Monografia apresentada ao Supervisor do Programa de Residência Médica da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal, como requisito parcial para obtenção do título de especialista em Pediatria EMERGÊNCIAS PSIQUIÁTRICAS EM PEDIATRIA Hospital Regional da Asa Sul/SES/DF MANUELA COSTA DE OLIVEIRA ORIENTADOR: JEFFERSON AUGUSTO P. PINHEIRO www.paulomargotto.com.br 11/11/2009 •. Introdução Prevalência dos transtornos psiquiátricos : 10 a 20%. Fonte de angústia para pais/profissionais de saúde. Falta de conhecimento preconceito comprometimento do diagnóstico/tratamento. Acesso à rede de saúde situações de emergência. Nessas situações, o médico que vai estar à frente é, na maioria das vezes, o pediatra geral. Sendo assim, é fundamental que esse esteja preparado para reconhecer e manejar essas crises, até que seja possível a avaliação por um psiquiatra. World Health Organization. Disponível no site http://www.who.int/en. Introdução Emergência psiquiátrica: Situação em que há uma alteração do pensamento e/ou das ações de uma pessoa que levem a um comportamento auto ou hetero-agressivo, podendo estar associado a risco de morte. A maioria das emergências psiquiátricas na pediatria ocorre em adolescentes. Metade dos casos envolve ideação ou tentativa de suicídio = principal causa de internação psiquiátrica. Assumpcao Jr, Francisco B . Tratado de Psiquiatria da Infância e da Adolescência. HYMAN, Steven E., TESAR, George E. Trad. Angela Moraes Rego Reis. Manual de emergências psiquiátricas. . Objetivo Fornecer aos profissionais de saúde informações atuais sobre os principais transtornos psiquiátricos que potencialmente evoluem para emergências psiquiátricas, aumentando o seu reconhecimento e compreensão, proporcionando uma melhor abordagem. Material e métodos Realizada revisão da literatura nacional e internacional utilizando os bancos de dados MEDLINE, LILACS-BIREME e COCHRANE. Selecionados artigos publicados nos últimos 10 anos, abordando emergências psiquiátricas em pediatria. Autismo Transtorno do neurodesenvolvimento em que há interrupção dos processos normais de desenvolvimento social, cognitivo e comunicativo. As anormalidades no funcionamento em cada uma dessas áreas devem estar presentes até os três anos de idade. Prevalência: 1 em 1.000 nascimentos. Klim A. Autismo e síndrome de Asperger: uma visão geral. Rev Bras Psiquiatr. 2006. Autismo Tratamento medicamentoso destina-se a redução de sintomas-alvo: Agitação; Agressividade; Irritabilidade. Drogas utilizadas: Antipsicóticos; Anfetaminas; Antidepressivos; Estabilizadores do humor. Assumpção FB, Pimentel ACM. Autismo infantil.Rev Bras Psiquiatr 2000. Depressão Síndrome caracterizada por alterações do humor e da psicomotricidade associadas a uma variedade de distúrbios somáticos e neurovegetativos. Prevalência: 2% em pré-púberes; 6% em adolescentes. Curatolo E, Brasil H. Depressão na infância: peculiaridades no diagnóstico e tratamento farmacológico. J Bras Psiquiatr 2005. Depressão Critérios diagnósticos: Humor deprimido Anedonia Perda/ganho de peso Insônia/hipersonia Agitação/retardo psicomotor Fadiga Sentimento de inutilidade Diminuição da capacidade de pensar Pensamentos de morte recorrentes Ideação suicida ou tentativa Prejuízo do funcionamento social ou sofrimento significativo. Os sintomas não se devem a efeito de substâncias ou condição médica geral. * CID-10: classificação de transtornos mentais e de comportamento da CID-10: descrições clínicas e diretrizes diagnósticas. Depressão Particularidades: Pré-escolares: sintomas físicos. Escolares: tristeza ou tédio referidos. Adolescentes: comportamento irritável e instável. O abuso de álcool e drogas nessa faixa etária pode ser um forte indicador de depressão! Curatolo E, Brasil H. Depressão na infância: peculiaridades no diagnóstico e tratamento farmacológico. J Bras Psiquiatr 2005. Depressão Calcula-se que a depressão seja responsável pela maioria dos suicídios entre jovens. A maioria das crianças e adolescentes deprimidos não é sequer identificada, e muito menos encaminhada a tratamento: Antidepressivos; Psicoterapia*. Bahls SC. Aspectos clínicos da depressão em crianças. Jornal de Pediatria 2002. Transtorno bipolar Mania (ou hipomania)/ episódios depressivos. Prevalência: 1 a 7%. Particularidades: Humor irritável é mais freqüente do que euforia; É maior a prevalência de psicose; Ciclagem rápida é mais freqüente. Lee Fu I. Transtorno afetivo bipolar na infância e na adolescência. Rev Bras Psiquiatr 2004. Transtorno bipolar Comorbidades: Transtorno de déficit de atenção/hiperatividade. Diagnósticos diferenciais: TDAH; Depressão; Esquizofrenia. Lee Fu I. Transtorno afetivo bipolar na infância e na adolescência. Rev Bras Psiquiatr 2004. Transtorno bipolar Tratamento medicamentoso: Estabilizadores do humor; Antidepressivos; Antipsicóticos. É desaconselhável o uso isolado de antidepressivo em crianças com fatores de risco para transtorno bipolar. Rohde LA, Tramontina S. O tratamento farmacológico do transtorno bipolar na infância e adolescência. Rev. Psiq. Clín. 2005. Transtornos de ansiedade Pânico Estresse agudo Estresse pós-traumático Ansiedade generalizada Ansiedade de separação Obsessivo-compulsivo Fobias específicas Agorafobia Fobia social Transtornos ansiosos Ataque de pânico: Período distinto de intenso medo ou desconforto + pelo menos 4 dos sintomas somáticos ou cognitivos: Palpitações Falta de ar/asfixia Parestesias Sudorese Tontura Despersonalização Tremores/abalos Dor torácica Medo de perder o controle Calafrios Náusea/ dor abdominal Medo de morrer DSM-IV: manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. 4.ed. Transtornos de ansiedade O mais importante é diferenciar o pânico dos quadros orgânicos: Feocromocitoma; Hipertireoidismo; Distúrbios respiratórios/cardíacos. Alguns agentes que podem desencadear ataque semelhante ao ataque de pânico são: Cafeína; Álcool; Nicotina. Assumpcao Jr, Francisco B . Tratado de Psiquiatria da Infância e da Adolescência. 2003. Transtornos ansiosos Tratamento medicamentoso: Benzodiazepínicos durante breves períodos de tempo. Antidepressivos também podem ser utilizados, particularmente quando se observam sintomas depressivos associados. Assumpcao Jr, Francisco B . Tratado de Psiquiatria da Infância e da Adolescência.2003. Transtornos conversivos “O ser humano é linguagem” Lacan Alteração ou perda de uma função física, que sugere um distúrbio neurológico, porém é devido a um conflito ou necessidade psicológica. Não são intencionais/ sofrimento psíquico intenso. São muito mais comuns na adolescência, que é a idade habitual de início do distúrbio. Abaixo dos 10 anos, encontramos mais comumente problemas de marcha. Assumpcao Jr, Francisco B . Tratado de Psiquiatria da Infância e da Adolescência. 2003. Transtornos conversivos Crise pseudoepiléptica: Evento emocional desencadeante Abalos assincrônicos de braços e pernas Progressão não fisiológica e desordenada Fácies de indiferença Preservação da resposta a estímulos ambientais Choros e gritos durante ou logo após Recuperação mnésica detalhada Stella F, Pereira MEC. Transtornos dissociativos - Semiologia e características clínicas das crises pseudo-epilépticas. Rev. Latinoam. Psicopat. Fund. 2003; Transtornos psicóticos As características clássicas da psicose são: Prejuízo em perceber a realidade de forma adequada; Presença de delírios; Presença de alucinações e ilusões. Funcionais, orgânicos ou psicogênicos. Agudos ou crônicos. Tengan SK, Maia AK. Psicoses funcionais na infância e adolescência. Jornal de Pediatria 2004. Transtornos psicóticos Esquizofrenia: Principal representante das psicoses orgânicas. Rara na infância! Idade de início:15 -30 anos. Nem toda psicose é esquizofrenia! Em 35 meses de seguimento, de 20% a 50% dos pacientes apresentam recuperação total ou melhoria significativa. Importância do tratamento precoce. Chaves AC. Primeiro episódio psicótico: uma janela de oportunidade para tratamento? Revisão da literatura. Rev. Psiq. Clín. 2007; Delirium Quadro orgânico agudo que se caracteriza por déficit de atenção, confusão e flutuações do estado de consciência ao longo do dia. O delirium é secundário a uma condição médica geral e/ou de seu tratamento. Tratamento: causa base/uso de antipsicóticos. JanN.M. Schieveld, et cols. Pediatric delirium in critical illness: phenomenology, clinical correlates and treatment response in 40 cases in the pediatric intensive care unit.Intensive.Care Med 2007 Suicídio Uma das dez principais causas de morte. Uma das três primeiras causas de morte na faixa etária entre 15 e 35 anos. Em torno de 90% das vítimas de suicídio sofre de algum transtorno psiquiátrico. Um terço dos que conseguem completá-lo apresentam histórico de tentativas anteriores. Com a intervenção adequada, a maioria dos pacientes com ideação suicida muda de idéia a respeito de querer morrer. •Estellita-Lins C, Oliveira VM, Coutinho MFC. Acompanhamento terapêutico: intervenção sobre a depressão e o suicídio. Psychê 2006; 18: 151-166. Abordagem Crise de agitação: Autismo, depressão, transtorno bipolar, transtornos ansiosos, transtornos psicóticos, delirium. Crise de ansiedade. Tentativa de suicídio. Conduta na crise de agitação Conversar, colocar limites com firmeza. Avaliar a necessidade de contenção física. Avaliar a necessidade de medicação**: Quando o paciente está apenas moderadamente agitado, podem ser oferecidos medicamentos orais (mais seguros e menos traumáticos). Em caso de agitação extrema, devem ser usadas medicações via parenteral. HYMAN, Steven E., TESAR, George E. Trad. Angela Moraes Rego Reis. Manual de emergências psiquiátricas.1994. Conduta na crise de agitação Não há consenso sobre o tratamento medicamentoso da crise de agitação. Há poucos estudos conclusivos nessa área e nenhum estudo na faixa etária pediátrica. Nem mesmo a eficácia e a segurança das drogas usadas em pediatria foram adequadamente confirmadas. Wilhelm S, Schacht A, Wagner T. Use of antipsychotics and benzodiazepines in patients with psychiatric emergencies: Results of an observational trial. BMC Psychiatry 2008; 8:61 - 74. Conduta na crise de agitação Drogas escolhidas Frequência de uso Haloperidol + prometazina 61% Haloperidol +prometazina +diazepam 15% Diazepam 9% Haloperidol+prometazina+clorpromazina 7% Clorpromazina+diazepam+prometazina 1% Clorpromazina + prometazina 1% Clorpromazina 1% Diazepam + prometazina 1% Haloperidol + diazepam 1% Prometazina 1% Drogas de escolha de uso intramuscular e frequência de uso. Fonte: Adaptado de Current practices in managing acutely disturbed patients at three hospitals in Rio de Janeiro-Brazil: a prevalence study.2000. Conduta na crise de ansiedade Uma conduta calma e o uso de técnicas de relaxamento simples (por exemplo, respiração profunda) podem ser eficazes como intervenção inicial. Se houver indicação para intervenção farmacológica aguda, os benzodiazepínicos são o tratamento de escolha. •HYMAN, Steven E., TESAR, George E. Trad. Angela Moraes Rego Reis. Manual de emergências psiquiátricas. 3.ed. Rio de Janeiro : MEDSI, 1994. 504p. Conduta na tentativa de suicídio Todos os pacientes com distúrbio psiquiátrico grave devem ser questionados acerca de idéias suicidas. Perguntar aos pacientes sobre suicídio não coloca a idéia em suas mentes. Pacientes realmente suicidas frequentemente ficam aliviados quando são questionados a respeito disso. HYMAN, Steven E., TESAR, George E. Trad. Angela Moraes Rego Reis. Manual de emergências psiquiátricas. 3.ed. Rio de Janeiro : MEDSI, 1994 Conduta na tentativa de suicídio Deve-se evitar atitudes de censura, o que proporciona maiores probabilidades de uma evolução satisfatória. Avaliar necessidade de internação: Risco iminente de suicídio; Eventos precipitantes; Estabilidade clínica; Recursos sociais e de suporte. •Estellita-Lins C, Oliveira VM, Coutinho MFC. Acompanhamento terapêutico: intervenção sobre a depressão e o suicídio. Psychê 2006 Conclusões Deve-se estar atento para a possibilidade de patologia orgânica . É importante avaliar o contexto em que criança vive. Em todos os casos, deve ser avaliado o risco de suicídio. Tão importante quanto agir na crise é assegurar o acompanhamento a longo prazo. A emergência psiquiátrica deve ser encarada como uma obrigação de agir contra o risco de morte e oportunidade de garantir uma melhor qualidade de vida. O diagnóstico psiquiátrico não é uma condenação. Ele é constatação. Mais! Ele é oportunidade! Para a busca mais do que da normalidade: Para a busca da felicidade!