Protocolos e Normatizações - Reumatologia

Propaganda
Protocolos e Normatizações - Reumatologia
Introdução e conceitos gerais sobre dores nos membros
Pacientes com queixas relativas ao sistema músculo-esquelético são
freqüentemente encaminhados aos serviços de reumatologia para investigação,
embora nem sempre sejam portadores de enfermidades reumatológicas. Segundo
Bowyer, 7% das consultas pediátricas são devidas a dores nos membros. Muitas
vezes, no entanto, embora as queixas sugiram uma doença reumatológica, a
etiologia é de natureza diversa, por exemplo, associada a distúrbios mecânicos ou
doenças infecciosas. A literatura registra que cerca de 50 a 60% dos casos
atendidos em serviços de Reumatologia Pediátrica estão ligados a doenças não
reumatológicas, ou seja, são doenças ortopédicas, infecciosas, endocrinológicas,
hematológicas ou que, primariamente, acometem outros sistemas, mas têm
manifestações osteomioarticulares. Portanto, cabe ao pediatra reconhecer o
diagnóstico diferencial das enfermidades que apresentam estas manifestações
mais freqüentemente, assim como traçar uma estratégia de diagnóstico para
melhor investigar e encaminhar o paciente.
Alguns conceitos rápidos são importantes de serem enfatizados. A localização da
dor é extremamente importante, já que esta pode se localizar na articulação, nos
ossos, músculos, tendões, ligamentos ou outras estruturas de partes moles.
Artralgia significa dor na articulação e artrite ocorre quando, além da dor, existem
sinais inflamatórios como calor e hiperemia, além da impotência funcional. O
aumento de volume de uma articulação pode ocorrer pela presença de derrame
articular, inflamação da sinóvia, aumento do volume ósseo ou por edema de
partes moles adjacentes à articulação. Denominamos de artrite crônica aquela que
é fixa em uma articulação por pelo menos 6 semanas e artrite aguda é o
acometimento articular por tempo inferior. Poliartrite ocorre quando há
acometimento de 5 ou mais articulações e oligoartrite 4 ou menos.
Diagnóstico diferencial das dores nos membros na infância e adolescência
Como poderá ser visto abaixo, são muitas as causas de dores que envolvem o
sistema músculo-esquelético, variando de causas localizadas a doenças
sistêmicas, abrangendo uma pluralidade de condições, sendo, portanto, muito
amplo o diagnóstico diferencial. Embora muitas das condições a seguir
mencionadas não sejam de natureza primariamente reumatológica, pode haver
acometimento do sistema em estudo durante o curso das diversas condições ou,
ainda, como nas causas ortopédicas, existe o acometimento de estruturas
articulares ou justa articulares que ocasionam freqüentes erros diagnósticos.
Diagnóstico diferencial das dores nos membros na infância e adolescência
1. Traumatismos
-fratura de stress
-miohematoma
-miosite ossificante
-lesões por esforço de repetição
2. Doenças ortopédicas
-condromalácia da patela
-plica sinovial
-osteocondrite dissecante
-osteocondroses: Legg-Calvé-Perthes, Osgood Schlatter, Sever, Freiberg e Kohler
-epifisiólise
-espondilólise e espondilolistese
-síndrome da hipermobilidade articular
3. Doenças colágeno-vasculares
-febre reumática
-artrites idiopáticas juvenis
-lupus eritematoso sistêmico
-dermatopolimiosite
-esclerodermia
-doença mista do tecido conjuntivo
-síndrome de Sjögren
-vasculites
4.Doenças infecciosas
-bacterianas: artrite séptica, osteomielite, piomiosite,discite
-virais: artrites reativas, miosite viral aguda, sinovite transitória do quadril
-outras: toxoplasmose, doença de Lyme, leptospirose, sífilis, doenças sexualmente
transmitidas, tuberculose, hanseníase, doenças causadas por fungos.
5. Neoplasias
-leucemia
-linfoma
-neuroblastoma
-histiocitose
-tumores ósseos e sinoviais
6. Doenças hematológicas
-anemia falciforme
-outras hemoglobinopatias
-hemofilia
7. Distúrbios endocrinológicos
-hipo e hipertireoidismo
-hipo e hiperparatireoidismo
-hipercortisolismo
-osteoporose
8. Distúrbios nutricionais
-hiperavitaminose A
-escorbuto
-raquitismo
9. Síndromes de origem desconhecida
-dores de crescimento
-fibromialgia
10. Desordens psicossomáticas
-reumatismo psicogênico
-fobia escolar
-distrofia simpático-reflexa
11. Outras causas
-doenças de depósito
-eritema nodoso
-sarcoidose
-farmacodermia
-osteoporose juvenil idiopática
-imunodeficiências
Rotina laboratorial mínima na investigação de pacientes com dores em
membros
É interessante o conhecimento de uma rotina laboratorial mínima necessária para
auxiliar nos rumos da investigação diagnóstica. Algumas vezes são úteis para
confirmar certos diagnósticos e, outras vezes, servem para descartar outras
enfermidades. Exames complementares normais em pacientes poliqueixosos, sem
alterações no exame físico, sugerem quadros funcionais. Esta rotina mínima vai
sendo acrescida de novos exames à medida que o desenvolvimento da
enfermidade e alguns exames laboratoriais ou de imagem sugiram algum
diagnóstico específico. A rotina laboratorial mínima deveria constar de hemograma
completo, velocidade de hemossedimentação e proteínas de fase aguda,
elementos anormais e sedimentoscopia urinários, além de exame parasitológico
de fezes. Outros exames deverão ser solicitados no curso da investigação
diagnóstica, quando necessários. Assim, por exemplo, na presença de uma
poliartrite migratória aguda, em que suspeitamos de febre reumática, deverão ser
solicitados, além dos exames da rotina mínima, cultura de orofaringe, dosagem da
antiestreptolisina O e eletroforese de proteínas.
Rotina laboratorial mínima na investigação das dores nos membros na
adolescência:hemograma completo, velocidade de hemossedimentação e
proteínas de fase aguda, elementos anormais e sedimento urinário exame
parasitológico de fezes
Alguns exemplos práticos da utilização desta rotina laboratorial mínima:
1- hemograma mostrando leucocitose sugere processo infeccioso, leucemia ou
AIJ sistêmica; leucopenia pode ser encontrada no LES e leucemia;
trombocitopenia pode ser encontrada no LES, leucemia e infecções graves e
trombocitose pode ser achado da AIJ, principalmente da forma sistêmica; a
púrpura de Henöch-Schönlein não tem trombocitopenia e isto pode ser útil para
diferenciá-la de uma leucemia.
2- A velocidade de hemossedimentação e as proteínas de fase aguda
apresentam-se aumentadas nos processos inflamatórios, infecciosos e nas
neoplasias, encontrando-se em valores normais na maioria das doenças
ortopédicas, síndromes de amplificação da dor e dores de origem psicogênica.
Crianças ou adolescentes com queixas vagas de dores em membros, sem
acometimento sistêmico, com VHS normal, provavelmente terão distúrbios de
origem funcional e não doenças orgânicas. Por exemplo, em crianças ou
adolescentes com queixas de dores noturnas com VHS alterado o diagnóstico de
dor de crescimento será pouco provável.
3- Elementos anormais e sedimento urinário: como o sistema gênito-urinário pode
estar acometido na maioria das doenças sistêmicas, este exame serve como um
bom método de triagem. Assim, pacientes com aquele quadro descrito
anteriormente como suspeito de LES provavelmente terão EAS alterado. As
vasculites, que podem apresentar-se como uma febre de evolução arrastada,
podem ter seu diagnóstico direcionado a partir do encontro de hematúria. Na
Síndrome de Reiter, a piúria estéril como apresentação da uretrite é um critério
diagnóstico.
4- O exame parasitológico de fezes é útil sob dois aspectos: pacientes infestados
podem apresentar quadros de artralgia ou, menos freqüentemente, artrite reativa.
Além disto, como em muitas ocasiões necessitaremos da terapêutica com
corticosteróide, a identificação de pacientes com certos agentes como o
strongiloides stercoralis permite seu tratamento precoce para que se evitem
complicações de sua disseminação.
Roteiro de investigação de dores nos membros
Investigação das queixas músculo-esqueléticas
1. Localização: articulação, músculo. osso, entese, tendão, dor referida (por
exemplo, na dor do joelho, investigar o quadril, dor vaga (dores psicogênicas e
síndromes de amplificação da dor) ou localizada (doenças infecciosas ou
inflamatórias, neoplasia, unilateral (infecção, tumor), bilateral ou alternante (dor de
crescimento), simetria; fixa ou migratória, musculatura proximal (miopatias
inflamatórias) ou distal (neuropatias)
2. Presença de sinais inflamatórios: dor espontânea ou à palpação; calor; aumento
de volume; hiperemia.
3. Início: gradual (artrite idiopática juvenil) ou súbito (febre reumática; artrite
séptica)
4. Horário preferencial: doenças inflamatórias cursam com dor geralmente pela
manhã, após período de repouso (rigidez matinal); dor de crescimento e osteoma
osteóide ocasionam dor noturna.
5. Duração: persistente ou transitória. As dores de origem inflamatória melhoram
com o movimento e as de origem diminuem com o repouso. Melhora associada ao
uso de medicações.
6. Perturbação das atividades da vida diária.
Critérios diagnósticos de febre reumática
Guia diagnóstico para ataque inicial de Febre Reumática (Critério de Jones,
atualizado em 1992
Manifestações maiores
Cardite,Poliartrite, Coréia, Eritema marginatum,nódulos subcutâneos
Manifestações menores
Artralgia, Febre, Alteração proteínas de fase aguda, intervalo PR (ECG)
Evidência de infecção estreptocócica Prévia
Cultura de orofaringe positiva para o estreptococo beta hemolítico do grupo A,
títulos de anticorpos anti estreptocócicos aumentados ou em ascensão
A ocorrência de 2 critérios maiores ou 1 maior com 2 menores, ambos
acompanhados de uma evidência prévia de infecção estreptocócica, torna o
diagnóstico de Febre Reumática bastante provável.
O valor da antiestreptolisina O (ASO) no diagnóstico da febre reumática
Devido às baixas condições sócio-econômicas de nossa população, é freqüente
encontrarmos níveis de antiestreptolisina O (ASO) um pouco elevados em relação
ao que se considera normal (250-500 U Todd, na dependência da idade,
localização geográfica e estação do ano). Daí, mais importante, chamamos de
“curva de ASO” quando detectamos valores seriados ascendentes (fase inicial) ou
descendentes (fase posterior) da ASO, sugerindo infecção recente. A ASO
começa a aumentar uma semana após o início da faringoamigdalite, alcança seu
pico por volta da terceira ou quarta semana (quando a criança provavelmente já
estará sintomática para FR) e, depois, começa a baixar seus valores. Como a
capacidade de depuração de anticorpos é variável entre os indivíduos, não existe
um parâmetro ou tempo fixo após o qual a ASO deverá estar dentro dos valores
habituais, isto é, enquanto em uma pessoa a ASO pode normalizar-se em um ou
dois meses, em outra isso pode levar cinco meses. De um modo geral, os valores
da ASO normalizam-se até seis meses após a infecção estreptocócica. Não se
devem usar anti-inflamatórios ou tornar mais freqüente a aplicação da penicilina
benzatina com o intuito de diminuir os valores de ASO, pois eles retornarão ao
normal por si só.
Tratamento da febre reumática
O tratamento da febre reumática consiste no tratamento dos sintomas e nas
profilaxias primária e secundária.
Tratamento sintomático da FR
1. Artrite: ácido acetil salicílico - 80-100 mg/kg/dia, diminuir lentamente após 15
dias.
2. Cardite: prednisona - 1-2 mg/kg/dia por 2-3 semanas, diminuição lenta após;
repouso.
3. Coréia: haloperidol, ácido valpróico, benzodiazepínico, clorpromazina
Profilaxia primária da FR: seu objetivo é tratar o paciente com infecção
estreptocócica da orofaringe para evitar que ele desenvolva febre reumática.
Penicilina benzatina (1a escolha)
Maior 25 kg: 600.000 U, intramuscular, dose única
Menor 25 kg: 1.200.000 U, intramuscular, dose única
Outras opções:
Fenoximetipenicilina: 50.000 U/kg/dia, 6-6 horas, via oral, 10 dias.
Penicilina procaína: 400.000 U, 12-12 horas, intramuscular, 10 dias.
Amoxicilina: 50 mg/kg/dia, 8-8 horas, via oral, 10 dias
Cefalexina: 50-100 mg/kg/dia, 6-6 horas, via oral, 10 dias
Azitromicina: 12 mg/kg/dia, 1 vez ao dia, via oral, 5 dias
Outras cefalosporinas orais também podem ser utilizadas
Para alérgicos à penicilina:
Eritromicina: 20-40 mg/kg/dia, 6-6 horas, via oral, 10 dias.
Azitromicina: 12 mg/kg/dia, 1 vez ao dia, via oral, 5 dias
Lincomicina: 30 mg/kg/dia, 12-12 horas, intramuscular, 10 dias.
Profilaxia secundária da FR: seu objetivo é evitar novos surtos naqueles pacientes
que tiveram febre reumática.
Penicilina benzatina (1a escolha)
Maior 25 kg: 600.000 U, intramuscular, a cada 21 dias
Menor 25 kg: 1.200.000 U, intramuscular a cada 21 dias
Fenoximetilpenicilina: 250.000 U/dose (crianças < 25 kg) ou 500.000 U/dose (>25
kg),12-12 horas.
Alérgicos à penicilina : sulfadiazina 250 mg/dose (<12 anos) ou 500 mg/dose (>12
anos), 12-12 horas.
Pacientes sem acometimento cardíaco devem fazer a profilaxia até 18 anos de
idade ou por cinco anos após seu início, optando-se sempre pelo que for de maior
duração. Mesmo com a indicação de suspensão, caso o paciente esteja exposto a
fatores de risco, como por exemplo freqüentar ambientes fechados como quartéis,
salas de aula, ou tenha uma profissão que lide diretamente com crianças na faixa
etária de escolares ou adolescentes (médicos, professores), recomenda-se o
prolongamento da profilaxia. Caso tenha havido comprometimento cardíaco, o
ideal é que a profilaxia seja por tempo indeterminado, mas alguns autores
admitem que ela deve estender-se até pelo menos os 35 anos de idade.
O Ministério da Saúde, a Sociedade Brasileira de Pediatria e as secretarias
estaduais e municipais de Saúde vêm tentando divulgar e ampliar o uso do
“Cartão da Penicilina Benzatina”. Todos os pacientes com FR deveriam possuir tal
cartão, que contém várias informações úteis, bem como local apropriado para
marcação e agendamento das datas de aplicação da medicação. Cabe às
pessoas da área de saúde (médicos, enfermeiros, auxiliares de enfermagem e
outros profissionais) facilitar a aplicação da medicação, evitando obstáculos como
a necessidade de que o paciente passe por uma consulta médica a cada 21 dias,
o que o desestimula a manter a profilaxia. Os serviços de saúde deveriam, realizar
também, através principalmente do setor de serviço social, uma busca aos
pacientes faltosos.
Classificação atual das artrites idiopáticas da infância
As artrites idiopáticas juvenis (AIJ) constituem o segundo grupo de doenças
reumáticas mais freqüentes, diferentemente dos países desenvolvidos, onde a
febre reumática é rara e as AIJ constituem a principal causa de enfermidade
reumática na faixa etária pediátrica.
Classificação das artrites idiopáticas da infância proposta em 1997.
1. Artrite sistêmica
2. Poliartrite (fator reumatóide negativo)
3. Poliartrite (fator reumatóide positivo)
4.Oligoartrite
a- persistente
b-extendida
5. Artrite associada a entesite
6. Artrite psoriásica
7. Outros:
a- não preenche critérios para quaisquer categorias 1-6 ou
b- preenche critérios para mais de uma categoria 1-6
Critérios diagnósticos do LES
Eritema malar,Lesão discóide, Fotossensibilidade, Úlceras orais, Artrite não
erosiva, Serosites, Doença renal, com proteinúria acima de 0,5 g/dia ou cilindrúria,
Alterações neuropsiquiátricas: convulsão, psicose, Distúrbios hematológicos:
anemia hemolítica com, reticulocitose ou leucopenia (<4.000 leucócitos/mm3 em
duas ou mais ocasiões) ou linfopenia (< 1.500 linfócitos/mm3 em duas ou mais
ocasiões) ou trombocitopenia (<100.000 plaquetas)
Alterações imunológicas: presença de anticorpo anti-DNA ou anticorpo anti Sm ou
presença de teste falso positivo para sífilis ou nível sérico anormal de anticorpo
anticardiolipina (IgG ou IgM) ou anticoagulante lúpico
Presença do fator antinuclear
A presença de 4 dos 11 critérios acima confere altas sensibilidade e especificidade
para o diagnóstico da enfermidade
Critérios diagnósticos da Doença de Kawasaki
São necessários 5 dos 6 critérios listados abaixo para se fazer o diagnóstico da
doença, excluíndo-se doenças como viroses exantemáticas, escarlatina, síndrome
do choque tóxico, dentre outras.
Critérios diagnósticos da Doença de Kawasaki
febre por mais de 5 dias, não responsiva a antibioticoterapia
hiperemia conjuntival
alterações da orofaringe
lábios eritematosos, edemaciados e fissurados
eritema difuso da orofaringe
língua em ´´framboesa`` ou ´´morango``
alterações nas extremidades periféricas
eritema de palmas e plantas
edema de dorso demãos e pés
descamação da pele das mãos e pés
exantema polimorfo
linfadenopatia crevical geralmente única >1.5 cm
Manuais
- Corticoterapia em doenças reumáticas (gentilmente cedido pela Profa. Maria
Odete Estves Hilário)
[Corticoterapia em Doenças Reumáticas]
[Mecanismo de Ação dos Glicocorticóides]
DOCUMENTO PRODUZIDO PELO DEPARTAMENTO DE REUMATOLOGIA
Download