Mudanças climáticas e Relações Internacionais.

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Mudanças climáticas e Relações Internacionais.
Leandro Belini
Resumo:
Este artigo baseia-se no aprofundamento das análises dos documentos que resultam das
Conferências Internacionais1 - referente às mudanças climáticas2 - causada principalmente pelo
acumulo de gás carbônico (CO2) na atmosfera, resultado do processo de industrialização que nos
dias atuais alcançou níveis alarmantes de produção de poluentes. Focarei esta discussão no
Protocolo de Kyoto que, ao instituir o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) propõe uma
cooperação entre os países desenvolvidos e os países em desenvolvimento na efetivação de projetos
de redução/captação das emissões de gases de efeito estufa. Diante desses acordos, este texto
pretende analisar se o MDL será um mecanismo efetivo visando mitigar o efeito estufa ou apenas
um instrumento de interesse dos países industrializados para legitimar suas emissões. O propósito
desta discussão é ampliar a compreensão sobre os acordos referentes as mudanças climáticas frente
as discussões geopolíticas.
Introdução:
O processo de industrialização iniciado com a Revolução Industrial no final do
século XIX intensifica-se a partir da segunda metade do século XX. Este, por sua vez,
pauta-se pela combinação entre ciências, tecnologias avançadas e grandes investimentos
econômicos. Tanto o mercado quanto o padrão de consumo, na sua forma atual, são
resultados consistentes do desenvolvimento do sistema capitalista, que, por sua vez, baseiase na busca pela maximização do consumo e da produção (Kurz, 1992. No entanto, pela
primeira vez a sociedade industrial deparou-se com condições completamente novas: a ação
antrópica no meio ambiente está alterando o clima da terra.
O efeito estufa é um fenômeno natural causado pela presença de gases na
atmosfera, sendo o gás mais conhecido o dióxido de carbono (CO2) os quais formam uma
barreira natural que impede a fuga das emissões de radiação da superfície terrestre. Ou seja,
agem como se fossem uma estufa, mantendo a temperatura média da terra em 16ºC,
aproximadamente.
O problema surge em decorrência de um aumento da concentração desses gases
na atmosfera, resultado de um aumento da ação antrópica no planeta. A atual fonte de
geração de energia adotada pelo sistema capitalista está baseada em fontes fósseis, como o
1
Realizadas no Rio de Janeiro (1992), Berlim (1995), Genebra (1996), Kyoto (1997), Buenos Aires (1998),
Bonn (1999), Haia (2000), Bonn (2001), Marrakesh (2001), Joanesburgo (2002), Nova Deli (2002)
2
Mudança do clima: mudança que possa ser direta ou indiretamente atribuída à atividade humana que altere a
composição da atmosfera mundial e que se some àquela provocada pela variabilidade climática natural
observada ao longo de períodos comparáveis.
1
carvão e o petróleo, que estão alterando o equilíbrio natural do clima da terra,
intensificando o fenômeno. O CO2 é um dos principais gases de aquecimento antrópico,
podendo ser emitido através dos atuais processos de industrialização, geração de energia,
queimadas, desmatamento, etc. Sua concentração na atmosfera é a cada ano maior, o que
nos leva a salientar que os gases de efeito estufa3 permanecem por mais de um século na
atmosfera, intensificando ainda mais o aquecimento do planeta. Tal processo de emissão de
gases de efeito estufa requer que os governantes mundiais adotem medidas que venham a
beneficiar o clima da terra. Para tanto, faz-se necessário a introdução de novas pesquisas
objetivando a ampliação das fontes de geração de energias renováveis, dentre elas, a eólica,
a solar, das marés, etc.
Nesse sentido, o problema do efeito estufa e das mudanças climáticas, na
condição de um problema global, assume um papel importante nessa pesquisa, à medida
que será necessário analisar se as mudanças propostas pelo Protocolo de Kyoto, visando a
redução/captação das emissões de gases de efeito estufa, serão compatíveis ao atual padrão
de consumo mundial. A magnitude dessa questão e de todos os seus reflexos econômicos,
políticos, sociais e ambientais é um dos maiores desafios já enfrentados pela geopolítica
internacional. No entanto, sua solução efetiva exige um grande esforço no sentido de uma
mudança paradigmática na relação homem/meio ambiente.
Portanto, as discussões em torno da problemática ambiental no final do século
XX e início do século XXI, resultam do modelo adotado de crescimento, da atividade
industrial e do consumismo desenfreado em nível local e mundial. Estas, por sua vez, visam
restabelecer acordos entre os países desenvolvidos e os em desenvolvimento, o que
caracteriza o surgimento de um cenário de mudanças na geopolítica internacional. Nesse
sentido, deve-se levar em consideração que os desafios presentes nas Conferências
assumiram um caráter ético-político, situado além das fronteiras dos Estados/Nações, uma
vez que as mudanças do clima resultam da ação antrópica global e, necessariamente, exige
soluções globais. Assim, a redução das emissões de gases de efeito estufa e a mitigação do
3
São considerados gases importantes no processo de aquecimento do planeta, segundo o Protocolo de Kyoto:
Dióxido de Carbono (CO2); Metano (CH4); Óxido Nitroso (N2O); e as famílias dos perfluorcarbono
(composto completamente fluorado), em especial Hidrofluorcarbonos (HFCs); Perfluoretano (C6F6);
Hexafluoreta de Enxofre (SF6).
2
seu impacto no planeta, constitui-se como um dos maiores desafios da relação do homem
com o meio ambiente.
Ao aproximar-me do tema proposto - negociações políticas mundiais sobre a
problemática do aquecimento global do clima e as mudanças climáticas - deparei-me com a
atual política econômica mundial. Ou seja, com o fato de que tal política tenha culminado
em longas negociações entre os grandes líderes mundiais que travam constantes batalhas
por soberania, vislumbrando a imposição de um modelo de desenvolvimento econômico
que só aumentará a desigualdade social e a degradação ambiental. Nesse sentido, existe um
limite para o atual modelo de desenvolvimento econômico? Ou ainda, o uso predatório dos
recursos naturais pode impor limites a esse desenvolvimento econômico?
Assim, as discussões que se colocam no cenário político internacional sobre a
redução das emissões de gases de efeito estufa e a mitigação das mudanças climáticas
globais envolve, no debate atual, a expansão de um modelo econômico voltado para a
maximização da economia e o aumento da produção, sem qualquer compromisso com a
sustentabilidade ambiental. Essa lógica adotada pelo atual modelo econômico é
caracterizado, na análise de Lester Brown, como sendo “[...] da própria natureza dos
sistemas econômicos industriais degradar o meio ambiente do qual eles dependem”
(Brown, 2002).
Isto posto, é possível questionar, frente a essa problemática, os acordos
estabelecidos entre os mais de 150 países que fazem parte da Convenção sobre Mudanças
Climáticas (CMC)4, visando à redução das emissões de gases de efeito estufa. Ou seja: os
impasses econômicos e políticos entre os principais grupos de países com metas de redução
irão impedir a ratificação de acordos de mitigação do clima global? À medida que a
economia política determina em grande parte os tipos de relação social ou decisão
ecológica, política, etc, como buscar soluções para as mudanças do clima global? Ou ainda,
é possível estabelecer uma governança global visando minimizar as ações antópicas no
clima do planeta?
4
(UNFCCC) ou (FCCC) Convenção - Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima - United Nations
Framework Convention on Climate Change - Acordo multilateral voluntário constituído durante a
Conferência para o Meio Ambiente e Desenvolvimento, no Rio de Janeiro, em 1992, com vistas à redução de
emissões de gases de efeito estufa a níveis de 1990, meta a ser atingida até o ano 2012.
3
Dessa forma, repensar uma sociedade capitalista industrial diante dos impactos
ambientais mundiais é um dos exercícios que precisa ser analisado à luz das Ciências
Sociais, partindo de uma perspectiva da geopolítica, visando a compreensão das discussões
sobre a problemática do aquecimento global do planeta.
II - Mudanças climáticas e geopolíticas internacionais
Com a intensificação das relações políticas e econômicas emergentes das três
ultimas décadas do século XX, a questão ambiental perde o seu caráter antes restrito aos
limites fronteiriços e ganha uma conotação completamente nova: um caráter geopolítico. A
Conferência de Estocolmo, realizada em 1972, é um marco na reorganização política em
busca de tratados na ordem geopolítica ambiental. Com a Conferência do Rio de Janeiro,
em 1992, houve a multiplicação de instrumentos jurídicos internacionais na busca de
encontrar soluções cooperativas para os problemas ambientais globais. Estas, por sua vez,
culminaram em regimes ambientais internacionais como o das mudanças climáticas,
proteção da biodiversidade, da desertificação e das substâncias que destroem a camada de
ozônio.
Em 1988, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e a
Organização Meteorológica Mundial (World Meteorological Organization) criaram um
comitê
científico,
Painel
Intergovernamental
sobre
Mudanças
Climáticas
(Intergovernamental Panel on Climate Change – IPCC5), encarregado de elaborar um
tratado mundial para atenuar os impactos das Mudanças Climáticas. No final de 1990,
diante dessas circunstâncias, a Assembléia Geral das Nações Unidas estabeleceu o Comitê
Intergovernamental de Negociações para a Convenção Quadro sobre Mudanças do Clima
(CIN/CQMC), a qual ficou responsável pela redação da Convenção. Representantes de
mais de 150 países encontraram-se durante cinco reuniões celebradas entre fevereiro de
1991 a maio de 1992; em 9 de maio de 1992 foi firmada a Convenção Quadro das Nações
5
Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima - Intergovernmental Panel on Climate Change –
(IPCC). O IPCC foi criado em 1988 pela Organização Mundial de Meteorologia e pelo Programa para o
Meio- Ambiente da ONU (PNUMA). Ele conduz pesquisas rigorosas sobre informações técnicas, literatura e
publicações científicas de todo mundo. Publica Relatórios de Avaliação que são reconhecidos pela sua
credibilidade como fontes de informação existentes sobre mudança de clima. O IPCC também trabalha com
metodologias e responde a pedidos específicos dos outros grupos subsidiários da Convenção.
4
Unidas sobre Mudanças Climáticas, na Sede das Nações Unidas, em Nova York. O
documento assinado, chamado de Convenção Quadro, (United Nationes Framework
Convention on Climate Change - UNFCCC), indica que cada Conferência Internacional6
deverá ser seguida de protocolos que detalharão as medidas adicionais que serão tomadas
pelos diversos países. No mesmo ano pouco mais de 150 países firmaram a Convenção
sobre Mudanças Climáticas (CMC) durante a United Nations Conference on the
Environmet and Development (Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento - CNUMAD), um acontecimento histórico que ficou conhecido como
“Cúpula da Terra”, na cidade do Rio de Janeiro, a Eco 92.
No centro das discussões sobre as mudanças climáticas está o reconhecimento
de que o planeta passará por mudanças graves no sistema climático neste século. Os
cientistas prevêem a elevação de até 6°C na temperatura da terra até o ano 2100, o que
causará o derretimento das calotas polares e, conseqüentemente, a elevação do nível do
mar, bem como alteração no regime de chuvas, freqüência e intensidade de furacões,
enchentes e outros fenômenos climáticos, resultado da emissão de 7 bilhões de
toneladas/ano7 de gás carbônico (CO2) despejadas na atmosfera. A mais elevada taxa de
concentração histórica de CO2 encontrada na atmosfera pulou de 280 ppm (parte por
milhão) em 1850 para os atuais 370 ppm. As evidências apresentadas pelo IPCC no seu
terceiro relatório, publicado em 2001, atribuem claramente à ação antrópica a alteração do
clima global, causado pelo uso crescente de combustível fóssil, resultado das emissões de
gases de efeito estufa lançados na atmosfera8, sendo emitido através do petróleo, do gás
natural ou na queima de biomassa, como o carvão mineral, desmatamento (queimadas),
dentre outros.
6
Ver nota 1.
Os vinte maiores poluidores mundiais são (emissão em toneladas): Estados Unidos (1.489.648), China
(913.768), Rússia (390.616), Japão (316.164), Índia, (279.899) Alemanha (227.364), Reino Unido (142.096),
Canadá (133.890), Coréia do Sul (116.701),Itália (111.323) Ucrânia (100.427), México, (99.964) Polônia
(95.413), França (92.878), África do Sul (86.532), Austrália (86.336), Brasil (78.666), Irã (785850), Arábia
Saldita (72.616), Coréia do Norte (68.794). O Brasil está em 17ª na lista. Sua emissão per capta é de 0,48
toneladas anuais.Fonte: Carbon Dioxide Information Center
8
A atmosfera é constituída por uma mistura de gases, predominantemente Nitrogênio N2 e Oxigênio O2, que
juntos somam 99%. Vários outros gases encontram–se presentes em pequenas quantidades e naturalmente,
constituem os conhecidos gases de efeito estufa, tais como, Dióxido de Carbono (CO2), Ozônio (O3), Metano
(CH4), e o Oxido Nitroso (N2O), juntamente com o vapor d’água (H2O).
7
5
Entre as Conferências sobre as Mudanças Climáticas (COPs)9, merece lugar de
destaque a Conferência de Kyoto, realizada no Japão entre 1º a 12 de dezembro de 1997,
quando os países membros da Convenção sobre Mudanças Climáticas (CMC) assinaram o
Protocolo de Kyoto. Este documento cria leis e dita metas de redução e combate ao
aquecimento global. Os países que fazem parte do Anexo I10 terão que reduzir, entre 2008 e
2012, o equivalente a 5,2% das emissões mundiais de gases responsáveis pelo aquecimento
global. As metas previstas pelo Protocolo aos países do Anexo I estabelecem 8% para a
União Européia, 7% para os Estados Unidos e 6% para o Japão, por serem esses os maiores
emissores de gases de efeito estufa.
Porém, o que se observou ao longo dos mais de dez anos de negociação sobre a
adoção da convenção sobre a mitigação das mudanças climáticas recai sobre a
complexidade desses acordos. Estes, até o momento, não são suficientes para garantir a
adoção de um Protocolo visando alcançar suas metas propostas, qual seja, a redução das
emissões de gases de efeito estufa objetivando mitigar os efeitos das mudanças climáticas
no clima global do planeta.
A política internacional contemporânea caracteriza-se como um sistema
unimultipolar constituído por uma superpotência e diversas potências altamente
significativas11. Os Estados Unidos atualmente destacam-se como há única superpotência e,
portanto, são capazes de promover seus interesses em praticamente todas as partes do
mundo. São os Estados com preeminência sobre os demais em todas as esferas de poder econômica, militar, diplomática, ideológica, tecnológica - e tem, entretanto, o poder de
vetar ações adotadas entre outros Estados. Portanto, a participação dessa superpotência na
9
Conferência das Partes - Conference of the Parties: A COP é o corpo supremo da Convenção. Ela
normalmente se encontra uma vez ao ano para revisar os progressos da Convenção. A palavra "conferência"
não é usada no sentido de encontro, mas no sentido de "associação", que explica a aparente redundância da
expressão " sessão da Conferência das Partes".
10
Os países listados no Anexo I são os seguintes: Alemanha, Austrália, Áustria, Belarus, Bélgica, Bulgária,
Canadá, Comunidade Européia, Croácia, Dinamarca, Eslováquia, Eslovênia, Espanha, Estados Unidos
da América, Estônia, Federação Russa, Finlândia, França, Grécia, Hungria, Irlanda, Islândia, Itália,
Japão, Letônia, Liechtenstein, Lituânia, Luxemburgo, Mônaco, Noruega, Nova Zelândia, Países Baixos,
Polônia, Portugal, Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, República Tcheca, Romênia,
Suécia, Suíça, Turquia*, Ucrânia. (Os países em negrito também fazem parte do Anexo II e os países
classificados como EITs estão sublinhados. Os países acrescentados ao Anexo I na COP 3, em 1997, estão em
itálico e o asterisco (*) indica os países que ainda não ratificaram a Convenção).
11
É o caso Franco – Alemão na Europa; da Rússia na Eurásia; da China e potencialmente do Japão no
Oriente; da Índia no sul da Ásia; do Irã no sudeste Asiático; do Brasil na América Latina; e da África do Sul e
Nigéria na África.
6
resolução das principais questões internacionais, em especial das mudanças climáticas, é de
extrema importância para a consolidação do Protocolo de Kyoto. Assim, as transformações
propostas pelo acordo são insuficientes na busca de mitigação das mudanças climáticas
globais, já que o consumo mundial de energia baseada em fontes fósseis só está
aumentando. Entretanto, o debate traçado dentro de uma lógica do consumo energético,
perpassa pela busca da compreensão das causas que levam a sociedade mundial e/ou os
governos mundiais a insistirem nos investimentos/consumo de fontes de energias que estão
diretamente relacionadas ao aquecimento global do planeta.
Atualmente os Estados Unidos consomem mais de 1/3 de todo o combustível
fóssil que é produzido no mundo. Suas industrias de petróleo mantêm um forte lobby
dentro do senado americano impedindo que ações na tentativa de mitigar os efeitos das
emissões de gases derivado da queima desses combustíveis fósseis sejam aprovadas pelo
senado. Conseqüentemente, não é do interesse, principalmente dos grandes países
produtores e/ou consumidores de combustíveis fósseis, avançar em direção as energias
renováveis já que a produção de petróleo apresenta uma grande vantagem sobre as energias
limpas, pois sua produção ainda é muito mais barata se comparada às energias limpas.
Assim, o modelo social e de consumo principalmente dos países do Norte está associados a
uma crise do capital e não uma crise econômica, ou seja,
Isto ocorre porque ainda hoje há uma desvalorização da natureza como parte do
homem. Isto é, existe uma dificuldade de se encontrar soluções globais para problemas
globais como as mudanças climáticas, pois demanda uma mudança na neutralidade e no
comportamento de todos os atores sociais, sejam eles Estados, mercado ou sociedade civil.
(Kloss, 2000)
Portanto, a proposta de analisar o Protocolo de Kyoto como um mecanismo
efetivo na busca de redução das emissões de gases de efeito estufa, requer indagar a
seguinte questão: será este um acordo efetivo visando mitigar o efeito estufa e as mudanças
climáticas ou apenas será um instrumento de interesse dos países industrializados para
legitimar suas emissões? Faz-se necessário tal análise, já que o Protocolo de Kyoto prevê
instituir o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) como uma cooperação entre os
países desenvolvidos e os países em desenvolvimento na efetivação de projetos de redução
captação das emissões de gases de efeito estufa. Isto porque os efeitos que as alterações do
7
clima irão causar ao planeta e a necessidade de a elas responder coletivamente, obrigam os
atores políticos, os movimentos sociais e os operadores econômicos a repensar o conceito
de bem comum12 no plano político mundial e integrar esforços de regulação de uma nova
ordem internacional. Assim, as discussões sobre a mitigação das mudanças climáticas
perpassam pela necessidade de proteção do clima global como interesses de um bem
comum compartilhado por todos. Entretanto, admitir que a mitigação das mudanças
climáticas seja alcançada, dentro desta perspectiva, não é um elemento que conduza à
regulação; ou seja, mesmo que os governos mundiais reconheçam a necessidade de reduzir
os impactos das mudanças climáticas, isso não está sendo suficiente para se tomar decisões
eficientes objetivando atingir as metas estabelecidas pelo acordo. Porém, como ocorre com
qualquer bem comum global, os esforços para atingir os interesses individuais exigem a
repartição dos custos entre os membros dos grupos “[...] embora exista interesse comum na
obtenção de um benefício, não há interesse comum na divisão do ônus de sua obtenção
entre os membros do grupo. Cada grupo busca obter o máximo de bem comum e o mínimo
de custo” (Olson, 1971, p.21 apud, Kloss, 2000, p.07).
Portanto, as mudanças climáticas podem ser vistas como um dos muitos fatores
de reacomodação das relações internacionais, dos fluxos transnacionais (demográficos,
culturais e econômicos), ou como um dos componentes da chamada globalização que
integra diferentes esforços de regulação da ordem mundial. Mas, negociar um acordo sobre
a redução das emissões de gases de efeito estufa na atmosfera suporia superar, segundo
Leis (1998), as seguintes dificuldades:
[...] a) justificar o custo político e social de medidas que implicam pedir
sacrifícios aos consumidores de derivados de petróleo (usuários de carros e
de sistemas de aquecimento, por exemplo); b) estabelecer compensações
para as emissões desiguais que foram feitas no passado (histórico
acumulado) e que estão sendo feitas no presente pelos diversos países; c)
considerar que nem todos os países são prejudicados da mesma forma com
a mudança climática (os países insulares podem sofrer enormes danos com
o aumento do nível das águas dos oceanos e os países com terras
impróprias para agricultura por causa das baixas temperaturas poderiam ser
beneficiadas com o aumento deste); e d) contemplar a situação de países
com diferentes graus de industrialização (o que supõe maior ou menor
12
A expressão bem comum entendida nesse contexto não expressa a conotação de exploração nos moldes do
sistema capitalista atual, mas sim refere-se a necessidade de repensar os mecanismos atuais de
desenvolvimento a partir de uma lógica protencionista a todos.
8
dependência e eficiência no consumo de combustíveis fósseis) (Leis 1998,
p.350).
Porém, o que podemos observar é que, mesmo que as evidências científicas
comprovem um aumento no aquecimento do clima no planeta, ainda há muita relutância
dos países, principalmente os industrializados, em adotar o Protocolo de Kyoto. A exemplo,
podemos citar os Estados Unidos - maior emissor de gases de efeito estufa - que se recusou
a assinar o Protocolo baseando-se no impacto negativo que a sua ratificação iria causam a
economia do país. O mesmo aconteceu com a Rússia que, na última Conferência, realizada
em Milão, (Itália) em dezembro de 2003, recusou-se a assinar o Protocolo também
justificando seu impacto na economia do país.
Para entrar em vigor, o Protocolo precisa ser assinado por um total de países que
represente 55% das emissões mundiais. Hoje, essa porcentagem já atingiu o equivalente a
44,2%, ou seja, a adoção da Rússia (responsável por 17,4%) ou dos Estados Unidos
(responsável por 36,1%), seriam o suficiente para que o acordo entrasse em vigor e,
portanto, o Protocolo tornar-se-ia um mecanismo primário de contenção das emissões de
gases de efeito estufa.
Entretanto, de que forma os países que aderiram ao Protocolo de Kyoto
posicionam-se frente à relutância de duas grandes potências - tanto econômicas quanto
poluidoras - de não adotarem o acordo? Em resposta a esse posicionamento antagônico, o
que se observou na última Conferência foi a adoção de acordos que estabelecem
mecanismos nos quais o abatimento das emissões poderá ser feito com o financiamento de
projetos de reflorestamento e florestamento nos países em desenvolvimento, a fim de
manter a legitimidade do Protocolo. Por outro lado, as críticas direcionadas a esses projetos
fundamentam-se no enfraquecimento de um acordo cujo objetivo é a busca de redução das
emissões de gases de efeito estufa e não a absorção desses pelos chamados “sumidouros de
carbono - sinks13”. Mas, frente à necessidade de adoção de um acordo, o Protocolo de
Kyoto representa o único mecanismo, hoje legítimo, capaz de buscar soluções para a
alteração do clima global. Ainda que as duas grandes potências econômicas supracitadas
13
De acordo com o Protocolo de Kyoto os países desenvolvidos podem incluir mudanças no nível "líquido"
de emissões (calculando as emissões menos a retirada de CO2) por mudança no uso do solo e no setor
florestal. O Cálculo do efeito de Sinks ((*) Quaisquer processos, atividades ou mecanismos, incluindo a
biomassa e, em especial, florestas e oceanos, que têm a propriedade de remover um gás de efeito estufa,
aerossóis ou precursores de gases de efeito estufa da atmosfera. Podem constituir-se também de outros
ecossistemas terrestres, costeiros e marinhos).
9
não ratifiquem a adesão, a busca pela implementação das medidas visadas pelo Protocolo
deve ser mantida baseada em uma divisão de responsabilidades, comum a todas as nações,
frente às necessidades de redução das emissões dos gases responsáveis pelo aquecimento
global.
Ou seja, a relevância que as mudanças climáticas requerem dos acordos
geopolíticos, é a tentativa de minimizar as ações antrópicas no clima global. Portanto, as
reflexões visando a sua mitigação derivam, dentre outros, do caráter transnacional das
mudanças climáticas, pois não se limita a um determinado território. Ao mesmo tempo, as
mudanças climáticas são ocasionadas pelo mau desenvolvimento tanto dos países do norte
como dos países do sul. Os diferentes impactos estão diretamente relacionados com o
estágio de desenvolvimento de cada país; os países desenvolvidos (Norte) ostentam um
padrão insustentável de utilização dos recursos naturais. Já nos países em desenvolvimento
(Sul), as pressões sobre os ecossistemas estão diretamente ligadas a pobreza, exploração
demográfica e degradação dos recursos naturais. Nas negociações internacionais, os
conflitos entre os diferentes interesses podem determinar as condições sobre as mudanças
climáticas, podendo ser um dos elementos chave para a reflexão atual sobre governança e a
divisão de responsabilidades entre o Norte e o Sul.
Por outro lado, pode-se afirmar com Leis (1998) que, a questão ambiental - em
especial as mudanças climáticas - atingiram todos os setores da sociedade mundial.
Todavia, os Estados/Nações não conseguiram melhorar a governabilidade ambiental ao
mesmo tempo que “[...] não surgiu nenhuma adequação e/ou renovação significativa das
teorias sociais e políticas existentes para responder aos desafios das mudanças climáticas”
(Leis, 1998, p. 351). A ideologia dominante dos países industrializados prevalece aos
interesses de acordos que buscam a mitigação das mudanças climáticas no planeta. Essa
postura está calçada em interesses econômicos, cuja justificativa sustenta-se no conceito de
progresso que será capaz de atenuar, relativamente, as pressões sobre o meio ambiente
através do avanço tecnológico. Mas, tal conceito pauta-se em indicadores como produto
interno bruto e/ou renda per capta. Outros aspectos como eqüidade social, distribuição de
renda ou qualidade ambiental não são contemplados, considerando o conceito de progresso
baseado apenas nos indicadores econômicos (Gutberlet, 1998, p.6). Na análise de Adorno,
o conceito de progresso perdeu sua totalidade, limitando-se às técnicas, tornando-se
10
totalitário e ilusório, diluído pela reificação, transformando a natureza e o homem em
objeto, ou seja, o paradoxo de que haja um progresso e, contudo não o haja. (Löwy, 1995)
Nesse sentido, será que o modelo de industrialização alcançado pelos países
desenvolvidos seria o caminho a ser trilhado pelos países pobres, a fim de que estes atinjam
o estágio de desenvolvimento vivenciado pelos países ricos? Uma perspectiva crítica vê o
desenvolvimento como um processo de mudanças estruturais, sociais e políticas, e não
apenas através de indicadores de crescimento econômico. Segundo Diegues, “O
desenvolvimento e o subdesenvolvimento são faces da mesma moeda, e criados pelos
mesmos processos que aumentam os níveis de produção e qualidade de vida nos países
centrais e mantêm os demais atrasados” (Diegues, 1992, p.23). Isso significa que será
difícil para um país em processo de desenvolvimento atingir um nível que o impeça de se
desenvolver sem uma intervenção direta no clima do planeta, já que suas fontes de energia
estão baseadas no uso de combustíveis fósseis, carvão, etc. Assim, a justificativa para a
busca do progresso ou desenvolvimento econômico e tecnológico como um meio de reduzir
as emissões de gases de efeito estufa não se sustenta, pois mesmo uma superpotência
econômica como os Estados Unidos, que alcançaram o pleno desenvolvimento econômico e
tecnológico, o sustenta, fundamentalmente, baseado em um alto grau dessas emissões,
refletida local e globalmente.
Valérie Campos Mello (1996) explicita bem essa questão na seguinte passagem:
As inovações tecnológicas transformaram-se em potentes armas de
competição, tornando-se difícil para os países do terceiro mundo adquirílas, e mais difícil ainda desenvolver-la autonomamente. Portanto, se a
solução para a crise ecológica é dependente da tecnologia, e, como a
tecnologia é um monopólio dos países desenvolvidos, a probabilidade de
que países em desenvolvimento consigam superar a crise ecológica torna-se
extremamente remota (Mello, 1996, p.301)
Segundo o ex-Embaixador brasileiro Rubens Antônio Barbosa, os países em
desenvolvimento defendem a mesma posição ideológica: “crescimento econômico,
liberação do comércio e proteção ambiental como os objetivos compatíveis e
complementares” (Barbosa, 1996, p143). Mas, se nos basearmos na política de liberação do
comércio mundial, por exemplo, não devemos esquecer que, ao buscar o aumento na
atividade econômica (produção, consumo, etc.), essa política neoliberal atinge diretamente
o meio ambiente através da poluição atmosférica, dos dejetos, podendo levar a escassez dos
11
recursos naturais. “O comércio não é considerado pelo que pode representar como meio de
realizar algo, e sim como um valor em si, uma referência absoluta com conotação positiva
ou negativa a partir do próprio fenômeno” (Caubet, 2001, p.153).
Portanto, “negociar” um acordo sobre as mudanças climáticas requer um
exercício, cujos benefícios coletivos possam sobressair-se aos interesses individuais de
cada Estado. Isso não significa o fim do capitalismo, nem mesmo o bloqueio do
desenvolvimento tecnológico, econômico e científico desses, mas encontrar soluções
concretas e eficazes nas negociações internacionais, principalmente em relação aos valores
e às práticas políticas e econômicas dominantes, em equilíbrio com o funcionamento dos
ecossistemas. Isto porque, segundo Milani (1998) “A busca de salvagardar o planeta não é
superior ao conflito econômico na definição de uma nova ordem internacional mundial”
(Milani, 1998, p.320).
As discussões referentes às transformações cabíveis dentro de um cenário
político e econômico mundial, voltado para a mitigação do aquecimento global do clima,
está relacionada à complexidade das negociações. Na análise de Kloss (2000), tanto os
países industrializados como os países em desenvolvimento baseiam-se suas ações em
acordos multilaterais para ações locais, pois “[...] nenhum governo está propenso a adotar
medidas unilaterais em relação à problemática global e arcar com a parcela que não lhe
cabe” (Kloss, 2000, p.3). Assim, podemos dizer que há uma disposição dos países às
negociações mundiais sobre temas geopolíticos, ainda que seja para obstruir o avanço nas
negociações, pois “[...] nenhum governo quer ficar ausente das negociações que terão
impactos diretos sobre seu destino” (Kloss, 2000, p.3).
Na verdade, o atual processo de aquecimento global reflete a crise da ocupação
humana no planeta e deve ser interpretada como uma deficiência nos fundamentos
organizacionais de nossa vida política e social contemporânea, ou seja, nosso atual padrão
de vida não é compatível com a capacidade do planeta de sustentá-lo. Nesse sentido, diante
de uma ameaça ambiental global e da necessidade de dar uma resposta global a esta
ameaça, cito Milani (1998), quando enfatiza que: “[...] Atualmente, a questão essencial é de
ordem política: trata-se de reconciliar a decisão dos interesses dos Estados, dos operadores
econômicos e dos atores sociais, por um lado, com a implementação de soluções propostas
para resolver problemas ambientais globais, por outro” (Milani, 1998, p.312).
12
Assim, as tentativas de negociações que se desenvolvem ao longo das
Conferências Climáticas, faz-se por intermédio de exercícios que devem passar por
conflitos e negociações nas quais os interesses coletivos têm que se sobrepor aos interesses
individuais, uma vez que esses não são, necessariamente, semelhantes. Por isso, a fim de
evitar o “free ride”, o Protocolo de Kyoto surge como um mecanismo regulatório. Porém,
se a estratégia dos governos mundiais forem à adoção do “free ride”, ações como a redução
das emissões de alguns países da União Européia frente ao descompromisso de outros
países industrializados, ou até mesmo dos países em processo de industrialização, as
tentativas de uma ação coletiva, visando reduzir as emissões globais de 5,2% impostos pelo
Protocolo não se realizariam. Isto porque as dificuldades impostas às ações coletivas não
são devidas, exclusivamente, à cegueira dos interessados, à sua falta de vontade política ou
à sua desconfiança com os dados apontados pelo IPCC, mas decorrem, sobretudo, da
realidade do paradoxo onde o bem estar individual se sobrepõe ao bem estar coletivo
(Milani 1998, p.115).
Nesse momento, o Protocolo de Kyoto demanda ações de cooperação entre os
atores presentes no cenário mundial. Porém, o que está por detrás desse diálogo
cooperativo? Frente aos acordos estabelecidos pelo Protocolo de Kyoto, os países
industrializados seriam os únicos com metas de redução a serem cumpridas até 2012.
Entretanto, é a partir desse momento que os governos mundiais passam a traçar
negociações que venham a beneficiá-los. Na ausência desses benefícios, os governos
tendem a sentir-se ameaçados, o que acaba por levá-los a organizar-se a fim de modificar,
ou mesmo por recusar-se a ratificá-lo.
Assim, parece simples para algum país recusar-se a adotar o Protocolo de Kyoto
e deixar para outros países a responsabilidade pelos custos que a redução das emissões
acarretam, já que a proteção do clima é feita em vista de um bem comum. Isto posto, a
adoção de um acordo global pressupõe sua adoção baseada em um caráter ético global
frente aos demais países membros, assim como um dever, em especial dos países de
economia desenvolvida e, portanto, mais poluidoras. Assim sendo, na análise de Samuel
Huntington, a participação dos países industrializados, em especial dos Estados Unidos por destacarem-se como uma superpotência - é indispensável no tratamento da
problemática das mudanças climáticas (Huntington, 1999, p.15).
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É nesse momento que surgem as tentativas de subestimar os impactos globais
que as mudanças climáticas irão causar no planeta, mediante o custo que a adoção do
Protocolo de Kyoto irá ocasionar à economia de cada país. Ou seja, as discussões que
envolvem os acordos sobre a adoção do Protocolo referem-se a quem deve pagar a conta da
redução das emissões.
Portanto, o que se observa ao longo das discussões sobre a implementação de
um acordo de redução das emissões de gases de efeito estufa na atmosfera está pautada nos
interesses individuais de cada Estado, que busca beneficiar-se ao máximo pelo uso da
atmosfera, mas querem dividir o ônus de sua exploração abusiva com os demais países que
dela usufrui. Nesse sentido, o princípio da “responsabilidade comum, porém diferenciada”
– que hoje é definido por países em desenvolvimento – busca dividir os custos da utilização
da atmosfera pautando-se na participação das emissões mundiais de gases de efeito estufa
que contribuem para o aquecimento global.
Kloss (2000) enfatiza a necessidade de se estabelecer um nexo de causalidade
entre as emissões de gases de efeito estufa e suas conseqüências, como por exemplo, o
aumento no nível dos oceanos ou a elevação na temperatura do planeta.Em sua análise “O
estabelecimento desse tipo de relação permite eliminar, ou ao menos reduzir, a existência
de países ‘caronas’, que se aproveitam dos benefícios das reduções nas emissões em outros
países, sem oferecer suas próprias contribuições” (Kloss, 2000, p.07).
Assim, a participação dos países industrializados na busca de um acordo global
de redução das emissões de gases de efeito estufa é essencial, pois estes são os maiores
beneficiados na utilização da atmosfera. Assim, a não participação destes, pode, portanto,
comprometer qualquer tentativa de se adotar acordos internacionais de combate às
mudanças climáticas globais.
O governo americano considera que o pagamento que lhe cabe é muito alto.
Bush argumenta que o Protocolo custaria aos cofres americanos o equivalente a 400 bilhões
de dólares anuais, algo em torno de 4% do seu PIB até 2012, e 4,9 milhões de empregos.
Por outro lado, os países em desenvolvimento argumentam que precisam continuar se
desenvolvendo e, portanto, terão que receber ajuda dos países industrializados para evitar
que este desenvolvimento seja baseado em energias poluentes.
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III - Conclusão
O que podemos observar com relação à problemática das mudanças climáticas,
até o momento, é que ainda há muita divergência quanto aos impasses econômicos na
disputa por soberania entre os países do norte que, por um lado, não parecem dispostos a
abandonar seus hábitos poluidores, e muito menos contribuírem (na medida do possível)
para a mudança nos hábitos poluidores dos países do sul. E, estes, por sua vez, não aceitam
que se estabeleça corte em suas emissões, baseando-se na justificativa de um
desenvolvimento econômico e social e, portanto, reivindicam a necessidade de continuar a
poluir. Essas divergências arrastam a adoção de um acordo visando a redução das emissões
de gases de efeito estufa e a mitigação do aquecimento global por mais de uma década. Ou
seja, a ratificação do Protocolo de Kyoto seria a primeira, de uma série de medidas a serem
tomadas pelos governos mundiais, para alcançar a mitigação do aquecimento global do
planeta.
Por outro lado, os dados do IPCC apontam que as emissões de gases de efeito
estufa podem ser reduzidas abaixo do estimado se os governos mundiais investirem em
pesquisas visando o avanço do uso de energia renovável e no desenvolver de tecnologia
mais limpa. Porém, há muita relutância por partes destes governos em alcançar tal
investimento, pois esses, em sua maioria, representam os interesses dos lobbies das
indústrias de petróleo e de automóvel.
Dessa forma, ainda que dispositivos como a mudança nos padrões de
desenvolvimento dos países industrializados, transferências de tecnologia limpa para os
países em desenvolvimento e investimentos em fontes de energia renovável, possam
efetivamente contribuir para uma redução da degradação ambiental, o comércio (setor
econômico) estará acima do meio ambiente, não havendo dúvidas em relação à ordem de
prioridades que norteiam os comportamentos do livre comércio.
Assim, se as negociações internacionais atribuírem a mesma ordem de
importância às metas de crescimento econômico, liberalização do comércio e a proteção do
clima global, dificilmente irão alcançá-las, já que o sistema mundial do comércio não levou
em consideração a necessidade de discorrer em prol das mudanças do clima global. O que
nos leva a salientar que se o desenvolvimento econômico continuar permeando todos os
15
acordos acerca da mitigação do clima global, suas soluções ainda estarão muito longe de
acontecerem.
Isto posto, ao pensarmos em uma governança global, o grande obstáculo que se
apresenta a esse processo faz referência a difícil tarefa de unificação das diferentes posições
frente à necessidade de se chegar a um acordo sobre a formas de legitimar mecanismos que
venham a ser acordados pelos governos globais. Ao mesmo tempo, quais modelos deveriam
prevalecer na constituição de uma ordem mundial?
O rumo que o Protocolo de Kyoto irá tomar após a Conferência de Milão,
dependerá da legitimidade dos atores mundiais em negociar em torno dos mecanismos
válidos para a mitigação do aquecimento global e das mudanças climáticas. As soluções
que se esperam dos governantes estão intrinsecamente relacionadas aos interesses que os
atores podem construir para a tomada de decisão. A problemática relativa ao aquecimento
global do clima coloca-se no cenário internacional como um problema global e, portanto,
suas soluções têm que ser globais.
Frente ao processo de ratificação do Protocolo de Kyoto, e da responsabilidade
de cada país nas emissões de gases de efeito estufa, pode-se afirmar que as causas das
mudanças climáticas vão, portanto, muito além da eventual falta de compreensão dos riscos
ambientais existentes ou da pouca vontade política de tratar desses temas. Ou seja, vale
reforçar que o descompromisso das autoridades para com a responsabilidade de negociar
um acordo de redução das emissões de gases de efeito estufa reflete na dificuldade de gerir
a atual crise ambiental global.
Portanto, resta saber se o Protocolo de Kyoto será um instrumento efetivo na
luta para atenuar as mudanças climáticas ou apenas um mecanismo de representação dos
interesses dos países dominantes. Ao mesmo tempo, a adesão ao acordo seria apenas a
conseqüência natural de uma ética voltada para a proteção do clima global, sem que os
interesses econômicos vigentes pudessem interferir tão negativamente na busca de soluções
globais para as mudanças do clima global.
16
IV – Referência Bibliográfica.
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