A cafeicultura faz a lição de casa Maurício Miarelli* Nos últimos anos, os cafeicultores – assim como grande parte do agronegócio – têm investido no aumento da produtividade, o que proporcionou ao País ampliar a produção e exportação mundial, gerando divisas. Em 1987, o Brasil colheu sua maior safra até então – 42 milhões de sacas (60 quilos). A área plantada era de 3,4 milhões de hectares. Hoje temos praticamente a mesma produção em 2,3 milhões de hectares. Isto representa um aumento de produtividade de 48% em 19 anos. Estima-se que 8,4 milhões de brasileiros dependem do café de alguma forma, em 1,9 mil municípios. O produto é motor da economia em mais de 50% das cidades mineiras e em todos os municípios do Espírito Santo. Hoje, o setor tem exportações líquidas superiores a US$ 2,5 bilhões e projeta a imagem do Brasil no mundo. Agora, mais uma vez, o café faz a lição de casa. Além de, nos últimos anos, investir para ser mais competitivo, o setor planeja seu futuro. As principais instituições ligadas ao agronegócio do café – Conselho Nacional do Café (CNC), Associação Brasileira da Indústria do Café (Abic), Associação Brasileira da Indústria de Café Solúvel (Abics), Conselho dos Exportadores do Café (Cecafé) e a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) – se uniram para pensar o produto nos próximos anos. O Plano Estratégico para o Desenvolvimento da Economia Cafeeira (Pedec) é fruto desse esforço. As estimativas de mercado apontam aumento de consumo interno de 3% ao ano e externo de 1,5% ao ano. Considerando essas premissas, o Brasil teria que, na próxima década, produzir, em média, 53 milhões de sacas de café por ano para atender à demanda interna e manter os atuais patamares de 30% do comércio mundial. Quanto à produção, somente a Ásia pode vir a ser uma ameaça, já que não há condições agronômicas na América Latina; e políticas e econômicas na África para uma ampliação. O Brasil está, portanto, em uma posição favorável e as estimativas indicam um quadro mundial de oferta e demanda ajustado. Para seguir nessa liderança, o País não precisa aumentar significativamente a área cultivada, basta conseguir ganhos na produtividade, que está diretamente ligada à renda. Com o objetivo de proporcionar maior renda ao setor, é que o Pedec considera importante questões como a necessidade de ordenamento da safra, uma vez que a oscilação entre um ano e outro, devido ao ciclo bianual, chega a 10 milhões de sacas. O fluxo do café tem que ser regulado através de financiamentos para a estocagem e contratos de opção de venda públicos. Outra mudança importante que impactaria na renda é a inclusão do produto nacional na Bolsa de Nova York. O café é o único segmento do agronegócio que tem um conselho e um fundo próprios. E, por estar à frente do restante do agronegócio em termos de estrutura organizacional, é que toma a dianteira e propõe em seu plano estratégico a reformulação destas duas instâncias. A idéia do Pedec é que o Conselho Deliberativo da Política do Café (CDPC) seja o gestor, de fato, do Fundo de Defesa da Economia Cafeeira (Funcafé), que funcionaria nos moldes do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) ou dos fundos constitucionais, com mais autonomia. Desta forma, o setor teria mais independência para propor e implantar as suas políticas. Apesar das expectativas promissoras, o plano não deixa de abordar um problema: o endividamento, provocado por períodos de renda insuficiente. Esta questão tende a se agravar, já que novas crises acontecem e mais dívidas se acumulam. Neste sentido, o Pedec coloca o endividamento, a discussão das formas de financiamento, inclusive a redução dos juros, e a necessidade de se criar um seguro de produção, como bandeiras. Sem dúvida, o café tem feito a lição de casa tanto no aspecto de produção, produtividade e qualidade, quanto na busca de um arcabouço institucional mais adequado e compatível com as exigências atuais do mercado. * presidente do Conselho Nacional do Café (CNC) e da Cooperativa de Cafeicultores e Agropecuaristas (Cocapec)