MICROBIOLOGIA MÉDICA E IMUNOLOGIA I BACTERIOLOGIA GERAL NUTRIÇÃO E CULTURA DE BACTÉRIAS Para cultivar bactérias em laboratório é necessário conhecer as suas preferências nutricionais. É necessário conhecer também as suas exigências ambientais. NUTRIENTES Fonte de energia. Elementos plásticos: Carbono (C); Azoto (N); Fósforo (P); Enxofre (S); Minerais. Os principais elementos, suas fontes e funções nas células bacterianas Elemento peso seco (%) Fonte Compostos orgânicos ou CO2 H2O, compostos orgânicos, CO2, and O2 NH3, NO3, compostos orgânicos, N2 H2O, compostos orgânicos, H2 Fosfatos inorgânicos (PO4) SO4, H2S, So, compostos de enxofre orgânico Carbono 50 Oxigénio 20 Azoto 14 Hidrogénio 8 Fósforo 3 Enxofre 1 Potássio 1 Sais de potássio Magnésio 0.5 Sais de magnésio Calcio 0.5 Sais de cálcio Ferro 0.2 Sais de ferro Função Principal constituinte do material celular Constituinte do protoplasma e água celular; O2 é aceitador de electróes na respiração aeróbica Constituinte de aminoácidos, ácidos nucleicos nucleótidos e coenzimas Principal constituinte de compostos orgânicos e água celular Constituinte de ácidos nucleicos, nucleótidos, fosfolípidos, LPS, acidos teicóicos Constituinte da cisteina, metionina, glutatião, vários coenzimas Principal catião celular inorgânico e cofactor para certos enzimas Catião celular inorgânico, cofactor par certas reacções enzimáticas Catião inorgânico celular, cofactor para certos enzimas e um componente dos endósporos Componente dos citocromos e certas ferro-proteinas nonhemínicas e um cofactor para algumas reacções enzimáticas TIPOS TRÓFICOS DE BACTÉRIAS Fototróficas Utilizam a luz como fonte de energia. Fotolitotróficas – utilizam substâncias inorgânicas como fonte de electrões e protões: Sulfobactérias (Chromatium) utilizam SH2, produzindo.enxofre. Cianobactérias (Anabaena) utilizam H2O, produzindo O2. Fotoorganotróficas – utilizam substâncias orgânicas como fonte de electrões e protões: Rhodopseudomonas. Quimiotróficas Oxidam substâncias químicas para derivar energia e electrões e protões. Quimiolitotróficas: Bactérias nitrificantes (Nitrobacter e Nitrosomonas) oxidam o N a nitrito (NO2) e a nitrato (NO3). Bactérias sulfooxidantes (Thiobacillus thiooxidans) oxidam o S a ácido sulfúrico (H2SO4). Quimioorganotróficas: Bactérias saprófitas – Escherichia coli, Lactobacillus plantarum. Paratróficas Parasitas intracelulares obrigatórios – parasitas energéticos. Riquétsias e Clamídias. Outro modelo de classificação para os principais tipos tróficos procariotas Tipo nutricional Fonte de energia Fonte de carbono Exemplos Fotoautotróficos Luz CO2 Cianobactérias, algumas bactérias púrpuras e verdes Luz Compostos orgânicos Algumas bactérias púrpuras e verdes Fotoheterotróficas Quimioautotróficos ou litotróficos (Litoautotróficos) Compostos inorgânicos, Ex: H2, CO2 NH3, NO2, H2S Algumas Eubacteria e muitas Archaea Quimioheterotróficos ou Heterotróficos Compostos orgânicos A maior parte das Euacteria, algumas Archaea Compostos orgânicos FONTES DE CARBONO Autotróficas Utilizam substâncias inorgânicas como fonte de carbono. Obrigatórios - não crescem na presença de matéria orgânica (Nitrobacter, Nitrosomonas). Facultativos – também utilizam matéria orgânica como fonte de carbono (Hydrogenomonas). Heterotróficas – Utilizam substâncias orgânicas como fonte de carbono. Prototróficas – como fonte de carbono exigem, nos meios onde crescem, substâncias orgânicas tão simples como glucose (meio mínimo) (Escherichia coli). Auxotróficos – para crescer, nos meios de cultura, necessitam de substâncias orgânicas mais complexas – aminoácidos, vitaminas, etc., (bactérias patogénicas, bactérias lácticas). Vitaminas importantes na nutrição de algumas bactérias Vitamina Ácido paminobenzóico (PABA) Forma Coenzima Ácido fólico Á. Tetrahidrofólico Biotina Biotina Ácido lipóico Lipoamida Ácido mercaptoetanosulfónico Coenzima M Produção de CH4 pelas bactérias metanogénicas NAD (nicotinamida adenina dinucleótido) e NADP Coenzima A e a Proteína acil transportadora (ACP) Transportador de electrões nas reacções de deshidrogenação Oxidação de ceto ácidos e transportador de grupos acil no metabolismo Transaminação, desaminação, descarboxilação e racemização de aminoácidos Ácido nicotínico Ácido pantoténico Piridoxina (B6) Riboflavina (B2) Tiamina (B1) Vitamina B12 Vitamina K - Fosphato de piridoxal FMN (flavina mononucleótido) and FAD (flavina adenina dinucleótido) Tiamina pirofosfato (TPP) Cobalamina acoplada a adenina nucleósido Quinonas e naftoquinonas Função Precursor na biosíntese de ácido folico Transferência de unidades monocarbonadas e necessário à síntese de bases tiamina e purina, serine, metionina and á. pantoténico Reacções biosintéticas que requerem fixatção de CO2 Transferência de grupos acil na oxidação de ceto ácidos Reacções de óxido-redução Descarboxilação de ceto ácidos e transaminações Transferência de grupos metilados Processos de transporte electrónico FONTES DE AZOTO (N) A amónia (NH4+) é a fonte de N preferencial para a maioria das bactérias. Algumas bactérias utilizam nitratos (NO3-) como fonte de N. Diazotróficos – fixam o N2 atmosférico (Clostridium pasteurianum, Cyanobacter). FÓSFORO (P ) Existe em pequenas quantidades em todos os ecossistemas. Nos depósitos naturais encontra-se imobilizado numa forma não disponível (não solúvel). É importante para a estruturação dos ácidos nucleicos, fosfolípidos e ácidos teicóicos das bactérias Grampositivas. ENXOFRE (S) Necessário para a biossíntese de aminoácidos sulfurados (cisteína, cistina, metionina). Estruturação das proteínas. Nas arquibactérias, necessário para a estruturação da membrana citoplasmática. MINERAIS Importantes na manutenção da osmolalidade do meio. Controlo do pH. Estruturação de enzimas - enzimas conjugados (o átomo do mineral faz parte da própria molécula do enzima). Cofactores enzimáticos (para que os enzimas funcionem, é necessário que o mineral exista em determinadas concentrações no meio). Macroelementos (concentrações da ordem de g/l) K+, Na+, Mg2+, Mn2+ e Fe2+ Oligoelementos (concentrações da ordem de ppm) Zn2+, Mo2+, Co2+ e Cu2+ Factores de crescimento Alguns microrganismos são incapazes de sintetizar algumas macromoléculas exigem a sua incorporação no meio onde crescem 3 classes principais aminoácidos purinas e pirimidinas vitaminas - Enterococcus faecalis necessita de 8 vitaminas para crescimento; - Haemophilus influenzae exige hemina no meio de cultura; - Lactobacillus e Streptococcus são utilizados em ensaios microbiológicos para dosear vitaminas e aminoácidos. ABSORÇÃO DE NUTRIENTES Os microrganismos, em condições naturais, vivem em habitats pobres em nutrientes têm que absorver nutrientes contra concentração Transporte facilitado Permeases Glicerol é transportado por difusão facilitada gradiente de Transporte activo transporte contra gradiente de concentração consumo de energia Transportadores ABC (ATP-binding cassette transporters) Bactérias Arqueobactérias Eucariotas No exterior da membrana existe uma proteina ligante do soluto No interior, um domínio de ligação nucleotídica E. coli transporta vários glúcidos (arabinose, maltose, galactose, ribose) e aminoácidos (á. glutâmico, histidina, leucina) com este sistema Transporte activo usando gradientes de protões e Na+ Simport – absorção de lactose com entrada de protões A lactose-permease de Escherichia coli transporta lactose para o interior da célula com a entrada de protões Antiport – entrada de protões e excreção de sódio O gradiente de sódio gerado dirige a absorção de glúcidos e aminoácidos As proteinas transportadoras de E. coli transportam melibiose e á. glutâmico com a entrada de sódio Translocação de grupo A molécula é transportada para o interior da célula sendo alterada quimicamente Sistema Fosfotransferase (PTS) envolve a molécula de fosfoenolpiruvato (PEP) transporte de glúcidos PEP + glúcido (ext.) → piruvato + glucidofosfato (int.) Sistema bem distribuido nos procariotas com a excepção dos aeróbios estrictos Sistema bem estudado em E. coli e Salmonella typhimurium Absorção de ferro Quase todos os microrganismos requerem ferro (Fe) para a produção de citocromos A absorção do Fe é dificil devido à extrema insolubilidade do ião férrico (Fe3+) Muitas bactérias ultrapassaram esta limitação com a produção de sideróforos Moléculas de baixo peso molecular capazes de complexarem Fe3+ e fornecê-lo à célula Normalmente ou são hidroxamatos ou fenolatoscatecolatos Enterobactina é um catecolato produzido por E. coli Os microrganismos produzem sideróforos quando a concentração de Fe no meio é muito baixa Quando o complexo sideróforo-Fe atinge a superfície celular, liga-se com a proteina receptora-sideróforo Então o ião Fe ou é libertado e entra para a célula directamente ou o complexo sistema de transporte é transportado para transportador-ABC o interior da cálula pelo MEIOS DE CULTURA Para bactérias Quimicamente definidos – sintéticos. Quimicamente não definidos – Meios complexos. Peptonas, extracto de carne, extracto de levedura. Agar-agar – gelificante dos meios. Meio mínimo para o crescimento de Bacillus megaterium. Um exemplo de um meio quimicamente definido para o crescimento de uma bactéria heterotrófica Componente Quantidade Função do componente sacarose 10.0 g fonte de C e energia K2HPO4 2.5 g Tampão pH ; fonte de P e K KH2PO4 2.5 g Tampão pH ; Fonte de P e K (NH4)2HPO4 1.0 g Tampão pH; fonte de N e P MgSO4 7H2O 0.20 g Fonte de S e Mg++ FeSO4 7H2O 0.01 g Fonte de Fe++ MnSO4 7H2O 0.007 g Fonte de Mn++ water 985 ml pH 7.0 Meio complexo para crescimento da bactérias fastidiosas Componente Quantidade Extracto de carne 1.5 g Extracto de levedura Peptona Glucose Agar Água pH 6.6 3.0 g 6.0 g 1.0 g 15.0 g 1000 ml Função do componente Fonte de vitaminas e outros factores de crescimento Fonte de vitaminas e outros factores de crescimento Fonte de aminoácidos, N, S, e P Fonte de C e energia Agente solidificante inerte Tipos de Meios Meios Gerais: Caldo nutritivo, agar nutritivo. Meios enriquecidos: Sangue, soro, colesterol. etc (agar sangue). Meios Selectivos: Substâncias inibidoras – cristal violeta e sais biliares (agar MacConkey). Escherichia coli, (à direita) que fermenta a lactose, e Citrobactor freundii, (à esquerda), que não fermenta. Meios diferenciais ou indicadores: Contêm substâncias que sofrem alteração visível por acção dos microorganismos (agar MacConkey). Meios para testes microbiológicos: Antibiogramas (Müller Hinton), quantificação de vitaminas. Meios para riquétsias e clamídias Cultura de tecidos – são células animais desenvolvidas em meios laboratoriais. Linhas celulares primárias obtidas de explantes – amostras de tecidos ou células recolhidas de órgãos de animais. Linhas celulares contínuas – células transformadas adaptadas às condições in vitro (diferentes das originais , mas sem perder a afinidade para os virus). Ex: Células HeLa (neoplasia cervical de Helen Lane – 1951). CONDIÇÕES AMBIENTAIS PARA BACTERIANO Oxigénio (O2) Temperatura pH Concentração de solutos (osmolalidade) Potencial óxido-redutor (O/R) Oxigénio (O2) Bactérias aeróbias estrictas ou obrigatórias Acetobacter. Bactérias anaeróbias estrictas ou obrigatórias Clostridium; Bacteroides. Bactérias facultativas Escherichia coli. Bactérias microaerófilas Brucella; Campylobacter. O CRESCIMENTO Efeito do oxigénio nas bactérias aeróbicas, anaeróbicas, e facultativas Ambiente Grupo Aeróbico Anaeróbico Sem Aeróbio estricto Crescimento crescimento Crescimento se o Sem Microaerófilo nível não for muito crescimento elevado Anaeróbio obrigatório Sem crescimento crescimento Anaeróbio facultativo Crescimento (Aeróbio facultativo) Anaeróbio aerotolerante Crescimento Efeito do O2 Requerido (utilizado para a respiração aeróbica) Requerido mas em níveis abaixo de 0.2 atm Tóxico Não requerido para o Crescimento crescimento mas utilizado quando disponível Não requerido e não Crescimento utilizado Acção da superoxido-dismutase, catalase e peroxidase – estes enzimas destoxificam os radicais de oxigénio inevitavelmente gerados pelos sistemas vivos na presença de O2 e a sua distribuição determina a sua capacidade para crescerem na presença de O2 . Distribuição da superoxidismutase, catalase e peroxidase nos procariotas com diferentes tolerâncias ao O2. Grupo Aeróbios estrictos e a maior parte anaeróbios facultativos (e.g. Enterobactérias) A maior parte dos anaeróbios aerotolerantes (e.g. Streptococci, Lactobacilli) Anaeróbios estrictos(e.g. Clostridia, Metanogenes, Bacteroides) Superóxido Catalase Peroxidase dismutase + + - + - + - - - Temperatura Bactérias psicrófilas ou criófilas: crescem a temperaturas compreendidas entre 00 C – 200 C. Bactérias mesófilas: crescem a temperaturas compreendidas entre 150 C – 450 C. Bactérias termófilas: crescem a temperaturas compreendidas entre 450 C – 800 C. Bactérias termófilas extremas (Pyrodictium): crescem a temperaturas compreendidas entre 950 C – 1030 C. Temperatura de crescimento (graus C) Bactéria Minima Óptima Listeria monocytogenes 1 30-37 Vibrio marinus 4 15 Pseudomonas maltophilia 4 35 Thiobacillus novellus 5 25-30 Staphylococcus aureus 10 30-37 Escherichia coli 10 37 Clostridium kluyveri 19 35 Streptococcus pyogenes 20 37 Streptococcus pneumoniae 25 37 Bacillus flavothermus 30 60 Thermus aquaticus 40 70-72 Methanococcus jannaschii 60 85 Sulfolobus acidocaldarius 70 75-85 Pyrobacterium brockii 80 102-105 Máxima 45 30 41 42 45 45 37 40 42 72 79 90 90 115 Temperaturas óptimas de crescimento para vários procariotas Géneros e espécies Vibrio cholerae Photobacterium phosphoreum Rhizobium leguminosarum Streptomyces griseus Rhodobacter sphaeroides Pseudomonas fluorescens Erwinia amylovora Staphylococcus aureus Escherichia coli Mycobacterium tuberculosis Pseudomonas aeruginosa Streptococcus pyogenes Treponema pallidum Thermoplasma acidophilum Thermus aquaticus Bacillus caldolyticus Pyrococcus furiosus Óptimo de crescimento(graus C) 18-37 20 20 25 25-30 25-30 27-30 30-37 37 37 37 37 37 59 70 72 100 pH A maioria das bactérias proliferam nos meios de cultura a valores de pH compreendidos entre 6 e 9. Bactérias acidófilas – só crescem em meios ácidos (pH 5) Lactobacillus sp. Concentração de solutos Bactérias halófilas: concentração de NaCl nos meios 2% (Halococcus spp. e Halobacterium spp. – cresce em concentrações 20%; produzem o “vermelho do bacalhau”). Bactérias não halófilas: concentração de NaCl 2%. Bactérias osmófilas Não prescindem da presença de NaCl Desequilíbrios osmóticos - Plasmoptise – rebentamento celular (meio hipotónico). - Plasmólise – encolhimento do protoplasma celular (meio hipertónico). (plasmoptise) Solutos e Actividade da Água A quantidade de água disponível para os microrganismos pode ser reduzida por interacção com solutos. A actividade da água (Aw) traduz a água disponível para o desenvolvimento microbiano. É a relação existente entre a pressão do vapor da solução onde se encontram os microrganismos (Psol) e a pressão do vapor da água pura (Págua) à mesma temperatura: Aw= Psol/Págua Potencial óxido-redutor (E/0) É o grau de oxigenação ou redução do meio. A capacidade do meio dar (como dador) ou receber (receptor) O2. expressa-se em milivolts (mV): + 800 mV (potencial do O2) até - 450 mV (potencial do H2) Quanto mais electropositivo for o E/0, maior será o poder oxidante do sistema. Quanto mais electronegativo for o E/0 maior será o poder redutor. Potencial redox de alguns pares de oxido-redução: +800 H2O/1/2O2 Fe3+/Fe2+ +600 NO3-/NO2+400 Cit.c(red.)/cit.c (ox) +200 0 Lactato/piruvato -200 NAD(P)H/NAD(P)H+ -400 Ferredoxina(red)/Ferredoxina (ox) 1/2H2/H+ -600