Genética Animal - Mutação 1 MUTAÇÃO GÊNICA Mutação é uma alteração súbita e herdável na estrutura do material genético. Esta alteração pode levar a uma mudança correspondente no fenótipo do indivíduo. As mutações são fontes extremamente importantes de variabilidade genética nas populações, pois fornecem novas informações genéticas. A recombinação – mistura de genes paternos durante a meiose por meio de crossing over -, que é outra fonte de variabilidade, apenas rearranja informações genéticas já existentes em novas combinações. Sem a mutação, todos os genes ocorreriam apenas em uma forma, pois não existiriam alelos. Portanto, os organismos não seriam capazes de evoluir e adaptarse às mudanças ambientais. Tradicionalmente, as mutações envolvem alterações na molécula de DNA, podendo ocasionar mudanças no fenótipo. No entanto, as alterações cromossômicas numéricas e estruturais também podem induzir alterações fenotípicas herdáveis. Simplificadamente, uma mutação gênica ocorre em decorrência de substituições em pares de bases. Tais substituições originam mutações pontuais. Como conseqüência da substituição de um par de bases, a seqüência de aminoácidos de uma proteína pode ser alterada. Caso essa mudança altere a atividade bioquímica da proteína, poderá interferir no fenótipo. Esse é o caso da hemoglobina na anemia falciforme e da insulina na diabete, em que um aminoácido da proteína foi trocado devido à substituição de um par de bases de um gene. Além disso, a substituição do par de bases pode mudar o códon original para um códon finalizador, resultando em término precoce da síntese de uma proteína. Sempre que bases forem adicionadas ou deletadas, ocorre uma mudança de matriz de leitura, Deleção alterando a composição dos aminoácidos de toda a proteína. Por outro lado, devido à Leitura da fita redundância do código genético, nem todas as alterações de pares de bases levam a um aminoácido alterado na proteína. Logo, quando as mutações não promovem efeitos no fenótipo são chamadas de mutações silenciosas. Elas podem ser identificadas através da comparação de seqüências de pares de bases entre genes normais e mutantes. ▪ Exemplo de mutação pontual → Anemia Falciforme ou Siclemia: Causada por uma alteração na cadeia β da hemoglobina, decorrente da substituição de uma adenina por uma timina (transversão) no sexto códon do gene. Através dessa mutação pontual, o códon GAA transforma-se em GTA, provocando substituição do ácido glutâmico pela valina na cadeia polipeptídica. Essa simples substituição de nucleotídeos e de um único aminoácido na cadeia polipeptídica leva a hemoglobina a assumir uma configuração espacial diferente, que causa a deformação das hemáceas. A hemoglobina alterada em forma de foice é denominada hemoblobina S (de sickle cell anemia). Genética Animal - Mutação 2 → Classificação das mutações: 1) Mutação somática: Aquela que ocorre em genes de células somáticas. Portanto, permanece restrita ao indivíduo que a porta, não sendo transmitida aos descendentes através dos gametas. Exemplo: ◦ Heterocromia de íris: Condição na qual as duas íris são de cores distintas ou apenas uma porção da íris é de cor diferente do restante. Se ambas as íris apresentarem coloração distinta, a mutação ocorreu na primeira célula que originou as demais. Caso a mutação surja em um estágio mais avançado do desenvolvimento da íris, o indivíduo apresenta apenas uma mancha em uma das íris. Genética Animal - Mutação 3 2) Mutação germinativa: Aquela que ocorre em células que originam gametas, sendo portanto natureza sem uma causa aparente. Podem ser devidas a erros na replicação do DNA ou a mutagênicos químicos e físicos. Exemplo: ◦ Carneiros da raça Ancon: O primeiro registro de mutação germinativa dominante em animais domésticos foi feito por Seth Wright em 1791. Wright notou um carneiro com pernas incomumente curtas no rebanho de carneiros de sua fazenda. Ocorreu a ele que seria vantagem ter um rebanho inteiro de carneiros com essa característica, pois impossibilitaria que os animais pulassem os baixos muros de pedra de sua vizinhança em New England. Wright, então, cruzou seu novo carneiro de pernas curtas com 15 ovelhas na estação seguinte. Nasceram 15 carneiros dos quais 2 tinham pernas curtas. Estes foram cruzados, dando origem a uma nova linhagem na qual a característica expressava-se em todos os indivíduos. → Agentes mutagênicos: I) AGENTES FÍSICOS: - Temperatura: O aumento da temperatura promove a quebras das ligações entre os átomos. - Radiações: Incluem radiações ionizantes de alta energia, tais como raios X, raios gama, nêutrons, e partículas beta e alfa, bem como radiação não-ionizante de baixa energia, luz ultravioleta, cada uma induzindo mutações por sua ação sobre o DNA. ◦ Radiação Ionizante: O espectro de radiação eletromagnética é muito amplo e estende-se desde longas ondas de rádio até os raios cósmicos, que podem ter 10-14 cm. Quanto menor o comprimento de onda, maior a energia dos fótons eletromagnéticos, resultando em penetração nas células e tecidos. Nesse processo, os fótons podem colidir com um dos elétrons do átomo e fazê-lo mudar de órbita. Assim, um átomo previamente neutro torna-se carregado positivamente, pois existe maior carga positiva no núcleo do átomo do que cargas negativas nos elétrons orbitais. Então, esse átomo, agora carregado positivamente, e o elétron formam um par de íons. Os raios X de alta energia e os raios gama produzem trilhas de pares de íons em sistemas biológicos. Átomos ionizados e as moléculas em que eles ocorrem são quimicamente muito mais reativos do que os neutros. Além disso, os elétrons perdidos por um átomo nesse processo se movem em alta velocidade, fazendo com que outros átomos também se tornem ionizados. Cada elétron perdido por um átomo é ganho por outro, tornando-o negativamente carregado. O resultado desse repetido processo de ionização é uma cadeia de pares de íons ao longo da trilha de fótons de alta energia. Os efeitos mutagênicos resultam das reações químicas sofridas pelos íons à medida que suas cargas são neutralizadas. Genética Animal - Mutação 4 Um resultado do processo de ionização é a quebra das ligações açúcar-fosfato do DNA. Caso a quebra do filamento ocorra em dois ou mais pontos próximos, pares de nucleotídeos podem ser perdidos e a matriz de leitura do mRNA transcrito é alterada. O resultado final pode consistir em proteínas ou enzimas com capacidade funcional reduzida ou mesmo inoperantes. Este último evento pode ser letal, particularmente em homozigotos. As radiações ionizantes podem causar: ● Formação de tautômeros raros: Tautômeros são formas alternativas das purinas e pirimidinas no DNA e no RNA. A tautomerização ocorre pelo rearranjo de elétrons e prótons na molécula. Os tautômeros raros de adenina, citosina, guanina e timina diferem das formas comuns pelas posições de átomos de hidrogênio e, como resultado, algumas ligações simples tornam-se duplas. ● Substituição de uma base por outra: Consistem em transição e transversão. A transição é a substituição de uma purina (A e G) por outra ou de uma pirimidina (T e C) por outra. Já a transversão é a troca de uma purina por uma pirimidina. A T/U G C ● Deleção ou adição de uma base em uma das fitas de DNA: Adições e deleções são referidas coletivamente como frameshift mutations, porque alteram a estrutura de leitura de todas as trincas de pares de bases no gene a partir do ponto em que surgem. Isso ocorre porque o trecho deixa de ser múltiplo de 3, mudando a leitura do segmento de DNA, o que resulta em aminoácidos alterados a partir daquele ponto e, freqüentemente, no aparecimento de um códon de terminação. ● Inversão da seqüência de pares de bases de nucleotídeos dentro da molécula de DNA. ● Formação de peróxidos. ◦ Radiação não ionizante: A radiação ultravioleta, embora não possua energia suficiente para ionizar o DNA, é capaz de causar mutações na molécula. O comprimento de onda específico que é absorvido pelo DNA é de 254nm e, embora não seja profundamente penetrante no tecido, é eficiente para matar bactérias, fungos e aumentar a incidência de câncer de pele em animais. A mais conhecida ação da UV no DNA é a formação de dímeros de pirimidina, ligações carbono-carbono entre pirimidinas adjacentes, sendo comum com a timina. Isto resulta na distorção da molécula ou ligação entre moléculas adjacentes, cessando a replicação do DNA temporariamente. Genética Animal - Mutação 5 → Mecanismos de reparo do DNA: 1) Mecanismo de reparo por fotorreativação: Uma enzima fotorreativadora é ativada na presença de luz. Ela liga-se aos dímeros de pirimidina e utiliza a energia da luz para quebrar as ligações que formam o mesmo, restaurando a estrutura original da molécula. 2) Mecanismo de reparo por excisão: Consiste em um processo multienzimático dividido em 4 etapas. Inicialmente, uma enzima endonuclease reconhece a distorção causada pelo dímero e corta um dos filamentos próximo ao mesmo. Esta é chamada etapa de incisão. Em seguida, a DNA-polimerase I sintetiza um novo filamento, deslocando o filamento velho que contém o dímero. Esta é chamada síntese de reparo. Em uma terceira etapa, denominada excisão, um segundo corte além do dímero é feito pela exonuclease, removendo-o da molécula de DNA. Finalmente, o filamento recém sintetizado é unido ao original pela DNA-ligase. 3) Mecanismo de reparo por recombinação pós-replicativa: Quando a replicação chega a um dímero, ela é bloqueada devido à distorção da molécula. Eventualmente a replicação continua, mas pulando a região do dímero. Isto resulta em falhas no filamento filho correspondentes ao dímero no filamento parental. Essas falhas podem ser fechadas por síntese de reparo. O dímero não é excisado ou quebrado, mas sim retido na molécula de DNA parental. II) AGENTES QUÍMICOS: - Análogos de bases: Consistem em moléculas com estrutura parecida com uma base nitrogenada natural e que às vezes são incorporadas ao DNA durante a replicação. Então, o Genética Animal - Mutação 6 análogo pareia-se com a base “errada”, induzindo uma mutação por substituição de bases. -Reagentes para purinas e pirimidinas: São substâncias que reagem com o DNA e alteram diretamente a estrutura da base, em vez de se incorporar à molécula. Esses reagentes desaminam adenina, citosina e guanina, resultando em mutações por pareamento errado ou substituição de pares de bases. O ácido nitroso (HNO2) é uma dessas substâncias mutagênicas. Ela causa alterações nas bases do DNA por substituir um grupamento amina (-NH2) por uma hidroxila (-OH). -Corantes acridínicos: Classe de substâncias químicas que se intercalam entre as bases do DNA. Isso aumenta a rigidez e altera a conformação da dupla hélice, distorcendo a molécula e rompendo o alinhamento e o pareamento das bases. Devido a isso, ocorrem deleções ou adições de pares de base durante a replicação. -Agentes alquilantes: Reagem com o DNA adicionando grupamentos etil ou metil às bases. Isto tem como conseqüência o mau pareamento ou total perda da base afetada, criando uma fallha. A principal base afetada é a guanina, embora outras também possam ser alquiladas. Exemplos: EMS (etilmetanossulfonato), DES (dietilsulfato), enxofre nitrogenado e gás mostarda. Este último foi um dos primeiros grupos de mutagênicos químicos descobertos através de estudos envolvendo operações militares durante a Segunda Guerra Mundial. → Referências bibliográficas: ▫ Genética – George W. Burns e Paul J. Bottino – Editora Guanabara Koogan – 1991 ▫ Concepts of genetics – William S. Klung e Michael R. Cummings – Editora Prentice Hall – 1997 ▫ Modern genetic analysis – Anthony J. F. Griffiths, Willian M. Gelbart, Jeffrey H. Miller e Richard C. Lewontin – Editora W. H. Freeman and Company - 1999 ▫ Genética – Eldon J. Gardner e D. Peter Snustad – Editora Guanabara Koogan – 1986 ▫ Dicionário Médico – Blakiston - Editora McGraw-Hill Book Company - 1982