Eletroestimula#U00e7#U00e3o do nervo tibial posterior no

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Eletroestimulação do Nervo Tibial Posterior no
Tratamento de Incontinência em Paciente com A. V. E.
Resumo
Débora Maciela Matielo, Vanessa Dias César,
Laura Ferreira de Rezende Franco
O acidente vascular encefálico (AVE) é uma das patologias
mais comuns e é a terceira maior causa de mortalidade
nos países de terceiro mundo. Estima-se que ocorram 20
milhões de novos casos no mundo por ano. As sequelas
deixadas por essa doença são dependentes da área afetada
e do tamanho da lesão. As alterações mais comuns são as
disfunções motoras, sensoriais, na fala e na manutenção
da continência urinária. Após lesão em qualquer segmento
do sistema nervoso, a alteração na micção é denominada
bexiga neurogênica. Os tratamentos disponíveis incluem
medicação e técnicas invasivas. Este trabalho tem a
finalidade de avaliar os efeitos da eletroestimulação
externa do nervo tibial posterior na continência urinária
de paciente com bexiga neurogência pós-AVE através do
acompanhamento do tratamento de um paciente por dois
anos. O tratamento consistiu na eletroestimulação do nervo
tibial posterior, com duração de 30 minutos, uma vez por
semana, freqüência de 10 Hz e largura de pulso de 200
microssegundos, com intensidade média de 18 miliamperes,
mantida abaixo do limiar motor, através de um canal e dois
eletrodos posicionados - um deles dois centímetros acima
do maléolo medial e o segundo eletrodo posicionado 10
centímetros acima. Foi observado que as fraldas passaram
a ser trocadas com menor freqüência, a paciente passou a
ter desejo miccional e melhor controle vesicoesfincteriano.
Dessa maneira verifica-se que a eletroestimulação do
nervo tibial posterior se mostra uma técnica não invasiva
e com resultados satisfatórios no tratamento de bexiga
neurogênica.
Palavras-chave
Incontinência urinária, Bexiga neurogênica, Eletroestimulação
do nervo tibial posterior.
Autoras
Débora Maciela Matielo
Graduanda do Curso de Fisioterapia
do Centro Universitário das Faculdades
Associadas de Ensino – FAE
e-mail:
[email protected]
Vanessa Dias César
Graduanda do Curso de Fisioterapia
do Centro Universitário das Faculdades
Associadas de Ensino – FAE
e-mail:
[email protected]
Laura Ferreira de Rezende Franco
Graduada em Fisioterapia pela PUCCampinas. Especialista em Fisioterapia
Aplicada à Saúde da Mulher pela UNICAMP,
Mestre e Doutora pela UNICAMP, Pósdoutoranda pela UNESP. Professora e
Coordenadora do Curso de Fisioterapia
do Centro Universitário das Faculdades
Associadas de Ensino – FAE
e-mail:
[email protected]
Recebido em 03/novembro/2009
Aprovado em 02/dezembro/2009
Pensamento Plural: Revista Científica do
, São João da Boa Vista, v.3, n.2, 2009
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MATIELO, D. M. CÉSAR, V. D. FRANCO, L. F. de R.
1. Introdução
O estímulo elétrico como forma de tratamento começou no Egito, com uma espécie de enguia elétrica encontrada no Rio Nilo. Hoje, existem vários aparelhos que geram correntes, mas o princípio para o tratamento continua
sendo um estímulo elétrico que é captado por receptores
sensitivos que se localizam na pele, despolarizam a membrana de células nervosas, e geram um potencial de ação
que despolariza a membrana celular, isto se a estimulação
for realizada e feita na duração e intensidade correta. O
estímulo vai então se propagar pela terminação nervosa, e
quando o potencial de ação chegar a junção neuromuscular, vai acontecer a abertura dos canais de cálcio que vão
em direção à membrana. Com isto ocorre o controle das
funções secretoras do neurônio que libera neurotransmissores na fenda sináptica. (MARQUES, 2008)
Os trabalhos de Magnus Fall, na Suécia, começaram a
descrever o uso da eletroterapia na reeducação esfincteriana e do assoalho pélvico. (MORENO, 2009). A eletroestimulação é uma alternativa no tratamento da incontinência
urinária e foi citada inicialmente por Cadwell, em 1963,
que fez uso de eletrodos de agulha implantados na musculatura periuretral. (RUBINSTEIN, 2001; MORENO, 2009).
Os resultados desta eletroestimulação se apresentam conflitantes. Os índices de cura variam de 30 a 50%, ocorrendo melhora dos sintomas em 6% a 90% das pacientes.
(HERRMANN et al, 2003)
A neuromodulação foi criada inicialmente por Schmidt
et al. (1979) e foi aprovado pelo Food and Drug Administration (FDA) em 1997 (MARQUES, 2008; MORENO,
2009). É um método cirúrgico através do qual é feita a
identificação de raízes sacrais, por estimulação direta,
geralmente em S2/S3, que é responsável pela inervação
esfincteriana. É implantado neste nível medular um eletrodo que está conectado a um gerador de pulso fixado na
região subcutânea da parede abdominal anterior, podendo
ser regulada por telemetria (BELLETTE, 2007; MARQUES,
2008; MORENO, 2009).
Durante a eletroestimulação as fibras motoras de S2
e S4 são excitadas seletivamente utilizando correntes de
baixa frequência que não alcançam limiar de outras fibras
aferentes e eferentes. Desta forma, a atividade simpática
do nervo hipogástrico é aumentada e a atividade parassimpática dos neurônios motores inferiores da bexiga é diminuída. Se a neuromodulação estiver ativada, ocorre inibição da contratilidade do detrusor e, quando interrompida,
dispara o reflexo da micção. (BELLETTE, 2007). As complicações desta técnica incluem infecções, vazamento de
líquor, deiscência, dor dentre várias outras complicações.
(MORENO, 2009). Além de ser uma forma de tratamento
totalmente invasiva, possui alto custo para ser empregada
e o tempo de funcionamento do dispositivo varia de 7 a 10
anos, e os sintomas parecem ocorrer rapidamente após o
fim da eletroestimulação. (SGROTT, 2007).
O tratamento da Incontinência Urinaria apresenta dificuldades relativas ao diagnóstico e conduta terapêutica.
Por esta razão, nos últimos anos, o tratamento não cirúrgico da IU vem ganhando maior projeção apresentando
maiores resultados com baixo índice de efeitos colaterais e
custo reduzido. (HERRMANN et al., 2003). O tratamento
cirúrgico não é efetivo em todos os casos, podendo ocorrer
recidiva dos sintomas antes de cinco anos. (BERNARDES et
al., 2000).
Isto indica a importância de buscar novas alternativas
que sejam mais eficazes no tratamento destas pacientes.
Além do treinamento vesical e do treinamento dos múscu-
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los do assoalho pélvico, a eletroestimulação no tratamento
da incontinência urinária vem sendo altamente utilizada,
com o surgimento de muitos novos estudos. (FRANCO et
a, s.d.).
A partir dos resultados satisfatórios obtidos com a eletroestimulação, cada vez menos invasivas, foram surgindo
novas propostas no sentido de alcançar a redução de sintomas miccionais com o menor desconforto possível para
o paciente. Considerando a inervação do plexo sacral e
a ramificação do nervo pudendo, pontos centrais do processo de eletroestimulação, surgiu em 2003, proposto por
Amarenco et al, a possibilidade de eletroestimulação do
nervo tibial posterior, assunto que será abordado em particular no item abaixo.
O tratamento com eletroestimulação é usado para
minimizar a atividade do músculo detrusor e fortalecer a
musculatura do assoalho pélvico. McGuire et al. (1983)
descreveu a eletroestimulação no nervo tibial posterior
como uma forma de tratamento pouco invasivo para incontinência urinária de urgência devido a hiperreflexia do
detrusor. Esta prática de estimulação foi baseada na medicina tradicional chinesa que utiliza pontos de acupuntura
para influenciar a atividade da bexiga, como pode ser visto
na figura abaixo. (SOL et al, 2008)
Figura 1: Atlas gráfico de Acupuntura
Fonte: MARQUES, 2008
Para estimulação do nervo tibial posterior, o ponto de
acupuntura utilizado foi o de Sanyinjiao (SP6), utilizado
como ponto de pressão para disfunções da bexiga, segundo a medicina chinesa. Este ponto está localizado aproximadamente cinco centímetros acima do maléolo medial,
entre a borda posterior da tíbia e o tendão do músculo
sóleo. (SOL et al., 2008; MARQUES, 2008)
As fibras aferentes do nervo pudendo (S2 a S4) podem
diminuir a hiperatividade do detrusor. O nervo tibial posterior contém fibras motoras e sensoriais, portanto é um
nervo misto. As suas raízes nervosas têm origem em L4 e
L5, S1 a S3, desta forma possuem inervações comuns às
da bexiga, e, consequentemente, tem origem dos mesmos
segmentos sacrais da inervação parassimpática vesical.
(SOL et al., 2008). Desta forma, a estimulação de forma
direta deste nervo deve inibir os aferentes S2-S4 suprindo a
atividade da bexiga. (SOL et al., 2008).
O plexo sacral é formado por L4-L5 e S1-S4, que são
ramos anteriores dos nervos espinhais, sendo situado, em
sua grande maioria, anteriormente ao sacro. Este plexo
vai inervar os músculos glúteos, do assoalho pélvico e dos
membros inferiores. Os ramos anteriores dos nervos espinhais S4-S5 mais os nervos coccígeos se unem formando o
Pensamento Plural: Revista Científica do
, São João da Boa Vista, v.3, n.2, 2009
Eletroestimulação do Nervo Tibial Posterior no Tratamento de Incontinência em Paciente com A. V. E.
plexo coccígeo, que inerva uma pequena área da pele na
região coccígea. (TORTORA, 2007)
O nervo isquiático (L4-S3) é o maior nervo do corpo e
se origina do plexo sacral. (TORTORA, 2007). Origina-se
na pelve através do forame isquiático maior, logo abaixo
do piriforme, passando entre trocânter maior e tuberosidade isquiática, dividindo nos nervos tibial e fibular comum,
próximo ao joelho. (WILLIAMS et al., 1995)
O nervo tibial (L4-S3) é o maior ramo do nervo isquiático, proveniente dos ramos ventrais do quarto e quinto
nervos lombares e do primeiro ao terceiro nervos sacrais.
Proximalmente está situado entre os músculos sóleo e gastrocnêmio, no terço distal é coberto somente por pele e
fáscias chegando algumas vezes sobreposto pelo músculo
flexor longo do hálux. Sua projeção superficial é uma linha situada na região mediana do membro, entre maléolo
medial e o tendão calcâneo, terminando em retináculos
flexores, que serão divididos em nervos plantares medial e
lateral. (WILLIAMS et al., 1995)
O nervo pudendo (S2-S4) deixa a pelve através do forame isquiático maior entre os músculos piriforme e coccígeo, para adentrar a região glútea. Este nervo dá origem
ao nervo retal inferior que se divide em nervo perineal e
nervo dorsal do pênis ou clitóris. Os músculos do assoalho
pélvico, lábios maiores e menores da vagina na mulher, e
no homem a pele do pênis, são inervados pelo nervo pudendo. (WILLIAMS et al., 1995). A lesão neste nervo, que é
aferente para os músculos do assoalho pélvico como para
o esfíncter peri-uretal, pode resultar no comprometimento
da integridade do assoalho pélvico, determinando assim a
incontinência urinária. (HERRMANN et al., 2003)
Portanto, a estimulação aferente do nervo tibial posterior inibe neurônios motores pré-ganglionares da bexiga
por uma raiz direta da medula sacral. (SOL et al, 2008).
Esta neuroestimulação sacral inibe a fibra C aferente da
bexiga em consequência da ativação somática das raízes
do nervo sacral. Como o nervo tibial posterior divide raízes
nervosas sacrais com aferentes da bexiga, a inibição dessas fibras C pode acontecer. (SOL et al., 2008). As fibras
C são um pequeno grupo de fibras não mielinizadas, que
ficam localizadas no urotélio, e têm grande importância no
controle da micção. (MARQUES, 2008).
A estimulação elétrica do nervo tibial posterior pode
ser uma alternativa no tratamento de bexiga hiperativa. No
começo a inibição do detrusor é realizada somente nos casos de uma contração involuntária, com isto a estimulação
elétrica é iniciada quando a pressão intravesical começa a
subir e pode ser interrompida quando a pressão retornar
aos seus valores normais. (FJORBACK et al., 2006).
Segundo MORENO (2009), a eletroestimulação do
nervo tibial posterior é bastante tolerada pelas pacientes,
além do que, não apresenta efeitos colaterais e o resultado
final é parecido com os tratamentos farmacológicos. É uma
técnica segura, sendo que somente alguns pacientes apresentaram eritema local. Desta forma a eletroestimulação
do nervo tibial posterior é um método terapêutico eficaz.
No tratamento das disfunções urinárias do trato inferior,
traz melhoras significativas nos sintomas de urgência, urgeincontinência, frequência urinária, noctúria, enurese e
capacidade cistométrica máxima.
Amarenco et al. (2003) teve grande contribuição no
estudo da eletroestimulação do nervo tibial posterior, descrevendo um protocolo efetivo. Em seus estudos foram
utilizados dois eletrodos auto-adesivos posicionados sobre
o tornozelo, o eletrodo negativo foi posicionado atrás do
maléolo medial e o eletrodo positivo 10 centímetros acima.
A posição correta do eletrodo negativo foi obtida através
Pensamento Plural: Revista Científica do
de uma corrente de um hertz (Hz), a fim de identificar corretamente o nervo tibial posterior. Esta posição é confirmada
com o movimento de flexão rítmica dos dedos. A frequência então é alterada para 10 Hz e largura de pulso de 200
microssegundos e a intensidade ajustada de acordo com
limiar de cada paciente, obedecendo o limiar de contração
motora.
A partir dessa ideia, o objetivo deste trabalho foi avaliar o efeito da eletroestimulação do nervo tibial posterior
no tratamento da incontinência urinária em pacientes com
bexiga neurogênica decorrente de lesão do sistema nervoso central. Para tanto, acompanhou-se a evolução do
tratamento de uma paciente com queixa de incontinência
urinária após acidente vascular encefálico.
2. Método: Estudo de Caso
Paciente M.A.D.P, sexo feminino, com 70 anos de idade, utilizando cadeira de rodas, chegou ao setor de Saúde
da Mulher da clínica-escola de Fisioterapia do Centro Universitário das Faculdades Associadas de Ensino -FAE, em
São João da Boa Vista-SP, no segundo semestre de 2005.
O acompanhamento foi realizado semanalmente – exceto
nos períodos de férias acadêmicas - até início do ano de
2007, quando a paciente foi a óbito.
Encaminhada pelo médico neurologista, apresentava
queixa de perda de urina. A história da moléstia pregressa
mostra que a paciente passou por episódio de AVE isquêmico e tinha como sequela hemiparesia espástica à direita,
além do aumento do tônus, ou seja, uma hipertonia provavelmente causada pela hipertensão arterial, que é principal
fator de risco para ocorrência de AVE. Devido ao fator de
risco pré-existente, faz uso do medicamento Hidantal, para
controle desta hipertensão arterial. A bexiga neurogênica
foi do tipo espástica branda, pois ocorreu lesão do córtex
cerebral.
Através do exame de ressonância magnética, pode-se
observar que a paciente teve uma extensa área de infarto
antigo envolvendo região dos gânglios da base, região insular e cápsula interna esquerda.
As cuidadoras, que são as filhas, relataram que a paciente não tem controle urinário nenhum e por esta razão,
faz o uso de fraldas descartáveis que são trocadas quatro
vezes ao dia em média. Possui bons hábitos intestinais, que
são voluntários. Foi entregue o diário miccional, que não
conseguiu ser preenchido pelas cuidadoras devido ao uso
de fraldas.
Foram realizadas nas sessões de fisioterapia o protocolo de Amarenco et al (2003), para tratamento para a incontinência urinária através da eletroestimulação do nervo
tibial posterior. O aparelho de eletroestimulação utilizado
foi da marca Dualpex 961, da Quark. No início da sessão
era realizado a uma frequência de 1 Hz para localização
do nervo tibial posterior, que era possível ser observado
com exatidão do seu ponto motor quando a paciente realizava flexão do hálux. Após a localização do nervo, a
sessão se iniciava a partir do posicionamento dos eletrodos
na borda medial do membro inferior esquerdo, um deles,
a cerca de dois centímetros acima do maléolo medial e
o segundo eletrodo posicionado a 10 centímetros acima,
conforme a figura 9. Após esse procedimento, passou-se a
utilizar uma frequência de 10 Hz, largura de pulso de 200
microssegundos, intensidade média de 18 miliamperes,
por um tempo de 30 minutos cada sessão.
Após cinco sessões de tratamento seguindo o protocolo
proposto, as cuidadoras relataram que a quantidade de
urina presente na fralda no período da tarde, já era em
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menor quantidade e que a paciente já conseguia prever
o início da micção, sendo assim a possível colocação de
uma comadre no quarto para que a utilização de fraldas
fosse cessando.
Após dez sessões as cuidadoras relatam que houve melhora significativa no quadro de incontinência urinária e
que as trocas de fraldas já estavam sendo realizadas em
menor quantidade, em torno de duas vezes ao dia.
Após o recesso de final de ano, no início de 2006 as
cuidadoras relataram que a perda de urina esteve ocorrendo em maior quantidade no período da noite, mas que
após o início do tratamento com a eletroestimulação do
nervo tibial posterior, as perdas de urina diminuíram. Após
outras seis sessões, realizadas no ano de 2006, a cuidadora relatou que a fralda estava praticamente seca a cada
troca, e que a paciente pede para levá-la ao banheiro. Foi
realizada a orientação para que a cuidadora a levasse ao
banheiro a cada três horas e, com isso, fosse diminuindo
cada vez mais o uso de fraldas descartáveis.
Após o recesso acadêmico do mês de julho, a paciente voltou para as sessões de fisioterapia e as cuidadoras
relataram que as trocas de fraldas estavam ocorrendo três
vezes ao dia, mostrando que a interrupção da eletroestimulação implica em piora do quadro urinário.
Em 2007, a paciente passou por um período de hospitalização, uma vez que encontrava-se desidratada e o
quadro de incontinência urinária apresentou uma piora.
Antes de ser hospitalizada a paciente tinha o controle fecal
e desejo miccional pedindo para levá-la ao banheiro; após
o episódio, as cuidadoras relataram que ela apresenta o
desejo miccional algumas vezes, mas voltou a perder urina
e fezes. A paciente foi a óbito alguns dias depois devido a
um novo episódio de AVE.
3. Discussão
A bexiga neurogênica da paciente foi causada por
lesões em núcleos da base, cápsula interna e região insular, trazendo perdas de urina frequentes, fazendo com
que a paciente passasse a utilizar fraldas diariamente. A
bexiga neurogênica do caso estudado foi do tipo espástica
branda, pois ocorreu lesão do córtex cerebral incompleta.
(MORITZ et al., 2005).
Tratar a incontinência urinária é um desafio para os
profissionais da saúde, especialmente as queixas provenientes de lesões cerebrais. A falta de estudos sobre a
eletroestimulação externa em pacientes neurológicos, faz
com que os tratamentos se tornem ainda mais complexos,
pois poucos profissionais da área de fisioterapia conhecem
essa possibilidade terapêutica. Estudos recentes trazem a
eletroestimulação do nervo tibial posterior como uma dessas possibilidades, podendo trazer benefícios para esses
pacientes.
O interesse do fisioterapeuta nos tratamentos de pacientes neurológicos ainda está muito relacionado a disfunções
motoras, sensitivas e funcionais, ficando outros tipos de sequelas em segundo plano, trazendo, assim, maiores dificuldades para a recuperação global do paciente. As queixas
urinárias só passam a ter importância quando se tornam um
incômodo para os pacientes e, principalmente, para os cuidadores, que a partir daí se mostram dispostos a agir junto
com a equipe de fisioterapia para que o desconforto desses
pacientes se torne menor.
A eletroestimulação do nervo tibial posterior pode ser
uma forma de tratamento devido a sua localização e inervação; a corrente elétrica inibe as contrações não inibidas do
detrusor e melhora as perdas urinárias frequentes.
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A eletroestimulação do nervo tibial posterior é uma
técnica pouco invasiva e com poucos efeitos colaterais. A
eletroestimulação intracavitária (vaginal ou anal) não se
mostra uma boa opção, uma vez que o tônus possivelmente
também encontra-se alterado na musculatura do assoalho
pélvico, dificultando a introdução e manutenção do eletrodo
durante a terapia.
Em relação ao estudo de caso observado nessa monografia, após o início do tratamento com eletroestimulação do
nervo tibial posterior, as trocas de fraldas foram diminuindo e
o desconforto urinário também, pois a paciente passou a referir desejo miccional. A eficácia deste tratamento é evidenciada pelo fato de que todas as vezes nas quais a paciente se
encontrava impossibilitada de comparecer à fisioterapia, os
distúrbios miccionais pioravam de forma significativa, fazendo com que as cuidadoras tivessem novamente que realizar
trocas de fraldas com maior frequência. Quando a paciente
voltava a realizar a eletroestimulação, os sintomas voltavam
a melhorar, trazendo resultados positivos.
A desvantagem deste tratamento é a necessidade de que
não seja interrompido, tornando-se crônico. Mas como já
foi observado anteriormente, para pacientes neurológicos,
esta nova técnica traz uma possibilidade de recuperação dos
sintomas miccionais de maneira segura, barata e, possivelmente eficiente, quando comparada a neuromodulação ou
eletroestimulação por eletrodos intravaginais ou anais.
A grande limitação deste estudo foi o acompanhamento
de um único estudo de caso, o que limita a ampliação dos
dados para uma população maior. O ideal seria fazer um
estudo randomizado, com tamanho de amostra maior.
Outra limitação encontrada é que a paciente utilizava
fralda, devido a sua incapacidade para ir ao banheiro. Esta
dificuldade encontrada não permitiu que fosse feito o diário
miccional, ficando, então, os resultados baseados em relatos feitos pelas cuidadoras.
Também não foi realizado o exame urodinâmico desta
paciente, pois o serviço público da cidade não oferece esta
possibilidade de avaliação, limitando mais uma vez a avaliação dos resultados do tratamento.
Em contrapartida, pode-se observar muitas vantagens
a partir deste estudo, dentre estas, destaca-se a possibilidade de novas técnicas na área de fisioterapia, a partir do
qual pode-se obter resultados satisfatórios com a eletroestimulação externa em pacientes neurológicos com bexiga
hiperativa. Para que se tenham bons resultados, entretanto,
é necessário um acompanhamento longo destas pacientes.
A grande possibilidade levantada a partir desse estudo é a
melhora na qualidade de vida, tanto da paciente, quanto da
família, pois com a diminuição das perdas urinárias é possível uma reintegração social com melhora da auto-estima,
da motivação e da satisfação da paciente.
Para a profissão de fisioterapia é mais uma possibilidade
a ser utilizada no intuito de buscar a recuperação do paciente neurológico, ampliando as áreas de atuação e as opções
profissionais no mercado de trabalho.
4. Considerações finais
A técnica de eletroestimulação do nervo tibial posterior
mostrou-se viável no tratamento de incontinência urinária
devido à bexiga neurogênica. Esta vem se tornando uma
alternativa satisfatória e eficaz no tratamento das disfunções miccionais, devido aos resultados obtidos. Entretanto,
são necessários mais estudos evidenciando a utilização da
mesma em relação às pacientes com bexiga neurogênica,
a fim de melhorar sua qualidade de vida e torná-las menos
dependentes de seus cuidadores.
Pensamento Plural: Revista Científica do
, São João da Boa Vista, v.3, n.2, 2009
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Abstract
WILLIAMS et al. Gray Anatomia. 37. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan S.A., 1995.
The accident vascular encephalic (AVE) is one of pathologies more common and is the third mmajor cause of
mortality in third world countries. It is estimated that occur 20 million new cases in the world by year. The sequelae
left by this disease depends on the affected area and the size of injury. The more common changes are in motor,
sensory and speech dysfunctions and in urinary continence maintenance. Neurogenic bladder refers to dysfunction
of the urinary bladder due to disease of the central nervous system or peripheral nerves involved in the control
of micturition. The treatments available include medication and invasive techniques. This work was made with
the purpose of assess the effects, of external electrostimulation of the posterior tibial nerve in urinary continence
of patient with neurogenic bladder post-AVE through the observation of a patient treatment during two years.
The treatment consist in the electrostimulation of the posterior tibial nerve, for 30 minutes, once a week, with a
frequency of 10 Hz and pulse width of 200 microseconds, with average intensity of 18 mA, kept below the motor
threshold, through a channel and two electrodes positioned – one, two centimeters above of the medial malleolus
and the second electrode positioned 10 centimeters above. It was observed that the diapers were changed with
less frequency and the patient started to manifest voiding desire and better vesicouretral control. Thus it is verified
that electrostimulation of the posterior tibial nerve may be considered as a noninvasive technique with satisfactory
results in treatment of the neurogenic bladder.
Key words
Urinary continence, Neurogenic bladder, Electrostimulation of the posterior tibial nerve.
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