Assistência de enfermage m ao paciente submetido à transplante cardíaco: revisão de literatura ÁLVARO PEREIRA DA SILVA JÚNIOR* MARIA MADALENA DEL DUQUI LEMES** RAICA CRISTINE ALVES ARANTES* Resumo O presente estudo trata-se de uma revisão de literatura, sobre o tema transplante cardíaco, objetivando identificar artigos científicos publicados pela enfermagem num período de 1966 à 2004. Para isto foi realizado um levantamento bibliográfico de periódicos indexados nos sistemas MEDLINE, LILACS e BDENF, que resultou em cinco artigos. Tendo o texto sido elaborado a partir desses artigos consta no mesmo: definição de transplante cardíaco, objetivo do transplante, seleção do receptor, seleção do doador, técnica operatória, imunossupressão, assistência de enfermagem e um estudo de caso no pós-operatório. Unitermos: Transplante cardíaco, assistência de enfermagem. *Alunos do 10º período do curso de enfermagem da Universidade Católica de Goiás. Trabalho de Conclusão de Curso na modalidade de monografia, revisão de literatura. **Mestre em Enfermagem pela Universidade Federal de Minas Gerais. Enfermeira. Professora efetiva do curso de enfermagem da Universidade Católica de Goiás. 1 1-INTRODUÇÃO “Há homens que lutam por um dia e são bons. Há homens que lutam um ano e são melhores. Há aqueles que lutam muitos anos, e são muito bons. Porém, há os que lutam por toda vida. Estes são imprescindíveis. ” Bertold Brecht O transplante cardíaco é uma modalidade terapêutica que possibilita a reversão de uma patologia grave de um paciente com doença cardíaca, utilizada quando não há mais nenhum tipo de tratamento disponível. As indicações mais comuns, segundo o registro da Sociedade Internacional de Transplante (1998), são a cardiopatia isquêmica 1 com 50,6%; as miocardiopatias2 com 40,9%; outros tipos de doenças cardíacas, 5,3%; e retransplante, 3,2%. Os pacientes com cardiopatia chagásica também são submetidos a transplante cardíaco, com bons resultados. O transplante cardíaco, atualmente, tem como objetivo, não apenas promover a sobrevivência de um paciente com enfermidade cardíaca avançada, mas proporcionar melhor qualidade de vida para o mesmo, vislumbrando o resultado positivo e o sucesso do próprio transplante (PORTO, 1998). Os pacientes que têm indicação para transplante cardíaco são, na maioria das vezes, portadores de uma doença crônica de evolução progressiva e irreversível com internações repetitivas de urgência devido a graves e recorrentes complicações da doença de base. De modo geral, os pacientes apresentam um conjunto de características complexas, que envolvem aspectos biológicos, psicológicos, sociais e econômicos (GILLIAM, 1991). A possibilidade de o paciente ser submetido a um transplante pode suscitar reações contraditórias, como fascínio e inquietação. O fascínio decorre da perspectiva de vida que o transplante proporcionará as pessoas ameaçadas pela falência do coração; bem como da mobilização de uma grande cadeia de solidariedade que se forma com apoio de tecnologias 1 2 Cardiopatia isquêmica: caracteriza-se por uma oxigenação tecidual insuficiente (PORTO, 1998). Miocardiopatias: doença cardíaca de etiologia desconhecida (PORTO, 1998). 2 inovadoras. A inquie tação ocorre porque a transferência de um órgão ou tecido, com maior freqüência obtida de um indivíduo com morte encefálica, proporciona o confronto de imagem de nossa própria morte (Arquivos Brasileiros de Cardiologia, 1996). Contudo, a pessoa a ser submetida a um transplante deve levar em consideração a mudança que este método proporcionará em sua vida, reinserindo-a no convívio social e reestruturando sua vida econômica com a possibilidade de voltar a exercer as mesmas funções que antes do adoecer (GILLIAM, 1991). Os candidatos a transplante têm uma qualidade de vida ruim e vivem na perspectiva de morte iminente. A inclusão deles em uma lista de espera para realização do transplante representa a possibilidade de viver e de voltar a ter uma vida normal (MASSAROLLO & KURCGANT, 2000). Acompanhando o histórico dos transplantes cardíacos vemos a transformação do tabu de ontem na alta rotina corretiva de hoje. Desde os primórdios, a humanidade luta para ver seus sonhos se tornarem realidade. Lutas descritas em lendas e relatos históricos. E foi assim, sonhando com a longevidade e melhores condições de vida que diversos pesquisadores se empenharam na prática do transplante, termo utilizado pela primeira vez por John Hunter em 1778, no qual ele descrevia experimentos com enxertos ovarianos e testiculares em animais não relacionados (PEREIRA, 1996). Os alotransplantes3 ósseos foram desenvolvidos à partir dos trabalhos de MacEwen em 1881, e os transplantes de córnea iniciaram-se com Zirm em 1905. No mesmo ano Alex Carrel e Charles Guthrie, trabalhando na Universidade de Chicago-EUA, desenvolveram ensaios experimentais com objetivo de estudar técnicas diferentes de anastomoses4 vasculares, o que influenciou na evolução da cirurgia de tórax. Segundo Castiglioni, em 1941, na tradução inglesa da Grande História da Medicina (1941), foi ressaltado o fato de que “com exceção da drenagem de empiema e de abcesso pulmonar, a cirurgia torácica encontrava-se muito atrasada em relação às outras áreas do corpo”, o que se agravava quando se cogitava a idéia de intervenções sobre o 3 4 Alotransplante: técnica de transplante em que se utiliza órgão de animais da mesma espécie. Anastomose: união de duas partes (sutura). 3 coração, seja por dificuldades técnicas ou pela significação do órgão como estrutura intocável na constituição físico-espiritual do corpo (Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo, 1996). Os referidos estudos culminaram com o primeiro transplante cardíaco heterotópico5 , oferecendo importantes informações na época com a possibilidade do coração ser retirado de um animal, tolerar um período de anóxia e readquirir seus batimentos, de forma eficiente, após seu reimplante em outro animal (PEREIRA, 1996). Em 1933 Frank Man, na Mayo Clinic, obteve sobrevida dos enxertos de até oito dias através de modificações na técnica de implante heterotópico do coração. Ele decidiu anastomosar as extremidades seccionadas da artéria carótida e da veia jugular do animal receptor na aorta e na veia pulmonar do coração implantado. Após a morte do receptor, pôde constatar a falência do coração associada às alterações anatomopatológicas (NESRALLA et al 1994) que, posteriormente, viriam a ser constatadas no final da década de 40 no século XX, por Simonsen e Dempster através de estudos de alotransplantes renais em cães. Descobria-se, então, um fator chamado rejeição, e que é de grande relevância nos transplantes. Outro fator era o de não se utilizar circulação extracorpórea ou hipotermia e que os conhecimentos sobre preservação miocárdica eram rudimentares (PEREIRA, 1996). Com o advento da circulação extracorpórea, Webb e Howard, entre 1957 e 1959 realizaram transplantes cardíacos ortotópicos6 , com limitado sucesso. Em 1958 Berman e Goldberg utilizaram uma técnica de transplante ortotópico, conservando uma parte do átrio esquerdo do receptor, o que eliminou a necessidade de se anastomosar individualmente as veias pulmonares; ainda assim, as veias cavas eram ligadas com tubos de plásticos. Em 1959, Cass e Brock e, mais tarde, Lower e Sumway descreveram a técnica de transplante cardíaco ortotópico utilizada até hoje, em que um segmento de ambos os átrios do receptor é mantido e suturado ao coração do doador. Já em sua fase inicial, o trabalho experimental de Lower e Shumway possibilitou a sobrevida dos animais por 5 6 Transplante heterotópico: o coração do doador é colocado ao lado do coração do receptor (PORTO, 1998). Transplante ortotópico: o coração do receptor é retirado e substituído pelo coração do doador (PORT O, 1998). 4 períodos de 6 a 21 dias, associando a técnica de preservação do coração pela imersão em soro gelado no período de implante. A qualidade dos resultados com animais mostraram a recuperação satisfatória até 24 horas antes da morte, sendo este evento um importante estímulo para o uso clínico do transplante cardíaco (NESRALLA, SANT’ANNA, 1994). Em seres humanos, os primeiros passos foram dados por James Hardy em 1964, quando empregaram o coração de um macaco em um paciente portador de insuficiência cardíaca acentuada. Equipes responsáveis pela retirada e implante do coração foram se organizando, mas o maior problema permanecia na identificação do período exato em que o receptor se encontrava em estado terminal. A falta de amparo legal para retirada do coração do doador antes que este cessasse os batimentos também dificultava a operação. A despeito do sucesso técnico, o paciente faleceu após algumas horas devido ao seu estado clínico e ao pequeno tamanho do coração do doador; porém, esta operação demonstrou, do ponto de vista científico, a sua exeqüibilidade em humanos (SOCESP, 1996). O primeiro transplante cardíaco com sucesso ocorreu em 3 de dezembro de 1967, realizado por Cristian Barnard, na África do Sul. O paciente apresentou boa evolução clínica inicial e faleceu após 18 dias de pneumonia. Este fato abriu perspectiva real no arsenal terapêutico, despertando interesse em vários centros de cirurgia cardíaca no mundo (SOCESP, 1996). Resultados insatisfatórios foram descritos devido a episódios de infecção e principalmente rejeição que determinaram a pouca continuidade de alguns centros. Este entusiasmo inicial pelo novo método foi responsável pela realização de cerca de 102 transplantes até o final de 1968 (NESRALLA, SANT’ANNA, 1994). Na década de 70 no século XX, com uma quantidade reduzida de centros, a persistência do grupo Stanford, dos EUA, ofereceu importantes contribuições para o transplante cardíaco, como o desenvolvimento da biópsia endomiocárdica7 e a monitorização imunológica. Durante este período 7 Biopsia endomiocárdica: exame que tem por finalidade observar condições do coração transplantado (PORTO, 1998). 5 eram realizados cerca de 50 transplantes por ano, em que a maioria encontrava-se sob a responsabilidade daquele grupo. O ano de 1976 foi marcado pela utilização de uma nova droga imunossupressora, a ciclosporina, que foi desenvolvida por Borel e cols., na Basiléia (SOCESP, 1996). A ciclosporina revolucionou os transplantes clínicos em todo o mundo, não somente em termos de aumentar o número de transplantes, mas também o índice de sobrevida e o encorajamento da sociedade em relação aos mesmos. Porém, a ciclosporina só foi introduzida na prática clínica em 1980, o que levou o ressurgimento do interesse pelos transplantes, multiplicação progressiva das operações realizadas e a melhoria dos resultados. Registros da International Society of Heart and Lung Transplantation demonstram que até 1994 cerca de 30 mil transplantes haviam sido realizados em todo mundo, sendo que 3.500 neste último ano. Enquanto somente no ano de 1995 foram realizados cerca de 4.326 transplantes em 271 centros (SOCESP, 1996). Nos Estados Unidos são realizados cerca de 24 transplantes anuais por milhão de habitante, e em nosso meio, esses valores não excedem a um. Es tima-se que não mais de 30% dos pacientes que ingressam na lista de espera sejam operados e os demais acabam falecendo. Alguns fatores contribuem para este baixo índice de transplantes realizados: a falta de órgãos; o número reduzido de centros que realizam transplantes; o retardo do encaminhamento de pacientes portadores de cardiomiopatia terminal e a falta de profissionais qualificados em todas as etapas do processo, com destaque para a falta de capacitação do profissional enfermeiro (SOCESP, 1996). No Brasil, onde procedimentos cirúrgicos não eram realizados até fins do século XIX, o médico Zerbini, chefiando um grupo do Hospital das Clínicas da FMUS, realizou o primeiro transplante cardíaco da América Latina, em 26 de maio de 1968. No Instituto do Coração, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, o INCOR, o programa de transplante foi reiniciado, após algum tempo de paralisação em 12 de março de 1985. Até agosto de 1995, em 14 centros foram realizados 600 transplantes, sendo 70% em São Paulo (SOCESP, 1996). 6 Dados da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO) demonstram que os transplantes têm aumentado, apesar do grande contingente de pessoas na fila para receber um “novo coração” (SOCESP, 1996). No ano de 1995 foram realizados 82 transplantes cardíacos; em 1996, 89 procedimentos; em 1997, 77 transplantes; no ano de 1998, 92 procedimentos; em 1999, 110 transplantes; em 2000, 119; em 2001, foram 127 procedimentos; e, em 2002, 146 transplantes. Dentre todos os problemas abordados, há que se dar ênfase a falta de capacitação do profissional enfermeiro para atuar nesta área, tendo em vista a expansão deste tratamento no Brasil e no mundo. Acreditamos que na grande maioria das universidades este assunto não é abordado, observando uma verdadeira omissão no que diz respeito ao tema transplante cardíaco para os enfermeiros, o que não condiz com a importância que este profissional adquiri dentro do grupo multiprofissional. Esperamos com esta produção despertar o interesse de profissionais e acadêmicos pelo assunto abordado e contribuir para a reflexão dos mesmos sobre a produção de artigos científicos publicados pela enfermagem sobre transplante cardíaco. Para isto, optamos por fazer uma revisão da literatura, pois é o melhor método de apresentar o que foi publicado e conscientizar a todos desta deficiência que se reflete na falta de qualificação dos enfermeiros nesta área. Todos esses aspectos e problemas engrandecem esta pesquisa, que será de grande importância, não apenas para nós profissionais, mas para todos aqueles que também amam “os segredos do coração”. 7 2-TRAZENDO OS DADOS ENCONTRADOS Ao fazermos a busca desse assunto no banco de dados MEDLINE foi possível identificar alguns dados numéricos que julgamos interessantes e os apresentaremos a seguir. No período de 1966 a 1992, 26 anos de publicação, encontramos 127 artigos. Local Quantidade de Artigos Local Quantidade de Artigos EUA 61 Dinamarca 02 Inglaterra 17 Suécia 02 Alemanha O. 07 Espanha 02 França 06 Taiwan 01 África Sul 06 Áustria 01 Canadá 05 N. Zelândia 01 Itália 03 Alemanha 01 Suíça 02 Irlanda 01 Japão 02 Austrália 01 Portugal 02 Brasil 01 Índia 02 Polônia 01 Fonte: MEDLINE, 2004. 8 No período de 1993 a 2004, 10 anos de publicação, encontramos 70 artigos. Local Quantidade de Artigos EUA 55 Inglaterra 11 França 02 Alemanha 01 Espanha 02 Fonte: MEDLINE, 2004. O estudo é de caráter descritivo, que segundo GAMBOA (1999), visa descrever as características conhecidas ou componentes do fato, fenôme no ou representação. Sua realização foi baseada em levantamento bibliográfico de periódicos indexados nos sistemas MEDLINE, LILACS e BDENF com data de publicação entre os anos de 1966 a 2004. Estas bases de dados foram escolhidas por serem as mais comumente usadas pelos profissionais da saúde para levantamento bibliográfico. Para tanto foram usados os seguintes descritores: Transplante Cardíaco em Enfermagem, Assistência de Enfermagem em Transplante Cardíaco. A princípio foram selecionados 13 artigos que apresentavam uma associação com o tema pesquisado e a possibilidade de ser mais facilmente traduzidos. Deste total foram selecionados 12 artigos que foram solicitados a BIREME. Parte dos artigos solicitados não foram recebidos porque embora estivessem indexados nas bases de dados pesquisadas, não haviam cópias dos mesmos nas bibliotecas ligadas a BIREME, o que reduziu a amostra deste estudo a um total de 5 artigos apresentados a seguir. 9 Artigos recebidos pela biblioteca virtual ligada à BIREME. Local Quantidade de Artigos Ano da Publicação Base de Dados Espanha 02 1985 / 1998 MEDLINE Brasil 03 1968 / 1987 / 1989 MEDLINE / BDENF Fonte: MEDLINE e BDENF, 2004. O texto foi elaborado à partir dos conteúdos contidos nos artigos. Assim, foi possível identificar definição, objetivo, seleção do receptor, seleção do doador, técnica operatória, imunossupressão, assistência de enfermagem em relação ao transplante cardíaco e um estudo de caso no pós-operatório. 2.1 Definição de transplante cardíaco: O transplante cardíaco constitui uma modalidade terapêutica comprovada em pacientes cardiopatas na fase terminal. O músculo cardíaco está totalmente degenerado e todos os sistemas em ótimas condições de funcionamento (MATOS, GUIMARÃES, VIDGAL, SANTOS, 1989). Atualmente o transplante cardíaco é a melhor opção terapêutica para muitos pacientes com falha cardíaca terminal. O êxito do transplante, se deve ao importante desenrolar dos últimos anos do tratamento imunossupressor e antiinfeccioso, métodos de detecção de rejeição, adequada preservação do órgão, correta seleção do receptor e dos cuidados pós-operatórios. Estes cuidados, que em geral se assemelham aos do paciente submetido a cirurgia cardíaca, apresentam aspectos específicos relacionados com o funcionamento do enxerto, reconhecimento e tratamento da rejeição, prevenção e vigilância da infecção e atenção psicológica do paciente (CASADO, CHAVARREN, SANCHO, COSCOJUELA, ERRO, 1998). 10 2.2 Objetivo do transplante cardíaco : Prolongar a vida do paciente, atentando para que a qualidade da mesma seja a melhor possível (SOTO, ORTEGA, PEÑA, 1985). 2.3 Seleção do doador: Este deve incidir sobre pessoa jovem, que tenha sofrido morte violenta por traumatismo, como por exemplo, traumatismo cerebral (FERRARINI, MULLER, MELLO, 1968). Confirmada a hipótese de tal paciente vir a ser um doador, ele é assistido por um grupo de especialistas: neurocirurgião, cardiologista, eletroencefalografista e imunologista. Levado a uma sala previamente equipada e livre de contaminação, ele é mantido com antibióticos, respiração artificial e controlada pelo eletroencefalograma (EEG) e eletrocardiograma (ECG), enquanto providências ético- legais são tomadas junto à família, a fim de possibilitar a doação do órgão (FERRARINI, MULLER, MELLO, 1968). Os autores acima referem que nesta fase, é de maior importância o trabalho do imunologista, que aplica os testes para determinar a compatibilidade sanguínea e histológica. O prognóstico fechase quando é confirmada a contusão do tronco cerebral irreversível, midríase paralítica e arreflexia periférica. O conceito de morte que norteou os trabalhos do professor Cristian Barnard caracterizava-se pela paralisação do sistema nervoso central, pela ausência completa de reflexos; incapacidade de respirar, exceto com respiração artificial assistida, pela ausência de função do centro respiratório e parada cardíaca total durante cinco minutos. Além desses conceitos o Hospital das Clínicas de São Paulo acrescentava o controle do EEG e ECG. Do ponto de vista eletroencefalográfico é necessário que o paciente apresente linhas isoelétricas cerebrais em todas as derivações durante dez minutos, após iniciadas as manobras de estimulação dolorosas, auditivas e luminosas (FERRARINI, MULLER, MELLO, 1968). Negativas todas essas respostas do sistema nervoso central e 11 sobrevindo a parada do coração, a morte é configurada sob o ponto de vista da ética médica e da moral (FERRARINI, MULLER, MELLO, 1968). 2.4 Seleção do receptor: O transplante de coração é indicado no caso de incapacidade irreversível do coração, de bombear o sangue para o organismo, decorrente de fibrose com alterações miocárdicas globais. São insuficiências cardíacas recentes, progressivas, que evoluem para o óbito, por debito cardíaco baixo. Sendo quatro as indicações para o transplante: miocardia idiopática ou por vírus, na qual as lesões são exclusivas do coração, a evolução e progressiva e refratária a qualquer tratamento clínico convencional; lesões congênitas complexas; ateriosclerose coronariana e moléstia de Chagas (FERRARINI, MULLER, MELLO, 1968). Depois de estudado o caso do receptor e concluído o protocolo médico das provas de laboratório, teste psicológico e valores diagnósticos, se procederá a orientação do paciente e sua família, fazendo- lhes saber da irrevogabilidade de sua decisão e dos riscos que esta intervenção cirúrgica comporta (SOTO, ORTEGA, PEÑA, 1985). Entre os riscos e complicações pósoperatórias a serem esclarecidas destaca-se a hepatoxidade, nefrotoxicidade e infecções (MATOS, GUIMARÃES, VIDGAL, SANTOS, 1989). O preparo do receptor deve ser planejado e executado por uma equipe que inclui o cardiologista, o cirurgião, a enfermagem e especialistas tais como: imunologista, psiquiatra e psicólogo. O paciente deve estar preparado física e psicologicamente para o transplante e deve firmar um documento legal, dando à entidade hospitalar a autorização de realizá- lo (FERRARINI, MULLER, MELLO, 1968). 2.5 Imunossupressão: O emprego da ciclosporina a partir de dezembro de 1980 na Universidade de Stanford trouxe um novo impulso no desenvolvimento dos transplantes. Porem é de suma importância que o pessoal 12 da enfermagem se familiarize com uma série de complicações que esta droga podem causar, proporcionado uma melhor assistência (MILANEZ, ALMEIRÃO, 1987). Quando o coração é transplantado ocorrem uma série de reações imunológicas no receptor que passam a produzir um grupo de glicoproteínas chamadas interferons (IFNS) com propriedades antigênicas e biológicas distintas. Os IFNS estão divididos em três grupos: IFNS alfa que promovem a formação e multiplicação dos linfócitos, os IFNS beta ligados à formação de fibroblasto, e os IFNS gama que modulam a intensidade do fenômeno imunitário (MILANEZ, ALMEIRÃO, 1987). Outra reação do hospedeiro ao coração transplantado é comandada pelos linfócitos, elementos geneticamente programados para responder aos antígenos. Os linfócitos se originam na medula óssea e são programados de maneiras distintas: alguns passam pelo timo e se transformam em linfócitos T (LT) e os demais serão linfócitos B (LB) (MILANEZ, ALMEIRÃO, 1987). Os LT responsável pela imunologia celular comanda o fenômeno da rejeição. O LB atua na atividade humoral, formando os anticorpos. A ciclosporina tem ação especifica no LT, deixando LB em condições de proteger o organismo contra agentes infecciosos. Isto associado ao fato de que com a ciclosporina se pode administrar doses menores de corticóides, explica a maior facilidade de controlar a infecção com esta droga (MILANEZ, ALMEIRÃO, 1987). Os LT são dois tipos LT “Helper” (LTh) e LT “Supressor” (LTs). No transplante cardíaco o timo passa a produzir um terceiro tipo de LT, o linfócito citotóxico (LTc), que atua produzindo necrose miocítica. O LTh produz uma substância, a interleucina 2 (IL2), que é um fator de crescimento e maturação dos LTc e LTs, responsáveis pelo episodio da rejeição. A ciclosporina atua impedindo a formação de IL2 e, em conseqüência, de LTc e LTs. Por esta razão, o surto de rejeição é mais facilmente tratado com ciclosporina, que possui ação especifica. Atua também sobre os macrófagos, reduzindo a intensidade de sua resposta imunitária, mas resguardando suas funções de fagocitose e atividade na pré-coagulação do sangue. 13 A ciclosporina produz necrose e trombose na parede dos vasos, isto explica o efeito neutrotóico da droga e as lesões coronarianas encontradas em corações transplantados (MILANEZ, ALMEIRÃO, 1987). A perda da função renal durante as seis primeiras semanas é freqüente com uso da ciclosporina, assim como a retenção de fluídos, elevação da pressão diastólica e alteração tubular renal, mesmo apresentando todas essas complicações é incontestável a diminuição dos episódios de rejeição que ela proporciona e o quanto torna estes episódios mais facilmente contornáveis (MILANEZ, ALMEIRÃO, 1987). 2.5.1 Complicações da ciclosporina: O enfermeiro responsável pela unidade de transplante cardíaco deve estar familiarizado com as diversas complicações que o paciente poderá apresentar em função do uso da ciclosporina, o que viabilizara uma assistência mais eficaz. Dentre estas complicações destacam-se a nefrotoxicidade com aumento da creatinina e do nitrogênio uréico do sangue, menor secreção urinária de sódio, hipercalemia, oligúria pós –operatória, diminuição crônica na depuração da creatinina; hepatotoxicidade com aumento na fosfatase alcalina; neurotoxicidade produzindo distúrbios psiquiátricos, alucinações, tremores finos, crises convulsivas; hipertricose ocasionando deformação em crianças pequenas e mulheres; hiperplasia gengival por fibroplastia; trombose vascular com trombose glomerular, síndrome hemolítica- urêmica; distúrbios linfoproliferativos ocasionando linfomas não-Hodkin e sarcoma de Kaposi; hipertensão difícil de tratar devido mecanismo exato desconhecido; fibrose miocárdica do tipo microfibrilar de conseqüências incertas (MILANEZ, ALMEIRÃO, 1987). Apesar dessas complicações o uso da ciclosporina aumentou a sobrevida dos pacientes e reduziu as complicações associadas aos efeitos colaterais dos esteróides, fazendo renascer em 1987 a possibilidade de êxito dos transplantes (MILANEZ, ALMEIRÃO, 1987). 14 2.5.2 Cuidados ao paciente imunodeprimido: As drogas imunossupressoras são administradas de acordo com um protocolo estabelecido com as doses adaptadas à sensibilidade de cada paciente, porque o transplante, em conseqüência da patologia cardíaca, traz problemas hepáticos e renais que vão influenciar na dosagem dos medicamentos (MILANEZ, ALMEIRÃO, 1987). O tratamento da provável rejeição tem início antes da cirurgia com administração de ciclosporina 18 mg/kg/dia, duas horas antes da cirurgia, por via oral e após a cirurgia 2 a 4 mg/kg/dia, endovenosa em soro glicosado a 5%, até novamente recomeçar a via oral (MILANEZ; ALMEIRÃO, 1987). A administração de prednisona será por via oral e na primeira semana a dose será de 1 mg/kg/dia, sendo reduzida, semanalmente, conforme as respostas dos pacientes à terapia. Se houverem episódios de rejeição serão usados esquemas especiais com o aumento da dose de ciclosporina e da predinisona e introduzida a metil-prednisona 1g endovenosa, durante três dias, constituindo-se este esquema “a pulsoterapia” (MILANEZ; ALMEIRÃO, 1987). 2.6 Técnica operatória: Verificado o óbito, o importante é manter o coração do doador em condições fisiológicas que possibilitem o transplante. Para isso são tomadas medidas como heparinização do cadáver e perfusão das artérias coronárias mantendo a circulação artificial com sangue normotérmico e oxigenado. Esta perfusão é feita através de um cateter introduzido no tronco bráquio-cefálico (FERRARINI, MULLER, MELLO, 1968). A normoterapia apresenta vantagem por determinar menor incidência de distúrbios do ritmo cardíaco após a implantação, tal como ocorreu no nosso caso de transplante, que dispensou o choque elétrico; o coração voltou a bater logo após a implantação em ritmo normal. Em contraposição, a normoterapia torna difícil a técnica de sutura, pois o coração fibrila todo o tempo e 15 o campo operatório está sempre inundado pelo sangue que drena pelo seio coronário (FERRARINI, MULLER, MELLO, 1968). Feita a ressecção do coração do doador, a circulação coronária deste coração é ligada à circulação extracorpórea do receptor, passando a fazer parte deste embora ainda não implantado (FERRARINI, MULLER, MELLO, 1968). O coração do receptor é retirado mantendo-se a parte superior das aurículas, septo, veias cavas superior e inferior e as quatro veias pulmonares (FERRARINI, MULLER, MELLO, 1968). A sutura é feita seguindo a técnica de Shumway, modificada por Barnard, que mantém o nó sinusal do receptor para que o coração volte a bater em ritmo sinusal (FERRARINI, MULLER, MELLO, 1968). Realizadas as suturas do átrio esquerdo, septo inter-atrial e átrio direito, terminadas as anastomoses das artérias pulmonares e aorta, são realizadas as manobras de retirada de ar das cavidades cardíacas, culminando com a abertura da pinça da aorta antes que a sutura desse vaso esteja completa. Despinçada a aorta, os batimentos cardíacos se restabelecem e o coração transplantado assume a propulsão da massa sanguinea do receptor (FERRARINI, MULLER, MELLO, 1968). 2.7 Assistência de enfermagem: O preparo da equipe de enfermagem propicia condições ao grupo para agir com medidas adequadas a cada situação e, sobretudo, nas solicitações de emergência (FERRARINI, MULLER, MELLO, 1968). 2.7.1 Pré-operatório: A fase pré-operatória começa com a indicação do paciente como provável candidato do transplante. Pode se iniciar no serviço de cardiologia clínica com assistência permanente (FERRARINI, MULLER, MELLO, 1968). Esta fase exige da equipe de enfermagem um trabalho de identificação de problemas que o paciente possa apresentar na sua admissão, quer na aceitação 16 da hospitalização e aceitação do tratamento, quer na identificação de vários outros problemas de ordem física e psicossocial (FERRARINI, MULLER, MELLO, 1968). Durante esse período, os pacientes são orientados sobre o tipo de intervenção cirúrgica a qual serão submetidos, tempo de permanência no centro de tratamento intensivo, uso de oxigênio, drenos e equipamentos especiais, cuidados corporais, prevenção de infecção, exercícios físicos, exercícios de respiração profunda e de tosse. Várias atividades recreativas podem ser proporcionadas, assim como apoio psicossocioespiritual. É preciso ter paciência para que a pessoa exteriorize e explique todas suas dúvidas, preocupações e temores, ajudando-a a se expressar com confiança e tranqüilidade (MATOS, GUIMARÃES, VIDGAL, SANTOS, 1989; SOTO, ORTEGA, PEÑA, 1985). 2.7.2 Pré-operatório imediato: Deve-se explicar ao paciente todos os procedimentos a serem realizado; fazer o esvaziamento intestinal conforme prescrição médica; orientar sobre o jejum; fazer tricotomia torácica, axilar, pubiana e de membros inferiores duas horas antes da cirurgia; encaminhar ao banho de aspersão e orientar sobre a importância da limpeza da pele com solução degermante e antisséptica; orientar sobre higiene oral; administrar a medicação imunossupressora conforme prescrição médica; administrar o pré-anestésico conforme prescrição médica; verificar os sinais vitais; registrar no prontuário os cuidados prestados e as observações de enfermagem sobre o paciente naquele momento, e horário de encaminhamento à cirurgia; encaminhar o paciente ao centro cirúrgico em maca previamente desinfectada juntamente com o prontuário, o resultado de exames laboratoriais e raio-X (MATOS, GUIMARÃES, VIDGAL, SANTOS, 1989). 2.7.3 Pós-operatório: O paciente deverá permanecer em semi- isolamento durante um período de no mínimo oito a dez dias, devido a imunossupresão, sendo necessário disponibilizar uma enfermaria que tenha 17 características similares com a unidade de tratamento intensivo, devendo a mesma ser individual (SOTO, ORTEGA, PEÑA, 1985). A assistência de enfermagem deve ser especializada, estando o enfermeiro preparado para perceber precocemente sinais e sintomas de complicações através das reações do paciente, da leitura do gráfico do eletrocardiograma no monitore de outros elementos objetivos de ordem clínica. É de sua competência a observação de sinais vitais; controle de líquidos ingeridos e eliminados; controle de drenos e sondas; administração de medicação; execução de limpeza concorrente da unidade de transplante cardíaco; providências relativas a material, equipamento e medicamentos (FERRARINI, MULLER, MELLO, 1968). Como previsto os pacientes apresentam reações e manifestações diferenciadas, motivo pelo qual os cuidados devem ser sempre reavaliados, complementados e ajustados a cada paciente de acordo com as necessidades diárias apresentadas pelos mesmos (MATOS, GUIMARÃES, VIDGAL, SANTOS, 1989). 2.7.4 Pós-operatório imediato: O pós-operatório imediato é considerado o período de alerta e por isso engloba uma série de cuidados dentre eles: observar rigorosamente o paciente na recuperação pós-anestésica; transportar o paciente para Unidade de Terapia Intensiva com movimentos seguros, avaliando as funções respiratórias, oxigenando-o com ambú até instalação do respirador artificial; explicar ao paciente todos os procedimentos a serem realizados; monitorar e observar a presença de arritmias; posicionar e verificar o funcionamento da pressão intra-arterial (PIA); fazer controle da pressão venosa central (PVC) e observar funcionamento do respirador artificial e permeabilidade do tubo; aspirar secreção oral e traqueal sempre que necessário; verificar sinais vitais; manter sonda nasogástrica aberta; instalar sistemas de drenagem e observar funcionamento; posicionar o paciente adequadamente para facilitar drenagens; verificar aspecto das secreções drenadas; fazer exame físico (estado de consciência, reflexos, incisão cirúrgica, drenos, sonda, soroterapia, perfusão capilar); orientar o 18 paciente sobre o tratamento e as rotinas assim que estiver consciente; providenciar exames laboratoriais e raios-X se solicitados; manter jejum; controlar o gotejamento do soro e drogas infundidas e controlar volume urinário; fazer balanço hídrico e observar características; colaborar na extubação traqueal; estimular o paciente a tossir e expectorar; colaborar e/ou retirar drenos e sondas conforme prescrição médica; prestar cuidados de conforto, higiene oral e limpeza corporal; fazer massagem de conforto e mudança de decúbito; fazer limpeza da área cirúrgica, e ou curativos de drenos, cateter central e PIA; insistir na hidratação após liberação do jejum e supervisionar aceitação da dieta oral;registrar as atividades executadas, reações e manifestações apresentadas (MATOS, GUIMARÃES, VIDGAL, SANTOS, 1989). 2.7.5 Pós-operatório mediato: Neste período deve-se explicar ao paciente todos os procedimentos a serem realizados; supervisionar a hidratação e aceitação da dieta; administrar a medicação conforme prescrição médica; fazer os cuidados de higiene oral e limpeza corporal; fazer a limpeza da área cirúrgica com solução fisiológica e antisséptica; iniciar os exercícios ativos e passivos e mudança de decúbito; orientar ao paciente para iniciar os exercícios de fisioterapia respiratória e os exercícios de tosse; observar reações e manifestações do paciente (estado emocional), apetite, tosse, funcionamento intestinal; fazer inspeção da orofaringe; colaborar na realização dos exames; verificar sinais vitais, peso, volume urinário e características; estimular a deambulação; registrar as atividades executadas, reações e manifestações apresentadas (MATOS, GUIMARÃES, VIDGAL, SANTOS, 1989). 2.7.6 Pós-operatório tardio: Supervisionar aceitação da dieta hiperprotéica; administrar a medicação conforme prescrição médica; orientar sobre a importância da higiene oral; orientar sobre a limpeza corporal; colaborar na realização de exames; observar eliminação renal e funcionamento intestinal; verificar sinais vitais; acompanhar o paciente na deambulação; orientar para o autocuidado (alimentação, medicação, peso, higiene, atividades físicas); orientar sobre a alta hospitalar; registrar atividades 19 executadas, reações e manifestações apresentadas (MATOS, GUIMARÃES, VIDGAL, SANTOS, 1989). 2.8 Estudo de caso: Este estudo foi realizado na Escola Universitária de Enfermagem da Espanha por CASADO, CHAVARREN, SANCHO, COSCOJUELA e ERRO em 1998. Foram estudados 29 pacientes, 28 homens e uma mulher submetidos a transplante cardíaco num período de janeiro de 1994 a março de 1996, a idade média foi de 58,6 anos (15-70). A coleta dos dados foi realizada através dos registros diários da enfermagem e história clínica que permitiu analisar a evolução das distintas funções corporais: Sistema neurológico: momento da recuperação da consciência depois da anestesia e comprovação dos movimentos das extremidades. Sistema respiratório : evolução da função respiratória, tempo de intubação e ventilação artificial, período de desintubação e cuidados específicos. Sistema cardiovascular: eletrocardiograma e arritmias, parâmetros hemodinâmicos, fármacos vasoativos utilizados, perdas sanguineas pelos drenos torácicos e presença de instabilidade hemodinâmica, definida esta como a necessidade de administrar fármacos inotrópicos maiores de 10 mg/kg/min ou precisar de assistência circulatória mecânica. Sistema nefrourinário : débito urinário, permanência da sonda vesical, tratamento farmacoló gico especifico administrado e aplicação de hemodiálise. Sistema digestivo : momento da retirada da sonda nasogástrica, inicio e tolerância da dieta oral, restauração do ritmo intestinal. Sistema locomotor e tegumentário: estado da ferida cirúrgica, evolução da esternotomia, presença de alterações de pele e mucosas, movimentações e atividades físicas realizadas. 20 Rejeição e infecção: tempo médio de permanência dos cateteres e vias invasivas, tratamento antiinfeccioso e imunossupressor administrado, controle bacteriológico, febre e sinais de infecção e rejeição. Bem estar: necessidade de analgesia, descanso noturno, alterações do estado de ânimo e apoio familiar. Resultados : os 29 pacientes estudados receberam transplante cardíaco ortotópico, a causa que os levou ao transplante foram: miocardiopatia dilatada em 12 pacientes (41,3%), miocardiopatia isquêmica em 11 (37,9%), valvulopatia em 4 (13,7%), cardiopatia congênita em 1 (3,4%) e um retransplante (3,4%). A permanência média na unidade da cuidados intensivos foi de sete dias, tendo sido observados os seguintes aspectos: Sistema neurológico: em 100% dos pacientes a recuperação da conciência ocorreu em um tempo médio de 4 horas, não apresentando déficit neurológico em nenhum caso. Sistema respiratório : todos os pacientes foram extubados com normalidade e apresentaram uma função pulmonar satisfatória. O tempo médio de intubação foi de 16 horas, tendo sido utilizado tubo em “T” de oxigênio em 100% dos casos, em 19 pacientes utilizou-se ventilação mecânica com pressão assistida e pressão positiva continua (CPAP), sendo que 17% dos pacientes utilizaram pressão assistida e 12% ventilação mandatória intermitente sincronizada (SIMV) mais pressão assistida. Dezessete pacientes, precisaram de drenagem pleural e outros dois precisaram de sua colocação para resolver pneumotórax. Para otimizar a ventilação pulmonar durante o período de ventilação artificial, todos os pacientes receberam cuidados específicos que este tratamento requer como aspirações endotraqueais com técnica asséptica. Uma vez extubados, realizaram exercícios respiratórios e aerosolterapia com mucoliticos varias vezes ao dia. 21 Sistema cardiovascular: o ritmo cardíaco foi sinusal na maioria dos pacientes, 27 (93%) necessitando 15 deles de marcapasso ventricular de forma temporária. Como apoio cronotrópico foi utilizado o sulfato de Isoprenalina em 25 (86,2) dos transplantados, mantendo este tratamento durante um período de médio de 6 dias. Um paciente manteve ritmo de marcapasso durante toda sua internação. A vigilância hemodinâmica foi realizada por meio do cateter de Swan-Ganz e monitorização invasiva da pressão arterial. Para manter o funcionamento do enxerto todos foram tratados com drogas vasoativas, necessitando quatro deles de doses elevadas por apresentarem instabilidade hemodinâmica; outros dois pacientes precisaram de assistência circulatória (um com balão intraórtico e outro de assistência biventricular mecânica desde o ato cirúrgico falecendo ao terceiro dia). O sangramento médio por drenos torácicos nas primeiras 24 horas foi de 1108 ml (400-3.240), repondo com hemoderivados em 100% dos casos. A permanência média dos drenos foi de 2,5 dias. Foram registrados três tamponamentos cardíacos que precisaram de reintervenção, um no mesmo dia operatório e dois com apresentação tardia ao oitavo dia, resolvendo todos favoravelmente. Sistema nefrourinário: inicialmente o débito urinário foi controlado de forma horária através da sondagem vesical, a permanência média da sonda foi de dois dias e meio. Em 82,7% dos casos o tratamento farmacológico foi à base de Dopamina para melhor a função renal, dois precisaram de tratamento de hemodiálise. Sistema digestivo: todos os pacientes permaneceram com sonda nasogástrica, após a retirada iniciou-se a dieta oral com boa tolerância em todos os casos, exceto em dois que necessitaram de nutrição enteral devido o estado prévio de desnutrição. A eliminação fecal foi reiniciada na unidade de cuidados intermediários por 79% dos pacientes, precisando dois de enema. 22 Sistema tegumentário e locomotor: a ferida cirúrgica teve evolçução favorável em todos os transplantados. Para prevenir a deiscência de esterno, todos os pacientes foram orientados a movimentar-se com os braços cruzados sobre o tórax para evitar apoiar os braços com fo rça, evitando assim fazer pressão sobre o esterno. Quatro pacientes apresentaram erupções na pele, dois deles já apresentavam na sua admissão e outros dois que eram diabéticos desenvolveram na UCI; alguns pacientes apresentaram lesões em mucosas; um em orifício nasal e outro na boca; um terceiro paciente apresentou herpes labial. Em todos os casos a evolução foi favorável devido a aplicação dos cuidados estabelecidos nos protocolos de cuidados da unidade. Todos os pacientes foram mudados de decúbito a cada duas horas, iniciando-se a partir das seis primeiras horas depois do pós-operatório; do mesmo modo todos os pacientes fizeram movimentações das extremidades desde o dia seguinte da intervenção. Cerca de 48% começaram a deambular durante sua permanência na UCI e 10% realizaram exercícios progressivos na bicicleta ergométrica. Dois pacientes necessitaram de ajuda da equipe por se apresentarem durante um longo período de tempos acamados. Rejeição e infecção: todos os pacientes permaneceram em isolamentos com dedicação exclusiva de uma enfermeira que utilizava gorro, máscara, luvas e capote para técnicas assépticas e contaminadas com lavagem freqüente das mãos. Foi utilizada na terapia imunossupressora a ciclosporina antes das 48 horas em todos os pacientes. No que diz respeito a permanência dos cateteres, 23 pacientes utilizaram cateteres de SwanGanz, retirados antes das 48 horas em 93,3% dos casos. Já o cateter arterial e venoso periférico, sempre foi retirado antes das 72 horas e o cateter venoso central foi mantido até a realização da primeira biopsia cardíaca ao oitavo dia. Em nenhum paciente foi observado sinais clínicos de infecção pulmonar, urinária ou por cateteres vasculares. O cultivo em estufa foi positivo em cinco casos, encontrando-se: Enterobacter em um paciente e Enterococo em outro, ambos foram tratados com antibioticoterapia especifica. Nos outros três pacientes foram encontradas leveduras, porém 23 apenas um teve necessidade de tratamento antifúngico sistêmico. Somente um paciente teve febre, apresentando duração de três horas. Bem estar: para controlar a dor, 86,2% (25) pacientes foram submetidos a analgesia. Em 93,1% (27) pacientes usou-se sedativo e ansiolítico para favorecer o descanso noturno, sendo registrado como adequado em 75,8% dos casos. Por outro lado 24% (7) apresentaram ansiedade e alterações no estado de ânimo, três deles necessitando de tratamento psiquiátrico. Visita familiar: todos os pacientes receberam a visita de seus familiares com flexibilidade de horários. Após todo o exposto foi concluído pelos autores, que devido o baixo índice de complicações relacionadas diretamente com os cuidados de enfermagem, o protocolo de cuidados aplicados pela instituição estava correto. 3-CONSIDERAÇÕES FINAIS Através da realização deste estudo, verificou-se que há grande escassez de trabalhos científicos com abordagem da atuação da equipe de enfermagem em transplante cardiaco, tendo sido encontrados apenas três artigos científicos no Brasil num período de 36 anos (1968-2004). Porém, torna-se nítida a importância do papel desempenhado pelo enfermeiro desde as primeiras etapas vivenciadas pelo candidato ao transplante cardíaco e sua família, ao acontecimento da cirurgia, no pós-operatório imediato e mediato, na alta hospitalar até a sua reintegração ao ambiente familiar e social. O trabalho do enfermeiro no exercício de suas atribuições deve ser realizado na assistência, na administração, no ensino, na pesquisa e na consultoria, devendo sempre investir esforços na identificação e na prevenção de comp licações e intervir para proporcionar a recuperação integral e uma melhor qualidade de vida para o paciente (FERRAZ, 1989). Em contrapartida, verifica-se um processo de desinformação e desinteresse por parte de profissionais que desde a sua formação, pela falta de ênfase/capacitação no referido tema alguns se 24 tornam resistentes às mudanças, na sua forma de atuação e integração à equipe multiprofissional. Sendo necessário uma maior atenção por parte das instituições para que se possa apresentar padrões satisfatórios de trabalhos por parte dos enfermeiros. Desta forma, segundo SALVIANO e SILVA (1998), a modalidade terapêutica transplante veio enfatizar a importância da capacitação e da qualificação dos enfermeiros. Dessa forma, esperamos que este estudo abra caminhos para outras pesquisas, tentando melhor capacitação do enfermeiro frente ao tema transplante cardíaco, despertando não apenas o interesse, mas o entusiasmo, ocasionando assim o aumento das publicações cientificas pelos enfermeiros que tanto contrib uem para o conhecimento e principalmente a melhoria da qualidade da assistência de enfermagem. 4-REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA CASADO, N. Garcia; CHAVARREN, I. Malumbres; SANCHO, C. Torres; COSCOJUELA, M. A. Margal; ERRO, M. C. Asiain. Atención postoperatoria en U.C.I. al paciente con transplante cardíaco. Revisión de los dos útimos años. In: Enfermería Intensiva, volume 9, número 1: 3-9, janeiro- março, 1998. Disponível em http:// bases.bireme.br FERRARINI, Clarice Della Torre; MULLER, Maria de Lourdes; MELLO, Minervina Zeghbi Ribeiro de. Transplante de Coração – Enfermagem. In: Revista Brasileira de Enfermagem, volume21, número 6: 529-37, dezembro, 1968. 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