Qualidade de vida e estratégias cirúrgicas para o tratamento da

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Camargo DN et al.
ARTIGO ORIGINAL
Qualidade de vida e estratégias cirúrgicas para o
tratamento da Síndrome de Parry Romberg
Quality of life and surgical strategies for treatment of Parry Romberg
Syndrome
Daniella Nunes Camargo1, Thiago Olivetti Artioli1, And Yara Gelmini2, Celso Luiz Buzzo3, Cesar Augusto Raposo-do-Amaral4,
Cassio Eduardo Raposo-do-Amaral5
RESUMO
ABSTRACT
Introdução: Os objetivos do nosso trabalho foram descrever a qualidade de vida de pacientes portadores da síndrome
de Parry-Romberg, bem como delinear as estratégias cirúrgicas
para o tratamento destes pacientes. Método: Trata-se de estudo
retrospectivo que envolveu quatorze pacientes (11 mulheres e
3 homens), no período correspondente a 2005-2011. Os pacientes responderam a dois questionários previamente validados,
abrangendo sinais clínicos da síndrome e qualidade de vida no
período pós-operatório. As estratégias cirúrgicas utilizadas no
tratamento foram descritas. Resultados: A média de idade no
período pré-operatório foi de 19 anos, variando de 6 a 30 anos.
A estratégia cirúrgica foi individual para os casos estudados,
envolvendo enxerto de gordura livre, enxerto dermogorduroso
e enxerto ósseo com retalho de fáscia têmporo-parietal (RFTP).
As respostas ao questionário sobre a qualidade de vida demonstraram que não há associação entre a gravidade da doença e
a qualidade de vida dos pacientes. Discussão: As estratégias
cirúrgicas utilizadas no tratamento variaram conforme a gravidade da síndrome. Nosso estudo demonstrou que o tratamento
multidisciplinar para as deformidades craniofaciais é indispensável para a qualidade de vida destes pacientes.
Introduction: The goals of this study were to describe
the quality of life of patients presenting Parry Romberg syndrome as well as to delineate some surgical strategies to treat
them. Methods: This is a retrospective study (from 2005 to
2011) with 14 patients who underwent surgery. All patients
answered a validated questionnaire about the quality of life of
these patients and clinical features of them. Surgical strategies
were also highlighted and varied according to the severity
of each patient. Results: The surgical strategy varied from
free-fat graft to dermal-fat grafting to calvarial bone grating
to temporoparietal fascia flap (TPF). There was no direct and
proportional relation from quality of life and severity of the
cases. Discussion: The surgical option depended on the
severity of the case. The quality of life questionnaire showed
that the multidisciplinary treatment for craniofacial deformities
is essential.
Descritores: Síndrome de Parry-Romberg. Atrofia facial
progressiva.
Key words: Parry-Romberg Syndrome. Progressive
facial atrophy.
1.Acadêmico de Medicina da Pontifícia Universidade Católica de Campinas
(PUC-Campinas), Campinas, SP, Brasil.
2.Acadêmica de Medicina da Universidade do Oeste Paulista (UNOESTE).
3. Chefe do Serviço de Cirurgia Plástica Craniofacial da SOBRAPAR. Membro
Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) e Sociedade
Brasileira de Cirurgia Crânio-Maxilo-Facial, Campinas, SP, Brasil.
4.Fellow em Cirurgia Craniofacial do Serviço de Cirurgia Plástica Craniofacial da SOBRAPAR, Campinas, SP, Brasil.
5.Médico cirurgião plástico. Preceptor dos residentes. Vice-presidente do
Hospital SOBRAPAR, Campinas, SP, Brasil. Membro Titular da Sociedade
Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) e Sociedade Brasileira de Cirurgia
Crânio-Maxilo-Facial. Regente do capítulo de cirurgia craniofacial da
SBCP. Membro da Sociedade Americana de Cirurgia Plástica, Americana
de Fissura Lábio-Palatina (ACPA), Internacional de Cirurgia Craniofacial
(ISCFS), Européia de Cirurgia Crânio-maxilo-facial. Scholar da Sociedade Americana de Cirurgia Plástica (2008).
Correspondência: Cássio Eduardo Raposo-do-Amaral
Hospital de Crânio e Face SOBRAPAR
Av. Adolpho Lutz, 100 – Cidade Universitária – Campinas, SP, Brasil – CEP:
13083-880
Distrito de Barão Geraldo - Caixa Postal 6028
E-mail: [email protected]
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Qualidade de vida e estratégias cirúrgicas para o tratamento da Síndrome de Parry Romberg
Técnica operatória
Os pacientes foram submetidos a três tipos de procedimentos cirúrgicos:
1) Enxerto de gordura livre da região abdominal com a
técnica descrita por Coleman9;
2) Enxerto dermogorduroso - Marcação: Com o paciente
em pé, foi demarcada a região do abdome inferior com
maior eixo na posição horizontal, seguindo as orientações da técnica de miniabdominoplastia clássica. A área
demarcada foi desepitelizada, com espessura total, sendo
a aponeurose do músculo reto abdominal o limite inferior
desta dissecção. O enxerto dermogorduroso foi cortado
em formato de triângulo, imergido em solução fisiológica contendo antibiótico. O enxerto foi introduzido na
região facial atrofiada, com mínimo descolamento da
face. Esta técnica para utilização de enxertos dermogordurosos foi descrita e padronizada por Raposo-Amaral
et al.10 para aumento da região glútea.
3) Enxerto ósseo com retalho de fáscia têmporo-parietal
(RFTS) - A artéria temporal superficial foi cuidadosamente demarcada em todo o seu trajeto. Quando a
elevação do retalho envolveu ilha de pele, a distância
entre a área receptora e o eixo de rotação foi cuidadosamente aferida com paquímetro. Esta distância foi
transferida para o couro cabeludo, que foi demarcado
com tinta azul. A incisão foi inicialmente realizada
na porção mais distal do couro cabeludo em relação
ao início da artéria temporal superficial. A elevação
do couro cabeludo ocorreu no plano subcutâneo
em direção à orelha. Quando a elevação do retalho
envolveu ilha de pele, esta foi incisada em todo seu
contorno. Após completa elevação do retalho cutâneo
de couro cabeludo, visualizou-se o pedículo axial do
retalho. A fina fáscia temporal superficial foi subsequentemente elevada em todo o trajeto11.
INTRODUÇÃO
A síndrome de Parry Romberg (SPR) foi primeiramente
descrita por Parry, em 1825, e por Romberg, em 1946. É uma
doença ainda pouco conhecida, que atinge preferencialmente o
sexo feminino, na proporção de 1.5:1, sendo que em 95% dos
casos relatados há acometimento unilateral da face1. Grimaldi
et al.2 relataram ser o lado esquerdo da face o mais acometido,
apesar de poder afetar também outras partes do corpo, como
o pescoço, os ombros, o tórax e o membro inferior ipsilateral.
Esta síndrome é rara, de caráter heterogêneo, que afeta
pele, tecido celular subcutâneo, gordura, músculos e, raramente, ossos e cartilagens. A faixa etária mais acometida é a
primeira e a segunda décadas de vida, se estacionando em 2 a
20 anos3. Tem como etiologias propostas a denervação do nervo
trigêmeo, ou do facial (V e VII pares dos nervos cranianos,
respectivamente). Trauma facial, hereditariedade, infecções
bacterianas ou virais, e a associação com doenças autoimunes
(vitiligo, artrite reumatoide, espondilite anquilosante e lúpus
eritematoso sistêmico) são outras possíveis etiologias4.
A manifestação clínica da doença apresenta sinais como
manchas hipopigmentadas ou hiperpigmentadas, alopecia
ipsilateral em sua maioria, além de enxaquecas, convulsões,
sintomas oculares (ptose, uveítes, enoftalmia ou exoftalmia)5.
Alguns pacientes apresentam atrofia linear na região média
da fronte, conhecida como esclerodermia em coup de sabre,
que para alguns autores é uma doença distinta da SPR 6.
Contudo, não há evidência de tratar-se de doenças distintas.
Portanto, alguns autores consideram ambas as doenças como
parte de diferentes espectros clínicos de gravidade da mesma
síndrome5,7.
OBJETIVOS
Os objetivos propostos para esse estudo são:
• Avaliar as estratégias cirúrgicas utilizadas nos pacientes
com Síndrome de Parry Romberg;
• Avaliar a qualidade de vida destes pacientes.
Critérios de inclusão
Devido ao grande espectro de expressões clínicas e dificuldade diagnóstica da doença estudada foram incluídos todos os
pacientes diagnosticados em prontuário com síndrome de ParryRomberg, doença de Parry-Romberg, síndrome de Romberg,
doença de Romberg, hemiatrofia facial progressiva, esclerodermia em golpe de sabre e esclerodermia que apresentavam
atrofia ou assimetria facial moderada a severa.
MÉTODO
Trata-se de estudo retrospectivo que envolveu quatorze
pacientes (11 mulheres e 3 homens), no período correspondente
a 2005-2011. Destes 14 casos, 13 eram unilaterais e 1 bilateral.
A abordagem dos casos foi realizada com a aplicação de dois
questionários, sendo um relativo aos sintomas e sinais clínicos
mais comumente encontrados na Síndrome de Parry Romberg
e o outro o WHOQOL-100, The World Health Organization
Quality of Life (questionário oferecido pela Organização
Mundial de Saúde para definição de perfis de qualidade de
vida, sendo feita a contabilização da pontuação com o software
Excel8), além da análise particular de gravidade dos casos e
o do tratamento escolhido para cada caso. O questionário de
qualidade de vida WHOQOL envolveu 6 domínios de questões (capacidade física, psicológico, nível de independência,
ambiente, espiritualidade e relações sociais). Os dados sobre a
qualidade de vida dos pacientes obtidos por meio deste questionário foram correlacionados com a gravidade de cada caso.
Critérios de exclusão
Pacientes com atrofia de face com origem esclarecida (por
exemplo, trauma, queimadura ou tumores).
RESULTADOS
A média de idade no período pré-operatório foi de 19
anos e 4 meses de idade, variando de 6 e 29 anos de idade.
A gravidade da síndrome de Parry Romberg variou de leve a
moderado e grave, sendo 4 (28,57%) casos leves, 6 (42,85%)
moderados e 4 (28,57%) graves. O número médio de dias de
internação foi de 3 dias.
A estratégia operatória foi individualizada para cada
caso (Figuras 1 a 3). Dos 14 pacientes estudados, 14 (100%)
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foram submetidos a enxerto de gordura livre, 4 (28,57%) a
enxerto dermogorduroso e 2 (14,28%) deles foi submetido a
enxerto ósseo com RFTP. O número de cirurgias realizadas
em cada paciente foi variável, dependendo da gravidade
de cada caso.
Os sinais clínicos mais frequentes foram atrofia hemifacial (85,71%), retração unilateral da região zigomática
(85,71%) e retração do terço inferior da face (85,71%)
(Tabela 1).
Não houve correlação direta e proporcional de nenhum
item do questionário (domínios) com a gravidade dos
casos. Em outras palavras, interessantemente, a intensidade da resposta do indivíduo a esta doença craniofacial
Figura 1 – Paciente com diagnóstico de síndrome de Parry
Romberg classificado como de gravidade leve submetido
a enxerto ósseo do crânio, região parietal, tábua externa.
Fotografia frontal do período pré-operatório (A) e fotografia
frontal do período pós-operatório após 1 ano da cirurgia (B).
Tabela 1 – Questionário síndrome de Parry Romberg
(sinais e sintomas iniciais).
Sinais e Sintomas
Figura 2 – Paciente com diagnóstico de síndrome de
Parry Romberg classificado como de gravidade moderada submetido a sucessivos enxertos de gordura livre com
evolução satisfatória. A região abdominal foi a doadora
dos enxertos gordurosos. Fotografia frontal do período
pré-operatório (A) e fotografia frontal do período pósoperatório após 3 anos da cirurgia (B).
Figura 3 – Paciente com diagnóstico de síndrome de Parry
Romberg classificado como de gravidade grave, submetido a
enxerto de gordura livre, enxerto dermogorduroso e enxerto
ósseo com RFTP. Fotografia frontal do período pré-operatório
(A) e fotografia da tomografia computadorizada de crânio do
período pré-operatório (B).
Atrofia hemifacial
12 (85,71%)
Enoftalmia
9 (64,28%)
Retração da região malar
12 (85,71%)
Retração do terço inferior da face
12 (85,71%)
Assimetria do pescoço
1 (7,14%)
Assimetria dos ombros
0
Assimetria dos braços
0
Dor facial
1 (7,14%)
Enxaqueca
4 (28,57%)
Convulsões
0
Descoloração do cabelo
0
Perda ou mudança sensorial da face
4 (28,57%)
Sensação fria nas mãos
1 (7,14%)
Sudorese excessiva
3 (21,42%)
Disfunção lacrimal
5 (35,71%)
Problemas de visão
3 (21,42%)
Presença de lesão facial hipercrômica
8 (57,14%)
Presença linha mediana en coup de sabre
2 (14,28%)
Desvio do queixo
8 (57,14%)
Desvio do nariz
6 (42,85%)
Dificuldade de respiração
2 (14,28%)
Alopecia
4 (28,57%)
Perda auditiva
1 (7,14%)
Dificuldade de fala
0
Déficit oclusal
10 (71,42%)
Trauma anterior ao início sintomas
2 (14,28%)
Comprometimento neurológico
0
Comprometimento outro sistema
0
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N (%)
Qualidade de vida e estratégias cirúrgicas para o tratamento da Síndrome de Parry Romberg
Tabela 2 – Resultados WHOQOL X gravidade de casos.
Iniciais (gravidade) Capacidade física Psicológico Nível independência
Relações
sociais
Ambiente
Espiritualidade
E.B.S. (leve)
70,83%
62,50%
65,62%
52,08%
87,50%
56,25%
J.A.J.G. (leve)
39,58%
52,5
40,62%
37,5%
56,25%
75%
R.F.B. (leve)
72,91%
53,75%
46,87%
43,75%
56,25%
87,50%
D.A.M. (leve)
83,33%
86,25%
68,75%
56,25%
75%
100%
A.C.S. (moderada)
72,91%
43,75%
57,81%
45,83%
81,25%
56,25%
R.B.L. (moderada)
45,83%
31,25%
45,31%
52,08%
18,75%
37,50%
A.P.S. (moderada)
91,66%
81,25%
35,93%
50%
81,25%
100%
I.S.S. (grave)
50%
46,25%
42,18%
31,25%
50%
18,25%
C.J.R. (grave)
93,75%
67,50%
54,68%
37,50%
75%
68,75%
P.L.F.S. (grave)
79,16%
77,50%
56,25%
45,83%
68,75%
75%
A.S.O.D. (grave)
68,75%
47,50%
53,12%
22,91%
68,75%
50%
casos gravidade leve (N=4), casos gravidade moderada (N=3), casos gravidade grave (N=4)
adicionar novas informações sobre esta doença.
Interessantemente, inúmeros estudos não consideram
o acometimento ósseo nesta doença 6. No entanto, uma
estreita correlação entre o acometimento ósseo e a gravidade
da doença foi observada, de forma que os pacientes que
apresentaram atrofia óssea do esqueleto craniofacial foram
classificados como graves.
Com objetivo de organizar os sinais clínicos desta
doença, propomos uma classificação de gravidade clínica
baseado na evolução da doença:
• Leve: casos em que há comprometimento somente da
epiderme, derme e tecido celular subcutâneo;
• Moderado: casos em que há comprometimento da
epiderme, derme, tecido celular subcutâneo e muscular;
• Grave: Casos em que há comprometimento da
epiderme, derme e tecido celular subcutâneo, muscular
e ósseo.
Esta classificação, que foi utilizada em nossos pacientes,
foi embasada na tomografia tridimensional e nos sinais e
sintomas característicos de cada grau de acometimento. Ela
foi sugerida devido à observação da evolução da doença,
de forma que a doença inicia-se com atrofia da epiderme,
derme e tecido subcutâneo, evoluindo subsequentemente
para a musculatura da face e ossos da face. Não identificamos em nossos pacientes e na literatura pertinente
pacientes com acometimento ósseo sem acometimento da
pele, tecido subcutâneo e muscular. Os níveis de gravidade
da doença coincidem com a própria evolução da doença
e, portanto, recebem esta classificação lógica e funcional.
Existe estreita relação entre a síndrome de Parry Romberg e
esclerodermia em golpe de sabre (en coup de sabre), as quais
compartilham de hemiatrofia facial progressiva, e outras
(ao ambiente, aos pares e à espiritualidade) não foi diretamente proporcional à gravidade da doença. Isto significa
que pacientes leves podem apresentar grande comprometimento psicossocial, por outro lado pacientes classificados
como graves podem apresentar pequeno comprometimento
psicossocial (Tabela 2).
DISCUSSÃO
A síndrome de Parry Romberg é uma doença rara de
origem desconhecida, caracterizada por atrofia facial
progressiva que acomete pele, tecido celular subcutâneo,
músculo, nervos e ossos12. A doença se manifesta a partir
da segunda década de vida, mais frequentemente entre 5 e
15 anos de idade. Existe grande especulação sobre a origem
desta síndrome. Causas neurológicas e/ou acometimento do
nervo trigêmeo são possíveis etiologias12,13.
Avaliamos, retrospectivamente, os pacientes com diagnóstico de síndrome de Parry Romberg, suas características
clínicas, sinais e sintomas. As principais características
clínicas identificadas neste estudo foram atrofia hemifacial
progressiva, em especial dos terços médio e inferior da
face (85,71% dos pacientes estudados), acometimento de
estruturas faciais, como enoftalmia (64,28%), desvio do
nariz (42,85%) e boca (déficit oclusal em 71,42%). Stone12
descreveu características clínicas semelhantes ao nosso
estudo, por outro lado Obermoser et al. 14 e Menascu et
al.15 identificaram pacientes com características clínicas
diferentes com manifestações neurológicas persistentes,
demonstrando que esta doença pode apresentar um grande
espectro clínico e algumas controvérsias clínicas e terapêuticas. Por este motivo, acreditamos que nosso estudo poderá
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diversas características comuns6. No entanto, ao contrário
da síndrome de Parry Romberg, a esclerodermia pode ser
beneficiada com tratamento farmacológico adjunto ao tratamento cirúrgico6. Interessantemente, 14,28% dos pacientes
estudados apresentaram o golpe de Sabre como uma das
características clínicas, demonstrando estreita correlação
entre as duas doenças. É importante ressaltar que existe
outra classificação para a mesma síndrome, apresentada por
Guerrerosantos et al.16, em 2007.
A classificação sugerida neste estudo associada a
exames complementares (tomografias computadorizadas
tridimensionais, radiografias e fotografias) poderá facilitar
a orientação e condução terapêutica destes pacientes.
As opções terapêuticas variam desde enxertos de
gordura, enxertos dermogordurosos e enxertos ósseos a
implantes aloplásticos. Embora os implantes aloplásticos
possam ser uma alternativa terapêutica, não a utilizamos
como possível forma de tratamento. A engenharia de
tecidos e células tronco emerge como uma nova e promissora alternativa terapêutica para estes pacientes.
O enxerto de gordura livre é a opção terapêutica mais
comum, fácil e com a menor morbidade, utilizada nos
pacientes com diferentes gravidades como opção terapêutica principal ou adjuvante. Os enxertos dermogordurosos
concomitantes aos enxertos de gordura livre são possíveis
propostas terapêuticas aos casos moderados. Os enxertos
ósseos com retalho de fáscia temporal superficial 13 são
indicados aos casos graves.
Observamos em nossos pacientes que 71,42% apresentam algum déficit oclusal, dentre eles a mordida aberta
anterior, mordida cruzada posterior e anterior por retrusão
ou não de maxila e a relação de incisivos em topo. Todos
os pacientes de nosso estudo apresentaram manifestações
de rejeição, tristeza e depressão com a sua aparência física
em algum momento da vida, necessitando acompanhamento
psicológico com profissional especializado nas deformidades craniofaciais. A oportunidade do trabalho conjunto,
multiprofissional, certamente promove a reabilitação destes
pacientes. Por este motivo, é frequentemente sugerido que
estas deformidades craniofaciais devem ser tratadas em
centros especializados, oferecendo trabalho multidisciplinar e interdisciplinar.
A necessidade de observar todos os aspectos do paciente
com síndrome de Parry Romberg levou à proposta do uso
do questionário WHOQOL-100. Interessantemente, os 6
domínios observados e suas respectivas pontuações avaliam
o indivíduo em seu âmbito pessoal, social, profissional e
espiritual.
Na avaliação psicossocial, foram observados níveis
satisfatórios de pontuação (média 59,09%), demonstrando que nossos pacientes, acompanhados pela equipe
de psicologia desenvolveram mecanismos de defesa ao
estresse social imposto pela deformidade craniofacial.
Por outro lado, o perfil qualidade de vida encontrado
em nossos pacientes demonstrou que os mecanismos de
defesa desenvolvidos pelos pacientes durante a terapia
psicológica são diretamente proporcionais à adesão dos
pacientes ao tratamento. Ensinar aos pacientes instrumentos para o manuseio do medo e das inseguranças
diante de um mundo altamente impositivo não é uma
tarefa fácil.
Em suma, os resultados desta pesquisa visam ao enriquecimento das informações já existentes sobre esta síndrome,
e contribuir para sua melhor caracterização.
A classificação e estadiamento desta doença podem
permitir uma organização em relação ao entendimento
e ao tratamento desta doença. As estratégias cirúrgicas
utilizadas no tratamento variaram conforme a gravidade
da síndrome. Nosso estudo demonstrou que o tratamento
multidisciplinar para as deformidades craniofaciais é
indispensável para a qualidade de vida destes pacientes.
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Artigo recebido: 11/12/2010
Artigo aceito: 20/2/2011
Rev Bras Cir Craniomaxilofac 2011; 14(1): 12-7
17
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