A influência dos fatores sociais na regência do verbo ir

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A influência dos fatores sociais na regência do
verbo ir
The influence of social factors in conducting the
word go
Maria José Blaskovski Vieira
RESUMO
Neste trabalho, são apresentados resultados de análise quantitativa, envolvendo
amostras de fala retiradas do Banco de Dados VARX/Pelotas-RS. Submetidos os
dados à análise computacional, foram selecionadas as variáveis idade, grau de
definitude e ocupação como variáveis que condicionam a escolha da preposição
no complemento locativo do verbo ir. Quanto aos fatores sociais selecionados –
idade e ocupação -, os resultados obtidos apontam que os indivíduos com mais
de 50 anos preservam mais a preposição a/para do que os mais jovens e que os
indivíduos que desempenham atividade técnica e intelectual preservam mais a
preposição a/para do que os indivíduos que exercem atividade manual.
PALAVRAS-CHAVE
Verbos de movimento; variação; regência verbal.
ABSTRACT
In this paper, we present results of quantitative analysis involving speech
samples taken from the Database VARX/Pelotas-RS. Submitted data to the
computational analysis, it were selected the variables age, degree of definitness
and occupation as variables that influence the choice of the locative preposition in the complement of the verb go. In relation of social factors - age and
occupation - the results indicate that people with more than 50 years tend to
preserve the preposition a/para more than younger people and that people who
perform technical and intellectual activity tend to preserve the preposition a/
para more than the people who perform manual activity.
KEY WORDS
Verbs of movement; variation; verbal regency.
A influência dos fatores sociais na regência do verbo ir
1 INTRODUÇÃO
Estudos variacionistas sobre a regência do verbo ir têm mostrado
que, além de condicionantes lingüísticos, fatores sociais tais como a
idade, escolaridade e o sexo são importantes na análise da preposição
escolhida pelo falante. Entre esses fatores, dois merecem uma análise
mais cuidadosa – a idade e a escolaridade. O primeiro, ao ser selecionado nas análises computacionais, parece apontar para uma possível
mudança na regência dos verbos de movimento. Já o segundo revela
o papel desempenhado pela escola no sentido de preservar formas e
estruturas linguísticas consideradas de prestígio. No entanto, para que
se possam extrair conclusões confiáveis do papel efetivo desses fatores
sociais, é necessário ter clara a interação entre eles.
Neste artigo, são apresentados resultados de análise quantitativa por
meio da qual identificam-se os fatores lingüísticos e extralinguísticos
condicionadores da preposição que acompanha o verbo ir, objetivandose, mais especificamente, verificar a interação entre os fatores sociais
idade e ocupação, controlados na pesquisa aqui descrita.
2 Verbo ir – Pesquisas sociolinguísticas
De acordo com a tradição gramatical, o verbo ir deve ser empregado
com a preposição a ou para (consideradas padrão), uma vez que essas
preposições carregam sentido de direção, sendo que a escolha de uma
ou outra implica uma diferença sutil de sentido. No entanto, na língua
falada, além dessas preposições, também é comum o uso de em (considerada não-padrão) acompanhando esses verbos.
Há autores que interpretam essa alternância como uma variação1
linguística, condicionada por fatores linguísticos e extralinguísticos.
Mollica, (1996), por exemplo, realizou estudo em que analisa amostras
de fala de 64 informantes da Amostra Censo/UFRJ, buscando identificar
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Com base nos pressupostos da Teoria Gerativa, Farias (2006, p.216)
afirma que a alternância
no uso das preposições
a, para e em com verbos de movimento não
pode ser tratada como
um caso de variação
linguística nos moldes
labovianos, isso porque
a mudança de uma preposição por outra não
representa simplesmente
formas diferentes de se
dizer a mesma coisa, mas
constitui uma variação
léxico-sintática.
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Maria José Blaskovski Vieira
fatores que condicionam a escolha de uma ou outra dessas preposições
empregadas com o verbo ir.
O estudo de Mollica mostra que o tipo de locativo (se ele tem como
referente um lugar fechado ou aberto) e o grau de definitude desse locativo
(se o referente é conhecido ou facilmente identificável pelo falante ou
ouvinte e se é acompanhado ou não de um determinante) influenciam
a escolha da preposição. Locativos que se referem a um espaço fechado
tendem a selecionar a preposição em; enquanto locativos que se referem a
um lugar aberto tendem a selecionar a preposição a/para. Em relação ao
grau de definitude do locativo, o estudo mostrou que referente conhecido
e acompanhado de determinante favorece a escolha da preposição em.
Quanto aos fatores sociais, a pesquisa revela que a escolarização tem um
papel importante na definição da escolha da preposição que acompanha o
verbo ir: quanto maior a escolaridade maior a tendência de uso da forma
padrão a/para em detrimento da preposição em.
Vallo (2005), a partir da análise de amostras de fala do corpus VALPB,
verifica que o percentual de uso da preposição em entre os falantes de João
Pessoa é menor que o percentual de uso dessa preposição na fala carioca.
O estudo revela ainda que, a exemplo dos resultados encontrados por
Mollica, locativos que têm referente conhecido e são acompanhados de
determinante tendem a ser introduzidos pela preposição em. No entanto,
diferentemente da de Mollica, a pesquisa de Vallo indica que locativo que
tem como referente um lugar [+fechado] favorece o uso da preposição a/
para. Em relação aos fatores sociais, o trabalho de Vallo também constata
o papel da escolarização na escolha da preposição: falantes com mais de
11 anos de escolaridade tendem a preferir a preposição a/para, enquanto
aqueles com menor escolaridade tendem a escolher a preposição em.
Ribeiro (2008), testando os mesmos fatores que Mollica (1996), analisa amostras de fala retiradas do corpus do Projeto NURC da cidade do Rio
de Janeiro. Os resultados obtidos confirmam as tendências encontradas
por Mollica quanto aos fatores lingüísticos: locativo com características
semânticas [-aberto, +definido, +determinante] favorece a presença
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da preposição em; locativo com características semânticas [+aberto,
-definido, -determinante] favorece a presença da preposição a-para.
Em relação às variáveis sociais, os resultados obtidos por Ribeiro
apontam que homens mais jovens preferem a preposição em, enquanto
os mais velhos a preposição apara. Já as mulheres de faixas etárias
extremas preferem a preposição em, enquanto as de faixa etária intermediária, a preposição apara. Para o autor, esses resultados indicam que o
comportamento conservador das mulheres pode ser conseqüência de sua
maior sensibilidade às pressões exercidas pelo mercado de trabalho.
Wiedemer (2008), diferentemente dos trabalhos anteriores, analisa
separadamente as preposições a/para/em no complemento locativo do
verbo ir, buscando verificar os fatores que determinam a escolha da
preposição que irá se manifestar junto ao locativo. Para tanto, seleciona
uma amostra de 72 entrevistas de falantes de Santa Catarina, retiradas
do Banco de Dados VARSUL e verifica que as variáveis demarcação do
espaço (fator [+fechado] condiciona o uso de em e o fator [-fechado]
favorece para) e destino (fator [+direção] condiciona fortemente a
escolha de a e o fator [-direção], a de para) têm papel relevante na
escolha da preposição. Em relação aos fatores sociais, a localização, a
idade e a escolaridade desempenham papel importante. Em Blumenau,
os mais velhos privilegiam a e os mais jovens para; os mais escolarizados
favorecem a em Florianópolis e, em Chapecó, os menos escolarizados
tendem ao uso de em nessa última cidade.
Vieira (2009) realiza análise de 39 entrevistas das cidades de Porto
Alegre, Florianópolis e Curitiba, retiradas do Banco de Dados VARSUL,
buscando identificar fatores que condicionam a variação na regência
dos verbos ir, vir, chegar e levar, num primeiro momento, e os fatores
que condicionam a regência do verbo ir, num segundo momento. Resultados gerais para os verbos de movimento apontam o tipo de verbo,
o traço [permanência], a configuração do espaço, o grau de definitude
e a variável geográfica como condicionadores da preservação da preposição a/para. Dentre os verbos analisados, levar e vir apresentam
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valores altos de uso da preposição a/para, enquanto chegar apresenta
valores significativos de uso de em. O verbo ir, diferentemente dos outros
verbos, apresenta variação considerável. Os resultados apontam que
a indeterminação do locativo e o fato de ter como referente um local
aberto favorecem a emergência da preposição a/para, já a determinação
e definição do locativo e o fato de ter como referente um local fechado
condicionam o uso de preposição em. Em relação aos fatores sociais,
o único que se mostrou relevante foi a variável geográfica que indicou
Porto Alegre como a cidade, cujos falantes têm um comportamento
mais inovador, preferindo a preposição em, e Curitiba como a cidade,
cujos falantes têm uma atitude mais conservadora.
3 Aspectos metodológicos
Para realização deste estudo, a partir das variáveis sociais sexo, idade
e ocupação, foram selecionadas, do Banco de Dados VARX, que contém
amostras de fala da cidade de Pelotas/RS, 58 entrevistas que foram
submetidas à análise estatística, utilizando-se o programa Goldvarb
para ambiente Windows.
Considera-se como variável dependente o uso da preposição em
no complemento locativo do verbo ir. As variáveis independentes,
controladas nesta pesquisa, dividem-se em variáveis lingüísticas e
extralingüísticas. São variáveis lingüísticas a configuração do espaço,
o grau de definitude e de determinação do locativo, o traço semântico
[±permanência], a existência de elemento interveniente entre o verbo e a
preposição e variáveis extralingüísticas o sexo, a idade e a ocupação.
De acordo com o que Mollica chamou configuração de espaço, referindo-se ao nome que ocupa posição de núcleo no SPres ligado ao verbo,
foram controlados os traços semânticos do locativo [±aberto]. O locativo
que possui o traço [-aberto] tem como característica o fato de ser um
lugar cercado, com uma entrada definida, com ou sem cobertura. Aquele
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que possui o traço [+aberto] caracteriza-se por não apresentar essas
características ou por se referir a um lugar indefinido ou abstrato.
Por meio da variável grau de definitude e de determinação do locativo, controlaram-se dois tipos de informações, o fato de os locativos
terem referentes conhecidos ou facilmente identificáveis por parte do
falante/ouvinte e o fato de serem precedidos por artigo definido ou
pronome possessivo ou demonstrativo. Essas informações desdobraram-se em dois traços: [± definido] e [±determinante]. Assim, se o
locativo tivesse como referente um nome conhecido do falante/ouvinte
e fosse precedido de artigo definido, receberia os traços [+definido,
+determinante]; se fosse precedido de artigo indefinido ou pronome
indefinido e fosse desconhecido de um dos interlocutores, receberia os
traços [-definido, +determinante]; se os nomes não fossem precedidos
de um determinante e o referente fosse conhecido, receberia os traços
[+definido, -determinante]; e se os nomes não fossem precedidos de
determinantes e os referentes fossem vagos, desconhecidos do falante/
ouvinte, receberiam os traços [-definido, -determinante].
Por meio da variável [±permanência] controlou-se, através da análise
do contexto linguístico, a presença/ausência da idéia de permanência no
local de destino. Quando não havia, no contexto, indicações claras da
idéia de permanência, o fator utilizado deveria ser [-permanência].
A quarta variável lingüística controlada teve como motivação a suposição
de que a existência ou não de elemento interveniente entre o verbo e a
preposição poderia condicionar a escolha dessa preposição. Assim partiu-se
da hipótese de que a ausência de elemento interveniente favoreceria o uso
da preposição a/para, enquanto a presença de elementos intervenientes
(um, dois, três ou mais), favoreceria o uso da preposição em.
Entre as variáveis sociais, foram controlados nessa pesquisa o sexo, a
idade (de acordo com a estratificação feita no VARX, foram consideradas três
faixas etárias 16 a 25, 26 a 49 e mais de 50 anos) e a ocupação (de acordo
com a estratificação feita no VARX, foram consideradas as ocupações que
envolviam atividades de natureza manual, técnica e intelectual).
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4 Apresentação e discussão dos resultados
Das oito variáveis controladas, foram selecionadas pelo programa
computacional uma variável linguística e duas extralinguísticas, com uma
frequência geral de aplicação de 28%. Para se chegar a esses resultados
foram realizadas várias rodadas, sendo feitas algumas amalgamações
naqueles fatores cujos resultados apresentavam valores muito próximos
entre os subfatores. Após as amalgamações, foram considerados relevantes
para a emergência da variante com a preposição “em” o grau de definitude
e de determinação do locativo, a ocupação e a idade. Os resultados que
passam a ser apresentados referem-se à variável grau de definitude e de
determinação do locativo, a primeira a ser selecionada pelo programa.
Tabela 1 – Grau de defin. e determ. do locativo – valor de aplicação:
prep. em
Aplic/total
%
Peso relativo
[±def./+det.]
107/221
48
0.67
[±def./-det.]
36/222
16
0.33
Total
143/443
32
Significância: 0.008
Input: 0.282
Observa-se na tabela acima que o fato de o locativo referir-se a um
lugar determinado - seja essa determinação feita por um artigo seja
por um pronome - contribui para a emergência da variante em. É o
que indica o peso relativo 0,67. Opostamente, o que menos favorece a
emergência da preposição em é a indeterminação do locativo, isto é, o
fato de o locativo não ser acompanhado de artigo ou pronome. É o que
se verifica a partir do peso relativo 0,33.
Originalmente, por meio desse fator analisava-se não somente a presença ou não de um determinante, mas também o fato de o locativo ter
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como referente um lugar que podia fazer parte ou não do universo de
conhecimento do falante. Tendo em vista, no entanto, que por meio dessa
categorização havia resultados estatísticos muito próximos, decidiu-se pela
amalgamação da qual resultaram os valores apresentados na Tabela 1.
Tais resultados assemelham-se àqueles encontrados por Mollica
(1996), Vallo (2005) e Ribeiro (2008) e apontam para o fato de que a
maior ou menor integração entre preposição e locativo é dependente
de características semânticas do locativo. Do ponto de vista semântico, é possível perceber partilhamento de sentido entre a preposição
em e locativos que apresentarem os traços semânticos de definitude
e de determinação. Nesse sentido, conforme Borba (1971), quando o
falante usa a preposição em com os verbos de movimento, ele não está
interessado em representar a direção do movimento em si, mas apenas
a sua inclusão no ponto de chegada, como em ir no restaurante, voltar
no banco e esse ponto de chegada há de ser conhecido e determinado.
Além disso, um locativo determinado e conhecido, introduzido pela
preposição em, reforça a idéia de “lugar onde” além do “movimento”
dado pelo verbo ir (Mollica, 1996, pág. 158).
A segunda variável selecionada pelo programa foi a variável ocupação,
cujos resultados são apresentados na Tabela 2 a seguir.
Tabela 2 – Ocupação – valor de aplicação: preposição em
Aplic/total
%
Peso relativo
Manual
66/148
45
0.65
Técnica
Intelectual
Total
47/135
30/160
143/443
35
19
32
0.49
0.37
Significância: 0.008
Input: 0.282
Observa-se na tabela acima que indivíduos que exercem uma atividade de natureza manual tendem a preferir a preposição em, conforme
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depreende-se do peso relativo 0,65. Já os indivíduos que desempenham
atividades de natureza intelectual tendem a usar mais a preposição a/
para. É o que indica o peso relativo 0,37. Em relação aos indivíduos
que desempenham uma função de natureza técnica, o peso relativo
0.49 indica que eles não têm qualquer papel na definição da preposição
que irá se manifestar com o verbo “ir”. Considerando-se que, em geral,
atividades de natureza manual demandam menor escolaridade e que
atividades de natureza intelectual exigem um grau maior de escolaridade, os resultados permitem concluir que quanto mais escolarizado
for o falante, maior a possibilidade de ele utilizar a regência padrão
do verbo ir.
O terceiro fator selecionado pelo programa foi a variável idade, indicando que falantes mais jovens tendem a usar mais a variante em,
não-padrão, do que os mais velhos, que preferem a variante a/para. É
o se pode ver na Tabela 2 a seguir.
Tabela 3 – Idade – valor de aplicação: preposição em
Aplic/total
%
Peso
relativo
16 a 25
anos
75/184
41
0.59
26 a 49
anos
39/97
40
0.54
+ 50 anos
29/162
18
0,37
Total
143/443
Significância: 0.008
32
Input: 0.282
Conforme se pode observar nos resultados apresentados na tabela
acima, o peso relativo 0,59 indica que os falantes mais jovens usam mais
a preposição em do que os mais velhos (0,37). Em termos absolutos,
a preferência dos falantes mais velhos pela preposição a/para é mais
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clara: em 162 contextos com o verbo ir acompanhado de locativo, houve
apenas 29 em que esse locativo foi introduzido pela preposição em.
Em pesquisas anteriores (MOLLICA, 1996 e RIBEIRO, 2008), a variável idade se mostrou relevante, estando, em geral, associada ao sexo.
Em Wiedemer (2008), a idade também tem influência na escolha da
preposição a ou para, analisadas separadamente, mas não na escolha de
em: quanto maior a idade menor o uso da preposição a e, ao contrário,
quanto menor a idade maior o uso da preposição para.
Independentemente da estratificação feita nessas pesquisas, o que se
verifica é que há uma tendência de os falantes de mais idade preferirem a
forma padrão a/para em detrimento da forma não-padrão em. Já entre os
falantes mais jovens a preposição mais utilizada é a não-padrão. Poderiam
esses resultados estar apontando para uma mudança em progresso?
Labov (1994) parte da ideia de que é possível captar mudanças em
progresso através da análise distribucional-quantitativa de variáveis
em diferentes faixas etárias. Isso representa o que se convencionou
chamar análise em tempo aparente. Através desse método, é possível
comparar, em uma comunidade concreta, a fala de pessoas mais velhas
com a de pessoas mais jovens. A partir dos dados coletados, qualquer
diferença entre essas falas poderia ser interpretada como resultado de
uma mudança em curso.
A partir, então, dos resultados obtidos no estudo da regência do verbo
ir na fala de Pelotas, poder-se-ia supor a existência de um processo de
mudança. No entanto, o próprio Labov sustenta que a distribuição de
variantes por faixas etárias pode não representar mudança lingüística na
comunidade, mas um padrão característico de uma determinada faixa
etária. De acordo com o autor, somente a observação em tempo real
poderia confirmar a ocorrência de uma mudança em progresso.
De acordo com Guy e Zilles (2007, p. 221), “fatores como sexo, idade
e classe social, muitas vezes, não se comportam independentemente uns
dos outros”. Dessa forma, decidiu-se verificar o cruzamento das variáveis
idade e ocupação, cujo resultado é apresentado na Tabela 4 abaixo.
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Tabela 4 – Idade x Ocupação – valor de aplicação: preposição em
Manual
Aplic/
total
Técnico
%
Aplic/
total
Intelectual
%
Aplic/
total
%
16 a 25
anos
26 a 49
anos
+ 50 anos
29/47
7/15
9/31
29
23/51
34/75
12/62
19
14/50
4/29
11/83
13
Total
66/148
45/119
32/176
19
Conforme se pode ver na tabela acima, há uma estreita relação
entre idade e ocupação. Apesar de indivíduos mais jovens usarem
mais a preposição em do que os mais velhos, o que se percebe é que
esse uso diminui em função da ocupação exercida pelo indivíduo.
Indivíduos da faixa etária mais jovem que exercem uma função
manual usam mais a preposição em (62%) do que indivíduos dessa
mesma faixa etária que exercem uma função intelectual (29%). Da
mesma forma, em indivíduos da faixa etária mais velha, a natureza
da atividade também determina o maior ou menor uso da preposição
em: os que exercem ocupação manual usam mais a preposição em
(28%) do que os de ocupação intelectual (13%). Comparando-se o
uso da preposição em por ocupação, verifica-se uma significativa
diferença entre os mais jovens e os mais velhos que desempenham
uma função de natureza manual: os mais jovens usam a preposição
não-padrão em 62% dos contextos com o verbo acompanhado de
locativo, já os mais velhos usam a preposição não-padrão em 28%
dos contextos. A diferença, no entanto, é bem menor entre os indivíduos que exercem uma função de natureza intelectual: os mais
jovens usam a preposição não-padrão em 19% dos contextos e os
mais velhos em 13% dos contextos.
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5 Considerações finais
A partir do estudo realizado é possível tecer algumas considerações
a respeito da regência do verbo ir. Em primeiro lugar, a exemplo do que
já haviam concluído Mollica, Vallo, Ribeiro e Vieira, pode-se dizer que
o deslocamento da articulação verbo-preposição para verbo-locativo
que vem ocorrendo no português brasileiro não representa uma variação livre, mas motivada por razões semânticas e, possivelmente,
por razões pragmáticas. Portanto, há condicionamentos lingüísticos e
extralingüísticos atuando na seleção da preposição que rege os verbos
de movimento. Em segundo lugar, a escolha de uma ou outra preposição está relacionada tanto a traços semânticos do locativo e do verbo
quanto da preposição.
Especificamente em relação aos resultados encontrados, foi possível
verificar que se mostraram relevantes na definição da preposição no
complemento locativo do verbo ir a s variáveis grau de definitude e de
determinação do locativo, a idade e a ocupação exercida pelo falante.
Em relação ao primeiro fator, verificou-se que o fato de o locativo ser
acompanhado de um determinante contribui para a emergência da
variante em. Em sentido contrário, o que menos favorece a emergência
da preposição em é a indeterminação do locativo, ou seja, o fato de não
vir acompanhado de artigo ou pronome.
Em relação às variáveis sociais, verificou-se que indivíduos mais
jovens e que exercem uma atividade de natureza manual usam mais
a preposição em do que indivíduos mais velhos que também têm
esse tipo de atividade. O uso da preposição em, no entanto, diminui
significativamente entre os indivíduos que exercem uma atividade de
natureza intelectual, sejam eles jovens ou de mais idade. Isso significa
que é necessário levar em conta a interação entre esses dois fatores na
análise dos resultados.
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Maria José Blaskovski Vieira
REFERÊNCIAS
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Alegre, v. 41, n. 1, p. 213-234, 2006.
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MOLLICA, M. C. A regência verbal do verbo ir em movimento. In : SILVA, G. M. O. (Org.) & SCHERE, M. M. (Org.). Padrões sociolingüísticos.
Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, UFRJ, 1996. p. 85-119.
RIBEIRO, Antonio J.C. Variação e funcionalidade no uso de preposições
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VALLO, M. A. G. do. A regência do verbo ir de movimento na perspectiva
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VIEIRA, M.J.B. Variação das preposições em verbos de movimento. In:
Signum: Estudos da linguagem, v. 12, n.1, Londrina, 2009.
Maria José Blaskovski Vieira
Doutorado em Linguística e Letras pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Professor adjunto na Faculdade de Letras da
Universidade Federal de Pelotas, RS.
E-mail: [email protected]
Recebido em 30/09/2010
Aceito em 30/11/2010
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A influência dos fatores sociais na regência do verbo ir
Vieira, Maria José Blaskovski. A influência dos fatores sociais na
regência do verbo ir. Nonada Letras em Revista. Porto Alegre, ano
13, n. 15, p. 145-158, 2010.
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