Osteotomia mandibular subapical para correção de mordida cruzada

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Oliveira JAGP
RELATO DE CASO
Osteotomia mandibular subapical para correção de
mordida cruzada
Subapical mandibular osteotomy for correction of crossbite
José Augusto Gomes Pereira de Oliveira1
RESUMO
ABSTRACT
A osteotomia mandibular subapical é um procedimento
de extrema versatilidade, relativa simplicidade e baixa morbidade, podendo ser empregada em casos selecionados nos
quais a mecânica ortodôntica tem suas limitações, a despeito
dos enormes avanços ocorridos nas técnicas e nos materiais
utilizados, promovendo estética e função mais satisfatórias.
The subapical mandibular osteotomy is a procedure of
extreme versatility, relative simplicity and low morbidity, and
can be used in selected cases in which the orthodontic mechanics has its limitations, despite the enormous advances
in techniques and materials used promoting aesthetics and
function more satisfactory.
Descritores: Osteotomia. Má oclusão. Cirurgia ortognática.
Keywords: Osteotomy. Malocclusion. Orthognathic
surgery.
1. Professor Titular da Disciplina de Traumatologia Maxilofacial da Universidade
Federal da Paraíba (UFPB), João Pessoa, PB, Brasil, Postdoctoral Research
Fellow em Cirurgia Ortognática na University of Washington, Seattle, USA.
Correspondência: José Augusto Gomes Pereira de Oliveira
Rua Silvino Lopes, 410 – Bairro Tambau – João Pessoa, PB, Brasil – CEP
58039-190
E-mail: [email protected]
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Osteotomia mandibular subapical para correção de mordida cruzada
5) descarte do bloqueio maxilomandibular e checagem
da oclusão cêntrica (Figura 8);
6) síntese do retalho mucoperiósteo;
7) bandagem compressiva mentoniana para minimização do edema pós-operatório.
No pós-operatório imediato, notou-se considerável melhora
no posicionamento do lábio inferior, em decorrência da diminuição do gap interlabial, acarretando satisfatório resultado
cosmético.
INTRODUÇÃO
As osteotomias segmentares na mandíbula fornecem o
refinamento do contorno labial e a oclusão dentária em alguns
casos nos quais somente a mecânica ortodôntica não é suficiente
para a obtenção do resultado almejado.
As osteotomias anteriores subapicais na mandíbula são indicadas para pacientes com acentuada curva reversa da oclusão,
com espaço residual, perda de espaço na área de canino ou
pré-molar ou, ainda, assimetria alveolar anterior. Por meio dessa
técnica, podem-se corrigir os níveis de oclusão acentuados,
produzindo mudanças anteroposteriores na posição anterior do
alvéolo dental (removendo ou criando espaços), corrigir assimetrias dentoalveolares anteriores, alterar a inclinação axial dos
dentes anteriores, diminuir o tempo de tratamento e promover
estabilidade no tratamento dentário1, além de promover movimentos de intrusão acima de 2 mm em pacientes adultos2.
Segundo Capelozza Filho et al.3, a osteotomia de corpo e
a osteotomia subapical pela técnica intrabucal são atualmente
utilizadas nos casos em que se necessita de uma pequena
redução do prognatismo mandibular, com a extração de dentes
(molares ou pré-molares, bilateralmente) ou pelo consumo de
um espaço protético existente.
O objetivo deste artigo é demonstrar uma das indicações
e a aplicabilidade da osteotomia mandibular subapical em um
caso de mordida cruzada.
Figura 1 – Perfil direito do paciente mostrando
posicionamento inadequado do lábio inferior.
RELATO DO CASO
Figura 2 – Vista frontal da oclusão dentária, onde se
observa desvio dos dentes anteriores inferiores para o lado
esquerdo, bem como do frênulo labial inferior.
Paciente do gênero masculino, melanoderma, portador de
desarmonia facial. Ao exame clínico apresentou posicionamento inadequado do lábio inferior (Figura 1), mordida cruzada
anterior e dos pré-molares, lado esquerdo (Figuras 2 a 4). Na
análise de perfil, observou-se um perfil côncavo e, na análise
frontal, desvio do segmento afetado para o lado esquerdo.
O paciente referiu como queixa principal não o aspecto estético, mas sim a dificuldade mastigatória. Uma vez o tratamento
ortodôntico pré-cirúrgico finalizado, foi realizada a cirurgia
de modelos, sem, no entanto, realizarmos a confecção de guia
cirúrgico, pois a intercuspidação dos elementos dentários
demonstrou ser possível o descarte desse recurso.
O procedimento cirúrgico constou de:
1) incisão e divulsão em dois planos, inicialmente no
plano mucoso e, posteriormente, no periósteo, aproximadamente 3 mm abaixo da junção mucogengival,
evitando assim estresse e possível deiscência da
ferida, entre os segundos molares, bilateralmente
(Figura 5), e exodontia do elemento dentário 44;
2) ostectomia vertical no local do elemento avulsionado
para a criação de um gap cirúrgico que promovesse a
mobilização do segmento osteotomizado para o lado
direito, harmonizando a oclusão dentária (Figura
6), osteotomia vertical do lado esquerdo, na distal
do elemento dentário 35, e osteotomia subapical
interligando as osteotomias verticais;
3) mobilização do segmento osteotomizado e bloqueio
maxilomandibular transcirúrgico (Figura 7);
4) fixação interna rígida por meio de miniplacas para
a estabilização do bloco segmentado;
Figura 3 – Vista da oclusão dentária, lado direito,
mostrando o overjet negativo.
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Figura 4 – Vista da oclusão dentária, lado esquerdo,
demonstrando a mordida cruzada.
Figura 7 – Osteotomias subapical e verticais do segmento
já mobilizado e bloqueio transcirúrgico para o correto
posicionamento da oclusão dentária.
Figura 5 – Divulsão do retalho mucoperiósteo realizada
em dois planos para evitar deiscência.
Figura 8 – Osteossínteses com miniplacas para estabilização
do segmento osteotomizado.
Figura 6 – Exodontia do elemento dentário 44
e ostectomia vertical para a criação de um gap cirúrgico.
DISCUSSÃO
No caso relatado no presente estudo, algumas mudanças
positivas encontradas por nós nos perfis de tecidos moles e
duros são similares às encontradas por Speidel et al.4, sendo
elas: postura do lábio mais relaxada, como revelado pelo
comprimento do vermelhão do lábio inferior diminuído, sulco
labial inferior mais côncavo e os vermelhões labiais superior
e inferior movidos mais para posterior em relação ao plano
facial inferior.
Em contrapartida, existem estudos que demonstram que
as desvantagens do procedimento mandibular subapical
incluem a neuropraxia, a possibilidade de defeito periodontal
associado à osteotomia interdental e o fato de que a técnica
não é sempre útil em pacientes com incisivos inferiores pró
inclinados5.
Cheung & Lo6, em um estudo retrospectivo, observaram
que 61% dos pacientes relataram recuperação neurosensorial
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dentro de 3 meses. Esses autores confrontaram seus resultados
com os de Guernsey & DeChamplain7, que sugeriram que a
neuropatia temporária foi resultante da tração sobre o nervo
mentual, para a sua proteção durante a cirurgia, mais do que
um dano à integridade do nervo.
Schultes et al.8 relataram que 51 de 74 pacientes submetidos a osteotomias segmentares mandibulares apresentaram
defeitos ósseos ou dentes perdidos. Os problemas periodontais são provavelmente relacionados ao manejo dos
tecidos moles durante a cirurgia. Uma divulsão ampla dos
tecidos moles no local da osteotomia interdental é capaz de
maximizar a vascularização dos sítios periodontais envolvidos6. No presente caso, não observamos tais alterações.
Acreditamos que uma técnica minuciosa, o mais atraumática
possível, reduz sobremaneira alterações como a neuropraxia,
bem como defeitos periodontais, pela manipulação cuidadosa dos tecidos duros e moles.
Outra complicação das osteotomias segmentares da
mandíbula que pode ocorrer é a significativa diminuição
do fluxo sanguíneo, especialmente na polpa dental, gerando
alguma necrose na maioria dos dentes, além de problemas
periodontais, os quais diminuem relativamente quando os
cortes verticais são realizados em áreas desdentadas, e possui
como vantagem a estabilidade, uma vez que forças mínimas
do tecido mole são aplicadas nesta área9. É importante que
a osteotomia horizontal seja executada em torno de 5-7 mm
abaixo dos ápices dos caninos para evitar desvitalização
dos dentes, bem como pequenos ajustes ósseos devem ser
aplicados na mandíbula e não no segmento osteotomizado,
prevenindo assim lesões às raízes dentárias e problemas
periodontais.
O significativo potencial de mudanças pulpares degenerativas e a necessidade de controles radiográficos de rotina
após cirurgias mandibulares dentoalveolares, sejam anteriores
ou posteriores, são discutidas e devem ser levadas em alta
consideração10.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A osteotomia mandibular subapical é um procedimento
de extrema versatilidade, relativa simplicidade e baixa morbidade11, podendo ser empregada em casos selecionados nos
quais a mecânica ortodôntica tem suas limitações, a despeito
dos enormes avanços ocorridos nas técnicas e nos materiais
utilizados, promovendo estética e função mais satisfatórias.
REFERÊNCIAS
1.Wolford LM, Moenning JE. Diagnosis and treatment planning for
mandibular subapical osteotomies with new surgical modifications.
Oral Surg Oral Med Oral Pathol. 1989;68(5):541-50.
2.Handelman CS. The anterior alveolus: its important in limiting orthodontic treatment and its influence on the occurrence of iatrogenic
sequelae. Angle Orthod. 1996;66(2):95-109.
3.Capelozza Filho L, Suguimoto RM, Mazzottini R. Tratamento
ortodôntico-cirúrgico do prognatismo mandibular: comentários
através de um caso clínico. Ortodontia. 1990;23(3):48-60.
4.Speidel TM, Marine KM, Worms FW. Soft tissue changes associated
with mandibular subapical osteotomy. Angle Orthod. 1979;49(1):56-64.
5.Sarver D. The role of orthodontics in the surgical treatment of obstructive sleep apnea. Disponível em: http://orthocj.com/1999/12/
orthodontics-surgical-treatment-sleep-apnea/. The Orthodontic
CYBERjournal. Postado em 06 de dezembro de 1999.
6.Cheung LK, Lo J. The long-term clinical morbidity of mandibular step
osteotomy. Int J Adult Orthod Orthognath Surg. 2002;17(4):283-90.
7.Guernsey L, DeChamplain RW. Sequelae and complications of the
intraoral sagittal osteotomy in the mandibular rami. Oral Surg Oral
Med Oral Pathol. 1971;32(2):176-92.
8.Schultes G, Gaggl A, Kärcher H. Periodontal disease associated with
interdental osteotomies after orthognathic surgery. J Oral Maxillofac
Surg. 1998;56(4):414-7.
9.Miloro M, Ghali GE, Larsen P, Waite PD. In: Peterson’s principles of
oral and maxillofacial surgery. 2nd ed. New York: BC Decker; 2004.
10.Scheideman GB, Kawamura H, Finn RA, Bell WH. Wound healing
after anterior and posterior subapical osteotomy. J Oral Maxillofac
Surg. 1985;43(6):408-16.
11.Pedersen GW. The versatility of mandibular subapical procedures.
Oral Surg Oral Med Oral Pathol. 1973;35(4):448-61.
Trabalho realizado na Disciplina de Traumatologia Maxilofacial da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), João Pessoa, PB, Brasil.
Artigo recebido: 27/11/2011
Artigo aceito: 28/12/2011
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