Avaliação dos efeitos biológicos do fármaco Losartan em microcrustáceos Daphnia similis e Ceriodaphnia dubia (CRUSTACEA, CLADOCERA). Nathália Sayuri Yamamoto 1, Camilo Dias Seabra Pereira1,2, Fernando Sanzi Cortez1, Fabio Hermes Pusceddu1, Aldo Ramos Santos1, Luciana Lopes Guimarães1. 1 2 Laboratório de Ecotoxicologia, Universidade Santa Cecília, 11045-907 Santos, SP, Brasil. Institutos do Mar, Universidade Federal de São Paulo, 11030-400 Santos, SP, Brasil. O Losartan é um antihipertensivo amplamente utilizado que possui evidências de ocorrência em efluentes domésticos e matrizes ambientais (água superficial, sedimento). Diante disso, o presente estudo avaliou a toxicidade aguda e crônica deste composto, por meio de ensaios de toxicidade com os microcrustáceos D. similis e C. dubia, respectivamente. Os ensaios de toxicidade aguda, realizados de acordo com a norma NBR 12713/2009, demonstraram uma concentração efetiva média (n=3) de 175,26 mg.L -1 . Já o ensaio preliminar para avaliação de efeito crônico, realizado de acordo com a NBR 13373/2010, revelou uma a concentração de efeito observado (CEO) de 100 mg.L -1. Estes resultados evidenciam a improvável ocorrência de risco ecológico do Losartan, em função das concentrações de efeito serem superiores às concentrações já relatadas em ambiente aquático. Além disso, estes dados poderão gerar subsídios para o estabelecimento de concentrações seguras deste composto na legislação ambiental. Palavras-chave Ecotoxicologia, fármaco, Losartan, Daphnia similis e Ceriodaphnia dubia. __________________________________________________________________________ Assessment of the biological effects of the pharmaceutical Losartan on microcrustaceans Daphnia similis and Ceriodaphnia dubia (CRUSTACEA, CLADOCERA). The Losartan is a widely used antihypertensive that has evidence of occurrence in effluents and environmental matrices (surface water, sediment). Therefore, the present study assessed the acute and chronic toxicity of this compound by means of toxicity tests with the microcrustaceans D. similis and C. dubia, respectively. The acute toxicity tests, conducted in accordance with the NBR 12713/2009, demonstrated a median effective concentration (n=3) of 175.26 mg.L-1. The preliminary test for chronic effect assessment, conducted in accordance with the NBR 133732010, revealed a observed effect concentration (CEO) of 100 mg.L-1. These results demonstrate the unlikely occurrence of ecological risk for Losartan, considering that effect concentrations were greater than those recognized as environmentally relevant. In addition, these data may generate support for the establishment of safe concentrations for this compound in the environmental legislation. Keywords Ecotoxicology, pharmaceutical, Losartan, Daphnia similis and Ceriodaphnia dubia. ___________________________________________________________________________ UNISANTA BioScience – p. 49 - 53; Vol. 1, nº 2 (2012) Página 49 INTRODUÇÃO O avanço de novas tecnologias e o crescimento populacional permitiu o desenvolvimento na área da indústria farmacêutica, assim como na descoberta e produção de novos medicamentos em larga escala. Muitos deles vêm sendo utilizados no mundo todo, em grandes quantidades (Daughton & Ternes, 1999), tanto na medicina humana como na medicina veterinária (Khetan & Collins, 2007). Dessa forma, em diversas partes do mundo, estudos atuais têm abordado a presença de resíduos de fármacos encontrados em matrizes ambientais (como em água de abastecimentos, águas superficiais e em sedimentos), em concentrações que variam de pg.L-1 até mg.L-1 (Bila & Dezotti, 2003). Embora as concentrações de resíduos farmacêuticos sejam baixas no ambiente, a mistura deles pode provocar efeitos sinérgicos (Reis Filho et al., 2007). As principais classes de fármacos encontrados no ambiente aquático, com potencial risco de causar efeitos biológicos nos organismos aquáticos, são os antibióticos, antiinflamatórios, analgésicos, antidepressivos, antihipertensivos, entre outros (Melo et al., 2009; Daughton & Ternes, 1999; Narvaez & Jímenez, 2012; Fent et al, 2006). Entre as diversas classes de medicamentos citados anteriormente, o fármaco Losartan, pertencente a uma classe de antihipertensivos mais recentes, age de forma a bloquear seletivamente os receptores da angiotensina II, interrompendo o sistema renina angiotensina (Oparil et al., 2001). No estudo feito por Larsson et al. (2007) foi constatado a presença deste fármaco em amostras de efluentes na Índia em concentrações de até 2,5 g.L-1. No estudo realizado por Guimarães et al., (2012) relata a presença deste composto em água superficial marinha da área adjacente ao descarte do efluente do emissário submarino de Santos, S.P., destacando a importância deste estudo. A ocorrência de substâncias farmacêuticas no ambiente aquático leva à necessidade de se conhecer os possíveis efeitos adversos destas sobre a biota. O emprego de ensaios ecotoxicológicos é de suma importância para avaliar os efeitos biológicos causados por efluentes industriais e domésticos, por amostras ambientais e substâncias químicas, dentre elas os fármacos. Os métodos ecotoxicológicos permitem conhecer os efeitos e os mecanismos de ação dos contaminantes nos sistemas biológicos (Zagatto, 2006). Neste contexto, o presente estudo tem como objetivo avaliar a toxicidade do fármaco Losartan por meio de ensaios de toxicidade para avaliação de efeitos agudos e crônicos em Daphnia similis e Ceriodaphnia dubia, respectivamente. MATERIAIS e MÉTODOS Substância teste O Losartan (CAS 124750-99-8) (2-butil-4-cloro-1-[[2’-(1H-tetrazol-5-il)[1,1’-bifenil]4-il]metil]1H-imidazol-5-metanol) (Figura 1), pertence a uma classe recente de medicamentos antihipertensivos bloqueadores dos receptores (tipo AT1) da angiotensina II (Bonfilio, 2010). UNISANTA BioScience – p. 49 - 53; Vol. 1, nº 2 (2012) Página 50 Figura 1. Estrutura química do Losartan. Fonte: Hazardous Substances Data Bank. Ensaio de toxicidade para avaliação de efeito agudo Este ensaio foi realizado de acordo com a ABNT/NBR 12713/2009. Para realização do mesmo, neonatas de D. similis (6 a 24 horas de idade) foram expostas a diferentes concentrações do Losartan, em quatro réplicas, por um período de 48 horas em câmara de germinação com fotoperíodo (16 horas de luz difusa) e temperatura, controlados (20±2 ºC). Após o período de exposição foi analisado a imobilidade e mortalidade dos organismos nas diferentes concentrações. Em seguida foi empregado o método estatístico Trimmed Spearman-Karber para determinação da concentração efetiva inicial mediana (CE(I)50). Ensaio de toxicidade para avaliação de efeito crônico Este ensaio preliminar foi realizado de acordo com a ABNT/NBR 13373/2010. O efeito na reprodução de C. dubia foi avaliado por meio da exposição de neonatas (até 24 horas de idade) a diferentes concentrações do Losartan por um período de sete dias em câmara de germinação com fotoperíodo (16 horas de luz difusa) e temperatura (25±2 ºC) controlados. Durante o ensaio, a água do controle e as soluções-teste foram renovadas a cada dois dias e as neonatas geradas foram retiradas e contadas. Ao término do ensaio os dados foram analisados com o uso do software TOXSTAT 3.5 (West & Gulley, 1996) para determinação da concentração de efeito observado (CEO) e concentração de efeito não observado (CENO). RESULTADOS e DISCUSSÃO Os resultados dos ensaios para avaliação de efeito agudo (n=3) expressos em CE50 48h e a respectiva média, desvio padrão (DP) e coeficiente de variação (CV) estão apresentados na Tabela 1. Tabela 1 – Toxicidade aguda do Losartan para D. similis. Ensaios CE5048h (mg.L-1) (IC) 1 138.70 (117,46 – 163,78) 2 187.97 (174,81 – 202,13) 3 199.12 (181,91 – 217,97) Média 175,26 --DP 32,15 --CV 18,34 --DP = Desvio Padrão, CV = Coeficiente de Variação, IC = Intervalo de Confiança. A concentração efetiva média obtida no presente estudo demonstra uma maior sensibilidade de D. similis quando comparado com os resultados do estudo realizado pela U.S. UNISANTA BioScience – p. 49 - 53; Vol. 1, nº 2 (2012) Página 51 Food and Drug Administration (FDA, 2002) com diferentes organismos-teste, como por exemplo, D. magna (CL5048h – 331 mg.L-1) Pimephales promelas (CL5048h – > 1000 mg.L-1), Oncorhynchus mykiss (CL5096h – > 929 mg.L-1). No ensaio de toxicidade preliminar para avaliação de efeito crônico, foram obtidos valores de CENO e CEO de 10 mg.L -1 e 100 mg.L-1, respectivamente. Estes resultados também demonstraram uma maior sensibilidade de C. dubia quando comparado aos dados publicados no estudo acima citado com a microalga Pseudokirchneriella subcaptata (CENO – 143 mg.L-1). No sentido de garantir um nível elevado de proteção à saúde humana e ao meio ambiente, a União Europeia colocou em prática o sistema REACH, um sistema integrado único de registro, avaliação, autorização e restrição de substâncias químicas. No âmbito desta política, que está em vigor desde 2006, a diretiva 93/67/EEC classifica as substâncias químicas de acordo com os resultados pontuais de toxicidade (CEC, 1996). Com isso, baseado nos resultados preliminares obtidos no presente estudo, o Losartan poderia ser classificado como uma substância “Não tóxica” (CE50 > 100 mg.L -1). CONCLUSÃO O Losartan causou efeito agudo em D. similis na concentração média de 175,26 mg.L-1. Já o efeito crônico na reprodução de C. dubia foi observado na concentração de 100 mg.L-1. Sendo assim, é improvável a ocorrência de efeitos biológicos adversos deste fármaco no ambiente aquático, pois as concentrações de efeitos são superiores às concentrações ambientalmente relevantes. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABNT – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. Ecotoxicologia Aquática. - Toxicidade agudo - Método de ensaio com Daphnia spp. (Crustacea, Cladocera). Rio de Janeiro. NBR 12713, 2009. ABNT – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS – Ecotoxicologia Aquática – Toxicidade crônica – Método de ensaio com Ceriodaphnia spp. (Crustacea, Cladocera). Rio de Janeiro. NBR 13373, 2010. BILA, D. M.& DEZOTTI, M. Fármacos no ambiente. Química Nova. 26 (4): p. 523-530, 2003. BONFILIO, R.; MENDONÇA, T.F.; PEREIRA, G. R.; ARAÚJO, M. B. 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