TRATAMENTO DA ESPASTICIDADE Gláucia Vieira Ferreira,Rafael Guedes de Araujo Dias Paulo R. Margotto (ESCS/SES/Distrito Federal) ESPASTICIDADE Conceito Aumento, velocidade dependente, do tônus muscular, com exacerbação dos reflexos profundos, decorrente de hiperexcitabilidade do reflexo do estiramento. Etiologia Esclerose múltipla. Trauma crânio-encefálico. Trauma raquimedular. Paralisia cerebral. Acidente vascular encefálico. Fisiopatologia O aumento do tônus é secundário à perda das influências inibitórias descendentes (via retículo-espinhal), como resultado de lesões comprometendo o trato córtico-espinhal. A perda da influência inibitória descendente resultará em aumento da excitabilidade dos neurônios fusimotores gama e dos motoneurônios alfa. Os principais neurotransmissores envolvidos no mecanismo do tônus muscular são: ácido gama-aminobutírico (GABA) e glicina (inibitórios) e glutamato (excitatório), além da noradrenalina, serotonina e de neuromoduladores como a adenosina e vários neuropeptídeos. Quadro Clínico A espasticidade nos membros superiores predomina nos músculos flexores, com postura em adução e rotação interna do ombro, flexão do cotovelo, pronação do punho e flexão dos dedos. Nos membros inferiores, a espasticidade predomina nos músculos extensores, com extensão e rotação interna do quadril, extensão do joelho, com flexão plantar e inversão do pé. Os membros espásticos demonstram aumento de resistência ao movimento passivo, que é mais acentuado com o aumento da amplitude e da velocidade imposta. O aumento de resistência ao estiramento passivo é maior no início do movimento e diminui com a continuação dele( "sinal do canivete" ). Quadro Clínico “Clubfoot” Avaliação A espasticidade pode ser avaliada através de escalas. As escalas mais utilizadas são a de Ashworth (MAS) e a de espasmos. Avaliação Avaliação espontâneos TRATAMENTO Tratamento Fisioterapia. Agentes farmacológicos. Quimiodesnervação dos músculos (injeções de fenol). Utilização de injeções de toxina botulínica. Tratamento cirúrgico. Tratamento Tratamento Fisioterápico. Tratamento 1. Tratamento fisioterápico - Objetivos. Visa à inibição da atividade reflexa patológica para normalizar o tônus muscular e facilitar o movimento normal, devendo ser iniciado o mais breve possível. Tem como objetivo evitar e combater os padrões de movimento e posturas relacionadas aos mecanismos reflexos liberados, adotando posições e guias adequadas e empregando os métodos inibidores. Tratamento 1.Tratamento fisioterápico – Métodos. Método neuroevolutivo (Bobath) . Aplicação de calor e frio durante períodos prolongados. Massagens rítmicas profundas. Estimulação elétrica. Tratamento 2.Agentes farmacológicos. Baclofen. Benzodiazepínicos. Dandrolene sódico( Não disponível no mercado brasileiro). Clonidina. Tizanidina. Fenotiazínicos. Morfina. Tratamento 2.Agentes farmacológicos – Baclofen. Agonista do GABA, atuando em nível de receptores GABA-B, inibindo o influxo pré-sináptico de cálcio, que bloqueará a liberação de neurotransmissores excitatórios, na medula espinhal. O baclofen é mais eficiente para reduzir a espasticidade causada por lesões da medula espinhal do que por lesões cerebrais. Tratamento 2.Agentes farmacológicos – Baclofen. Vias de administração: oral e intratecal (implantação de bomba, de liberação gradual). Os critérios recomendados para a utilização de baclofen intratecal são: espasticidade grave, refratária à medicações por via oral, ou quando estas desencadeiam efeitos colaterais intoleráveis em doses efetivas. Tratamento 2.Agentes farmacológicos – Baclofen. Os efeitos colaterais da administração oral são sonolência, tontura, mal-estar, ataxia, confusão mental, cefaléia, depressão respiratória e cardiovascular e alucinações. Os efeitos colaterais mais comuns decorrentes do uso de baclofen intratecal são: hipotensão ortostática, sedação, pseudomeningocele pós-cirúrgica, e obstrução do cateter. EXISTEM BENEFÍCIOS DO USO DO BACLOFEN NO TRATAMENTO DA HIPERTONIA? O uso do baclofen em neonatos a termo com hipertonia The Use of Baclofen in Full-Term Neonates with Hypertonia Lisa R Moran Tricia Cincotta Kalpathy Krishnamoorthy Robert M Insoft J Perinatol 2005: 25, 66−68. Gláucia Vieira Ferreira,Rafael Guedes de Araujo Dias Paulo R. Margotto (ESCS/SES/Distrito Federal) INTRODUÇÃO Introdução Hipertonia neonatal pode causar severa incapacidade funcional. Hipertonia severa pode estar associada à dificuldades alimentares, dor, desconforto e incapacidade nas contrações articulares. Fornecer adequado cuidado para estes neonatos hipertônicos constitui um desafio tanto para a família quanto para a equipe médica. Introdução Medicações são raramente empregadas para tratar hipertonia neonatal. O baclofen é agonista do GABA (causa inibição présináptica, resultando na inibição sináptica de um ou vários reflexos), usado para reduzir o tônus muscular em crianças com paralisia cerebral e em adultos com várias desordens espásticas. O baclofen tem boa absorção enteral e prontamente atravessa a barreira hematoencefálica. Introdução Alívio sintomático de espasticidade crônica severa têm sido notado com a terapia com baclofen; entretanto, o uso deste medicamento em neonatos para espasticidade crônica severa não tem sido bem documentada. Foram relatados dois casos, detalhando o uso de baclofen em neonatos a termo com hipertonia muscular severa. Introdução Um consentimento familiar prévio foi obtido para iniciar baclofen em cada paciente. Ambos neonatos foram avaliados pelo mesmo profissional terapeuta usando a escala modificada de Ashworth (MAS). O escore desta escala varia de 0 a 4. A escala começa no 0, representando ausência de aumento no tônus e varia até 4 que significa aumento considerável no tônus com dificuldade em movimentos passivos. RELATO DE CASOS PACIENTE #1 Relato de casos Mãe , 24 anos, G1P1, gestação sem intercorrências. Tipagem sangüínea da mãe era A +, Coombs indireto negativo, imune para rubéola, HBsAg negativo, RPR negativo, grupo de estreptococos tipo B (GBS) positivo e PPD positivo sem alterações no Rx de tórax. Mãe deu entrada no hospital em trabalho de parto, com rotura prematura de membrana há 4 horas e recebeu 03 doses de ampicilina para profilaxia de GBS. Relato de casos O RN do sexo masculino, a termo, nasceu por parto vaginal, pesando 4030g, com APGAR de 2 e 3, em 1 e 5 minutos (respectivamente). Não há documentação de APGAR aos 10 e 15 minutos. RN necessitou de ressuscitação cardiopulmonar e foi intubado na sala de parto devido à importante bradicardia e apnéia. Na UTI neonatal apresentou como complicações hipertonia nas 4 extremidades, convulsões e desconforto respiratório durante seu 1° mês de vida, mas foi subseqüentemente extubado para ar ambiente. Relato de casos Observou-se que o neonato apresentava ausência do reflexo de sucção e movimentos faciais anormais. Ele recebeu fenobarbital para profilaxia de convulsões e apresentou um EEG inicial anormal. Terapia ocupacional foi realizada para avaliação geral do desenvolvimento e do tônus. Fenobarbital foi retirado com sucesso e o seguimento do EEG no 32°dia de vida não evidenciou alterações (convulsões). Relato de casos Repetida ressonância magnética cerebral, evidenciando alteração difusa e compatível com injúria hipóxica severa subaguda tardia em regiões da gânglia basal e perirolândica com evidência de significativa lesão de substância branca. Acompanhamento do desenvolvimento neurológico e técnicas de posicionamento foram introduzidos nos cuidados para melhora da hipertonia. Relato de casos Na reavaliação no 32° dia de vida, notou-se severa flexão sinérgica dos membros inferiores, “cortical fisting” e posição preferencial da cabeça para direita. A MAS da criança foi de 3/4 em todos os membros. Baclofen, 0,5mg/kg/dia de 6/6hs, via oral(VO) foi iniciado no 36° dia de vida. Evolução no 39° dia de vida evidenciou melhora do quadro clínico.O MAS foi de 3 para os membros superiores e 1 em membros inferiores, tronco e pescoço. Relato de casos Cuidados e posicionamento da criança foram acentuadamente melhorados após a introdução do baclofen (a criança foi capaz de manter flexão do tronco e pôde tolerar variações de movimentos em todas as extremidades e apresentou melhor interação com a família e os cuidadores). A dose do baclofen foi aumentada em 0,5mg/kg/dia VO a cada semana até atingir dose final de 1,5mg/kg/dia. Relato de casos Na avaliação final, antes da transferência da criança para um hospital de reabilitação, observou-se aumento da tolerância à variação de movimentos em todos os membros. Na reavaliação com 4 meses de vida, o lactente apresentava melhora do quadro, porém ainda recebia alimentação por gavagem. Paciente estava em uso de baclofen e o escore MAS foi 2 nos membros superiores e 1 nos inferiores.Criança não apresentava quadros convulsivos. PACIENTE #2 Relato de casos Mãe: G3 P3, 28 anos de idade. Ultra-sonografia realizada com 17 semanas evidenciou a presença de “pé torto”(clubfoot). Mãe, tipo sangüíneo A+, CI negativo, imune contra rubéola, HBsAg negativo, RPR não reativo, pesquisa para Streptococcus grupo B negativo. Rotura de membranas aconteceu cerca de 3 horas antes do parto. Relato de casos Criança, sexo feminino, nasceu a termo, de parto vaginal, pesando 2780 gramas, com Apgar de 8 no 1° minuto e 3 no 5° minuto. A criança evoluiu na sala de parto com leve taquipnéia e gemência, necessitando de aspiração de vias aéreas, CPAP e oxigênio suplementar. Raio-X de tórax evidenciou diminuição dos volumes pulmonares. Hipertonia de extremidades superiores e “hand clenching” foi também notada. A criança evoluiu com severa hipertonia dos quatro membros, convulsões e distúrbios respiratórios transitórios. Relato de casos No 1° dia de vida criança apresentou hipertonia significativa predominante em dimídio esquerdo em relação ao direito e predominando em membros inferiores em relação aos superiores.O MAS era de 2 em todas as extremidades.Terapia ocupacional foi iniciada. Criança evoluiu com aumento da hipertonia e desconforto importante durante cuidados de rotina como troca das fraldas e mudanças de posição.Técnicas de posicionamento foram introduzidas no cuidado da criança , objetivando a melhora da hipertonia.A criança não apresentou sinais de melhora da hipertonia com estas técnicas . Relato de casos RNM cerebral no 2° dia de vida demonstrou discreta anormalidade cortical, sem sinais de focalização. EMG no 3° dia de vida estava dentro dos limites da normalidade. EEG evidenciou presença de excessiva atividade de ondas “sharp” no hemisfério esquerdo,centro temporal e occipital. Fenobarbital foi iniciado e um EEG no 13° dia de vida estava essencialmente normal. A avaliação genética não evidenciou nenhuma patologia específica. Relato de casos Introduzido o uso de baclofen 0,35 mg/kg/dia de 6/6 horas VO no 24° dia de vida. Neste momento criança apresentava MAS 3 no membro superior esquerdo e MAS 4 nos demais membros.A dose foi aumentada para 0,5 mg/kg/sem até uma dose final de 1mg/kg/dia. Depois da introdução do baclofen o neonato passou a tolerar adequadamente atividades da terapia ocupacional . Relato de casos MAS diminuiu para 2 em todas as extremidades dentro de duas semanas após início do uso do baclofen e a criança foi então transferida para um Centro de Reabilitação Hospitalar no 47° dia de vida. Nova avaliação realizada quando a criança apresentava 4 meses revelou um MAS de 1 nos quatro membros e tronco, com a alimentação sendo feita exclusivamente por gavagem. Criança não apresentava convulsões neste momento. DISCUSSÃO Discussão O uso do baclofen no período neonatal não está bem documentado. Uma dose inicial de 0,5 mg/kg/dia VO é recomendada. A via enteral é a selecionada pela facilidade de administração. A administração intratecal tem sido associada à colapso cardiovascular, depressão do SNC e distúrbios respiratórios sendo raramente utilizada em crianças. A dose é adaptada de acordo com a resposta clínica ou uma diminuição no MAS. Discussão Com o início da terapia com o baclofen ambas as crianças apresentaram melhora na regulação do tônus e uma diminuição no MAS. Paciente nº1 apresentou uma redução do MAS de 4 para 2 e de 4 para 1 nas extremidades superiores e inferiores respectivamente , com uma dose final de baclofen de 1,5 mg/kg/dia. Paciente nº2 apresentou diminuição de 4 para 1 em todos os membros,exceto em membro superior esquerdo,onde a redução foi de 3 para 1.A dose final de baclofen foi de 1mg/kg/dia. Discussão Nenhum efeito colateral da droga foi evidenciado em ambos os pacientes. Ambas as crianças apresentaram melhora na movimentação, diminuição da dor e maior tolerância aos cuidados rotineiros. Nenhum dos pacientes apresentou efeitos como sonolência, intolerância alimentar, vômitos e constipação. Discussão Existem alguns relatos do efeito do baclofen no aumento da atividade convulsiva. Contudo, nenhum dos pacientes tiveram aumento da freqüência de convulsões com o uso de baclofen. O presente estudo mostrou segurança e sucesso no uso do baclofen em dois neonatos com hipertonia. Mais estudos devem ser feitos para comprovar os benefícios e a segurança do uso do baclofen. BIBLIOGRAFIA Bibliografia Young RR & Delwaide PJ. Drug therapy: spasticity (second of two parts). N Engl J Med 1981; 304: 96−99. | PubMed | Sweetman S. editor. Martindale: The Complete Drug Reference. London: Pharmaceutical Press Electronic version, MICROMEDEX, Greenwood Village, CO (Edition expires 3/2004). Bohannon RW & Smith MB. Interrater reliability of a modified Ashworth scale of muscle spasticity. Phys Ther 1987; 67: 206−207. | PubMed | Fosang AL, Galea MP & McCoy AT. Measurement of muscle and joint performance in the lower limb of children with cerebral palsy. Dev Med Child Neurol 2003; 45: 664−670. | Article | PubMed | Bibliografia Sanger TD, Delgado MR & Gaebler-Spira D. Classification and definition of disorders causing hypertonia in childhood. Pediatrics 2003; 111: 89−97. | Article | Terrance CF, Fromm GH & Roussau MS. Baclofen: its effects on seizure frequency. 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