Disciplina de Matemática Aplicada - UFRGS- Profª Irene Strauch A Matemática da Força de Coriolis: Quando se deseja fazer medições em sistemas que estão girando, como a Terra, é necessário examinar cuidadosamente os efeitos que aparecem. Diferentemente do movimento de translação que é relativo, o movimento de rotação é uma propriedade absoluta. Ou seja, pode-se determinar se um corpo está ou não em rotação, sem relacioná-lo à posição de qualquer outro objeto, porque há forças associadas apenas ao movimento de rotação. Uma destas forças é a já conhecida força centrífuga e a outra é a força de Coriolis, a qual desempenha uma importante função na circulação da atmosfera e dos oceanos. Com o objetivo de deduzir o aparecimento destas forças, vamos determinar inicialmente, os vetores velocidade e aceleração para um referencial em rotação (não-inercial), quando observados de um referencial fixo (inercial). Vamos usar o sub-escrito f para o sistema fixo e r para o sistema em rotação. Para simplificar, vamos escolher uma origem comum para os dois sistemas e coincidente no tempo t (ver fig. abaixo). Sejam a velocidade angular do sistema em rotação (em negrito) e r o vetor posição de uma partícula P com relação ao mesmo sistema, isto é, r r (t ) xr ir yr jr zr kr , onde xr xr (t ), yr yr (t ), zr zr (t ) . Com relação ao sistema fixo f, o vetor-posição r (t ) fica: r xi yj z k. A diferença entre essas duas descrições é que os vetores unitários (ir , jr , kr ) do referencial em rotação possuem direção e sentido que variam com o tempo, enquanto que os vetores unitários (i , j , k ) do referencial fixo são constantes em direção e sentido. Assim, o vetor velocidade da partícula P, medido no referencial fixo é: dr dt vf dx i dt dy j dt dz k dt Ou, tomando o mesmo raio-vetor referenciado ao sistema em rotação, podemos escrever: dr d vf xr ir yr jr zr kr dt dt dxr ir dt vr xr dyr jr dt dir dt yr dzr kr dt djr dt zr xr dir dt yr dkr dt djr dt zr , dkr dt (eq.( I )) Onde vr é a velocidade da partícula P relativa ao sistema em rotação. Os termos restantes expressam o movimento do sistema em rotação com relação ao sistema fixo. Por outro lado, sabemos do estudo do movimento de rotação que, quando uma partícula P gira com velocidade angular w em torno de um eixo fixo, conforme figura abaixo, dr r. o vetor velocidade linear v é dado por: v dt Adaptando este resultado aos três termos restantes, temos dir dt ir djr dt , jr , dkr dt kr , onde o 1º representa o vetor velocidade linear no ponto (1, 0,0), no sistema em rotação em qualquer tempo t . E de maneira análoga, o 2º representa a velocidade no ponto (0, 1,0) e o 3º a velocidade no ponto (0, 0,1). Usando estes resultados na eq, (I), podemos escrever: vf vr xr ir yr jr zr k r vr r (eq.(II )) . Isto é, o vetor velocidade medido no sistema fixo é igual ao vetor velocidade medido no sistema em rotação mais o vetor velocidade do sistema em rotação relativo ao sistema fixo. Esta afirmação ainda pode ainda ser escrita matematicamente, na forma operacional como: d dt r f d dt r . r Esta fórmula é válida para qualquer vetor e não apenas para o vetor posição r . Assim, em casos mais gerais, a leitura desta fórmula é: “a taxa de variação de um certo vetor no referencial fixo(f) é igual à taxa de variação do mesmo vetor no referencial em rotação (r) mais o produto vetorial entre a velocidade angular do referencial em rotação e o referido vetor”. Se este vetor arbitrário for a velocidade linear v f com relação ao referencial fixo, teremos: d dt d dt vf f vf . r O termo da esquerda é a definição do vetor aceleração a f no sistema fixo. À direita, façamos a substituição de v f pelo resultado obtido na eq.(II). Assim, d dt af dvr dt vr r r d dt r vr r (eq.III ) Esta expressão relaciona a aceleração a f com as acelerações medidas no sistema em rotação. Observe que se 0 então a f dvr . dt Vamos agora, identificar estas acelerações que aparecem no sistema em rotação (eq.III): dv -O termo r é a aceleração medida no sistema em rotação, ar . dt d r , encontramos: -Usando a derivada de um produto para o termo dt d d dr r r . dt dt dt Se supusermos que a velocidade angular d r dt é constante, então o 2º termo se reduz a dr vr . dt -Com isso, o 2º e o 3º termos se somam, dando 2 vr . Este é o termo que dá origem aceleração de Coriolis. -O 4º termo, ( r ) é um vetor normal a De acordo com a figura ao lado, vetores e r. . é o ângulo entre os Usando a regra do produto vetorial, o módulo deste triplo produto vetorial é 2 r sen . Este termo é identificado como a aceleração centrípeta e a força correspondente é a força centrípeta. Portanto, um observador inercial descreveria o movimento de rotação de um corpo de massa m, como uma força resultante F f dada pela 2ª Lei de Newton da Mecânica como a soma das seguintes forças: Ff Fr 2m( vr ) Fcentrípeta Já para o observador no sistema em rotação, tudo se passa como se a partícula se movesse sob a ação de uma força efetiva dada por: Fr Ff 2m( vr ) Fcentrípeta . Como este observador não-inercial também conhece a 2ª Lei de Newton, identificará no 1º termo a força resultante. O 2º e o 3 º termos são forças que só existem porque o sistema gira vr ) é a chamada força de Coriolis e o 3º com velocidade angular . O 2º termo 2m( termo Fcentrípeta é a força conhecida como força centrífuga, com sentido oposto à força centrípeta. Qualquer um que tenha tentado caminhar em uma plataforma girante, deve ter sentido os efeitos da força de Coriolis. Ela deflete o movimento em uma direção perpendicular ao plano determinado por e vr (ver fig. abaixo). Uma interessante constatação da existência desta força ficou conhecida como o pêndulo de Foucault. Um pêndulo longo em oscilação acabará por precessionar devido à força de Coriolis. Este movimento é uma evidência visível do movimento de rotação da Terra, independente de qualquer observação astronômica. Quem foram Coriolis e Foucault ? Gaspard-Gustave Coriolis foi um engenheiro francês que, em 1835, publicou um trabalho científico, resultado de suas pesquisas envolvendo máquinas em rotação, como as rodas d’água, no qual menciona a existência de uma força do tipo força centrífuga e deduz com bastante precisão sua fórmula matemática. No início do século XX, o termo força de Coriolis começa a ser usado em meteorologia. Os efeitos da força de Coriolis são hoje bem conhecidos no movimento dos ventos em centros de baixa pressão. Isto é, quando uma área de baixa pressão se forma na atmosfera, o ar tende a fluir em sua direção movido pelos gradientes de pressão, mas será defletido perpendicularmente à sua velocidade pela força de Coriolis. Um sistema de equilíbrio pode então se estabelecer, criando um movimento circular e dando origem a uma formação tipo campo de spin, característica dos fluxos ciclônicos. Também em escala microscópica os efeitos da força de Coriolis estão presentes e podem ser observados. Por exemplo, em moléculas poliatômicas, o movimento da molécula pode ser descrito como o movimento de rotação de um corpo rígido, superposto ao movimento de vibração interna dos átomos, entorno de sua posição de equilíbrio. Os espectros destas moléculas apresentam, conseqüentemente, uma mistura de modos rotacionais e vibracionais. Jean Bernard Leon Foucault foi um físico e astrônomo francês que, em 1851, realizou a 1ª demonstração experimental do movimento de rotação da Terra . O aparato experimental consistiu de um longo pêndulo, deixado livre para oscilar em qualquer plano vertical. A apresentação mais sensacional foi a realizada no Panthéon de Paris, onde usou uma massa de 28 kg suspensa em um fio de 67m de comprimento. O movimento do pêndulo em um sistema inercial seria um movimento harmônico simples, mas devido ao movimento de rotação da Terra estabelece-se, gradualmente, um movimento de precessão, resultante da composição da força gravitacional e da força de Coriolis que aderem do movimento de rotação da Terra. Para uma descrição qualitativa das forças no movimento de rotação, sugerimos a leitura do parágrafo 19-4 do Feymann, Lições de Física, Vol. I. Animações interessantes podem ser acessadas no endereço do Wikipedia, usando como palavras-chaves: Coriolis e Foucault ou no Amazing Physics do youtube. Sobre o movimento da água em ralos de pia, sugerimos o interessante artigo dos professores Fernando Lang da Silveira e Rolando Axt, publicado no Caderno Catarinense de Física, Florianópolis, v.17, n.1: p.22-26, 2000.