TRATAMENTO DA FASCITE PLANTAR CRÔNICA DOLOROSA COM ONDAS DE CHOQUE EXTRA-CORPOREA (E.S.W.T.) Moraes, Maurício de 1; Sergio Quispe 2 RESUMO Foram estudados, retrospectivamente, 40 pacientes portadores de Fascite Plantar crônica dolorosa, submetidos ao tratamento com Terapia por Ondas de Choque Extracorpórea (E.S.W.T.) no período de 2001 a 2002. Utilizou-se protocolo europeu com 03 sessões de 2000 impulsos com energia baixa/moderada sem qualquer tipo de anestesia.Todos pacientes estudados apresentavam tratamento convencional pregresso sem sucesso, de pelo menos 03 meses . Obtivemos 85% de resultados satisfatórios (MUITO BOM e BOM) e 15% de insatisfatórios (REGULAR e RUIM). Houve relato de melhora do quadro doloroso com 06 semanas de média, com poucos efeitos indesejados (03 casos de equimose local). Consideramos tratamento eficaz para a patologia estudada, não invasivo, seguro e de boa aceitação do paciente. 1. Mestre em Ciências da Saúde pela Faculdade de Medicina da Fundação do ABC, membro titular da SBOT 2. Médico-ortopedista, membro titular da SBOT INTRODUÇÃo A utilização das E.S.W.T.(Extracorporeal Shock Waves Therapy/ Ondas de choque extra-corpóreas, como tratamento da litíase urinária revolucionou a Urologia. Desde 1986¹, com modelos experimentais²‛³ na consolidação das fraturas⁴‛⁵ e das pseudoartroses⁶‛⁷, confirmadas posteriormente pelo potencial osteôgenico das ondas de choque (verificada em outras publicações, principalmente da Europa⁸‛⁹‛¹⁰), passou-se a utilizá-las no tratamento das patologias ósseas e músculo-tendineas na Ortopedia com sucesso. O calcanhar doloroso, geralmente associado com esporão inferior é uma síndrome ortopédica¹¹´¹²´¹³ comum. A causa desta entidade clínica permanece um mistério. O uso dos métodos conservadores com protocolo vasto de mandamentos não cirúrgicos visa aliviar essa condição nos pacientes¹⁴‛¹⁵‛¹⁶. Quando o tratamento conservador falha, a liberação cirúrgica tem sido indicada, com os mais variados resultados¹⁷‛¹⁸‛¹⁹. Pouco se conhece do efeito exato das ondas de choque nas patologias tendíneas. Postulam-se algumas teorias sobre o efeito da onda de choque na junção tendão-osso, e seus efeitos analgésicos. A formação local de substâncias inibidoras da dor, esgotamento dos potenciais dos receptores das células nervosas por hiperestimulação, e também o efeito de neoformação tendínea (microcirculação) foram demonstradas em diversos trabalhos experimentais²⁰‛²¹‛²². O presente estudo retrospectivo apresenta os resultados e a eficácia da terapia por ondas de choque ( E.S.W.T.) na fascite plantar dolorosa , refratária ao tratamento convencional. MATERIAIS E MÉTODOS No período de 2001 a 2002, no Centro de Ortopedia e Traumatologia (CENTRO) do Hospital Bandeirantes , foram tratados 177 casos de fascite plantar (com ou sem esporão), refratários ao tratamento convencional. Com o objetivo de avaliar a eficácia da E.S.W.T., foram incluídos retrospectivamente neste trabalho 40 pacientes. Utilizamos critérios de inclusão e exclusão para tal estudo.(vide tabela 01) Tabela 01 Critérios de inclusão: • • • Dor típica a digito pressão Carga (início de marcha e durante marcha ) Tratamento conservador sem sucesso , por mais de 3 meses Critérios de exclusão: • • • • • • Idade menor que 18 anos Gravidez Alterações Vasculo – neurológicas Infecção local Tumores Doenças de coagulação sanguinea Do total de 177 pacientes, foram incluídos no estudo 40 (22,5%), sendo que 19 (10,5%) foram excluídos, e infelizmente 118 (67%) não foram localizados por motivos diversos (vide tabela 02). Tabela 2 - Total de Casos 67% 90,0% Pesquisados Excluidos Não Encontrados 60,0% % 30,0% 10,5% s do ui s cl do Ex sa ui sq Pe 0,0% 22,5% Dos 40 pacientes que preencheram os requisitos, 16 eram homens e 24 mulheres. A média de idade foi de 59 anos (41 a 77 anos). Pé esquerdo tratado em 25 casos e pé direito em 15, dos quais 06 foram bilaterais (tabela 03 e 04). Tabela 3- 40 Pacientes Pesquisados 50 Quantidade 40 24 16 Homens Mulheres Total Total Mulheres Homens 0 Sexo Tabela 4 - Pés Acometidos 25 Direitos Esquerdos 15 Bilateral* 6* Direitos Esquerdos Bilateral* Dor persistente entre 03 meses à 04 anos .Todos os pacientes usaram antiinflamatórios não hormonais ou analgésicos por várias semanas. Destes, 22 pacientes realizaram pelo menos 10 sessões de fisioterapia. Infiltração com corticóide local foi utilizada em 13 pacientes. Antes do tratamento com E.S.W.T., 07 pacientes já utilizavam “calcanheiras” para diminuição e amortecimento do impacto contra o solo. A terapia foi administrada com litotripsor (gerador de ondas de choque da marca DORNIER modelo COMPACT S) que se utiliza a emissão de pulso eletromagnético²³ sobre um transdutor, com fluxos de energia (mecânica) entre 0,03 a 0,12 mJ/mm² , sendo realizadas 03 sessões de 2000 disparos com intervalo médio de 10 dias ( 7 a 14 dias ) . O gerador emite 120 disparos por minuto, sendo a duração das sessões de 16 minutos 40 segundos. A energia acima citada foi aplicada de maneira progressiva, conforme aceitação do paciente. Nenhum caso necessitou anestesia. Os pacientes foram posicionados lateralmente, com a parte medial do retro-pé sobre o transdutor, onde a onda de choque era transmitida tangencialmente ao calcâneo, na sua região plantar, perpendicular ao seu maior eixo. Para localização da área a ser tratada, utilizamos a radioscopia acoplada ao litotripsor associada à determinação do ponto mais doloroso , referido pelo próprio paciente²⁴‛²⁵. Os pacientes foram avaliados utilizando um protocolo misto, que se baseava numa escala analógica visual (V.A.S.), que varia de 10 à 0 pontos , onde 10 significa dor incapacitante e o 0 ausência de dor , associada ao interrogatório sobre dor durante a marcha expressa em metros , dor no início da marcha (ou primeira ¨pisada¨ pela manhã) , restrição às atividades da vida diária ( trabalho ,esporte/lazer ), dor no repouso e dor à digito-pressão (vide tabela 05). Tabela 05: Terapia por ondas de choque extra- corpórea E.S.W.T. Protocolo Nome: Altura: Peso: Diagnóstico: Anamnese Q.D. : Sob cuidados médicos, a partir de: Data Nasc.. : M F D Alívio das dores, a partir de: Exames Prévios Rx USG TC/RNM Ttos Prévios medicação infiltração cirurgia Data: Data: Data: fisioterapia palmilha Exame Clínico antes: Dor Escala de caminhada sem dor 0m <100m <1000m >1000m 45 30 15 0 E Dor depois do aquecimento ☺ Dor a pressão 0 1 2 5 6 7 8 9 15 10 ☻ 3 4 No trabalho ☺ 0 1 Restrição diária 2 3 4 5 6 7 8 9 10 ☻ Esportes/ lazer Repouso ☺ 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 ☻ ☺ 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 ☻ Total Após TOCE: 1. 2. 3. Dor 1 2 5 6 7 8 9 45 30 15 0 15 10 0m <100m <1000m >1000m Escala de caminhada sem dor Dor depois do aquecimento ☺ Dor a pressão 0 3 4 ☻ No trabalho ☺ 0 1 Restrição diária 2 3 4 5 6 7 8 9 10 ☻ Esportes/ lazer Repouso ☺ 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 ☻ ☺ 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 ☻ Total Após TOCE: 1. 2. 3. Os resultados foram incluídos em 04 (quatro) grupos que se utilizaram de dois parâmetros para inclusão. O primeiro incluiu pontuação de acordo com questionário prévio ao tratamento, e no mínimo 6 meses após o tratamento. O segundo parâmetro foi dividido em MUITO BOM, BOM, REGULAR e RUIM (vide tabela 06). Tabela 06: Critério para avaliação das dores Grupo 1 (0 –25 ) MUITO BOM: Completamente sem queixas • • • Sem dor com aumento de peso (carga). Sem hipersensibilidade. Sem dor pela manhã ao começar marcha Grupo 2 (26 –50 ) BOM : Poucas queixas restantes. • Praticamente sem dor com aumento de peso (carga). • Discreta sensibilidade local. • Sem dor pela manhã ao começar marcha Grupo 3 (51 – 75 ) REGULAR : Pouca melhora • • Dor ainda presente com aumento de peso( carga). Hipersensibilidade no local. Dor pela manhã ao começar Grupo 4 ( 76 – 100 ) RUIM: Sem mudança após a TOCE. • A dor não mudou após terapia. Retrospectivamente, as avaliações dos resultados foram realizadas com pelo menos 06 meses após o tratamento (03 sessões), variando de 06 meses a 42 meses de seguimento. Pacientes que realizaram 02 sessões ou 01 sessão não foram incluídos no grupo de estudo. Todos os pacientes foram orientados a usar “calcanheiras”. Nenhum referiu outro tipo de tratamento no período avaliado. RESULTADOS De acordo com os critérios já descritos, 55%(22) dos casos foram classificados como MUITO BOM, 30%(12) casos BONS, 5%(02) casos REGULARES e 10%(04) casos RUIM , sendo os resultados MUITO BOM e BOM responsáveis por 85%(34). Nenhum caso teve piora com E.S.W.T.. Todos os pacientes referiram desconforto variável durante o tratamento, com sintomas de dor, porém a maioria referiu melhora logo após a primeira sessão, suportando energia maior do fluxo nas sessões seguintes. Na média de 45 à 60 dias , os pacientes já apresentavam os resultados citados²⁶. Nenhum deles interrompeu o tratamento por dor, ou não retornou para as sessões seguintes. Observamos discreta equimose na região da aplicação em 03(três) pacientes, que regrediu espontaneamente, não impossibilitando o término do tratamento. Não foi possível mensurar o número de pacientes que realmente utilizou a “calcanheira” (vide tabela 07). Tabela 7- Resultados G1- Muito Bom G2- Bom 55% G3- Regular G4- Ruim 10% 5% 30% DISCUSSÃO Os resultados obtidos como MUITO BOM e BOM somaram 85%(34), equiparando-se com resultados da maioria dos trabalhos verificados na literatura mundial . Seguimos o protocolo da Sociedade Alemã, desenvolvida por R. Thiele e cols. Não podemos afirmar se utilizando número menor de sessões, com o aumento do número de impulsos, provocaria resultados semelhantes. A literatura é contraditória nesse sentido²⁷. Podemos afirmar que a baixa/moderada energia utilizada neste trabalho resultou na melhora clínica dos pacientes tratados. Autores europeus demonstraram em publicações de 1998 a utilização da alta e baixa energia²⁸, obtendo resultados melhores nos pacientes tratados com alta energia. A alta energia foi pior tolerada pelos pacientes , necessitando de algum tipo de anestesia para analgesia. Nenhum dos pacientes estudados necessitou de anestesia. Não houve relação significativa entre o tempo de existência da patologia com melhor ou pior resultado após o tratamento. A existência do tratamento pregresso em todos os pacientes nos leva a concluir que a indicação do tratamento (E.S.W.T.) nos pacientes com dor crônica foi correto. Talvez fosse importante nos estudos futuros a comparação com pacientes que não realizaram nenhum tipo de tratamento pregresso, ou que tivessem quadro agudo/subagudo. Num trabalho recente de 2002, Rompe e cols. demonstraram num estudo duplo-cego , que o número dos impulsos aplicados tem relação direta com o resultado final do tratamento . Alguns pacientes receberam apenas 10 impulsos em três aplicações. Os que foram submetidos a um número maior de impulsos (1000 em 03 sessões) mostraram melhores resultados. CONCLUSÃO 1. A indicação da E.S.W.T. para o tratamento da fascite plantar crônica foi correta, justificada pelo resultado positivo apresentado. 2. A E.S.W.T. demonstrou ter ação analgésica para esta patologia. (tabela 06). 3. É um procedimento minimamente invasivo, com efeitos colaterais insignificantes, bem tolerado, e seguro para o paciente. 4. Apesar do número absoluto da amostra estudada ser significativo, estudos comparativos com tratamento conservador (convencional), deverão fornecer dados relevantes para sua utilização na patologia no estágio inicial. REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS 1. Brendel W: Effect of shock waves on canine kidney. In; Gravenstein JS (ed) Extracorporal shock wave lithotripsy the rnal stone disease Technical and clinical aspects, Stoneham, Butterworth, 1986, p 141. 2. 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