87 Vulnerabilidade ambiental de uma área piloto na Amazônia ... VULNERABILIDADE AMBIENTAL DE UMA ÁREA PILOTO NA AMAZÔNIA OCIDENTAL: TRECHO DA BR-364 ENTRE FEIJÓ MÂNCIO LIMA, ESTADO DO ACRE1 E Environmental Vulnerability of a Pilot Area in Western Amazonia:BR-364 Highway, Between Feijo and Mancio Lima, Acre Eufran Ferreira do Amaral2, João Luiz Lani3, Nilson Gomes Bardales4 e Henrique de Oliveira5 1 Trabalho convidado. Embrapa Acre, Pós-graduando em Solos e Nutrição de Plantas, Universidade Federal de Viçosa – UFV, 36570-000 ViçosaMG, <[email protected]>; 3 Prof. do Departamento de Solos – UFV, <[email protected]>; 4 Pós-graduando em Solos e Nutrição de Plantas – UFV, <[email protected]>. Embrapa Pantanal, Pós-graduando em Solos e Nutrição de Plantas – UFV, <[email protected]>. 2 Resumo: O objetivo deste trabalho foi avaliar a vulnerabilidade ambiental de um trecho da BR-364 entre Feijó e Mâncio Lima, no Estado do Acre. Para avaliação da vulnerabilidade adotou-se como metologia a proposta de Crepani et al. (1998) e INPE (1999), com algumas modificações. Na definição dos índices de vulnerabilidade considerou-se a suscetibilidade a diversos temas, como os aspectos geológicos e geomorfológicos (intensidade de dissecação, amplitude altimétrica e declividade), os solos (classes de solos), o tipo de vegetação e o clima. Com pesos diferentes, segundo os critérios adotados, chegou-se ao mapa de fragilidade ambiental. Conclui-se que há vários ambientes com vulnerabilidades diferenciadas, o que pode impactar em diferentes graus. O trecho entre Feijó e Tarauacá deve ser mantido com a cobertura vegetal original e uso sustentável exclusivamente florestal (manejo florestal). O trecho entre Tarauacá e as proximidades de Cruzeiro do Sul suporta um uso mais intensivo, com predominância de cultivos agroflorestais, porém as várzeas do rio Juruá devem ser mais bem avaliadas para o uso mais sustentável. Palavras-chave: Sustentabilidade ambiental, Amazônia, fragilidade ambiental e rio Juruá. Abstract: This work aimed to evaluate the environmental vulnerability along BR-364 highway, between Feijó and Mancio Lima, in the state of Acre. The methodology recommended by Crepani et al. (1998) and INPE (1998) was adopted, with some modifications. For the definition of the vulnerability indices, the geological and geo-morphological aspects (dissection intensity, relief and slopes), soil classes, vegetation types, and climate were considered. In agreement with the adopted criteria, an environmental fragility map was obtained. It was concluded that different environments present differentiated vulnerabilities, causing impacts of different degrees. The area between Feijó and Tarauacá should be maintained with its natural vegetation and exclusively forest sustainable use (forest management). The area between Tarauacá and Cruzeiro do Sul can undertake a more intensive use, with the predominance of agro-forest systems. The Juruá river low lands should be better appraised for a more sustainable use. Key words: Environmental sustainability, Amazon region, environmental vulnerability, and Jurua River. 1 INTRODUÇÃO As questões ambientais extrapolam as áreas de atuação de várias ciências, uma vez que a compreensão das relações do meio ambiente e sua dinâmica requer uma visão integrada dos aspectos físicos e ecológicos de sistemas naturais e de Natureza & Desenvolvimento, v. 1, n. 1, p. 87-102, 2005 88 AMARAL, E.F. et al. suas interações com os fatores socioeconômicos e políticos (Figura 1). Dessa visão holística surgiu uma nova disciplina, a Ecologia de Paisagem (HAINES-YOUNG et al., 1993). que se conheçam algumas características climáticas da região onde se localiza a unidade de paisagem, a fim de que se anteveja o seu comportamento em face das alterações impostas pela ocupação. As unidades de paisagem natural, como unidades territoriais básicas passíveis de georreferenciamento, contêm uma porção do terreno onde está registrada uma combinação de eventos e interações, que imprimem a condição ambiental atual, representando um elo entre a geografia e a ecologia. A análise morfodinâmica das unidades de paisagem natural pode ser feita a partir dos princípios da ecodinâmica (TRICART, 1977), que estabelecem diferentes categorias morfodinâmicas resultantes dos processos de morfogênese ou pedogênese. Quando predomina a morfogênese prevalecem os processos erosivos, modificadores das formas de relevo, e quando predomina a pedogênese prevalecem os processos formadores de solos. Para analisar uma unidade de paisagem natural é necessário conhecer sua gênese, sua constituição física, sua forma e seu estádio de evolução, bem como o tipo da cobertura vegetal que sobre ela se desenvolve. Estas informações são fornecidas pela geologia, geomorfologia, pedologia e fitogeografia e precisam ser integradas para que se tenha uma visão real do comportamento de cada unidade diante de sua exploração. Finalmente, é necessário o auxílio da climatologia para O objetivo principal deste trabalho foi avaliar a vulnerabilidade ambiental de uma área piloto na Amazônia ocidental, trecho da BR 364 entre Feijó e Mâncio Lima, Estado do Acre, como uma ferramenta para o processo de ocupação dessa área. 2 METODOLOGIA Para definição da vulnerabilidade da área prioritária adotou-se a proposta de Crepani et al. (1998) e INPE (1998) , com algumas modificações, uma vez que neste caso o mapa de unidades de paisagem natural foi obtido preliminarmente pela integração dos cinco produtos temáticos prioritários. A partir dessa base preliminar, cada tema foi estratificado em classes de vulnerabilidade, de forma macro (Quadro 1). Figura 1 - Fatores formadores da paisagem, seus atributos e relacionamentos. (Factors forming the landscape, its attributes and relationships). Natureza & Desenvolvimento, v. 1, n. 1, p. 87-102, 2005 A partir da primeira aproximação, estruturou-se uma escala de vulnerabilidade para situações que ocorram naturalmente. Desenvolveu-se então o modelo definido (Quadro 2), que estabelece 21 classes de vulnerabilidade à erosão, distribuídas entre situações onde há o predomínio de processos de pedogênese (às 89 Vulnerabilidade ambiental de uma área piloto na Amazônia ... quais se atribuem valores próximos de 1,0), passando por situações intermediárias (às quais se atribuem valores próximos de 2,0) e situações de predomínio dos processos de morfogênese (as quais se atribuem valores próximos de 3,0). Quadro 1 - Avaliação da estabilidade das categorias morfodinâmicas (Evaluation of the stability of the morphodynamic categories) Categoria Morfodinâmica Relação Pedogênese/Morfogênese Estável Valor Prevalece a pedogênese 1,0 Intermediária Equilíbrio pedogênese/morfogênese 2,0 Instável Prevalece a morfogênese 3,0 Quadro 2 - Representação da vulnerabilidade e, ou, estabilidade das unidades de paisagem natural (Representation of the vulnerability and, or stability of the natural landscape units) Média U1 3,0 U2 2,9 U3 2,8 U4 2,7 U5 2,6 U8 U9 U10 U11 U12 U13 U15 U16 U17 Vulnerável 2,5 2,4 2,3 2,2 2,1 2,0 1,9 1,8 1,7 1,6 1,5 à U14 Grau de Vulnerabilidade ESTABILIDADE U7 VULNERABILIDADE U6 à Unidade de Paisagem Moderadamente vulnerável Medianamente estável/vulnerável Moderadamente estável 1,4 U18 1,3 U19 1,2 U20 1,1 U21 1,0 Estável Natureza & Desenvolvimento, v. 1, n. 1, p. 87-102, 2005 90 O modelo foi aplicado individualmente aos temas (geologia, geomorfologia, solos, vegetação e clima) que compõem cada unidade de paisagem natural (Figura 2), que recebe posteriormente um valor final, resultante da média aritmética dos valores individuais segundo uma equação matemática, que busca representar uma estimativa da posição desta unidade dentro da escala de vulnerabilidade natural à erosão: AMARAL, E.F. et al. Vu = (G + R + S + V + C ) 5 em que Vu = vulnerabilidade da unidade de paisagem; G = vulnerabilidade para o tema geologia; R = vulnerabilidade para o tema geomorfologia; S = vulnerabilidade para o tema solos; V = vulnerabilidade para o tema vegetação; e C = vulnerabilidade para o tema clima. Figura 2 - Fluxograma metodológico para definição de áreas ambientais frágeis e sensíveis ao uso dos recursos naturais. (Methodological fluxogram for definition of environmental areas vulnerable and sensitive to natural use). Natureza & Desenvolvimento, v. 1, n. 1, p. 87-102, 2005 91 Vulnerabilidade ambiental de uma área piloto na Amazônia ... Em razão dos resultados obtidos para a vulnerabilidade foi realizada uma estratificação, considerando os valores máximos e mínimos obtidos, de modo a definir cinco classes de fragilidade ambiental. O mapa resultante permite a visualização regional de graus de sensibilidade a alterações antrópicas dentro da área prioritária. Para elaboração das cartas na escala de 1:100.000, o fator clima não foi inserido no cruzamento entre os mapas temáticos, pois, em razão de sua variabilidade, decorrente da baixa densidade de estações, não permitiu isolar sua influência e condicionava a criação de polígonos irregulares, dando um aspecto irreal ao mapa final. 3 RESULTADOS 3.1 Geologia A contribuição da geologia para a análise e definição da categoria morfodinâmica das unidades de paisagem natural compreende as informações relativas à história da evolução do ambiente geológico e as informações relativas ao grau de coesão das rochas que a compõem. O grau de coesão das rochas é a informação básica da geologia a ser integrada a partir da ecodinâmica, uma vez que em rochas pouco coesas prevalecem os processos modificadores de formas de relevo, enquanto nas rochas bastante coesas prevalecem os processos de formação de solos (Figura 3). Por ser toda a área prioritária coberta por rochas sedimentares, a geologia é vulnerável e representa grande instabilidade ambiental, se exposta às condições climáticas atuais. Conforme pode ser constatado, no setor noroeste há uma mancha de maior vulnerabilidade que corresponde aos arenitos inconsolidados da Formação Cruzeiro do Sul. 3.2 Geomorfologia A geomorfologia oferece as informações relativas à morfometria, que influencia de maneira marcante os processos ecodinâmicos. As informações morfométricas utilizadas são a amplitude de relevo, a declividade e o grau de dissecação da unidade de paisagem. Essas informações caracterizam a forma de relevo da unidade de paisagem natural e permitem que se quantifique empiricamente a energia potencial disponível para o runoff (MORISAWA, 1968), isto é, a transformação de energia potencial em energia cinética, responsável pelo transporte de materiais que esculpem as formas de relevo. Desta maneira, pode-se concluir que em unidades de paisagem natural que apresentam valores altos de amplitude de relevo, declividade e grau de dissecação prevalecem os processos morfogenéticos, enquanto em situações de baixos valores para as características morfométricas predominam os processos pedogenéticos (Figura 4, Quadro 2). Na área prioritária, a geomormologia apresenta-se de medianamente estável a estável, uma vez que as amplitudes altimétricas são pequenas, ocorre baixa declividade e a intensidade de dissecação é muito pequena, condicionando uma superfície muito estável, do ponto de vista geomorfológico (Quadro 3). Ressalta-se aqui que o detalhamento do mapa temático, com a inclusão de unidades homogêneas menores, vai resultar em melhor estratificação na segunda fase do ZEE e permitirá a geração de mapas de vulnerabilidade mais detalhados. 3.3 Pedologia Os solos participam da caracterização morfodinâmica das unidades de paisagem natural, fornecendo um indicador básico Natureza & Desenvolvimento, v. 1, n. 1, p. 87-102, 2005 92 AMARAL, E.F. et al. Figura 3 - Vulnerabilidade do tema geologia da área prioritária (BR-364, entre Feijó e Mâncio Lima, Acre). (Vulnerability of the geology of the pilot area (BR-364, between Feijó and Mâncio Lima, Acre). Figura 4 - Vulnerabilidade do tema geomorfologia da área prioritária (BR-364, entre Feijó e Mâncio Lima, Acre). (Geomorphology vulnerability in the pilot area (BR-364 highway, between Feijó and Mâncio Lima, Acre). da posição ocupada pela unidade dentro da escala gradativa da ecodinâmica: a maturidade dos solos. A maturidade dos solos, produto direto da morfogênese/pedogênese, indica claramente se prevalecem os processos erosivos da morfogênese que geram solos jovens, pouco desenvolvidos, ou se, no outro extremo, as condições de estabilidade permitem o predomínio dos processos de pedogênese, gerando solos Natureza & Desenvolvimento, v. 1, n. 1, p. 87-102, 2005 maduros, lixiviados e bem desenvolvidos (Figura 5, Quadro 4). Por se tratar de um mapa de reconhecimento, o mapa de solos apresenta-se com unidades de mapeamento em associações de duas ou três classes de solos, o que demanda que o cálculo da vulnerabilidade seja realizado com média ponderada. 93 Vulnerabilidade ambiental de uma área piloto na Amazônia ... Quadro 3 - Definição da vulnerabilidade do tema geomorfologia na área prioritária (BR-364, entre Feijó e Mâncio Lima, Acre) (Definition of the geomorphology vulnerability in the pilot area (BR-364, between Feijó and Mâncio Lima, Acre) Polígono 1 2 3 4 Intensidade de Dissecação 1,0 1,4 2,3 1,0 Amplitude Altimétrica 1,0 1,2 1,9 1,0 Declividade 1,0 1,1 1,6 1,0 Vulnerabilidade Geomorfologia 1,0 1,2 1,9 1,0 Figura 5 - Vulnerabilidade do tema pedologia da área prioritária (BR-364, entre Feijó e Mâncio Lima, Acre). (Pedology vulnerability in the pilot area (BR-364, between Feijó and Mâncio Lima, Acre). Os solos mais vulneráveis são os Neossolos Flúvicos, por serem mais jovens e estarem em equilíbrio muito instável em condições naturais, pelo seu caráter deposicional sazonal e situação na paisagem, acompanhando os grandes rios e igarapés. Os Cambissolos, por se tratarem de solos muito jovens, estão em uma escala de vulnerabilidade alta e representam o segundo grupo de maior vulnerabilidade, estando expressos nas manchas amareladas no sudeste da área prioritária. As áreas tabulares onde ocorrem os Latossolos Amarelos apresentam-se com um grau de estabilidade elevado e estão representadas pelas manchas em verdeescuro no noroeste da área prioritária. Enfim, os solos, de modo geral, são mais jovens ou estão em equilíbrio da morfogênese/pedogênese, o que explica a presença de solos rasos e com baixa idade relativa. 3.4 Vegetação A cobertura vegetal representa a defesa da unidade de paisagem contra os efeitos dos processos modificadores das Natureza & Desenvolvimento, v. 1, n. 1, p. 87-102, 2005 94 AMARAL, E.F. et al. formas de relevo (erosão). A ação da cobertura vegetal na proteção da paisagem se dá de diversas maneiras: a) Evita o impacto direto das gotas de chuva contra o terreno, o que promove a desagregação das partículas. Quadro 4 - Determinação da vulnerabilidade das unidades de mapeamento que ocorrem na área prioritária (BR-364, entre Feijó e Mâncio Lima, Acre) (Determination of the vulnerability of the mapping units in the pilot area (BR-364 highway, between Feijó and Mâncio Lima, Acre) 1 Vulnerabilidade Componente 2 3 Vulnerabilidade (Unidade de Mapeamento)(1) 1,7 1,9 - 1,8 1,7 2,0 - 1,8 1,9 2,1 1,9 1,9 2,0 2,0 2,0 - 2,0 2,0 2,0 1,0 - 1,7 1,8 1,0 3,0 1,9 1,8 2,0 2,5 2,0 2,0 1,0 2,0 1,8 2,0 2,0 25 2,1 2,0 2,0 2,1 2,0 2,0 2,2 2,0 2,0 1,9 2,0 - 1,9 2,0 2,0 - 2,0 2,0 2,0 - 2,0 2,0 2,5 2,5 1,9 3,0 2,3 3,0 3,0 3,0 3,0 3,0 3,0 3,0 3,0 3,0 3,0 Unidade de Mapeamento ARGISSOLO VERMELHO Distrófico latossólico + ARGISSOLO VERMELHO Distrófico abrúptico ARGISSOLO VERMELHO Distrófico latossólico + ALISSOLO CRÔMICO argilúvico típico ARGISSOLO VERMELHO Distrófico típico + LUVISSOLO HIPOCRÔMICO Órtico típico + ARGISSOLO VERMELHO Amarelo alumínico alissólico ARGISSOLO AMARELO distrófico ARGISSOLO AMARELO distrófico + Alissolo Crômico argilúvico ARGISSOLO AMARELO distrófico + Latossolo Vermelho-Amarelo distrófico argissólico ARGISSOLO AMARELO Distrófico latossólico + LATOSSOLO AMARELO distrófico típico+NEOSSOLO QUARTZARÊNICO órtico típico ARGISSOLO AMARELO Distrófico latossólico + ARGISSOLO AMARELO distrófico + CAMBISSOLO HÁPLICO alumínico ARGISSOLO AMARELO distrófico + LATOSSOLO AMARELO distrófico típico + ARGISSOLO AMARELO distrófico ARGISSOLO AMARELO eutrófico plíntico + ALISSOLO CRÔMICO argilúvico + CAMBISSOLO HÁPLICO Ta Eutrófico ARGISSOLO AMARELO eutrófico plíntico + ARGISSOLO VERMELHO Amarelo eutrófico + CHERNOSSOLO ARGILÚVICO Órtico saprolítico ARGISSOLO AMARELO eutrófico típico + NITOSSOLO VERMELHO Eutrófico típico + ARGISSOLO AMARELO distrófico LUVISSOLO HIPOCRÔMICO Ortico Típico + ALISSOLO CRÔMICO Órtico típico ALISSOLO CRÔMICO argilúvico + ARGISSOLO AMARELO distrófico ALISSOLO CRÔMICO argilúvico típico + ARGISSOLO AMARELO Eutrófico ALISSOLO HIPOPOCRÔMICO Argiluvico Típico + CAMBISSOLO HÁPLICO Ta Eutrófico Gleico CAMBISSOLO HÁPLICO Ta Eutrofico vértico + LUVISSOLO HIPOCRÔMICO Órtico típico + CAMBISSOLO HAPLICO Ta Eutrófico tipico GLEISSOLO HÁPLICO Ta eutrófico + ARGISSOLO AMARELO Distrófico plíntico GLEISSOLO HÁPLICO Ta Eutrófico típico + GLEISSOLO HÁPLICO Ta alumínico GLEISSOLO HÁPLICO Ta Eutrófico típico + GLEISSOLO HÁPLICO Ta alumínico + NEOSSOLO FLÚVICO Ta Eutrófico GLEISSOLO HÁPLICO Ta Eutrófico típico + NEOSSOLO FLÚVICO Ta Eutrófico (1) Média ponderada. Natureza & Desenvolvimento, v. 1, n. 1, p. 87-102, 2005 2,2 2,5 2,4 2,8 3,0 95 Vulnerabilidade ambiental de uma área piloto na Amazônia ... b) Impede a compactação do solo, o que diminui a capacidade de absorção de água. c) Aumenta a capacidade de infiltração do solo, pela difusão do fluxo de água da chuva. d) Suporta a vida silvestre, que pela presença de estruturas biológicas como raízes de plantas, perfurações de vermes e buracos de animais aumenta a porosidade e a permeabilidade do solo. Em última análise, compete à cobertura vegetal um papel importante no trabalho de retardar o ingresso das águas provenientes das precipitações pluviais nas correntes de drenagem, pelo aumento da capacidade de infiltração, pois o ingresso imediato provoca o incremento do runoff (massas de água em movimento), com o conseqüente aumento na capacidade de erosão pela transformação de energia potencial em energia cinética. Dessa forma, a participação da cobertura vegetal na caracterização morfodinâmica das unidades de paisagem natural está diretamente ligada à sua capacidade de proteção. Assim, os processos morfogenéticos relacionam-se às coberturas vegetais de densidade (cobertura do terreno) mais baixa, enquanto os processos pedogenéticos ocorrem em situações onde a cobertura mais densa permite o desenvolvimento e a maturação do solo (Figura 6). Em função das tipologias florestais predominantes, as áreas sem ação antrópica possuem de moderada a alta estabilidade, uma vez que conferem ao solo uma excelente proteção aos efeitos erosivos da precipitação. No entanto, no Acre, em função dos sedimentos, ocorre uma condição muito peculiar, onde a floresta avançou sobre solos jovens de baixa permeabilidade, que quando expostos sofrem degradação muito rápida, principalmente em função de sua mineralogia, o que lhes conferem alta capacidade de expansão e contração (Quadro 5). 3.5 Clima As informações climatológicas necessárias à caracterização morfodinâmica das unidades de paisagem natural representam o contraponto ao papel de defesa desempenhado pela cobertura vegetal. Estas informações, relativas à pluviosidade Quadro 5 - Determinação da vulnerabilidade das unidades de mapeamento de vegetação que ocorrem na área prioritária (BR-364, entre Feijó e Mâncio Lima, Acre) (Determination of the vulnerability of the vegetation mapping units in the pilot area (BR-364 highway, between Feijó and Mâncio Lima, Acre) Tipologia Vulnerabilidade Tipologia 1 Tipologia 2 Vulnerabilidade da Unidade de Mapeamento 1,2 Floresta aberta com bambu dominante 1,2 - Floresta aberta com bambu + Floresta aberta com palmeira 1,2 1,2 1,2 Floresta aberta com palmeira em área aluvial 1,2 - 1,2 Floresta aberta com palmeira 1,2 - 1,2 Floresta aberta com palmeira + Floresta densa 1,2 1,0 1,1 Floresta densa + Floresta aberta com palmeira 1,0 1,2 1,1 Floresta aberta com palmeira + Floresta aberta com bambu 1,2 1,2 1,2 Floresta aberta com bambu aluvial 1,2 - 1,2 Área antrópica 2,9 Natureza & Desenvolvimento, v. 1, n. 1, p. 87-102, 2005 96 anual e à duração do período chuvoso, que definem a intensidade pluviométrica, permitem a quantificação empírica do grau de risco a que está submetida uma unidade de paisagem, pois situações de intensidade pluviométrica elevada, isto é, alta pluviosidade anual e curta duração do período chuvoso, podem ser traduzidas como situações em que a quantidade de água disponível para o runoff é muito grande e, portanto, é maior a capacidade de erosão. Essas situações reúnem as melhores condições para o desenvolvimento dos processos morfogenéticos cujo vetor principal é o runoff. De forma inversa, a baixa pluviosidade anual distribuída em um maior período de tempo, caracterizando intensidade pluviométrica reduzida, leva a situações de menor risco para a integridade da unidade de paisagem, pois é menor a disponibilidade de água no sistema para o runoff. A baixa densidade da rede de estações meteorológicas no Estado do Acre contribui para a baixa resolução das isolinhas de intensidade pluviométrica, porém permite perceber que as áreas situadas no extremo leste da área prioritária estão mais vulneráveis que as áreas situadas a oeste, indicando ser este atributo, mesmo em uma pequena extensão, um bom parâmetro para estratificar os ambientes (Figura 7). 3.6 Vulnerabilidade ambiental Para a representação cartográfica da vulnerabilidade das unidades de paisagem foram selecionadas 21 categorias de cores, obtidas a partir da combinação das três cores primárias aditivas (azul, verde e vermelho), de modo que se associasse a cada classe de vulnerabilidade sempre a mesma cor, obedecendo ao critério de que o valor de menor vulnerabilidade (1,0) se associa à cor azul, o valor de vulnerabilidade intermediária (2,0) se associa à cor Natureza & Desenvolvimento, v. 1, n. 1, p. 87-102, 2005 AMARAL, E.F. et al. verde e o valor de maior vulnerabilidade (3,0) à cor vermelha. Na definição dessas cores procurouse obedecer aos critérios de comunicação visual que buscam associar cores “quentes” e seus matizes (vermelho, amarelo e laranja) a situações de emergência, e as cores “frias” e seus matizes (azul, verde) a situações de tranqüilidade. Analisando o histograma de freqüência de pixels, observa-se que o mapa de vulnerabilidade possui a maior parte dos pixels no grau de vulnerabilidade 1,86 a 1,84, o que lhes confere a classe de medianamente vulnerável. Em 84% dos pixels encontra-se a classe 2 de vulnerabilidade e apenas 2% dos pixels estão enquadrados como moderadamente vulnerável. Estes valores revelam uma realidade de relativa estabilidade, que é imposta pela vegetação que reveste o solo e o material de origem, dando proteção para a dissecação do relevo, uma vez que dimunui a erosividade das chuvas (Figura 8). O mapa resultante revela que as áreas mais vulneráveis estão associadas aos terraços aluviais dos grandes rios, nas áreas de solos jovens e relevo mais movimentado, como as dos Cambissolos e nas áreas antrópicas (Figura 9). Uma vez que a vegetação representa o tema que está condicionando maior estabilidade ao sistema, pode-se retirar o tema vegetação e fazer uma simulação drástica na qual ocorra uma ação antrópica em toda a extensão da área prioritária (Figura 10). Na simulação, o histograma revela que 100% dos pixels ficaram com graus de vulnerabilidade superior a 2,1 e mais de 20% da área se enquadra como moderadamente vulnerável, de forma que uma ocupação desordenada dessa área pode Vulnerabilidade ambiental de uma área piloto na Amazônia ... 97 comprometer o ambiente de maneira significativa e em graus diferenciados, de acordo com a resiliência do sistema (Figura 11). correlação com os limites de graus de vulnerabilidade com uma escala de classes de fragilidade, de modo a se ter uma visão macro das condições de resiliência da área prioritária (Quadro 6). 3.7 Fragilidade ambiental A partir dessa correlação foi gerado um mapa com cinco categorias de fragilidade, de acordo com as condições ambientais específicas da área de estudo (Figuras 12 e 13). Partindo-se dos dados de vulnerabilidade, e para estratificar de forma mais simplificada, foi construída uma tabela de Figura 6 - Vulnerabilidade do tema vegetação da área prioritária (BR-364, entre Feijó e Mâncio Lima, Acre). (Vegetation vulnerability in the pilot area (BR-364 highway, entre Feijó and Mâncio Lima, Acre). Figura 7 - Vulnerabilidade do tema clima da área prioritária (BR-364, entre Feijó e Mâncio Lima, Acre). (Climate vulnerability in the pilot area (BR-364 highway, between Feijó and Mâncio Lima, Acre). Natureza & Desenvolvimento, v. 1, n. 1, p. 87-102, 2005 98 AMARAL, E.F. et al. 1600000 1400000 Número de pixels 1200000 1000000 800000 600000 400000 200000 0 2.56 2.52 2.48 2.44 2.4 2.36 2.32 2.28 2.24 2.2 2.16 2.12 2.08 2.04 2 1.96 1.92 1.88 1.84 1.8 1.76 1.72 Vulnerabilidade (lim. superior) Figura 8 - Distribuição de freqüência dos pixels do mapa de vulnerabilidade natural da área prioritária (BR-364, entre Feijó e Mâncio Lima, Acre). (Pixels frequency distribution of the natural vulnerability map in the pilot area (BR-364 highway, between Feijó and Mâncio Lima, Acre). Figura 9 - Mapa de vulnerabilidade natural da área prioritária (BR-364, entre Feijó e Mâncio Lima, Acre). (Natural vulnerability map in the pilot area (BR-364 highway, between Feijó and Mâncio Lima, Acre). Natureza & Desenvolvimento, v. 1, n. 1, p. 87-102, 2005 99 Vulnerabilidade ambiental de uma área piloto na Amazônia ... Figura 10 - Mapa de vulnerabilidade natural da área prioritária, considerando a retirada da vegetação natural (BR-364, entre Feijó e Mâncio Lima, Acre). (Natural vulnerability map in the pilot area, considering the removal of the natural vegetation (BR-364 highway, betwen Feijó and Mâncio Lima, Acre). 2500000 Número de pixels 2000000 1500000 1000000 500000 0 1.76 1.79 1.82 1.85 1.88 1.91 1.94 1.97 2 2.03 2.06 2.1 2.13 2.16 2.19 2.22 2.25 2.28 2.31 2.34 2.37 2.41 2.44 2.47 2.5 2.53 2.56 Graus de vulnerabilidade (lim. superior) Figura 11 - Distribuição de freqüência dos pixels do mapa de vulnerabilidade natural com a retirada da cobertura vegetal da área prioritária (BR-364, entre Feijó e Mâncio Lima, Acre). (Distribution of pixel frequency in the natural vulnerability map with the removal of vegetal cover in the pilot area (BR-364 highway, between Feijó and Mâncio Lima, Acre). Natureza & Desenvolvimento, v. 1, n. 1, p. 87-102, 2005 100 AMARAL, E.F. et al. Quadro 6 - Classes de fragilidade ambiental para a área prioritária (BR-364, entre Feijó e Mâncio Lima, Acre) (Environmental vulnerability classes for the pilot area (BR-364 highway, between Feijó and Mâncio Lima, Acre) Graus de Vulnerabilidade Classe de Fragilidade Min. Max. Excessivamente frágil 2,090 2,184 Fortemente frágil 2,184 2,278 Acentuadamente frágil 2,278 2,372 Frágil 2,372 2,466 Moderadamente frágil 2,466 2,560 Fonte: Zonneveld (1972). 7% 1% 15% 43% 34% Ambientes moderadamente frágeis Ambientes frágeis Ambientes acentuadamente frágeis Ambientes fortemente frágeis Ambientes excessivamente frágeis Figura 12 - Quantificação das classes de fragilidade ambiental da área de estudo (BR-364, entre Feijó e Mâncio Lima, Acre). (Quantification of the environmental vulnerability classes in the study area (BR-364 highway, between Feijó and Mâncio Lima, Acre). Os meios excessivamente frágeis são aqueles nos quais a morfogênese comanda a intensidade e a natureza dos processos morfogenéticos e o sentido da evolução. A estabilidade estrutural dos solos é decisiva nos fenômenos de escoamento superficial e a constituição do material sedimentar no qual está assentado o conjunto solo-floresta é extremamente instável. A granulometria comanda o modelado de acumulação. Nessas áreas o uso agronômico é marginal, portanto o critério de escolha deve ser mais de conservar para Natureza & Desenvolvimento, v. 1, n. 1, p. 87-102, 2005 proteger, principalmente, as áreas situadas a jusante dos cursos d’água. Os meios mais frágeis são aqueles nos quais a pedogênese é incipiente e os fenômenos de evolução da paisagem são controlados prioritariamente pela morfogênese. São áreas constituídas por meios de elevada sensibilidade, onde o equilíbrio natural é rapidamente alterado, a resiliência do ecossistema é baixa. Representam, principalmente, as grandes áreas aluviais que estão distribuídas na área prioritária. Nestas áreas o uso agronômico é restrito, a agricultura ribeirinha existente e as atividades extrativistas devem ser o maior grau de alteração e deveriam ser priorizadas para conservação, principalmente, naquelas áreas situadas a jusante dos centros urbanos. Os meios acentuadamente frágeis são aqueles nos quais a pedogênese é de incipiente a moderada e os processos de modelagem da paisagem são intensos. São áreas constituídas por meios de alta sensibilidade, onde o equilíbrio natural é mantido, principalmente, pela cobertura vegetal. Se a cobertura vegetal é degradada, há rápida liquidação dos solos, através de processos de erosão acelerada e petroplintização, fenômenos resultantes da precipitação pluviométrica elevada, material de origem de caráter pelítico e solos com argila de atividade alta. Nessas áreas, a geomorfologia atua como condicionador da intensidade dos processos de alteração e como fator de transformação dos demais fatores. Sua atividade agronômica é restrita e estas áreas deveriam ser priorizadas para uso controlado e, ou, conservação, principalmente aquelas situadas em áreas de influência direta da rede hidrográfica. Os meios frágeis são aqueles nos quais há um balanço relativamente estável da morfogênese e pedogênese. Nesses 101 Vulnerabilidade ambiental de uma área piloto na Amazônia ... Figura 13 - Mapa de fragilidade ambiental da área prioritária (BR-364, entre Feijó e Mâncio Lima, Acre). (Environmental vulnerability map in the pilot area (BR-364 highway, between Feijó and Mâncio Lima, Acre). meios a intensidade de dissecação fraca a moderada condiciona a complexidade da modelagem da paisagem e as características dos solos. São comuns o caráter vértico e plíntico, nos quais há uma restrição severa de drenagem, onde a cobertura vegetal permite manter o equilíbrio. Os argilitos e siltitos condicionam uma camada de restrição natural ao processo evolutivo. Nessas áreas o uso agronômico intensivo é restrito e as práticas agroflorestais devem ser adotadas em pequenas áreas, de forma a manter a cobertura do solo e evitar a degradação irreversível. Os meios moderadamente frágeis são aqueles nos quais há ligeira predominância dos processos de pedogênese. Nessas áreas a pedogênese é moderada e os processos e fatores de formação já condicionaram solos mais desenvolvidos. São áreas de solos mais profundos, com dissecação fraca à moderada e com uma resiliência do ecossistema moderada. Nestas áreas o uso agronômico é regular; o uso mais intensivo deve ser precedido de uma avaliação em escala local. 4 CONCLUSÕES A região, devido ao isolamento e às dificuldades de acesso, teve sua ocupação direcionada em razão da abertura da BR-364, o que fez com que fossem utilizadas áreas com distintos graus de vulnerabilidade. A variação da vulnerabilidade condiciona diferentes impactos ambientais e graus de resiliência dos ecossistemas. O trecho entre Feijó e Tarauacá deveria ser mantido com a cobertura vegetal original e o uso sustentável, exclusivamente florestal (manejo florestal). No trecho entre Tarauacá e as proximidades de Cruzeiro do Sul prevê-se um uso mais intensivo, devendo predominar práticas agroflorestais. As áreas de várzeas do rio Juruá devem ser mais bem estudadas, para que se tenha definido o seu verdadeiro potencial e um planejamento de ocupação ordenada e sustentável. Natureza & Desenvolvimento, v. 1, n. 1, p. 87-102, 2005 102 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ACRE. 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