- Noções Preliminares de Cristologia - Noções Preliminares de Cristologia Julio Eduardo S. R. Simões 2014 1 Julio Eduardo S. R. Simões S593N Simões, Julio Eduardo dos Santos Ribeiro. Noções Preliminares de Cristologia / Julio Eduardo dos Santos Ribeiro Simões. – São Paulo: PerSe, 2014 142 p. ISBN 1. Teologia Sistemática – Cristologia. I. Título. CDU: 271/278 2 - Noções Preliminares de Cristologia - Agradeço: - Aos meus pais pela sólida formação acadêmica e cristã que me proporcionaram; - Aos meus irmãos, especialmente Carlos Frederico pela companhia, acolhida e empréstimo do computador (sem o qual, naturalmente, tudo não passaria de uma vaga idéia); - Ao Pr Hellmanns Hoffman com sua esposa Suzana, do Instituto Teológico Tempo de Cantar da Igreja Evangélica Assembléia de Deus Ministério Madureira, sediada no Bairro São Mateus, em São Paulo, pelo incentivo e paciência de esperar que esta empreitada (por ele sugerida) chegasse ao fim; - Aos membros da IEAB, especialmente os congregados na Capela do Bom Samaritano. 3 Julio Eduardo S. R. Simões 4 - Noções Preliminares de Cristologia - Aos jovens Henrique Simões Daibert e José Lucas Poncilio Rodrigues, a quem tenho a especial incumbência de apresentar Cristo Jesus. 5 Julio Eduardo S. R. Simões 6 - Noções Preliminares de Cristologia - Introdução Um certo dia, um carpinteiro entrou na sinagoga em Nazaré, como fazia todos os sábados. Ele não era um desconhecido. As pessoas que freqüentavam aquela sinagoga o conheciam, conheciam sua mãe e sua família. Entre os Judeus, naquela época, só podia ler na sinagoga quem era freqüentador, já que os textos estavam em hebraico, língua pouco falada na Galiléia desde a época do Exílio, quando para aí foram trazidas pessoas de diferentes povos, vindo a adotarem o aramaico, e posteriormente o grego, como língua de uso comum. É por isso que dissemos: quem falava hebraico, quem conseguia ler em hebraico, nessa época, eram somente aqueles que freqüentavam a sinagoga, e se dedicavam ao estudo das Escrituras. Este carpinteiro era um destes estudiosos, um destes freqüentadores, e tinha o costume de ler durante as reuniões sinagogais. Ele tomou o texto de Isaías e leu: “O Espírito do Senhor me ungiu e consagrou para dar liberdade aos cativos, visão aos cegos, fazer os mudos falarem e os surdos escutarem, e proclamar a boa nova do Senhor.” Este texto refletia bem o que os fiéis judeus esperavam: 7 Julio Eduardo S. R. Simões um Messias, alguém que viesse pôr fim a sua escravidão em relação a Roma, que lhes desse oportunidade de falar o que quisessem, que fizesse o povo escutar e enxergar que eles precisavam reagir e expulsar os invasores. Um Messias, enfim, que viesse revestido da Glória de Deus, do Poder de Deus, e que libertasse Israel com um simples estalar de dedos. Não esperavam um homem comum, mas sim um super-homem, um todo poderoso Messias, para o qual não haveriam quaisquer limitações. O culto da sinagoga era sempre dirigido por quatro estudiosos da Palavra de Deus, que assim dividiam entre si o serviço: Um lia o texto em hebraico, outro o traduzia para o aramaico. Um terceiro explicava o texto para o povo, e o quarto ( que podemos supor que fosse o mais sábio destes) dava a confirmação de que os outros três não estavam errando em nada. Logo depois de ler o texto, este carpinteiro desobedeceu as regras. Não esperou sequer a tradução por parte do outro estudioso. E, fechando o rolo, disse em alta voz: “Hoje esta passagem da escritura se cumpriu”. 8 - Noções Preliminares de Cristologia Que ousadia! Que desrespeito com a ordem estabelecida! O povo, revoltado, o expulsa da sinagoga, dizendo: “Sabemos quem você é! Você é Jesus, o carpinteiro! Conhecemos sua família! Como ousa se dizer o Messias? O que você pensa, que pode simplesmente fazer o que bem entende de nosso culto aqui na sinagoga? Pois de agora em diante, por não saber respeitar nem a nós nem nossos mestres, considere-se expulso!” Este foi um dia muito importante na vida de Jesus. Este é o dia em que Ele desafiou a compreensão geral de um Messias todo poderoso e Se Revelou. Ele, um trabalhador de uma aldeia na Galiléia, é o Messias. E por causa disto é que os judeus que o conheciam na sinagoga o expulsaram. Entretanto, outros o acolheram. Entre estes, havia Nicodemos, um fariseu, um estudioso da Palavra. Havia também pescadores. E prostitutas. E cobradores de impostos, e até mesmo quem acreditava que a vida só iria mudar se pegassem em armas, como era o caso de Simão, o Zelota. Todos estes também eram judeus,e havia entre eles gente que freqüentava a sinagoga. 9 Julio Eduardo S. R. Simões Jesus e estes novos amigos andavam pela Galiléia e Judéia pregando a Boa Nova, libertando os cativos, curando os doentes. Um dia, Jesus quis saber destes que o seguiam: “Quem vocês dizem que eu sou?” E eles responderam, por Pedro: “Tu és o Messias, o Filho de Deus Vivo!” Estes textos que apresento aqui são o ponto de partida da Cristologia. Claro, a Cristologia não dá respostas. A resposta já foi dada. Nós cremos e sabemos que Jesus de Nazaré é o Filho de Deus Vivo, o Cristo, o Messias. A Cristologia não responde, mas pergunta: “O que significou esta experiência que estes judeus fizeram, ao ponto de desafiarem suas crenças em um Messias todo-poderoso para seguir um marceneiro que nem tinha onde dormir?” Pela Cristologia, então, refazemos esta experiência, pois aquela se ocupa em estudar a pessoa de Jesus Cristo em sua Natureza Humana e Divina, coisa que iremos discutir ao longo deste livrinho. Por este livrinho, esperamos; você também, que começa agora a se dedicar a um estudo mais profundo deste tema; poderá participar na experiência dos discípulos naquele dia em que confessaram Jesus como Messias e 10 - Noções Preliminares de Cristologia Deus Vivo. E isto se fará na medida em que formos juntos construindo um melhor entendimento sobre quem é Jesus e o que Ele veio fazer. Antes, porém, fica o convite: deixe-se supreeender! Da mesma forma que Jesus surpreendeu ao ser um Messias muito diferente do esperado pelo Judaísmo, também você deve ser surpreendido pelo Jesus que os Evangelhos nos mostram, e garantimos que em muitos aspectos Ele é totalmente diferente daquilo que você acreditava que Ele fosse... 11 Julio Eduardo S. R. Simões 12 - Noções Preliminares de Cristologia - Capítulo I – A Cristologia do Novo Testamento. Muito embora traços da esperança por um Messias possam ser encontrados tanto no Antigo Testamento quanto (mais raramente, é bem certo) em tradições religiosas diferenciadas em relação ao Judaísmo (como o Zaratustrismo do Irã e sua esperança de um Salvador final, por exemplo), falar de Jesus de Nazaré e sua identidade como Cristo demanda a leitura atenta dos relatos Bíblicos do Novo Testamento, pois decerto só o conhecemos através destes relatos. Note, em primeiro lugar, que “Messias” e “Cristo” são termos equivalentes entre si, um de origem hebraica (“messias”, que vem de “mashiach”, ou “ )”משיחenquanto outro é de origem grega. (“Cristo”, derivado de “christós”, ou “Χριστός”). Ambos termos significam “o ungido” ou “o escolhido do Senhor”, e chamar a pessoa de Jesus filho de José (ou Yehoshua ben Yussef, nome pelo qual Jesus é conhecido nos evangelhos de Mateus e Marcos, em oposição ao “Yehoshua ben Miriam” (“Jesus filho de Maria”) do evangelho de Lucas) de “Jesus Cristo” ou 13 Julio Eduardo S. R. Simões “Jesus, o Messias” significam reconhecê-lo como o tal “ungido do Senhor”. O conjunto de livros a que chamamos de Novo Testamento é uma coletânea de textos diferentes, escritos em lugares diferentes, em décadas diferentes e direcionadas a pessoas diferentes. Não entraremos aqui nestes detalhes, apenas queremos que você os traga à sua mente. Estes tais “detalhes” são o que chamamos de “condicionamento literário”, ou seja, as “regras do jogo” para se ler os livros em questão. Tendo em vista o que acabamos de expor e firmar, a identidade e Jesus só será obtida a partir de uma leitura que leve em conta todos estes condicionamentos literários, que busque em cada texto desta coletânea aquilo que aparece aí e não aparece em outros lugares, e procure compreender o que as especificidades sobre Jesus significam no contexto do livro no qual estão inseridas, e igualmente em relação ao todo do Novo Testamento e também em continuidade com o Antigo Testamento. Não se assuste, portanto, quando digo e exponho claramente: guardadas as devidas proporções, Jesus é uma personagem nestes textos, e padece do ponto de vista de 14 - Noções Preliminares de Cristologia literatura das mesmas características de qualquer personagens de qualquer texto. Por exemplo, muitos de nós conhecemos a história do Chapeuzinho Vermelho. Ora, a mesma história foi contada com finais distintos por Perrault e pelos irmãos Grimm. A Chapeuzinho Vermelho dos contos de Grimm é diferente da Chapeuzinho de Perrault, e inclusive tem um destino diferente: a de Perrault morre devorada pelo lobo, enquanto a dos Grimm logra sobreviver. Logicamente, a grande diferença entre a Chapeuzinho Vermelho e Jesus filho de José é o fato histórico da existência deste último. Jesus existiu, andou sobre a terra, conversou com seus amigos. E estes amigos, ou os amigos dos amigos, é que escrevem os evangelhos. No entanto, de um ponto de vista de escrita, o Jesus dos Evangelhos é uma personagem, central, nas histórias que vão sendo contadas, e por isto existem algumas variações entre os evangelistas. Por exemplo, Mateus fala de um “Sermão da Montanha”, enquanto Lucas nos apresenta um “Sermão da Planície”. Mateus nos apresenta a oração do Senhor, o “Pai Nosso”, em sua máxima extensão, enquanto Marcos nos fornece uma versão extremamente reduzida. 15