JANETE TAMAMI TOMIYOSHI NAKAGAWA AVALIAÇÃO DO PROGRAMA NACIONAL DE CONTROLE DO CÂNCER DO COLO DO ÚTERO NO ESTADO DE MATO GROSSO: IMPACTO SOBRE O PERFIL DA DOENÇA Tese apresentada à Universidade Federal de São Paulo para obtenção do título de Doutor em Ciências SÃO PAULO 2009 JANETE TAMAMI TOMIYOSHI NAKAGAWA AVALIAÇÃO DO PROGRAMA NACIONAL DE CONTROLE DO CÂNCER DO COLO DO ÚTERO NO ESTADO DE MATO GROSSO: IMPACTO SOBRE O PERFIL DA DOENÇA Tese apresentada à Universidade Federal de São Paulo para obtenção do título de Doutor em Ciências Orientadora: Dra. Janine Schirmer Co-orientadora: Dra. Márcia Barbieri SÃO PAULO 2009 Nakagawa, Janete Tamami Tomiyoshi Avaliação do Programa Nacional de Controle do Câncer do Colo do Útero no Estado de Mato Grosso: impacto sobre o perfil da doença. / Janete Tamami Tomiyoshi Nakagawa.- São Paulo, 2009. xxi, 124 f. Tese (Doutorado) Universidade Federal de São Paulo. Escola Paulista de Enfermagem. Programa de Pós-graduação em Ciências. Título em inglês: Evaluation of the National Program for the Prevention of Cervical Cancer: impact on the disease profile. 1. Câncer do colo do útero 2.Prevenção 3.Exame citológico (Papanicolaou) 4. Taxa de sobrevivência DEDICATÓRIA A todas as mulheres brasileiras que foram vítimas do câncer do colo de útero... iii AGRADECIMENTOS À Prof.ª Dra. Janine Schirmer, pelos ensinamentos, atenção carinhosa e apoio em todos os momentos que estive sob sua orientação. À Prof.ª Márcia Barbieri, pelo apoio e dedicação na co-orientação. Aos membros da banca de defesa: Dra. Neuci, Dr. Ismael Silva, Dra Maria Cristina Gabrielloni, Dra. Gislaine Kamiá, pela enorme contribuição. A todos os membros da equipe da Coordenação Estadual do Câncer da SES/MT e, em especial, à Enf. Solange, Enf. Adenildes, Enf. Ellen e Dr. Ney Pereira, pelo apoio e pelo “coração aberto e acochegante”. Ao Dr. Víctor Rodrigues, pelo apoio e confiança que nos ofereceu em todos os momentos que precisamos. À Secretaria do Estado de Saúde do Mato Grosso e Secretaria Municipal de Saúde, por ter autorizado a coleta de dados nas Unidades de Saúde. À Universidade Federal de Mato Grosso e a Faculdade de Enfermagem/UFMT, pelo apoio permanente. À Universidade Federal de São Paulo, por ter aceitado o projeto de doutorado (DINTER). À FAPEMAT, pela concessão de bolsas de pesquisa e financiamento do projeto de pesquisa. À Prof.ª Dra. Dulce Barbosa e Prof.ª Dra. Edir Nei Mandú, por viabilizar o projeto DINTER. À Prof.ª Dra. Áurea Christina Corrêa, pela dedicação na coordenação do DINTER. iv A toda equipe de professores do DINTER, em especial, Prof.ª Dra. Maria Gaby Gutierrez, Prof.ª Dra. Ana Brêtas e Prof.ª Dra. Sonia Barros, pelos sábios ensinamentos... Ao meu querido Prof. Dr. Neil Novo, pelas aulas de bioestatística e ao Prof. Mariano Martinez, por ter ajudado na análise estatística. À Prof.ª Maria do Rosário Latorre por ter me aceitado como aluna especial. À “teacher” Odila Watzel, pelos ensinamentos de inglês e traduções. À equipe administrativa da Faculdade de Enfermagem da UNIFESP, que sempre nos apoiou nos processos administrativos. As minhas queridas amigas do doutorado, Neuma, Silvana, Priscila, Cida Vieira, Walquíria, Rosângela, Conceição e Cláudia Junqueira pela constante ajuda e pela linda amizade que nos manteve unidas. A todos os meus colegas do DINTER, pela companhia e atenção. Às minhas queridas amigas Soninha e Neuci, que sempre me acompanhou nesta caminhada. À minha mãe, pelo carinho. Ao Henry, meu esposo, que sempre esteve, incansavelmente e carinhosamente, me apoiando para viabilizar o desenvolvimento do meu estudo e deste trabalho. A todas as mulheres que fizeram parte deste estudo. Aos meus queridos filhos Aline, Rodrigo e Érika, que souberam entender meus longos períodos de ausência, mas sempre estiveram presentes quando eu precisei. Vocês foram super-heróis nesta luta e obrigado por estarem sempre comigo, principalmente nos momentos difíceis... Sobretudo, a Deus, por estar sempre me acompanhando... v “Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo”. Paulo Freire vi RESUMO AVALIAÇÃO DO PROGRAMA NACIONAL DE CONTROLE DO CÂNCER DO COLO DO ÚTERO NO ESTADO DE MATO GROSSO: IMPACTO SOBRE O PERFIL DA DOENÇA. Em 2002, o Estado de Mato Grosso aderiu à segunda fase de intensificação Programa Nacional de Controle do Câncer do Colo do Útero (PNCCU) como medida de enfrentamento das altas taxas da doença e de morte por neoplasia cervical. Com o objetivo de analisar os principais resultados do PNCCU, foi feito um estudo em duas partes. A primeira parte teve como objetivo levantar o perfil da doença e a cobertura do exame rastreamento pelo PNCCU no Estado. Os objetivos da segunda parte foram: analisar o seguimento clínico da população rastreada, analisar as diferentes características evolutivas da doença associadas aos fatores sócio-demográficos e clínicos, bem como analisar o risco de óbito e a taxa de sobrevida estratificada pelas variáveis sócio-demográficas e clínicas das mulheres que apresentaram carcinoma invasivo. Na primeira parte, foi utilizado estudo do tipo transversal e na segunda parte, foi realizado um estudo de coorte. O período do estudo compreendeu de 2002 a 2007 e abrangeu todos os municípios do Estado de Mato Grosso. A população estudada na primeira fase do estudo correspondeu todas as mulheres que fizeram o exame de rastreamento no ano de 2002. Na segunda parte do estudo, a população correspondeu a uma amostra aleatória representativa das mulheres que apresentaram alterações citológicas na primeira fase do estudo, totalizando 323 mulheres. A fonte de dados utilizada foi o sistema de informação oficial de saúde, dentre eles o SISCOLO, SIM, APAC, além de dados oficiais da Secretaria Estadual de Saúde/MT (SES/MT), dados disponíveis no site do INCA e do DATASUS e prontuários clínicos. Para análise estatística dos dados foram utilizadas técnicas descritivas e inferenciais. Na parte descritiva foram utilizados tabelas, gráficos e medidas de posição e de dispersão. Para avaliar a o risco de adoecer por carcinoma cervical invasor foi utilizado regressão logística univariada e multivariada. Para analisar a taxa de sobrevida global foi utilizado o estimador de Kaplan-Meier e para analisar os fatores prognósticos, foi utilizado o modelo de riscos proporcionais de Cox. Dentre os principais resultados, destaca-se que no período estudado, Mato Grosso apresentou taxas de vii incidência elevadas, acima da média nacional. Os dados do seguimento clínico mostraram os diferentes desfechos, dentre eles, destaca-se que: entre as 323 mulheres, 18 (6,2%) foram a óbito tendo o câncer do colo do útero como causa básica da morte. Foi analisado o risco de a doença evoluir para o carcinoma invasor, segundo as variáveis sócio-demográficas e clínicas, sendo que as variáveis: faixa etária, estado civil, tabagismo, menarca e município foram as que apresentaram forte associação com a doença na fase invasora. Já na análise de sobrevivência, a taxa de sobrevida global em 60 meses, estimada pelo método de KaplanMeier, foi de 66,7%. No modelo final de risco proporcional de Cox, as variáveis com maior risco de óbito foi o estágio avançado da doença e a raça/cor. Estes dados levam a concluir que a doença no Estado de Mato Grosso tem uma determinação social muito grande, considerando a dificuldade de acesso aos serviços de saúde da população desfavorecida pelas condições raciais, sócio-econômicas, e chegam aos serviços com a doença em fase adiantada, quando a chance de sobrevivência é muito pequena. Conclui-se que para o efetivo combate a doença são necessárias políticas governamentais, como o PNCCU, que garantam a universalidade da assistência, principalmente da população desfavorecida socialmente. Descritores: Câncer do colo do útero – Prevenção - Exame citológico (Papanicolaou) – Taxa de sobrevivência viii ABSTRACT EVALUATION OF THE NATIONAL PROGRAM FOR THE PREVENTION OF CERVICAL CANCER: IMPACT ON THE DISEASE PROFILE In 2002, the State joined the second phase of intensification of the National Program for the Control of Cervical Cancer (PNCCU) as a measure to deal with the high rates of the disease and of death by cervical neoplasia. With the aim of analyzing the main PNCCU results, a two-stage study was carried out. The first phase aimed at presenting the disease profile and the coverage of the screening exam by the PNCCU in the State. The aims of the second phase were to analyze the clinical follow-up of the population that was screened, analyze the different evolutionary characteristics of the disease associated to sociodemographic and clinic factors, as well as analyze the factors associated to death risk and the stratified survival rate by the socio-demographic and clinical variables of women that presented invasive carcinoma. In the first part, the cross-sectional study was used and a cohort study was used in the second phase. The period of study was from 2002 to 2007 and comprised all the municipalities of the State of Mato Grosso. The population studied in the first phase of the study was all the women who had undergone the screening test in 2002. The population used in the second phase of the study was a representative random sample of those that presented cytological alterations in the first phase of the study, a total of 323 women. The source of data used was the official health information system, among them the SISCOLO, SIM, APAC, and also the official data of the State Health Department/MT (SES/MT), data available in the INCA and DATASUS sites and medical records. For the statistical analysis of the data, descriptive and inferential techniques were used. In the descriptive part, tables, graphics and position and dispersion measures were used. In order to evaluate the risk of being sick due to invasive cervical carcinoma, the univariate and multivariate logistic regression analysis was used. The Kaplan-Meier estimator was used to analyze the survival rate and to analyze the prognostic factors, the Cox proportional hazards model was used. Among the main results it is highlighted that in 2002, Mato Grosso presented high incidence rates, above the national average. The data of the clinical followix up showed the different clinical outcomes, among the 323 women, 18 (6,2%) died having as the basic cause of death the cervical cancer. The risk of the disease developing into the invasive carcinoma was analyzed according to the socio-demographic and clinical variables, and the variables: age group, marital status, smoking history, menopause and municipality were those that presented a strong association with the disease in the invasive phase. However, in the survival analysis, the global survival rate in 60 months, estimated by the Kaplan-Meier method, was of 66,7%. In the final Cox proportional hazards model, the variables with higher death risk was the advanced stage of the disease and the race/color. These data lead to a conclusion that the disease in the State of Mato Grosso has a very large social determination, considering the difficulties in the access to the health services by the population affected by racial, socio-economic conditions that arrive in the health services with the disease in an advanced stage, when the survival probability is very small. The conclusion is that for the effective fight against the disease governmental policies such as the PNCCU are necessary, and that the universality of the assistance be guaranteed, mainly to the socially disadvantaged population. Key-words: Cervical neoplasia – Prevention - Cytological exam (Pap test) - Survival rate x LISTA DE FIGURAS Pág. Figura 01- Taxa de Mortalidade Específica (TME) e Taxa de Incidência, por 100.000 mulheres, por neoplasia de colo de útero, no Estado de Mato Grosso no período de 2000 - 2007................................................................................ 37 Figura 02– Total de citologias realizadas no Estado de Mato Grosso, no período de 2000 - 2005. .................................................................................................... 37 Figura 03 – Razão entre o número de citologias realizadas em mulheres entre 25 a 59 anos em relação à população total do local da mesma faixa etária. Mato Grosso, 2002-2007. ..................................................................................... 38 Figura 04 – Distribuição das mulheres que apresentaram alterações citológicas segundo faixa etária. Mato Grosso, 2002. ............................................................ 42 Figura 05– Distribuição das mulheres que apresentaram alterações citológicas segundo raça/cor. Mato Grosso, 2002. ................................................................ 42 Figura 06– Tipos de tratamentos em que as mulheres submeteram nos serviços de referência terciária. Mato Grosso, 2002. ........................................... 46 Figura 07- Proporção de tratamentos realizados no decorrer do tempo (meses) de seguimento clínico. Mato Grosso, 2002. ......................................................... 47 Figura 08 – Curva de sobrevida acumulada das mulheres com carcinoma invasivo. Mato Grosso, 2002. ............................................................................... 67 Figura 09 – Taxa de sobrevida acumulada segundo faixa etária. Mato Grosso, 2002. .................................................................................................................... 70 Figura 10- Taxa de sobrevida acumulada segundo raça/cor. Mato Grosso, 2002. ..................................................................................................................... 71 Figura 11 - Taxa de sobrevida acumulada segundo município de residência. Mato Grosso, 2002................................................................................................ 72 Figura 12 - Taxa de sobrevida acumulada segundo ocupação. Mato Grosso, 2002. ..................................................................................................................... 73 Figura 13 - Taxa de sobrevida acumulada segundo sintomas/queixas referida. xi Mato Grosso, 2002................................................................................................ 74 Figura 14 - Taxa de sobrevida acumulada segundo resultado da colposcopia. Mato Grosso, 2002................................................................................................ 75 Figura 15 - Taxa de sobrevida acumulada segundo presença ou ausência de tumor vegetante. Mato Grosso, 2002................................................................... 76 Figura 16 - Taxa de sobrevida acumulada segundo recidiva da doença. Mato Grosso, 2002.......................................................................................................... 77 Figura 17 - Taxa de sobrevida acumulada segundo tempo de início do tratamento. Mato Grosso, 2002............................................................................ 78 Figura 18 - Taxa de sobrevida acumulada segundo extensão da doença. Mato Grosso, 2002. ........................................................................................................ 79 xii LISTA DE QUADROS Quadro 01 - Estadiamento proposto pela Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (FIGO)........................................................................... 28 xiii LISTA DE TABELAS Pág Tabela 01 – Número de mulheres com alterações celulares no Estado de Mato Grosso. Mato Grosso, 2002..................................................................................... 19 Tabela 02 – Tamanho de população ( N i* ), fração observada ( f i ) e tamanho de amostra aproximado ( n i ) para os dados da Tabela 1, conforme a alteração citológica.................................................................................................................. 21 Tabela 03 – Distribuição da amostra segundo classificação citológica. Mato Grosso, 2002............................................................................................................ 21 Tabela 04 – Classificação da doença segundo resultados da histologia. Mato Grosso, 2002............................................................................................................ 23 Tabela 05 – Distribuição da idade, por faixa etária, das mulheres que realizaram o exame citológico no Estado de Mato Grosso em 2002......................................................................................................................... 35 Tabela 06 – Tipo de alterações citológicas detectadas no exame citológico realizados no Estado de Mato Grosso, no ano de 2002.......................................................................................................................... 36 Tabela 07 – Nível de adequabilidade dos esfregaços cérvico-uterino do Estado de Mato Grosso, 2002.............................................................................................. 39 Tabela 08 – Caracterização da amostra populacional, segundo as variáveis sóciodemográficas da amostra populacional. Mato Grosso, 2002.......................................................................................................................... 41 Tabela 09 – Distribuição das variáveis gineco-obstétricas da amostra populacional. Mato Grosso, 2002. .......................................................................... 43 Tabela 10 – Número de mulheres com NIC I que fizeram (ou não) o seguimento citológico. Mato Grosso, 2002. ............................................................................... 44 Tabela 11 – Tempo (meses) de regressão das lesões (NIC I), durante o seguimento citológico. Mato Grosso, 2002.............................................................. 45 Tabela 12 – Tempo (meses) decorrido entre o exame de rastreamento e exame confirmatório/tratamento. Mato Grosso, 2002....................................................... 47 xiv Tabela 13 – Descrição do seguimento clínico das mulheres que apresentaram alterações citológicas. Mato Grosso, 2002............................................................... 48 Tabela 14 – Proporção de tratamentos concluídos ou não, durante o tratamento clínico-cirúrgico, entre as mulheres que apresentaram alterações citológicas. Mato Grosso, 2002................................................................................................... 49 Tabela 15 – Distribuição dos diferentes desfechos clínicos das mulheres em tratamento para o câncer do colo do útero. Mato Grosso, 2002.......................................................................................................................... 49 Tabela 16 – Concordância entre o exame citológico x histopatológico. Mato Grosso, 2002. ........................................................................................................... 50 Tabela 17 – Nível de concordância entre a citologia x histopatologia, valor de Kappa, p-valor. Mato Grosso, 2002. ....................................................................... 51 Tabela 18 – Concordância dos exames de citologia x histologia em LBG (NICI) segundo laudo citológico. Mato Grosso, 2002. ....................................................... 51 Tabela 19 – Concordância dos exames de citologia x histologia em LAG (NICII/NICIII/Ca in situ) segundo laudo citológico. Mato Grosso, 2002.................... 52 Tabela 20 – Concordância dos exames de citologia x histologia em Carcinomas Invasivos segundo laudo citológico. Mato Grosso, 2002. ....................................... 52 Tabela 21 – Exames de citologia x colposcopia. Mato Grosso, 2002...................... 53 Tabela 22 – Nível de concordância entre exame de citologia e colposcopia, Teste de Kappa e valor-p. Mato Grosso, 2002................................................................... 53 Tabela 23 – Resultado dos exames de histopatológico das mulheres que apresentaram colposcopia alterados. Mato Grosso, 2002...................................... 54 Tabela 24 – Diagnóstico histológico por faixa etária. Mato Grosso, 2002............... 55 Tabela 25 – Diagnóstico histológico por estado civil. Mato Grosso, 2002............... 55 Tabela 26 – Diagnóstico histológico segundo raça/cor. Mato Grosso, 2002.......... 56 Tabela 27 – Diagnóstico histológico segundo município de residência. Mato Grosso, 2002. ........................................................................................................... 57 Tabela 28 – Diagnóstico histológico segundo ocupação. Mato Grosso, 2002........ 58 xv Tabela 29 – Diagnóstico histológico segundo condição de tabagismo. Mato Grosso, 2002. .......................................................................................................... 58 Tabela 30 – Diagnóstico histológico segundo idade na menarca. Mato Grosso, 2002. ........................................................................................................................ 59 Tabela 31 – Diagnóstico histológico segundo uso ou não de métodos contraceptivos. Mato Grosso, 2002........................................................................ 60 Tabela 32 – Diagnóstico histológico segundo tipo de método contraceptivo. Mato Grosso, 2002. ................................................................................................ 61 Tabela 33 – Diagnóstico histológico segundo paridade. Mato Grosso, 2002......... 61 Tabela 34 – Variáveis, coeficientes, erro padrão dos coeficientes, teste de Wald, nível de significância (p), razão de chances (OR) e IC 95% do modelo logístico univariado. Mato Grosso, 2002................................................................................ 63 Tabela 35 – Variáveis, coeficientes, erro padrão dos coeficientes, teste de Wald, nível de significância (p-valor), razão de chances (OR) e IC 95% do modelo logístico múltiplo ajustado. Mato Grosso, 2002. ..................................................... 64 Tabela 36 – Distribuição da extensão da doença e o tempo decorrido entre a suspeita da doença e o início do tratamento das mulheres que apresentaram carcinoma invasivo. Mato Grosso, 2002.................................................................. 66 Tabela 37 – Análise univariada estratificada da sobrevida global segundo variáveis sócio-demográficas e clínicas. Mato Grosso, 2002. ................................. 68 Tabela 38 - Análise multivariada entre o risco de óbito e fatores prognósticos das mulheres com carcinoma invasivo, RR entre as categorias e seu respectivo valor de p. Mato Grosso, 2002................................................................................. 69 Tabela 39 - Modelo final da análise multivariada entre o risco de óbito e fatores prognósticos das mulheres com carcinoma invasor, com RR de óbito, seus respectivos IC de 95% e níveis de significância estatística (valor de p). Mato Grosso, 2002. ........................................................................................................... 80 xvi LISTA DE ABREVIATURAS AGUS - Atipias de Significado Indeterminado em Células Glandulares ASCUS - Atipias de Significado Indeterminado em Células Escamosas Ca in situ – Carcinoma in situ CACON - Centro de Alta Complexidade em Oncologia CAF – Cirurgia de Alta Frequencia CEP/HUJM-UFMT - Comitê de Ética e Pesquisa/Hospital Universitário Julio Muller Universidade Federal de Mato Grosso CEP/UNIFESP - Comitê de Ética e Pesquisa/Universidade Federal de São Paulo DO - declaração de óbito ERS – Escritório Regional de Saúde FIGO - Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (FIGO) HPV – Papiloma Vírus Humano IARC - International Agency for Research on Cancer IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IC – Intervalo de confiança ICESCC- International Collaboration of Epidemiological Studies of Cervical Cancer IFCPC - Internacional Federation for Cervical Pathology and Colposcopy INCA - Instituto Nacional do Câncer LAG - Lesão Intra-epitelial de Alto Grau LBG - Lesão Intra-epitelial de Baixo Grau MS - Ministério da Saúde MT – Mato Grosso NCI - National Cancer Institute NIC I - Neoplasia Intra-epitelial Cervical Grau I NIC II- Neoplasia Intra-epitelial Cervical Grau II NIC III - Neoplasia Intra-epitelial Cervical Grau III OMS - Organização Mundial de Saúde OPAS - Organização Pan-Americana de Saúde xvii OR – Odds Ratio PNCCU - Programa Nacional de Controle do Câncer do Colo do Útero RR – Risco Relativo SEER - Surveillance Epidemiology and End Results SES/MT - Secretaria de Estado de Saúde do Estado de Mato Grosso SIA/APAC - (Sistema de Informação Ambulatorial/Autorização de Procedimento de Alta Complexidade), SIM - Sistema de Informação sobre Mortalidade SISCOLO - Sistema de Informação do Colo do Útero SUS – Sistema Único de Saúde TI - Taxa de Incidência TME - Taxa de Mortalidade Específica TNM – Tumor, Nódulo, Metaplasia UBS - Unidade Básica de Saúde UICC - União Internacional Contra o Câncer VPN - Valor Preditivo Negativo VPP - Valor Preditivo Positivo xviii SUMÁRIO Pág. Dedicatória iii Agradecimentos iv RESUMO vii ABSTRACT ix Lista de Figuras xi Lista de Quadros xiii Lista de Tabelas xiv Lista de Abreviaturas xvii 1. INTRODUÇÃO..................................................................................................... 01 2. REVISÃO DE LITERATURA............................................................................... 04 2.1 Conceito, manifestação clínica do câncer de colo uterino e classificações citológicas.................................................................................................... 2.2 Vírus HPV como maior agente etiológico do câncer do colo do útero.................................................................................................................. 2.3 04 06 Estimativa do câncer do colo do útero no mundo, na América Latina e Caribe: incidência, mortalidade e tendências atuais......................................... 07 Co-fatores no desenvolvimento do câncer do colo de útero............................. 09 2.4.1 Tabagismo........................................................................................... 09 2.4.2 Paridade.................................................................................................. 11 2.4.3 Contraceptivos Hormonais Orais............................................................. 11 2.5 Outros agentes de transmissão sexual que atuam como co-fator.................... 12 2.6 Determinantes sociais, econômicos e culturais do câncer do colo do 2.4 útero.................................................................................................................. 13 2.7 Fatores de exposição ao vírus HPV.................................................................... 15 3 OBJETIVOS.......................................................................................................... 17 4 MÉTODO............................................................................................................ 18 xix 4.1 Tipo de estudo................................................................................................... 18 4.2 Local e período de estudo.................................................................................. 18 4.3 População a ser estudada/planejamento amostral........................................... 18 4.3.1 Cálculo da amostragem............................................................................ 19 4.3.2 Determinação do tamanho da amostra................................................... 19 4.4 Tamanho da amostra no seguimento clínico, conforme o fluxo de atendimento em diferentes níveis de atenção ................................................. 22 4.4.1 Amostra populacional do primeiro nível de atenção............,................... 22 4.4.2 Amostra populacional do segundo nível de atenção................................ 22 4.4.3 Amostra populacional do terceiro nível de atenção................................ 23 Variáveis............................................................................................................. 24 4.5.1 Variáveis independentes........................................................................... 24 4.5.2 Variáveis dependentes.............................................................................. 24 4.6 Fonte e coleta de dados..................................................................................... 25 4.7 Critérios de inclusão e de exclusão. .................................................................. 25 4.8 Condutas clínicas e classificações/estadiamento utilizados como parâmetro 4.5 no estudo........................................................................................................... 26 4.8.1 Conduta clínica adotada pelo INCA/MS.................................................... 26 4.8.2 Classificações e estadiamentos................................................................ 27 Eventos estudados............................................................................................. 29 4.10 Análise estatística.............................................................................................. 30 4.10.1 Análise de regressão logística................................................................. 30 4.10.2 Análise de sobrevida............................................................................... 32 4.11 Limitações do estudo......................................................................................... 34 4.12 Aspectos éticos da pesquisa.............................................................................. 34 5 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS................................................................... 35 5.1 Prevenção do câncer do colo do útero no Estado de Mato Grosso em 2002: 4.9 principais resultados......................................................................................... 35 5.2 Perfil da produção dos esfregaços cérvico-uterino........................................... 37 5.3 Seguimento clínico............................................................................................. 40 xx 5.3.1 Caracterização das mulheres com alterações celulares........................... 40 5.3.2 Seguimento clínico e tratamento para o câncer...................................... 44 5.4 Nível de concordância entre os exames utilizados para o rastreamento e o diagnóstico da doença....................................................................................... 50 5.5 Variáveis associadas ao grau de gravidade da doença...................................... 54 5.6 Análise de sobrevida.......................................................................................... 66 6. DISCUSSÃO DOS DADOS..................................................................................... 81 6.1 Cobertura do exame citológico - parâmetros de avaliação do PNCCU.............. 81 6.2 Perfil da produção do exame de rastreamento do PNCCU................................ 86 6.3 Seguimento clínico............................................................................................. 88 6.4 Fatores associados ao risco de adoecer por câncer do colo do útero............... 94 6.5 Análise da taxa de sobrevida............................................................................ 100 7 CONCLUSÃO...................................................................................................... 106 REFERÊNCIAS............................................................................................................... 110 ANEXOS....................................................................................................................... 119 xxi 1 INTRODUÇÃO O Estado de Mato Grosso está situado no centro de uma importante área geográfica do Brasil, com uma riqueza ecológica natural distribuída nas regiões do cerrado, pela mata amazônica e pelo sistema pantaneiro. Além da riqueza ambiental, possui uma diversidade etnográfica na sua população, composta de pessoas provindas de outras regiões do país, tudo isso, somado às pessoas nativas, que definem as características culturais da região. Apresenta também uma riqueza de recursos minerais, que historicamente, motivaram o processo de ocupação do Estado. Possui uma vasta extensão territorial, e a sua ocupação se intensificou na década de 70, quando houve uma política de incentivo à ocupação do Estado. O governo destinava a distribuição de lotes de terras para assentamento de colonos e pequenos produtores vindos de outras regiões do Brasil, além de oferecer incentivos, inclusive financeiros1. O autor, ainda relata que isto demarcou frentes de colonização e de ocupação econômica que promoveram migrações desordenadas, desflorestamento e exploração predatória de recursos naturais, incluindo a extração do ouro e da madeira, em todo o território do Estado. Atualmente, o Estado destaca-se como um importante centro agro-pecuário, com expansão das fronteiras territoriais, principalmente no norte do Estado. No entanto, esse modelo de expansão do sistema agrário e pecuário tem desfavorecido o crescimento de pequenos colonizadores, acentuando o contraste social entre as diferentes camadas da população mato-grossense. Além do contraste social, existem, no Estado, regiões bem sucedidas, contrapondo com regiões que têm dificuldade de crescimento econômico, não oferecendo atrativos para a sua ocupação, por faltar investimentos em infra-estrutura básica e em setores essenciais como a saúde. Essa desigualdade de desenvolvimento econômico nas diferentes partes do Estado se revela na incidência e na distribuição da mortalidade por câncer do colo do útero, por atingir mais a população com menor nível econômico. Mostra também as diferenças culturais, principalmente na esfera sexual, pelo câncer ser um doença que tem como principal fator etiológico o Papiloma Vírus Humano (vírus HPV) que é veiculado por meio de contacto sexual. Além disso, a barreira cultural dificulta o exame de rastreamento do câncer cervical, principalmente nos grupos populacionais fechados, como nas aldeias indígenas e em zonas rurais ou localidades de difícil acesso, que representam o grupo de maior vulnerabilidade para a doença pelo fato de existir mulheres que nunca realizaram o exame de prevenção de câncer do colo uterino. O câncer do colo do útero representa a neoplasia mais comum em áreas menos desenvolvidas, principalmente na região Norte do país, incluindo parte do Estado de Mato Grosso. No Brasil, é a segunda causa de morte por neoplasia no grupo feminino. No Estado de Mato Grosso, estimou-se, em 2008, uma taxa bruta da doença de 17,94 casos por 100.000 mulheres ou 260 casos novos, enquanto que no município de Cuiabá, capital do Estado, a taxa bruta da doença foi estimada em 17,75 por 100.000 mulheres, com 50 casos novos2. Ressalta-se que a distribuição da doença se dá de forma heterogênea nas diferentes regiões do Estado. Desde 1998, diante da alta incidência e mortalidade por neoplasia cervical, a redução da doença passou a ser uma das prioridades da Política de Saúde do Estado de Mato Grosso, quando houve a expansão nacional do projeto denominado “Viva Mulher”. Esse projeto, mais tarde, subsidiou o Programa Nacional de Controle do Câncer do Colo do Útero (PNCCU), que previa, entre outras ações, a mobilização e a busca ativa das mulheres alvo, o exame citológico, o controle de qualidade e o tratamento dos casos positivos 3. O Ministério da Saúde (MS), ao planejar o PNCCU, estrategicamente, convocou entidades representativas da Enfermagem para estabelecer uma parceria para o combate e controle da doença, buscando a participação da categoria profissional nos diferentes níveis de atenção, para que ações de convocação da população feminina para o exame de rastreamento, acolhimento da mulher nos serviços de saúde, coleta do material cérvicouterino, busca ativa das mulheres faltosas e organização do fluxo de atendimento, entre outras ações, fossem realizadas em todo o território brasileiro. Desde então, em Mato Grosso, a Enfermagem faz parte da história no combate à doença e têm desempenhado relevante papel na Atenção Básica, bem como nos serviços de referência de média e alta complexidade. A partir da implantação do PNCCU no Estado de Mato Grosso, a Secretaria do Estado de Saúde do Mato Grosso e a Universidade Federal de Mato Grosso têm sido parceiras no 2 combate a doença. Desde então, o tema foi inserido de forma regular na formação profissional do enfermeiro, com enfoque na prevenção e no controle da doença. Com a implantação do PNCCU no Estado, os resultados dos exames citológicos e histológicos, bem como os procedimentos autorizados de média e alta complexidade para o seguimento clínico das lesões precursoras ou do carcinoma são continuamente armazenados no banco de dados da Secretaria do Estado de Saúde/MT (SES/MT), alimentando o Sistema de Informação do Colo do Útero (SISCOLO) e de Autorização de Procedimentos de Alta Complexidade (APAC). No entanto, não foram desenvolvidos estudos analíticos dos dados da região. Embora existam estudos nacionais sobre a distribuição da doença no país 4, que analisam a doença nas cinco regiões do Brasil, o estudo não contempla as especificidades do Estado de Mato Grosso e não explica a maior prevalência da doença em determinados municípios ou regiões. Neste sentido, o presente trabalho analisou o perfil da doença no Estado de Mato Grosso, a partir da consolidação do Programa Nacional de Controle do Câncer do Colo do Útero em 2002, correlacionando as diferentes características evolutivas da doença com fatores sócio-demográficos, acesso precoce ao diagnóstico e ao tratamento preconizado pelo Instituto Nacional do Câncer do Ministério da Saúde (MS/INCA) das mulheres que tiveram em acompanhamento clínico no período de 2002 a 2007. Os diferentes desfechos da doença como, por exemplo, cura completa, persistência das lesões precursoras, recidivas da doença, morte, sobrevida de 60 meses, foram associados com fatores que podem influenciar no curso doença/tratamento, entre eles o acesso oportuno ou não aos exames de rastreamento e de diagnóstico, o número de exames citológicos realizados, o estadiamento da doença no momento do diagnóstico, o acesso aos procedimentos de média e alta complexidade, o tempo decorrido da suspeita da doença até a realização dos exames confirmatórios e a intervenção oportuna propriamente dita. Ao final, este conjunto de desfechos favoráveis ou não deu indicações para permitir uma avaliação do processo de implantação do PNCCU no Estado de Mato Grosso. 3 2 REVISÃO DE LITERATURA 2.1 Conceito, manifestação clínica do câncer do colo uterino e classificações citológicas O câncer do colo uterino denominado também de neoplasia cervical é definido como uma doença resultante de alterações que determinam um crescimento celular desordenado do epitélio escamoso ou do epitélio colunar do colo uterino e pode evoluir para o carcinoma escamoso invasor ou adenocarcinoma invasor5. O carcinoma do epitélio escamoso evolui por meio de vários estágios, até a manifestação clínica da doença. Inicialmente, manifesta-se em formas de lesões precursoras ou pré-cancerígenas, denominadas Neoplasia Intra-epitelial Cervical/NIC, que podem se transformar em carcinoma invasor. As etapas que seguem a Neoplasia Intra-epitelial são: 1Carcinoma in situ - a neoplasia se desenvolve no interior do tecido de origem, sem ultrapassar a membrana basal; 2- Carcinoma micro-invasor – o processo já atinge o tecido conjuntivo, mas não alcança profundidade superior a 5 mm; 3- Carcinoma invasor - quando se tem a infiltração, com invasão mais profunda dos tecidos adjacentes 5. Já no epitélio colunar, a doença já manifesta em forma de adenocarcinoma, sem apresentar as fases iniciais5. Outras formas de manifestação são encontradas como as Atipias de Significado Indeterminado em Células Escamosas (ASCUS) e Atipias de Significado Indeterminado em Células Glandulares (AGUS)5;6. É uma doença de evolução lenta, que leva em média, 13,81 anos para evoluir entre a lesão precursora para carcinoma invasivo6. A Organização Mundial de Saúde (OMS) considera o tempo de evolução de NIC I/NIC II para NIC III de 3-8 anos e de NIC III para carcinoma micro-invasor ou carcinoma invasor de 10 a 15 anos3. Cerca de 40% das Lesões de Alto Grau (LAG), quando não tratadas, evoluem para carcinoma invasor no período de 10 anos3. No entanto, a União de Controle do Câncer, em 1989, divulgou que as lesões tratadas nas fases iniciais podem chegar a 100% de sobrevida em cinco anos 3, e por isso são consideradas como doença prevenível. 4 A nomenclatura, para definir as etapas sequenciais da Neoplasia Intra-epitelial Cervical dos laudos citológicos, se modificou conforme evoluíram os conhecimentos acerca da doença. Inicialmente, foi definida por Papanicolau e, expressava somente se as células eram normais ou não, e foram denominadas de classes, e estas não acompanhavam o mesmo grau de alteração histológica. A classe I indicava ausência de malignidade; a classe II citologia atípica, mas sem malignidade; já a classe III uma citologia sugestiva, mas não conclusiva de malignidade; a classe IV fortemente sugestiva de malignidade e Classe V indicava citologia conclusiva de malignidade. A OMS introduziu-se o termo “displasia”, em 1952, considerando as alterações histológicas correspondentes, identificando displasias leves, moderadas e severas/Ca in situ que correspondia à classificação de Papanicolaou de III e IV. O carcinoma invasivo correspondia à classe V de Papanicolaou7. Em 1968, Richard propôs uma nova classificação, mantendo a correlação de alterações cito-histológicas. Estabeleceu o novo conceito de Neoplasia Intra-epitelial Cervical (NIC), subdivindo em três níveis, sendo as classificações de NIC I, NIC II e NIC III correspondente à displasia leve, moderada e severa/Ca in situ respectivamente, e mantendo a denominação de carcinoma invasivo para o estágio invasivo7;8. A classificação citológica atualmente utilizada é a do Sistema Bethesda, Maryland, Estados Unidos. Dentre as inovações da nova classificação foi previsto que o diagnóstico citológico deve ser diferenciado para as células escamosas e glandulares; houve a inclusão do diagnóstico cito morfológico sugestivo da infecção por HPV, devido às fortes evidências do envolvimento desse vírus na carcinogênese das lesões, dividindo-as em Lesão Intraepitelial de Baixo Grau (LBG) e Lesão Intra-epitelial de Alto Grau (LAG). A LBG correspondendo à alteração celular leve (NIC I) e a LAG correspondendo a alteração moderada e severa (NIC II e NIC III), sendo que, nestes conceitos, está embutida, a possibilidade das mesmas, de evoluírem para neoplasia invasora. Foi também, introduzida a análise da qualidade do esfregaço. Essa classificação foi revista em 1991 e 2001, porém sem mudanças estruturais7. 5 2.2 Vírus HPV como maior agente etiológico do câncer do colo do útero Historicamente, a associação do vírus HPV com o câncer do colo do útero começou em 1949, quando o patologista George Papanicolaou introduziu o exame mais difundido no mundo para detectar a doença: o exame Papanicolaou9. Esse exame analisa as células esfoliadas do colo uterino, identificando as alterações citológicas presentes em lesões précancerígenas e na doença propriamente dita, com base na modificação da estrutura arquitetural das mesmas7. A partir da identificação de mulheres com alteração celular pré-maligna, identificada pelo exame Papanicolaou, várias pesquisas epidemiológicas foram realizadas, apontando para a presença de uma associação entre a atividade sexual e o desenvolvimento do câncer do colo do útero10;11. No entanto, somente na década de 70, o conhecimento acerca da etiologia da doença teve considerável avanço. Estudos constataram que tal associação implicava na presença de um agente etiológico de transmissão sexual. Harold zur Hausen, um infectologista alemão, constatou que o HPV poderia ser esse agente, estabelecendo inicialmente a relação do vírus com as verrugas e condilomas12-14. Somente anos mais tarde, o vírus foi relacionado com o desenvolvimento do carcinoma do colo do útero 15-18. Com o advento da clonagem molecular e a utilização desta tecnologia na replicação do genoma do Papiloma Vírus na década de 90, o mesmo contribuiu para elucidar melhor aspectos da infecção11;19-21. O avanço da tecnologia molecular possibilitou a identificação do DNA do vírus HPV, em amostras de tecidos de carcinomas cervicais22. Isto possibilitou que estudos multicêntricos confirmassem a presença do DNA do Papiloma vírus em quase 100% dos epitélios de carcinomas invasivos23-25, levando à tese mundialmente aceita de que a infecção pelo vírus HPV é “causa necessária para o desenvolvimento do carcinoma invasivo”. Casos de carcinomas sem a presença do vírus HPV são raros e supõe-se, nestas situações, que o carcinoma não foi originado pela infecção viral ou pode ter ocorrido falha do exame 22. Em 2002, Bosch e col.19 reafirmaram o papel etiológico do vírus no desenvolvimento da doença ao publicarem o resultado de uma revisão sistemática em que se constatou a existência de uma associação de causalidade entre o vírus e a doença. Esta associação tem sido avaliada e aprovada sob todos os critérios de causalidade, estabelecidos pela 6 comunidade científica. A constatação é universalmente consistente e, até os dias de hoje, não existem estudos alternativos, refutando a hipótese. A discrepância entre a alta frequência de infecções HPV em mulheres jovens sexualmente ativas e a ocorrência baixa de lesões cervicais nessas mulheres, colocou-se em dúvida a etiologia viral da doença, e concluiu-se que a infecção era causa necessária, mas “não suficiente para o desenvolvimento da doença”, uma vez que, virtualmente, somente uma fração de mulheres portadoras do vírus desenvolveria a doença 22-27. Estudos prévios já sugeriam que um forte fator diferenciava a progressão ou não da doença, sugerindo que isto estava relacionado aos diversos tipos do vírus HPV 28;29 . Estudos posteriores mostraram que a progressão da doença depende não somente da presença do vírus, mas também do tipo de vírus, da persistência da infecção e da evolução da doença de lesões precursoras para o carcinoma invasivo30. Outros estudos de revisão literária sobre a relação entre o vírus HPV e o câncer do colo do útero foram realizadosI. 2.3 Estimativa do câncer do colo do útero no mundo, na América Latina e Caribe: incidência, mortalidade e tendências atuais A estimativa do câncer do colo do útero para o ano de 2000, feita pela International Agency for Research on Cancer (IARC) foi de 470.606 casos novos, e 233.372 mortes31, com uma prevalência (de cinco anos) de 1.401.000 casos. De acordo com esses dados, o câncer do colo do útero é a segunda neoplasia mais comum entre as mulheres, e, também a segunda causa de mortalidade por neoplasia no mundo. No entanto, 83% dos casos ocorrerem em países em desenvolvimento e, em muitas regiões, é o câncer mais comum entre as mulheres, sendo responsável por 15% de todos os tipos Já nos países desenvolvidos, o câncer cervical é responsável por 4% de todos os tipos de câncer e ocupou a sexta posição entre os cânceres mais comuns em 2000. Os países do oeste da Ásia e da China foram os que tiveram as menores taxas estimadas no mundo, no mesmo ano31. I Nakagawa, JTT; Shirmer J; Barbieri M. Vírus HPV e câncer do colo do útero. Artigo encaminhado para Revista Brasileira de Enfermagem (Reben) - em prelo. 7 Para o continente americano, a estimativa para o ano de 2000 foi de 92.136 casos da doença e 37.640 mortes, e destes, 83.9% e 81.2% ocorreriam na América Latina e Caribe, respectivamente. Essas duas porções do continente americano apresentaram uma das maiores taxas mundiais de incidência, no período, juntamente com alguns países da África e do sul e sudeste da Ásia. A taxa de incidência e de mortalidade na América Central foi de 40,28 e de 17,03 por 100.000 mulheres respectivamente; no Caribe foram de 35,78 e 16,84 por 100.000 mulheres e na América do Sul, de 30,92 e 16,84 por 100.000 mulheres de incidência e de mortalidade respectivamente31. Já em 2002, estimou-se, para América Latina e Caribe, 72.000 casos novos e 33.000 mortes, e se projetou um aumento de 75% desses valores para o ano de 2025, se a incidência permanecer constante 32. As taxas na América do Norte são acentuadamente menores, com 7,88 e 3,23 de taxa de incidência e de mortalidade por 100.000 mulheres, respectivamente. Os estudos sobre tendência de mortalidade por câncer do colo do útero na América Latina registraram um aumento de mortes no período de 1975 a 1985 33, diferentemente da tendência dos países desenvolvidos. Outro estudo de tendência detectou que não houve declínio das taxas após a implantação do programa de rastreamento na grande maioria dos países da América Latina34. Os países da América do Norte conseguiram reduzir as taxas para menos de 10 casos por 100.000 mulheres, após a implantação do programa de rastreamento da doença35. Dentre os países da América Latina e Caribe, a Argentina e o Uruguai têm as menores taxas de morbi-mortalidade; o Brasil apresenta uma situação intermediária, com taxa de incidência de 31,3 por 100.000 mulheres e uma taxa de mortalidade de 11,6 por 100.000 mulheres36;37. Os três países com as maiores taxas são: Haiti com uma taxa de incidência ajustada por idade padrão mundial de 93,9, por 100.000 mulheres e taxa de mortalidade ajustada por idade padrão mundial 53,5 seguida da Nicarágua e Bolívia 36. No Haiti, o câncer do colo do útero foi responsável por 49,2% das mortes por todas as neoplasias 37. No Brasil, o câncer do colo do útero foi responsável por 12,1% de todas as mortes por câncer37. Segundo dados divulgados pela Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS)37, as taxas de mortalidade de 1996 a 2001, ficaram na faixa de 6 a 7 mortes por 100.000 mulheres. A estimativa do Instituto Nacional do Câncer (INCA) para 2008 foi de 18.680 casos 8 novos de câncer do colo do útero, com taxa de incidência bruta de 19,2 por 100.000 mulheres. As taxas mais altas são encontradas nas regiões do Sul com 24,4 e no Norte com 22,2 por 100.000 mulheres. As taxas mais baixas são das regiões Sudeste e Nordeste, com 17,8 e 17,6 por 100.0000 mulheres, respectivamente, e a região Centro Oeste tem um taxa intermediária de 17,8/100.000 mulheres2. Com o declínio do câncer do colo do útero nas últimas décadas, especificamente nos países desenvolvidos que tiveram sucesso no programa de rastreamento, observou-se um aumento do número de casos de câncer de mama. Em 1990, o câncer de mama matava 8,6 vezes mais do que o câncer cervical em países como Canadá e EUA. Na America Latina e Caribe, essa transição pode ser vista na Argentina, Uruguai e Bahamas. No entanto, a mesma situação não foi observada em muitos países em desenvolvimento como no Haiti, cujas taxas de incidência de câncer cervical é 21 vezes maiores do que a do câncer de mama. Bolívia e Nicarágua, também apresentam taxa de câncer do colo do útero maior do que a taxa de câncer de mama37. 2.4 Co-fatores no desenvolvimento do câncer do colo do útero Sabe-se que o vírus HPV é o fator etiológico principal do câncer do colo do útero, no entanto, tem sido demonstrado que outros fatores contribuem para o aumento do risco de desenvolver o câncer cervical entre as mulheres com persistência da infecção pelo vírus HPV38;39, dentre eles a multiparidade, o consumo de cigarro e o uso de contraceptivos hormonais40. 2.4.1 Tabagismo O tabagismo foi classificado como um dos fatores de risco para o câncer, incluindo o colo do útero em mulheres portadoras do vírus HPV 30. Em meta-análise, tendo por base 12 estudos de vários países do mundo, o tabagismo apresentou um risco aumentado para o desenvolvimento do carcinoma escamoso (RR 1,50 - IC 95% 1,35–1,66), mas o risco não foi aumentado em casos de adenocarcinoma (RR 0,86 - IC 95% de 0,70–1,05)41. 9 Em um estudo de coorte, envolvendo mulheres com vírus HPV de alto risco (fumantes e ex-fumantes), as ex-fumantes, as fumantes de menos de um maço de cigarro por dia e as fumantes de mais do que 1 maço de cigarro por dia foi detectado um alto risco de desenvolver NIC III ou carcinoma cervical, comparando com as não fumantes, com um RR de 3,3 (IC 95% 1,6–6,7), de 2.9 (IC 95% de 1,4–6,1) e 4.3 (IC 95% 2,0–9,3) respectivamente42. A cessação do fumo foi associada com a regressão do NIC também em um estudo longitudinal com 82 mulheres com NIC I, estimuladas a deixar o fumo. Após seis meses de seguimento, 50% das lesões nas mulheres que tinham parado de fumar desapareceram, enquanto as lesões aumentaram em quem continuava43. No entanto, não é muito claro se o cigarro é um fator de risco para aquisição do vírus HPV. Alguns estudos indicam que a associação positiva entre o fumo e a detecção do vírus HPV tenderam a diminuir após controlar a variável comportamento sexual44, mas outros estudos registraram uma significativa associação positiva entre os fumantes e a incidência de infecção pelo HPV, mesmo após o controle das medidas de variáveis do comportamento sexual45. Para Muñoz39, os possíveis mecanismos que explicam o efeito carcinogênico do cigarro sobre a cérvice uterina é a redução da resposta imunológica do colo uterino, efeitos dos hormônios femininos além de danos genéticos causados pelos elementos carcinogênicos que contêm no cigarro. Brinton46 já havia sugerido em 1986 que uma das hipóteses para explicar os mecanismos biológicos relacionados com o fumo e o câncer cervical seria o efeito carcinogênico de substâncias provindas do cigarro e excretadas no muco cervical, dados confirmados por Schiffman em 198747. Posteriormente, Hellberg e col.48 analisaram os níveis de nicotina e cotinina no sangue e compararam com os níveis no muco cervical de pacientes com Neoplasia Intra-epitelial Cervical e concluíram que a cotinina, e especialmente a nicotina, apresentava-se em níveis muito mais altos no muco cervical do que no plasma sangüíneo. 10 2.4.2 Paridade Uma meta-análise de 25 estudos epidemiológicos analisou a associação de fatores reprodutivos e carcinoma cervical49. Mulheres com sete ou mais gestações completas tinham maior risco de desenvolver o carcinoma cervical, comparadas com mulheres que tiveram uma ou duas gestações completas. Também foi observado risco maior de desenvolver NIC III, carcinoma in situ e carcinoma invasivo quando a primeira gestação ocorreu em mulheres muito jovens (17 anos comparados com 25 anos), bem como gestantes HPV positivo com uma ou duas gestações, apresentavam maior risco de desenvolver carcinoma cervical, quando comparadas com as nulíparas. Nas mulheres que tiveram sete ou mais gestações, o risco aumentou quase cinco vezes. A plausibilidade biológica da multiparidade como fator de risco para a aquisição do vírus é explicada pela modificação do epitélio cervical, dando origem à metaplasia escamosa, ou seja, a formação da zona de transformação da ectocérvice durante a gestação. Essa modificação no epitélio do colo uterino, durante a gestação, não é suficiente para fazer barreiras contra microorganismos, tornando a gestante suscetível à aquisição do vírus do HPV39. 2.4.3 Contraceptivos Hormonais Orais O uso de contraceptivos hormonais orais tem sido associado a um aumento do risco de câncer do colo do útero50. Um estudo do grupo de colaboradores da International Collaboration of Epidemiological Studies of Cervical Cancer apresentou dados de várias partes do mundo e avaliou a associação do câncer cervical com o uso do contraceptivo hormonal, o tempo de utilização e os anos decorridos após a cessação do consumo 51. Entre as mulheres usuárias de contraceptivos hormonais, observou-se aumento do risco do desenvolvimento da doença e esse foi maior entre as que usaram cinco anos ou mais em relação aquelas que nunca fizeram uso. O risco diminuiu entre as mulheres que haviam deixado de utilizar contraceptivo, sendo que para aquelas que deixaram de usá-lo por 10 anos ou mais, o risco retornou aos valores semelhantes aos de quem nunca utilizou o contraceptivo hormonal. 11 Embora este estudo tenha fornecido uma forte evidência de uma relação causal, alguns estudiosos recomendam que esse resultado seja visto com cautela, porque grande parte dos dados estão relacionados com a primeira geração de contraceptivos hormonais, que diferem dos utilizados atualmente, em relação a sua dosagem 38. Para Schiffman et al52, o risco de câncer é muito maior quando o uso de contraceptivo oral é por tempo de 12 meses ou mais, sendo que o risco é maior em adenocarcinoma do que em carcinoma escamoso. Outro estudo identificou uma diminuição do risco das mulheres que não usavam contraceptivos hormonais e atribuiu isso ao fato de que essas mulheres utilizavam método contraceptivo de barreira ou porque não tinham atividade sexual, diminuindo a exposição ao vírus53. A descoberta de receptores hormonais54 no tecido cervical deu plausibilidade biológica para explicar o efeito dos contraceptivos estrogênicos na carcinogênese cervical. Os complexos receptores estrogênicos ligam a seqüência do DNA específico do vírus HPV e aumentam a transcrição gênica. Não se sabe ainda se esse fator dá inicio ao processo neoplásico ou se acelera o processo neoplásico que já havia iniciado55. Muitos estudos não encontraram a associação do câncer cervical com o hormônio56, mas estudos multicêntricos da OMS57 e do IARC58 encontraram associação com seu uso prolongado. Essa associação foi reforçada por outra revisão sistemática, que incluiu 28 estudos e envolveu 12.531 mulheres de varias partes do mundo. Foi feita a comparação de mulheres que nunca haviam usado contraceptivos hormonais orais com as que haviam usado por menos de 5 anos, 5 a 9 anos e 10 ou mais. Foi constatado aumento do risco de contrair a doença, conforme maior o tempo de uso do contraceptivo em mulheres HPV positivo50. 2.5 Outros agentes de transmissão sexual que atuam como co-fator Estudos evidenciaram que alguns agentes infecciosos de transmissão sexual têm relação com o câncer do colo do útero, dentre eles, Herpes Vírus tipo 2 (HSV-2)59, Clamidya Trachomatis60 e vírus HIV61. Outros62 consideram que provavelmente o aumento do risco de 12 câncer cervical na presença do Herpes Vírus tipo 2 e Clamidya Trachomatis se deve à resposta inflamatória que favorece o desenvolvimento da instabilidade genética. Quanto aos vírus HIV e HPV, estudos apontam uma maior incidência do HPV em mulheres com HIV, não somente por ambos serem de transmissão sexual, mas devido ao estado imunossupressor da mulher portadora do vírus HIV e conseqüentemente o aumento do risco da persistência do vírus HPV no risco de evoluir para o câncer cervical. Um estudo nacional identificou maior contaminação do vírus HPV entre as mulheres com HIV positivo (73,2%) comparando com as mulheres HIV negativo (23,7%)63. 2.6 Determinantes sociais, econômicos e culturais do câncer do colo do útero Estudos têm apontado o vírus HPV como o principal agente etiológico do câncer do colo do útero. No entanto, sabe-se que a veiculação do vírus está estreitamente relacionada com as condições ambientais, econômicas, sociais e comportamentais que aumentam ou diminuem o risco de contágio e conseqüentemente o risco de desenvolver o câncer do colo uterino. Dentre os fatores freqüentemente relacionados com maior proporção dos casos, há uma forte associação do nível de desenvolvimento do país, pois mais de 80% dos casos da doença incidem nos países em desenvolvimento, segundo estimativa de 2000 do IARC31. Dentre eles, os países da África e a América Latina apresentam as mais altas taxas de incidência e de mortalidade, países da Ásia e sudeste da Europa com taxas intermediárias, enquanto os países em desenvolvimento do Oriente Médio apresentam as menores taxas. Já nos países desenvolvidos, as maiores incidência da doença ocorrem em populações mais empobrecidas64, apesar do sistema de saúde disponível, nos países desenvolvidos, ser frequentemente superior em relação aos países em desenvolvimento. Neste sentido, o fator econômico se mostra como um importante fator determinante da doença, tanto em países em desenvolvimento como em países desenvolvidos. Fatores como classe social, nível educacional, condições econômicas e religião também são relacionados como fatores de grande influência no comportamento sexual e 13 reprodutivo, atuando, de alguma forma, nas diferentes taxas do câncer cervical, conforme detectado no estudo de Drain et al65. Esses autores, ao estudarem os determinantes sociais associados com as taxas do câncer do colo do útero nos países em desenvolvimento, detectaram que os países com maiores incidências da doença têm menores taxas de expectativa de vida, menos médicos por habitantes, mais crianças com baixo peso ao nascer e mais adultos com tuberculose e HIV. Tendem a ter, também, mais jovens, população com baixo nível de escolaridade e mais analfabetos. Também identificaram altas taxas de incidência da doença em locais com maior fecundidade, mulheres que tiveram primeiro parto em idade precoce e uma maior porcentagem de indivíduos do sexo masculino sem parceiras sexuais fixas. Detectaram também uma associação da doença com a religião, pois observaram que nos países em desenvolvimento, as taxas mais baixas da doença foram encontradas nos países da Ásia onde predomina a religião budista. Taxas intermediárias foram encontradas em países do Oriente Médio que predominantemente são compostos por muçulmanos, enquanto que as taxas mais elevadas foram encontradas em países da America Latina onde predomina o cristianismo65. Um estudo tipo caso-controle desenvolvido por Sanjose et al64 pesquisou a relação entre classe social e comportamento sexual em dois países: na Espanha, que apresenta as taxas mais baixas da doença e na Colômbia, que apresenta as taxas mais elevadas no mundo. Neste estudo, ficou evidente uma forte associação do baixo nível sócio-econômico com comportamentos sexuais que favorecem o contágio do vírus HPV. Nos dois países, observou-se que a prevalência do vírus HPV diminuiu à medida que aumentou o nível de escolaridade da mulher. Na Espanha, mulheres de baixo nível de escolaridade referiram menores números de parceiros sexuais, mas seus parceiros eram mais suscetíveis de utilizarem serviços de prostituição. Por outro lado, o estudo constatou que, na Colômbia, a prevalência de fatores de risco sexual era mais elevada do que na Espanha, bem como havia maior número de mulheres com menor grau de escolaridade assim como seus companheiros. Tem se mostrado que mulheres da América do Sul e do Caribe que são casadas ou que têm união estável tendem a serem monogâmicas, enquanto que o homem não tem o 14 mesmo comportamento. Assim, o risco da mulher contrair o vírus HPV depende, fortemente, do comportamento do seu companheiro66. 2.7 Fatores de exposição ao vírus HPV A infecção pelo vírus HPV foi considerada uma causa necessária para o desenvolvimento do câncer do colo do útero 25;39 , no entanto, sabe-se que a presença de certas condições aumenta o risco de exposição ao vírus HPV. Neste sentido, por ser uma infecção de transmissão sexual, o comportamento sexual está associado diretamente ao aumento do risco de aquisição da infecção, além da idade da primeira relação, do número de parceiros e do comportamento sexual do parceiro. Os estudos mostram uma diversidade no comportamento sexual, com variação muito grande por regiões/países e por sexo/gênero. O estudo de Wellings et al 66 mostrou as tendências do comportamento sexual nos dias atuais: o que se observa, de uma maneira geral, que a relação sexual ocorre mais cedo, mas os casamentos tendem a se concretizar mais tardiamente em muitos países. Há também um aumento de relação sexual antes do casamento, cuja prevalência é maior em países desenvolvidos do que em países em desenvolvimento. A monogamia é muito comum em mulheres, enquanto que dois ou mais parceiros sexuais no passado é mais comum nos homens que vivem em países industrializados. Além disso, os autores identificaram que, apesar do uso de preservativos ter aumentado, a taxa de prevalência do uso é menor em países em desenvolvimento. Um estudo envolvendo um grupo de mulheres que nasceram entre 1965 e 1969 na América Latina e no Caribe indicou que muitas se tornam sexualmente ativas entre 18 e 20 anos de idade66. A coitarca mais precoce tem sido apontada como fator de risco para contrair a infecção pelo vírus HPV, no entanto, para alguns estudiosos, a idade precoce é considerada um indicador do número de parceiros que se terá em vida67. Dentre os mecanismos biológicos que explicam uma maior suscetibilidade das adolescentes adquirirem a infecção pelo vírus HPV, as justificativas centralizam-se em torno da imaturidade do tecido cervical e do aumento da ectopia cervical68, e um alto grau de 15 metaplasia escamosa27 do colo uterino que tem a proteção prejudicada contra agentes infecciosos. A maior suscetibilidade também é explicada pelos ciclos menstruais anovulatórios, comumente presente em adolescente após a menarca, associados com a pouca produção da progesterona69. Isto pode levar a uma diminuição da produção do muco cervical e prejudicar também na proteção contra agentes infecciosos. Diante dessa suscetibilidade, o vírus HPV infecta as células basais do epitélio cervical podendo ocorrer à replicação do vírus durante a divisão celular. Outros mecanismos são encontrados como o trauma durante o ato sexual e os mecanismos imunológicos imaturos. Todos esses fatores diminuem a capacidade da cérvix de bloquear a exposição às infecções e propiciam o desenvolvimento da displasia cervical70. Em um estudo realizado no Brasil e Argentina, com 8.641 mulheres examinadas com vida sexual, as mulheres com idade abaixo da idade média apresentaram positividade maior para HPV (20,2%) em relação àquelas com idade acima da média (12,5%), com Odds Ratio (OR) de 1,8 (IC 95%=1,5-2,2; p<0,001)71. Este resultado indica que o início precoce da vida sexual aumenta o risco à aquisição do vírus HPV. Com relação ao número de parceiros sexuais, estudo realizado na Costa Rica com 8.513 participantes mostrou que a OR da infecção pelo vírus HPV (oncongênico e não oncogênico, em particular o tipo 16) aumenta para 2,1 quando se teve dois parceiros sexuais, um aumento no OR de 2,5 quando se teve três parceiros sexuais e para 3,5 quando se teve quatro parceiros ou mais quando comparado com um parceiro72. A aquisição da infecção também foi associada ao número recente de parceiros sexuais em um estudo de Muñoz et al (2004) na Colômbia, a OR foi de 2,6 para o contágio do vírus HPV não oncogênico quando se teve dois parceiros ou mais no último ano e de 2,2 para o contágio do HPV oncogênico73. Estudo conduzido pela IARC com 11.337 mulheres da Argentina, Chile, México e Colômbia registrou um significativo aumento do risco de infecção pelo vírus HPV (tanto os de baixo quanto os de alto risco) em mulheres que tiveram dois parceiros sexuais em relação àquelas que tiveram um parceiro, com OR de 1,85 (IC 95% 1,62–2,12)74. 16 3 OBJETIVOS 3.1 GERAL Analisar o perfil epidemiológico do câncer do colo do útero no Estado de Mato Grosso a partir de 2002, após a 2ª. fase de intensificação do Programa Nacional de Controle do Câncer do Colo do Útero (PNCCU). 3.2 ESPECÍFICOS Verificar a incidência das lesões precursoras e do câncer do colo do útero no ano de 2002; Levantar a Taxa de Mortalidade Específica (TME) e a Taxa de Incidência do câncer do colo do útero no período de 2002 a 2007; Levantar a taxa de cobertura do exame citológico e o perfil de produção dos esfregaços cérvico-uterino, no período de 2002 a 2007; Descrever o seguimento clínico, da amostra populacional representativa das mulheres que tiveram alterações celulares e que foram acompanhadas nos serviços de saúde de referência secundária e terciária de Cuiabá/MT no período de 2002 a 2007; Analisar os fatores sócio-demográficos, clínicos e laboratoriais associados ao risco de desenvolver a doença na fase invasiva, da amostra populacional representativa das mulheres que tiveram alterações celulares e foram acompanhadas nos serviços de saúde de referência secundária e terciária; Estimar a taxa de sobrevivência (sobrevida) da amostra populacional representativa das mulheres que tiveram carcinoma invasor e foram acompanhadas nos serviços de saúde de referência secundária e terciária; Analisar os fatores clínicos e sócio-demográficos associados ao risco de mortalidade por câncer do colo do útero da amostra populacional representativa das mulheres que tiveram carcinoma invasor e foram acompanhadas nos serviços de saúde de referência secundária e terciária. 17 4 MÉTODO 4.1 Tipo de estudo O estudo foi desenvolvido em duas etapas. Na primeira etapa foi utilizado um desenho transversal. O estudo transversal ou seccional é o tipo de estudo epidemiológico que se caracteriza pela observação direta de determinada quantidade planejada de indivíduos, em uma única oportunidade. A escolha deste desenho, nesta primeira etapa, se deve ao objetivo de caracterizar, comparar, descrever e correlacionar as variáveis sócio-demográficas das mulheres que tiveram alterações celulares detectadas em 200275. Na segunda etapa, foi realizado um estudo de coorte ou estudo longitudinal. Um estudo longitudinal é um tipo de estudo onde pelo menos duas observações são realizadas em momentos diferentes. Nesta fase, as unidades de observação foram as mulheres que tiveram lesões precursoras ou carcinoma do colo do útero, detectadas a partir de 2002, e que se submeteram ao tratamento preconizado pelo INCA/MSII no período de 2002 até 2007. 4.2 Local e período de estudo O período selecionado para o estudo foi o período de 2002 a 2007, quando se consolidou o Programa Nacional de Controle do Câncer do Colo do Útero no Estado de Mato Grosso. A abrangência do estudo, nesta fase, correspondeu a todos os municípios do Estado. 4.3 População a ser estudada/planejamento amostral Para a primeira fase do estudo, a população correspondeu às mulheres que tiveram alterações celulares no ano de 2002, detectadas na fase de consolidação do Programa Nacional de Controle do Câncer do Colo do Útero (PNCCU) no Estado de Mato Grosso, II . O tratamento preconizado pelo INCA/MS apresenta condutas diferenciadas para cada estadiamento clínico da doença 18 conforme dados disponibilizados pelo sistema de informação oficial do MS III. Na segunda fase do estudo, a população correspondeu a uma amostra representativa da população da primeira fase do estudo que tiveram lesões precursoras ou carcinoma do colo do útero. 4.3.1 Cálculo da amostragem Para obter uma amostra representativa foi necessário selecionar aleatoriamente cada unidade de acordo com um critério específico ou de planejamento, onde todos os elementos tinham iguais possibilidades. Nesta pesquisa o procedimento utilizado para obter a amostra foi o método de amostragem aleatória estratificada proporcional ao tamanho da população. 4.3.2 Determinação do tamanho da amostra A população de estudo foi constituída por mulheres com presença de alterações citológicas, no ano de 2002 além de outros critérios de inclusão detalhados neste capítulo. Assim, para a determinação do tamanho da amostra considerou-se a população de mulheres com NIC I, NIC II, NIC III/Ca in situ e Carcinomas invasivos. Os números obtidos são apresentados na Tabela 01. Tabela 01 - Número de mulheres com alterações celulares, no ano de 2002, no Estado do Mato Grosso. Tipo de alterações celulares NIC I Total 698 NIC II 195 NIC III 165 Carcinoma invasivo e adenocarcinoma in situ 51 Total 1.109 Fonte: MS/DATASUS/SISCOLO III Dados disponíveis no site www.datasus.gov.br 19 Com as informações da Tabela 01, foi determinado o tamanho da amostra conforme ilustrado a seguir. Considerando que, um dos objetivos da pesquisa foi analisar a incidência e a prevalência do câncer do colo do útero no Estado de Mato Grosso, sendo que os valores foram expressos em termos percentuais, e podem ser representados na forma de proporção, considerou-se para a determinação do tamanho da amostra (número de mulheres) uma expressão que se utiliza da proporção de mulheres a serem estimadas (p). Assim o tamanho de amostra aproximado ( n ) para estimar a proporção p , quando se conhece o tamanho da população ( N ) é dado pela seguinte expressão (1)76: n= Np (1 p ) , (N - 1 )(d / z ) 2 + p (1 p ) onde p é proporção de indivíduos a ser estimada, neste caso proporção de usuários; z é o valor na curva normal padrão, correspondente ao nível de confiança utilizado, e d é o erro de estimação (erro de amostragem). Nesta pesquisa, considerou-se: um coeficiente de confiança de 95%, isto é, z 1,96 ; um erro de amostragem de 5,00% ( d 0,05 ); que a proporção a ser estimada é de 0,5 ( p 0,5 ), por ser a de maior variabilidade, que leva à obtenção de tamanhos de amostras conservadoras. Portanto, o tamanho de amostra pela expressão (1) foi de 285 mulheres que apresentaram os quatro tipos de alterações, de acordo com as informações da Tabela 01. As 285 mulheres foram distribuídas segundo o tipo de alterações celulares (estrato), conforme mostra a Tabela 02. 20 Tabela 02 - Tamanho da população ( N i* ), fração observada ( f i ) e tamanho de amostra aproximado ( n i ) para os dados da Tabela 01 conforme a alteração citológica. * População ( N i ) fi ni NIC I 698 0,6294 180 NIC II 195 0,1758 50 NIC III/Ca in situ 165 0,1488 42 Ca invasivo/adenocarcinoma in situ 51 0,0460 13 1109 1,0000 285 Alterações citológicas Total N i* = tamanho médio da população com alteração citológica detectada no ano de 2002. Para selecionar o número de mulheres estabelecido por tipo de alteração citológica (exame de rastreamento), foi realizado um sorteio aleatório das mesmas por alteração citológica apresentada. O sorteio foi realizado utilizando o software SPSS 15.0. As alterações do tipo NIC II foram agrupadas com NIC III e Carcinoma in situ, considerando a proximidade entre elas, e os casos de adenocarcinoma in situ foram agrupados com os carcinomas invasivos devido às características evolutivas similares e, portanto, a conduta clínicocirúrgica adotada pelo INCA/MS ser o mesmo para ambas. Após o reagrupamento, a amostra foi constituída por 180 mulheres com NIC I, 92 com NIC II/NIC III/Ca in situ e 51 com carcinoma invasivo, incluindo os casos de adenocarcinoma in situ. Ressalta-se que foram selecionados 51 casos de carcinoma invasivo, para se ter uma amostra suficiente para fazer análises estatísticas inferenciais, totalizando uma amostra de 323 mulheres, conforme mostra a Tabela 03. Tabela 03 - Distribuição da amostra populacional segundo classificação citológica. MT, 2002. Freqüência CLASSE CITOLÓGIA n (%) NIC I 180 55,7 NIC II/NICIII/in situ 92 28,5 Ca invasivo 51 15,8 TOTAL 323 100,0 Fonte: MS/DATASUS/SISCOLO 21 O tamanho da amostra populacional se modificou no decorrer do seguimento clínico, uma vez que somente os casos de alterações celulares mais graves foram acompanhados em serviços de maior complexidade. Assim, apresentaremos o fluxo de atendimento nos três níveis de atenção, com o respectivo tamanho da amostra. 4.4 Tamanho da amostra no seguimento clínico, conforme o fluxo de atendimento em diferentes níveis de atenção 4.4.1 Amostra populacional do primeiro nível de atenção As alterações citológicas das 323 mulheres foram identificadas no primeiro nível de atenção e foram selecionadas conforme a classe citológica, obedecendo ao cálculo do tamanho da amostra de cada classe citológica, revelado na Tabela 02. 4.4.2 Amostra populacional do segundo nível de atenção As 323 mulheres foram encaminhadas para o 2º. nível de atenção por meio de agendamento da Unidade Básica de Saúde (UBS) para o serviço de atenção secundária, caracterizando demanda referenciada. Todas foram encaminhadas ao ambulatório especializado (referência secundária) para fins de confirmação do diagnóstico e tratamento quando necessário. Entre as 323 mulheres que compareceram aos serviços de referência para realizar os exames confirmatórios, 24 (7,4%) mulheres não se submeteram ao exame de colposcopia, por apresentarem vulvovaginite com indicação de tratamento antes de realizarem esse exame. No entanto, elas não retornaram ao serviço sendo considerados, no estudo, casos de abandono de tratamento. Foi realizado o exame de colposcopia em 299 mulheres e as que apresentaram alterações no exame, se submeteram à biopsia dirigida para realizar o exame histológico. Esses exames, junto com outros exames complementares como exames clínicos oncológicos, subsidiaram o diagnóstico definitivo da doença. 22 Entre os 180 exames que tinham classificação citológica de NIC I, 169 foram confirmados como NIC I no exame confirmatório (histopatológico), ou seja, 11 casos foram classificados como lesões mais graves. Assim, um novo reagrupamento das mulheres foi feito segundo o grau da doença, conforme mostra a Tabela 03. O total de exames que tiveram confirmação de carcinoma invasivo pelo exame histológico foram 55, ou seja, quatro resultados foram reclassificados de NICII/NICIII/in situ para carcinoma invasivo. No total, 15 exames não tiveram correlação entre os exames citológicos e histopatológicos. Com isso, houve uma mudança na distribuição do número de casos de cada classe citológica, conforme mostra a Tabela 04: Tabela 04 - Classificação da doença segundo resultados da histologia. Mato Grosso, 2002. n. casos Graus da doença n (%) NIC I 169 52,3 NIC II/NIC III/Ca in situ 99 30,7 Carcinomas invasivos 55 17,0 323* 100,0* TOTAL *24 mulheres que não realizaram biopsia dirigida tinham laudo citológico de NIC I e foram assim classificadas. Fonte: Prontuário clínico 4.4.3 Amostra populacional do terceiro nível de atenção Entre as 323 mulheres com alterações celulares, 154 mulheres (ou seja, 99 mulheres com NIC II/NIC III/Ca in situ e 55 que tiveram Carcinoma invasivo), foram encaminhadas para os serviços de referência terciária, sendo que 151 delas realizaram procedimentos nesses serviços e três não tiveram indicação de intervenção de alta complexidade. Deste modo, a amostra de cada nível de atenção está representada na Tabela 03, lembrando que a amostra populacional da Atenção Básica correspondeu aos casos de NIC I. Para analisar os fatores sócio-demográficos e clínicos, que estão associados com o grau de doença, a amostra correspondeu as 323 mulheres. Para analisar a taxa de sobrevida, a amostra populacional ficou restrita às 55 mulheres que apresentaram carcinomas invasivos. 23 4.5 Variáveis 4.5.1 Variáveis independentes Para análise de fatores associados com o grau da doença, as variáveis sócio- demográficas independentes selecionadas foram: faixa etária no momento do diagnóstico inicial, estado civil, raça/cor, tabagismo, município em que a mulher residia e ocupação. As variáveis clínicas foram: idade da primeira menstruação (menarca), número de partos (paridade), uso ou não de métodos contraceptivos e o tipo de método contraceptivo utilizado. Importantes fatores associados com a doença, relatados na literatura como o nível de escolaridade, coitarca (idade da primeira relação sexual) e o número de parceiros sexuais não constavam em todos os prontuários. Portanto, esses dados não puderam ser considerados na análise inferencial como variável independente. Para analisar a taxa de sobrevida, as variáveis sócio-demográficas independentes selecionadas foram: idade em anos ou faixa etária no momento do óbito, raça/cor, município em que a mulher reside e ocupação. As variáveis clínicas selecionadas foram: presença ou não de queixa na primeira consulta, resultado da colposcopia, presença ou não de tumor vegetante, se apresentou ou não recidiva da lesão, presença ou não de invasão e o tempo decorrido entre o diagnóstico e o início do tratamento. 4.5.2 Variáveis dependentes Para análise de fatores associados com o grau da doença, a variável dependente foi a situação da doença no momento do estudo, ou seja, se a doença se apresentou na forma de lesão precursora ou na forma invasora. Para analisar a taxa de sobrevida acumulada, a variável dependente foi o desfecho clínico, ou seja, o óbito ou não óbito. 24 4.6 Fonte e coleta de dados Na 1a etapa da pesquisa, a fonte de dados foi baseada em informações de banco de dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), Sistema de Informação sobre Câncer do Colo do Útero (SISCOLO), dados disponíveis no site do INCA (www.inca.gov.br) e banco de dados oficial da Secretaria do Estado de Saúde do Mato Grosso (SES-MT). Na 2a etapa da pesquisa, a fonte de dados foram os prontuários clínicos dos serviços de referência secundária e terciária que informam sobre a realização de procedimentos feitos durante o seguimento clínico e, quando necessário, recorreu-se a outras fontes que forneceram dados complementares como: dados do SIA/APAC (Sistema de Informação Ambulatorial/Autorização de Procedimento de Alta Complexidade), SISCOLO (Sistema de Informação do Colo do Útero) e Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM). Foi utilizado um instrumento de coleta de dados, com questões fechadas e semi-abertas, com os principais dados de identificação e clínicos, que subsidiaram a análise do seguimento (anexo I). 4.7 Critérios de inclusão e de exclusão Na primeira etapa do estudo, todos os exames citológicos com resultados registrados no SISCOLO/MT foram incluídos na análise. Na segunda etapa, foram definidas como critério de inclusão, as fichas clínicas das mulheres residentes no Estado de Mato Grosso, com lesões precursoras e/ou carcinoma/adenocarcinoma do colo do útero, e que se submeteram ao tratamento proposto pelo INCA/MS nos Serviços de Referência Estadual selecionados para o estudo. Como critérios de exclusão dessa etapa foram fichas clínicas das mulheres que residem fora do Estado, das que se submeteram ao tratamento em serviço particular não conveniado com o SUS e daquelas que não fizeram a primeira consulta nos serviços de referência secundária escolhida para o estudo. 25 4.8 Condutas clínicas e classificações/estadiamentos utilizados como parâmetro no estudo 4.8.1 Conduta clínica adotada pelo INCA/MS A conduta preconizada pelo INCA/MS prevê que as mulheres com presença de alterações malignas do tipo “Células Escamosas Atípicas de Significado Indeterminado (ASCUS) possivelmente não neoplásico”, Lesão Intra-epitelial de Baixo Grau (LBG), compreendendo efeito citopático pelo HPV e Neoplasia Intra-epitelial Cervical grau I (NIC I); “Células Glandulares Atípicas de Significado Indeterminado (AGUS), possivelmente não neoplásicas”, repitam o exame citológico em seis meses. Se após este período, o segundo resultado mantiver as mesmas características, ou seja, se houver persistência da lesão préneoplásica, deve ser feita a colposcopia. Neste exame, diante do resultado positivo, deve ser realizada a biópsia da lesão visualizada; e diante do resultado negativo, deve ser feita a repetição do teste citológico em seis meses. Já nos resultados citológicos com Lesão Intra-epitelial de alto grau (LAG) — compreendendo NIC II e NIC III, Carcinoma epidermóide invasor, Adenocarcinoma “in situ”, Adenocarcinoma invasor, a conduta preconizada é a realização imediata do exame histopatológico dirigido pela colposcopia. Em relação à colposcopia, as seguintes possibilidades de resultados demandam as respectivas condutas: se positivos, realização da biópsia da lesão visualizada; e se negativos, repetição do exame citológico em seis meses. Tomando por base os resultados histopatológicos procedentes da biópsia, as seguintes condutas devem ter sido adotadas: • se negativo, NIC I ou HPV — repetição dos testes de rastreamento em seis meses; • se positivo (NIC II, III, carcinoma escamoso ou adenocarcinoma invasor) - nesses casos, deve ter feito a retirada do local afetado através de Cirurgia de Alta Freqüência (CAF) e, em estágios mais avançados, a amputação do colo uterino, por conização a frio ou com laser, preservando o corpo do útero. O tratamento inclui um seguimento cuidadoso, com exame anátomo-histopatológico do colo retirado, com o objetivo de confirmar a não invasão do tumor. Um dos procedimentos indicados é a retirada total 26 do órgão (histerectomia total), dependendo do grau de invasão e a quimioterapia/radioterapia. Por ser um estudo retrospectivo, não foi possível identificar o tipo do vírus HPV, pois o exame específico para esse fim não foi adotado pelo INCA/MS no PNCCU. 4.8.2 Classificações e estadiamentos As classificações colposcópicas e os estadiamentos oncológicos adotados pelo MS/INCA para o PNCCU foram da Internacional Federation for Cervical Pathology and Colposcopy e da União Internacional Contra o Câncer (UICC), respectivamente e são apresentadas a seguir. Classificação colposcopia Segundo a classificação colposcópica preconizada pela Internacional Federation for Cervical Pathology and Colposcopy (IFCPC), os seguintes resultado foram preconizados: colposcopia com achados normais referem ao epitélio pavimentoso original, ao epitélio cilíndrico e à zona de transformação normal. Os achados anormais são divididos em lesões maiores e lesões menores. São consideradas lesões menores as que apresentam epitélio acetobranco fino, mosaico regular, leucoplasia fina e vasos típicos. Já as lesões maiores caracterizam-se por epitélio branco espessado, mosaico irregular, pontilhado irregular, leucoplasia espessada e vasos atípicos. Para definir as modalidades terapêuticas adotadas no PNCCU, o MS, se baseou nos critérios adotados pela União Internacional Contra o Câncer (UICC), de 1997, que faz a correspondência dos estadios adotados da Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (FIGO) com as categorias TNM, conforme mostra o Quadro 01: 27 Quadro 1 - Estadiamento proposto pela Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (FIGO) 0 • Carcinoma in situ I • Carcinoma limitado ao colo (a extensão ao corpo deve ser desprezada) Ia • Carcinoma invasor pré-clínico, diagnosticado somente pela microscopia Ia1 • Invasão microscópica mínima do estroma Ia2 • Tumor com componente invasor de 5 mm ou menos, com profundidade tomada da base do epitélio, e 7 mm ou menos, com extensão horizontal Ib • Tumor maior que T1a2 II • Carcinoma invadindo além do colo, mas não atingindo a parede pélvica e/ou comprometendo o terço inferior da vagina IIa • Sem invasão parametrial IIb • Com invasão parametrial III • Carcinoma estendendo-se à parede pélvica e/ou comprometendo o terço inferior da vagina e/ou causando hidronefrose ou rim não-funcionante IIIa • Tumor comprometendo o terço inferior da vagina, sem extensão à parede pélvica IIIb • Tumor estendendo-se à parede pélvica e/ou causando hidronefrose ou rim não-funcionante IVa • Tumor invadindo a mucosa da bexiga ou reto e/ou estendendo-se além da pélvis verdadeira Nota: A presença de edema bolhoso não é evidência para se classificar o tumor como T4. IVb • Metástases à distância 28 Estadiamento proposto por União Internacional Contra o Câncer – UICC O sistema proposto pela União Internacional Contra o Câncer – UICC se baseia em três componentes principais: características do tumor primário, características dos linfonodos das cadeias de drenagem linfática do órgão em que o tumor se localiza e presença ou ausência de metástases à distância. Nesta classificação o “T” representa o tamanho ou o volume do tumor primário, com subcategorias que variam de T0 a T4, o “N” indica a condição dos linfonodos regionais, com subcategorias que variam de N0 a N3, expressando o nível de evolução do tumor e dos linfonodos comprometidos, e o “M” indica a presença ou ausência de metástases à distância, com as subcategorias M1 ou M0, respectivamente. O símbolo “X” é utilizado quando uma categoria não pode ser devidamente avaliada. As categorias T, N e M são agrupadas em combinações pré-estabelecidas, formam se os estádios que, geralmente, variam de 0 a IV, com subclassificações A, B e C, em alguns estádios, para expressar o nível de evolução da doença. Foram consideradas as seguintes categorias de estadiamento: estádio I, estádio II, estádio III, estádio IV e estádio ignorado. Segundo os critérios da Organização Mundial da Saúde, foram considerados em estádio avançado os casos com doença nos estádios III e IV. 4.9 Eventos estudados Incidência e prevalência de lesões precursoras e carcinoma do útero. Mortalidade por carcinoma do colo do útero. Taxa de cobertura do exame colpo-citológico Proporção de alterações celulares malignas em relação ao total de exames realizados. Razão entre o número de lesões de baixo grau de malignidade (HPV e NIC I) e o número de lesões com alto grau de malignidade (NIC II + NIC III)IV. Tempo de regressão/progressão das alterações citológicas Taxa de sobrevida IV Esta razão deve ser inferior a dois, que indica que o programa está implantado de maneira eficaz, indicando que a detecção da doença se dá numa proporção maior na fase inicial do que na fase mais adiantada (BRASIL, 2002c). 29 Percentual de recidiva, de persistência das lesões precursoras e de falha no tratamento. 4.10 Análise estatística Para a análise estatística dos dados foram utilizadas técnicas estatísticas descritivas e inferenciais. Na parte descritiva foram utilizados tabelas, gráficos e medidas de posição e de dispersão. Foi levantada a taxa de cobertura do exame citológico, a proporção de exames alterados, a razão entre o número de lesões de baixo grau e número de lesões de alto grau, razão entre o número de citologias realizadas em mulheres de 25 a 59 anos em relação à população total do Estado da mesma faixa etária, dentre outros indicadores. A inferência estatística sobre os dados foi realizada considerando, individualmente e conjuntamente as variáveis (dependentes e independentes). Para avaliar o risco de adoecer por carcinoma cervical invasor, segundo as variáveis sócio-demográficas e clinico-obstétrico foi utilizada a regressão logística univariada e multivariada77. Nesta análise, os casos analisados foram os 323 prontuários selecionados. Para analisar a taxa de sobrevida global e taxa de sobrevida estratificada, segundo as variáveis sócio-demográficas e clínica, foi utilizada o estimador de Kaplan-Meier78;79. Para analisar os fatores prognósticos, foi utilizado o modelo de riscos proporcionais de Cox78;80. Dos 323 prontuários, somente os casos que tiveram resultado histopatológico na forma invasiva foram analisados, totalizando 55 prontuários nesta análise. A seguir, detalharemos algumas informações sobre o método estatístico inferencial utilizado no estudo. 4.10.1 Análise de regressão logística A variável resposta ou dependente foi a presença da doença, na forma invasiva ou a presença de lesão precursora (ausência da doença, na forma invasiva). As co-variáveis ou variáveis independentes sócio-demográficas e clínicas selecionadas foram os fatores de risco citados na literatura, no entanto, fatores como nível de renda, nível 30 de escolaridade, numero de parceiros sexuais e idade da primeira relação sexual não foram analisados por não constarem em todos os prontuários. As co-variáveis ou variáveis independentes sócio-demográficas estudadas foram: idade, estado civil, raça/cor, município de residência, ocupação e tabagismo. A idade foi categorizada em 3 faixas etárias: “< 35 anos” “≥ 35 - < 50 anos” e “≥ 50 anos”. O estado civil foi categorizado em “casada” e “não casada”. A raça/cor foi categorizada em “branca” e “não branca”. O município de residência foi categorizado em “capital” (aglomerado Cuiabá Várzea Grande) ou “interior” do Estado, e a ocupação foi categorizada em atividade “não remunerada“ (representada majoritariamente pelas “donas de casas”) e em atividade “remunerada”. As co-variáveis clínicas estudadas foram: idade da menarca, uso ou não de contraceptivo, tipo de contraceptivo e número de partos (paridade). A idade da menarca foi categorizada em “< 12 anos” e “≥ 12 anos”. O uso ou não de algum método contraceptivo foi categorizado em “uso de método contraceptivo” ou “não uso de método contraceptivo”. O tipo de contraceptivo foi categorizado em “contraceptivo hormonal” ou “contraceptivo não hormonal”. O número de partos foi categorizado em “3 partos ou menos” ou “4 partos ou mais”. Após obter os resultados da análise univariada de cada variável independente, ou seja, a OR, estas foram ordenadas segundo ordem decrescente de significância estatística, para então, iniciar a análise multivariada das variáveis selecionadas que tiveram p < 0,20. No processo de modelagem, foi se colocando cada variável, seguida de avaliação da significância do modelo geral, e o incremento de cada uma delas, através do teste de razão de verossimilhança (estatística G) e do teste de Wald, considerando para o modelo final, somente aquelas que apresentaram p < 0,05. Foram testados e analisados os possíveis fatores interação e confusão77. 31 4.10.2 Análise de sobrevida A variável dependente foi o óbito por câncer do colo do útero. As co-variáveis ou variáveis independentes sócio-demográficas estudadas foram: idade, raça/cor, município de residência e ocupação. A idade foi categorizada em duas faixas etárias: “< 50 anos” e “≥ 50 anos”. A raça/cor foi categorizada em “branca” e “não branca”. O município de residência foi categorizado em “capital” (aglomerado Cuiabá-Várzea Grande) ou “interior” do Estado, e a ocupação foi categorizada em atividade “não remunerada“ e em atividade “remunerada”. As co-variáveis clínicas foram: presença ou não de sintomatologias sugestivas da doença, alterações da cérvix uterina no exame de colposcopia, presença ou não de tumor vegetante, presença ou não de recidiva da doença pós-tratamento, tempo decorrido entre o diagnóstico e o tratamento e por último, a extensão da doença. A presença de manifestação da doença comumente presente na doença foi dicotomizada em “presente” ou “ausente”, que incluíram a presença de sinusorragia, dispauremia, dor no baixo ventre/pélvica entre outros. As lesões observadas no exame colposcópio foram categorizadas em “lesões menores” e “lesões maiores”. As lesões menores incluíram presença de epitélio acetobranco tênue, mosaico tênue, pontilhado fino ou colposcopia normal. Já as lesões maiores incluíam epitélio acetobranco grosseiro, mosaico denso, pontilhado grosseiro, vasos atípicos, leucoplasias e erosão. Também foi dicotomizada a categoria “recidiva” ou “não recidiva” da doença. O tempo decorrido entre o diagnóstico e início do tratamento foi dividido em: menos de 1 mês, 1 mês ou mais. Por último, foi analisado o grau da doença no momento do diagnóstico, dicotomizado em presença ou não de invasão parametrial/metástase (estádio II b a IV b), segundo classificação da FIGO. Para estimar a probabilidade de sobrevivência a cada tempo, foi utilizado o estimador de Kaplan-Meier78;80;81, analisado, primeiramente, de forma global, ou seja, sem estratificação; no segundo momento, com estratificação pelas co-variáveis determinadas no estudo. Para analisar as diversas curvas, foi utilizado o teste de long-rank, a fim de obter a proporcionalidade de risco. 32 Para estimar o efeito de cada co-variável na sobrevida de cada participante, ajustouse o modelo de Cox para cada uma delas e a partir da significância dos riscos relativos a cada tempo (definidas pela exponencial dos parâmetros), definiram-se quais as co-variáveis que entrariam no modelo multivariado80. Para a modelagem da função de sobrevida, foi utilizado o modelo de riscos proporcionais de Cox. Na análise multivariável inicial, todas as variáveis foram incluídas no modelo, sendo retiradas e recolocadas posteriormente, uma a uma, segundo o nível de significância estatística de 0,05, estabelecido para os coeficientes, conforme resultado do teste de Wald e do teste da razão da verossimilhança entre os modelos ajustados. Além disso, foram testadas todas as possíveis interações entre variáveis. As variáveis que permaneceram no modelo final foram as que se mostraram estatística e epidemiologicamente significantes, depois de controladas pelas demais no modelo de Cox multivariável. O pressuposto da proporcionalidade necessária ao modelo de Cox foi testado com o método gráfico e com o teste da co-variável dependente no tempo. O tempo de sobrevida foi calculado em meses e compreendeu entre a data da cirurgia/início do tratamento e a ocorrência de óbito ou da última consulta, considerando a data término do estudo, o último dia do ano de 2007 ou quando completasse os 60 meses. O evento de interesse, considerado como falha foi o óbito atribuído apenas ao câncer do colo do útero, segundo dados do prontuário ou da declaração de óbito (DO). No final do estudo, todas as pacientes que não tinham o registro de óbito, por estarem vivas, ou por terem morrido por outra causa, ou aquelas com perda do seguimento foram classificadas como censuras, e cada uma delas tiveram seu tempo de acompanhamento incluído na composição do grupo de risco. Para os casos de perda do seguimento, considerou-se a data referente ao último acompanhamento registrado no prontuário médico como a data da censura. Cabe observar que, tanto as análises estatísticas descritivas como inferências foram realizadas com o auxilio dos programas de computador. Para análise descritiva dos dados foram utilizados os softwares SPSS 15.0 e EPI INFO versão 3.5; e para construção de tabelas e gráficos foi utilizado o software EXCELL. Para análise inferencial, foram utilizados os programas SPSS 15.0, multiLR e EPI INFO versão 6.0 e versão 3.5. 33 4.11 Limitações do estudo Abandono do tratamento/seguimento clínico, gerando a incerteza do desfecho clínico Dados não registrados devidamente Possíveis erros de estadiamento e de diagnósticos laboratoriais Subestimação dos dados Dados sócio-demográficos e clínicos utilizados na análise estatística inferencial restrita aos registrados no prontuário. Fatores de risco importantes (nível de escolaridade, coitarca e número de parceiros) não foram registrados em todos os prontuários. Dados laboratoriais restritos aos utilizados no PNCCU. Número de casos (tamanho da amostra) reduzido para o cálculo de sobrevida. 4.12 Aspectos éticos da pesquisa A realização do presente estudo foi autorizada pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (CEP/UNIFESP), registro nº 0961/07 em 06/07/2007 e pelo Comitê de Ética e Pesquisa do Hospital Universitário Julio Muller da Universidade Federal de Mato Grosso (CEP/HUJM-UFMT) – registro nº 297/2006, aprovado em 13 de dezembro de 2006 (anexo II). Foi garantido o sigilo e confidencialidade dos dados das participantes. 34 5 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS 1ª. PARTE 5.1 Prevenção do câncer do colo do útero no Estado de Mato Grosso em 2002: principais resultados A base de dados utilizada nesta parte do estudo foi ambulatorial, e buscou dar um panorama sobre a segunda fase de intensificação PNCCU, ocorrida no ano de 2002, identificando características das mulheres com alterações citológicas. Os dados não se referem às taxas de incidência e de prevalência da doença em toda a população de mulheres do Estado, mas das mulheres que fizeram o exame citológico. Conforme dados divulgados pelo MS/DATASUS, foram 92.000 exames citológicos realizados no Estado de Mato Grosso no ano de 2002. A Tabela 05 mostra a distribuição da idade, por faixa etária, das mulheres que se submeteram ao rastreamento da doença em 2002. Tabela 05 - Distribuição da idade, por faixa etária, das mulheres que realizaram o exame citológico no Estado de Mato Grosso em 2002. Citologias realizadas Faixa etária n % 19 anos ou menos 5.311 5,8 Entre 20 a 34 anos 38.306 41,6 Entre 35 a 49 anos 36.946 40,2 Entre 50 a 59 anos 8.050 8,8 Acima de 60 anos 3.387 3,7 TOTAL 92.000 100,0 Fonte: MS/DATASUS/SISCOLO 35 Observa-se que cerca de 90% das mulheres que fizeram o exame de rastreamento tinham entre 20 e 59 anos. A população alvo definida para a 2ª. fase de intensificação do PNCCU (mulheres de 35-49 anos) representou 40% do total da população rastreada. Do total de exames citológicos realizados em 2002, 2.846 tiveram resultados alterados, conforme mostra a Tabela 06. De acordo com os parâmetros estabelecidos para a 2ª fase do PNCCU, estimou-se que 2,7% das mulheres que realizaram o exame apresentariam alterações no resultado do exame citológico. No Estado de Mato Grosso, essas alterações foram maiores que o estimado em nível nacional, chegando a 3,09%. A Tabela 06 mostra o percentual de cada alteração citológica. Tabela 06 - Tipos de alterações citológicas detectadas no exame citológico. Mato Grosso, 2002. Total Alterações celulares n % HPV 531 0,58 ASCUS 978 1,06 AGUS 228 0,25 NIC I 698 0,76 NIC II 195 0,21 NIC III/carcinoma in situ 165 0,18 Carcinoma escamoso invasivo 41 0,04 Adenocarcinoma in situ 7 0,01 Adenocarcinoma invasivo 3 0,00 2.846 3,09 TOTAL Fonte: MS/DATASUS/SISCOLO A Figura 01 apresenta a série histórica das Taxas de Mortalidade Específica e a Taxa de Incidência do Estado no período de 2000 a 2007. 36 Figura 01 - Taxa de Mortalidade Específica (TME)* e Taxa de Incidência (TI), por 100.000 mulheres, por neoplasia do colo do útero, no Estado de Mato Grosso, no período de 2000 - 2007** 40 33,88 30,89 35 27,8 30 21,73 25 20 15,94 12,78 15 10 20,04 4,44 3,86 3,47 4,49 4,85 6,22 5,62 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006/2007 5 0 TME TI Fonte: MS/INCA Nota: A estimativa do INCA é feita a cada dois anos, em função da estabilidade da ocorrência, com pouca variação anual; portanto, a taxa de incidência calculada é anual e os valores apresentados na Figura 01 são válidos para o ano de 2006 e para o ano de 2007 (MS). 5.2 Perfil da produção dos esfregaços cérvico-uterino Este item apresenta os dados sobre a capacidade operacional da rede de serviços laboratoriais disponíveis nos anos de 2002, no Estado de Mato Grosso. Figura 02 - Total de citologias realizadas no Estado de Mato Grosso, no período de 2000 - 2005. Total de citologias realizadas total de exames realizados 108.998 92.000 85.232 2002 2003 122.708 35.185 13.376 Fev-dez 2000 Jan-abr e out- Nov 2001 2004 2005 Fonte: MS/DATASUS/SISCOLO 37 Observa-se na Figura 02, que a partir de 2002, houve aumento progressivo de exames citológicos realizados no Estado, e isto se deve essencialmente à incorporação da rotina da coleta do material cérvico-uterino nas Unidades Básicas de Saúde, de acordo com as metas pactuadas entre a Secretaria do Estado de Saúde e as Secretarias Municipais de Saúde. Considerando a produção da citologia no ano de 2002 em relação ao ano de 2005, houve um aumento de 33% na cobertura do rastreamento, ou seja, calcula-se que 30.000 mulheres a mais tiveram acesso ao exame de rastreamento para o câncer do colo do útero, após quatro anos de consolidação do programa. Outro indicador utilizado para avaliar o grau de cobertura da citologia é a razão entre os exames realizados em mulheres entre 25 e 59 anos e a população feminina na mesma faixa etária. É um indicador utilizado para avaliar se houve ou não o cumprimento da meta pactuada da Atenção Básica. A razão mínima esperada é de 0,3 e essa razão em 2002, no Brasil, foi de 0,10 exame/mulher/ano82. A Figura 03 mostra série histórica da produção do exame no período compreendido de 2000 a 2006 do Estado de Mato Grosso. Observa-se que, nos anos de 2000 e 2001, a produtividade dos exames era insignificante, constatando-se um aumento de 23% desta produtividade, em seis anos. Figura 03 - Razão entre o número de citologias realizadas em mulheres entre 25 a 59 anos em relação à população total do local da mesma faixa etária. Mato Grosso, 2002-2007. Fonte: SES/MT 38 Quanto ao grau de adequabilidade dos esfregaços cérvico-uterinos realizados no ano de 2002, 54.346 foram classificadas como amostra “satisfatória”, 36.883 como amostra “limitada” e 739 foram registradas como “insatisfatória”, como mostra a Tabela 07. Tabela 07 - Nível de adequabilidade dos esfregaços cérvico-uterino do Estado de Mato Grosso, 2002. Amostra satisfatória n 54.346 % 59,09 Amostra limitada n 36.883 % 40,10 Amostra insatisfatória n 739 % 0,80 Total n 91.968 % 100,0 Fonte: MS/DATASUS/SISCOLO Conforme dados do MS, foi previsto a nível nacional, que 1,5% de lâminas seriam classificadas como insatisfatórias. Segundo a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), um dos critérios para manter o padrão mínimo de qualidade das lâminas é que o nível de amostra insatisfatória não ultrapasse mais do que 5% do total da coleta do material cérvicouterino. No Estado de Mato Grosso, as amostras insatisfatórias corresponderam a 0,80% do total das lâminas, ou seja, 739 amostras teriam que ser repetidas para garantir qualidade no programa de rastreamento. Por outro lado, o MS detectou recentemente que somente seis Estados brasileiros e o Distrito Federal apresentaram 100% dos municípios com menos de 5% de amostra insatisfatória. No Mato Grosso, em 2002, dentre os 134 municípios, três (Jangada, Barão de Melgaço e Acorizal) apresentaram amostras insatisfatórias acima de 5%, sendo que dois municípios não foram contabilizados devido ao pequeno número de citologias realizadas. A qualidade dos laboratórios é um aspecto que qualifica o Programa de rastreamento, e um dos critérios de avaliação é o número de laudos citológicos com atipias. Este resultado pode comprometer o desempenho dos resultados citológicos, pois não se descarta a possibilidade das células atípicas caracterizarem uma lesão mais grave. No Estado, foram 978 atipias (ASCUS) registradas em 2002, ou seja, o equivalente a 34,4% do total das citologias alteradas, um valor relativamente alto para um laudo incerto. 39 2ª. PARTE 5.3 Seguimento clínico Os resultados apresentados a seguir referem-se aos dados de base ambulatorial e hospitalar, e se relacionam ao seguimento clínico de 60 meses de uma amostra de mulheres que apresentaram alterações no exame citológico no ano de 2002. Para esta parte do estudo, considerou-se amostra representativa com 323 mulheres, cujos dados foram coletados nos prontuários de dois serviços de referência secundária e em dois serviços de referência terciária, localizados na capital do Estado. Os prontuários foram selecionados nos Serviços de Referência Secundária, ou seja, ambulatórios especializados com serviço de colposcopia, sendo que o fluxo de atendimento foi do nível de atenção primária até a terciária. 5.3.1 Caracterização das mulheres com alterações celulares As características da amostra populacional são apresentadas na Tabela 08. 40 Tabela 08 - Caracterização da amostra populacional, segundo as variáveis sócio-demográficas da amostra populacional. Mato Grosso, 2002. Variáveis sócio-demográficas n % < 20 11 3,4 ≥ 20 - < 35 131 40,6 ≥ 35 - < 50 133 41,2 ≥ 50 48 14,9 Branca 140 43,3 Negra 20 6,2 Parda 161 49,8 Outras 2 0,6 Solteira 49 15,2 Casada 235 72,8 Viúva 17 5,3 Separada 22 6,8 Interior 106 32,8 Capital (aglomerado Cuiabá-Várzea Grande) 217 67,2 Não Remunerada (dona de casa) 220 68,1 Remunerada 103 31,9 Sim 73 22,6 Não 250 77,4 Faixa etária (anos) Raça/cor Estado conjugal Município de residência Ocupação Tabagista Fonte: Prontuário clínico A idade média da amostra populacional foi de 38,15 (DP= 0,73), mediana de 37 e moda de 29 anos, DP de 13,16, idade mínima de 17 anos e idade máxima de 91 anos. A idade foi categorizada em faixas etárias com pontos de cortes determinados a partir do risco de 41 adoecimento, conforme estabelecido pelo MS, no Programa Nacional de Prevenção de Câncer do Colo do Útero. A Figura 04 mostra que a faixa etária mais freqüente, encontrada no estudo, foi de 3550 anos, correspondendo a 41,2% da amostra, somada com a faixa etária de 20-34 anos (40,6%), totalizando 81,8% do total da amostra populacional. Isto indica que a doença, nos seus diferentes graus de acometimento, manifestou-se essencialmente, entre os 20 e 50 anos. Essa faixa etária abrange a maior parte das mulheres na idade fértil, constituindo um indicativo que este é um período da vida da mulher que merece maior vigilância. Figura 04 – Distribuição das mulheres que apresentaram alterações citológicas segundo faixa etária. Mato Grosso, 2002. 35-50 anos 41% 51 anos ou mais 15% Idade fértil 82% 19 anos ou menos 3% 20-34 anos 41% Fonte: Prontuário clínico RAÇA/COR- As afro-descendentes, composta por mulheres negras e pardas, foram mais frequentes, totalizando 56% das que apresentaram alterações celulares em 2002, conforme mostra a Figura 05. Figura 05 – Distribuição das mulheres que apresentaram alterações citológicas segundo raça/cor. Mato Grosso, 2002. branca negra 50% outras parda 43% 1% 6% Fonte: Prontuário clínico 42 As variáveis clínicas foram categorizadas e as seguintes distribuições foram observadas, conforme mostra a Tabela 09. Tabela 09 - Distribuição das variáveis gineco-obstétricas da amostra populacional. Mato Grosso, 2002. Variáveis clínicas n % 0 25 7,7 1-3 182 56,3 4-7 95 29,4 ≥8 21 6,5 1–3 59 18,3 4–6 15 4,6 ≥7 9 2,8 240 74,3 12 - 14 15 4,6 15 - 19 58 18,0 ≥ 20 11 3,4 s/i * 239 74,0 < 12 179 55,4 ≥ 12 144 44,6 Não usa 148 45,8 Hormonal 53 16,4 Laqueadura 110 34,1 Outros 12 3,7 N. partos N. parceiros s/i * Coitarca (anos) Menarca (anos) Método contraceptivo Fonte: Prontuário clínico * s/i sem informação 43 Quanto às variáveis gineco–obstétricas, a média do número de partos foi 3,26, com DP de 0,133. A idade média da menarca foi de 12,68 anos (DP = 0,083), mediana e moda de 12 anos e variação de 9 a 17 anos. Quanto ao número de parceiros, 83 prontuários continha essa informação. A média de número de parceiros foi de 6,43 parceiros (DP = 1,79), mediana de 3 parceiros; a idade mediana da primeira relação sexual (coitarca) foi de 16,71 anos (DP 0,318). 5.3.2 Seguimento clínico e tratamento para o câncer 1º. Nível de atenção – UBS Para os 169 casos de NIC I, foi indicado seguimento clínico nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) de origem e, em situações diferenciadas, o seguimento foi realizado em ambulatório especializado. Tabela 10 - Número de mulheres com NIC I que fizeram (ou não) o seguimento citológico. Mato Grosso, 2002. NIC I Seguimento citológico n % Com seguimento citológico 80 48,0 Sem seguimento citológico 89 52,0 169* 100,0 TOTAL Fonte: Prontuário clínico *Dentre as 180 mulheres com citologia NIC I, 11 foram reclassificadas para NICII/IIII segundo resultado histológico. Dentre estes, 11 casos não foi possível clarear se o exame citológico classificou erroneamente ou se houve uma evolução das lesões para forma mais grave. Observa-se que um pouco mais da metade (52%) das mulheres que tiveram NIC I abandonaram o seguimento citológico. Dentre as 80 mulheres que fizeram seguimento citológico, foi observado o tempo de regressão da lesão. Aproximadamente metades das mulheres que fizeram seguimento 44 citológico tiveram regressão espontânea do NIC I, em 12 meses. O PNCCU não previu o exame para identificar o vírus HPV, no entanto, a persistência da lesão precursora foi observada em 42 casos. Tabela 11 - Tempo (meses) de regressão das lesões (NIC I), durante o seguimento citológico. Mato Grosso, 2002. NIC I Tempo de regressão (meses) n % Até 12 meses 38 47,5 12 a 24 meses 31 38,8 ≥24 meses 11 13,6 TOTAL 80 100,0 Fonte: Prontuário clínico 2º. Nível de atenção – ambulatório especializado Neste nível de atenção, os procedimentos realizados restringiram-se aos serviços de colposcopia e biópsia. Nesta fase do acompanhamento, 24 mulheres abandonaram o seguimento clínico, ou seja, não retornaram após o tratamento clínico das intercorrências ginecológicas que impediram a realização da colposcopia. Ao final, totalizaram 299 mulheres que fizeram os procedimentos no ambulatório especializado, incluindo colposcopia com ou sem biopsia dirigida. Na atenção secundária, considerando os 299 atendimentos, o tempo decorrido entre a suspeita da doença (rastreamento da doença pelo exame colpocitológico) e a realização dos exames confirmatórios (colposcopia e biopsia dirigida), se deu, em média, em 3,66 meses (DP 0,15), com mediana e moda de 3 meses. 3º. Nível de atenção – Unidade de Internação Entre as 323 com alterações celulares, 154 mulheres foram encaminhadas para os serviços de referência terciária por apresentar NIC II/NIC III/in situ e carcinoma invasivo nos 45 exames histopatológico. Destas, 151 realizaram procedimentos nesses serviços, conforme mostra o Figura 06. Figura 06 - Tipos de tratamentos em que as mulheres submeteram nos serviços de referência terciária. Mato Grosso, 2002. 60 55 Conização/CAF 51 n. procedimentos 50 Histerectomia 40 30 Conização e histerectomia 23 20 Histerectomia + suporte 11 10 6 5 Suporte 0 Fonte: Prontuário clínico Os procedimentos terapêuticos mais utilizados nos 151 casos atendidos nos serviços de referência terciária foram cirúrgicos, sendo o mais frequente a conização/CAF (36%), em segundo lugar a Histerectomia Total Ampliada (33%). Em 11 casos de conização (7%) foi necessária a realização da histerectomia em decorrência de comprometimento histológico do órgão, ou seja, a presença do processo invasivo, ultrapassando a margem do órgão útero retirado. Em 23 casos (15%) houve indicação da retirada do útero, associada ao tratamento clínico (radioterapia e/ou quimioterapia). Em seis casos (4%), o tratamento indicado foi somente o tratamento clínico (radioterapia e/ou quimioterapia) e cinco casos (3%) foram considerados fora das possibilidades terapêuticas, sendo oferecidos os procedimentos de suporte. O tempo decorrido entre a suspeita da doença e o início do tratamento foi de 6,88 meses (DP 0,43), com mediana e moda de 5 meses, conforme detalha a Tabela 12. Os casos mais graves foram tratados em até três meses. 46 Tabela 12 - Tempo (meses) decorrido entre o exame de rastreamento e exame confirmatório/tratamento. Mato Grosso, 2002. Tempo entre o exame de rastreamento e confirmatório Tempo entre o exame de rastreamento e tratamento Média 3,66 6,88 DP da média 0,149 0,433 Mediana 3 5 Moda 3 5 Mínimo 0 1 Máximo 15 42 Total de mulheres 293 151 Fonte: Prontuário clínico A resolutividade dos serviços foi observada pelo tempo decorrido entre a confirmação da doença e o início do tratamento. Dos 151 casos tratados nos serviços de referência terciária, 23% começaram o tratamento em três meses e, 60% do total da amostra, por volta de seis meses e em 12 meses, 90% dos casos iniciaram o tratamento. Figura 07 - Proporção de tratamentos realizados no decorrer do tempo (meses) de seguimento clínico. Mato Grosso, 2002. 100% mais de 12 meses 12 meses 90,10% 10 meses 84,50% 9 meses 79,50% 61,50% 23,60% 6 meses 3 meses Percentual de tratamentos realizados Fonte: Prontuário clínico 47 Ressalta-se que os abandonos do tratamento aconteceram em situações de NIC I, ou seja, lesões de baixo grau (LBG). É possível notar que os casos de abandono raramente acontecem quando a mulher já está sendo assistida no serviço de média ou alta complexidade. Nestes níveis de complexidade, já se estabelece um elo de confiança entre usuários e os serviços de saúde que fazem parte da rede de atendimento de oncologia e pode ser considerado um grande avanço do Sistema Público de Saúde do nosso país. Tabela 13 - Descrição do seguimento clínico das mulheres que apresentaram alterações citológicas. Mato Grosso, 2002. Freqüência Seguimento clínico n % Abandono na fase inicial 24 7,4 Fez seguimento citológico 80 24,8 Não fez seguimento citológico 89 27,6 Tratamento concluído e cura completa 91 28,2 Tratada - com recidiva após tratamento – curada 5 1,5 Fez tratamento e houve melhora 14 4,3 Óbito 20* 6,2 Total 323 100,0 Fonte: Prontuário clínico *1 óbito por complicação no pós-operatório (infecção) com diagnóstico de carcinoma invasor e 1 óbito por AVC com diagnóstico de NIC II A partir da tabela acima, pode-se dizer que a evolução dos casos NICII/NICIII/in situ e carcinomas invasivos na fase inicial sofreram intervenções, não permitindo o avanço para o estágio seguinte. Os casos mais graves foram assistidos dentro do ambiente hospitalar, por meio do tratamento paliativo, favorecendo um maior conforto. A Tabela 14 apresenta o nível de adesão aos tratamentos oferecidos durante o seguimento clínico. 48