exclusivamente 6 decorrente de uma variação da oferta de moeda, a qual tem de igualar a procura de moeda, que por sua vez depende do produto, tal situação origina que não é possível determinar um ponto de equilíbrio para o nível geral de preços, quando o objectivo da autoridade monetária é fixar a taxa de juro. (Sargent & Wallace, 1975, pp. 250-251) Para levar a cabo esta análise, que se enquadra na corrente do novo classicismo económico, Sargent and Wallace (1975) considera que mesmo no curto prazo se verifica um equilíbrio de pleno emprego com salários e preços flexíveis, o que lhes permite concluir que a curva de Phillips5 tende a assumir uma configuração vertical. O trade-off entre inflação e desemprego que os keynesianos constatavam num contexto de expectativas adaptativas legitimava a utilização de políticas monetárias expansionistas com vista à redução da taxa de desemprego e ao aumento do produto mesmo que essa redução tivesse como contrapartida um aumento da inflação. Num outro contexto, o de expectativas racionais o trade-off deixa-se de verificar ou, pelo menos, não se verifica de forma tão acentuada no curto prazo, originando a que no longo prazo os efeitos de políticas monetárias expansionistas tenham apenas impacto positivo na inflação (i.e., um aumento da inflação) e nulo no desemprego, o qual regressa à taxa de equilíbrio de desemprego natural (NAIRU)6. Estas conclusões são evidenciadas em Lucas (1973) em que se constata que esse trade-off se deixa de verificar. Em termos de longo prazo, keynesianistas e clássicos partilham as mesmas ideias relativamente ao trade-off entre inflação e desemprego decorrente de políticas económicas, havendo divergência apenas no curto prazo.7 (Sargent & Wallace, 1975, pp. 250-251) 5 Phillips identifica a existência de uma correlação positiva entre a taxa de crescimento do nível geral de preços e a taxa de crescimento do produto que os dados empíricos sustentam. Consequentemente verifica-se uma correlação negativa entre a taxa de crescimento do produto e a taxa de desemprego. 6 Non-Accelerating Inflation Rate of Unemployment 7 Os choques petrolíferos do início da década de 70 no qual se registou um período de estagflação (taxas de desemprego elevadas conjugadas com taxas de inflação elevadas) vêm sustentar empiricamente a tese defendida pelos novos-clássicos de que não existe trade-off entre inflação e desemprego, isto é, a curva de Phillips é vertical. 7 Taxa de Inflação Taxa de Desemprego Fonte: Gordon, Robert J (2006), Capítulo 17 Sargent & Wallace (1975) também efectua uma análise dos efeitos da política monetária quando a autoridade monetária dispõe de informação privilegiada. Independentemente de fazer ou não uso desta informação a fixação da taxa de crescimento da quantidade de moeda é o instrumento de política monetária que melhores resultados apresenta na minimização da função perda social. Neste cenário típico dos autores monetaristas como Friedman, políticas monetárias não antecipadas pelos agentes de carácter temporário, podem ter um impacto nas variáveis reais como o produto e a taxa de juro no entanto se a natureza destas políticas for permanente o seu impacto, ela já não produzirá efeitos nas variáveis reais mas apenas no nível geral de preços. No caso das políticas monetárias não antecipadas os agentes entendem o aumento dos preços dos produtos por eles produzidos como resultante de um aumento da procura por parte dos consumidores e não resultante de uma política monetária expansionista. Tal facto levaria os produtores a expandir a produção, a empresa estaria na disposição de oferecer um salário mais elevado de forma a contratar mais trabalhadores e dessa forma a taxa de desemprego seria inferior à taxa natural de desemprego. Todavia esses mesmos trabalhadores que ao salário anteriormente praticado pela empresa tinham uma preferência por lazer em relação ao trabalho, com o decurso do tempo apercebem-se de que o salário nominal aumentou mas o mesmo não sucedeu com o salário real. Em virtude da subida do nível geral de preços esses trabalhadores que ingressaram no mercado de trabalho retomam voluntariamente à 8 condição de desempregados e a economia regressa ao estado inicial antes do choque monetário. (Sargent & Wallace, 1975, p. 250) 3. Conclusão: Em suma, Sargent e Wallace (1975) demonstra que num contexto de expectativas racionais o instrumento de política monetária que a autoridade monetária deve aplicar na prossecução da política monetária é a fixação da taxa de crescimento da quantidade de moeda pois este é o instrumento que minimiza a função perda social. Num contexto de expectativas adaptativas a escolha entre um ou outro instrumento depende dos parâmetros estruturais que a economia apresenta. Bibliografia: Cagan, Phillip (1956), “The Monetary Dynamics of Hyperinflation” in Studies in the Quantity Theory of Money, Milton Friedman (editor), University of Chicago Press, pp. 101-104 Friedman, Milton (1948), “A Monetary and Fiscal Framework for Economic Stabilization”, American Ecocomic Review, 38, pp. 245-264 Gordon, Robert J (2006), “Chapter: 17: New Classical Macro Confronts New Keynesian Macro” in Macroeconomics, Addisson-Wesley, 10th edition (1st edition, 2002) Kydland, Finn E. & Edward C. Prescott (1977), “Rules Rather Than Discretion: The Inconsistency of Optimal Plans”, Journal of Political Economy, 85, pp. 473-491 Lucas Jr., Robert (1972) “Expectations and the neutrality of the Money”, Journal of Economic Theory, 4, pp. 103-124 Lucas Jr., Robert (1973): “Some International Evidence on Output-Inflation Tradeoffs”, American Economic Review, 63, pp. 326-334 Muth, John (1961) “Rational-Expectations and The Theory of Price Movements”, Econometrica, 29, pp. 315-335 Phillips, Alban W (1958) “The Relation between Unemployment and the Rate of Change of Money Wage Rates in the United Kingdom 1861-1957”, Economica, 25, pp. 283-299 Sargent, Thomas J. & Neil Wallace (1975), “Rational Expectations, the Optimal Monetary Instrument and the Optimal Money Supply Rule”, Journal of Political Economy, 83, pp. 241-254 9