Eu queria, só para situar a perspectiva brasileira

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Dezembro de 2011
DIÁRIO DO SENADO FEDERAL - SUPLEMENTO
Eu queria, só para situar a perspectiva brasileira,
sobretudo a perspectiva industrial brasileira no contexto
dessa crise, discorrer rapidamente sobre por que ela
se tornou tão aguda e por que não há claramente, no
horizonte, uma perspectiva do fim dessa crise, pelo
menos até o momento.
Ela teve um primeiro momento que foi a crise em
si. Quer dizer, foi uma crise financeira de proporções
catastróficas no mundo inteiro. Isso gerou uma reação
política muito positiva, sobretudo materializada nas
primeiras reuniões do G20.
Nessas reuniões em Washington, ainda com o
Presidente Bush, depois em Londres e em Pittsburg,
houve um consenso generalizado de que os países
deveriam enfrentar essa crise com uma política econômica coordenada, visando ao estímulo fiscal.
Essa foi a primeira reação política à crise. E foi
uma reação correta, tão correta que estancou um
processo de queda muito aguda em relação ao que
estava acontecendo, e começou a reverter a situação
ao longo de 2009 – a crise começa em 2008, torna-se
aguda no primeiro semestre de 2009 e, no segundo
semestre de 2009, já começa a se recuperar em função de uma operação coordenada dos países mais
avançados do mundo reunidos no G20, que haviam
decidido por políticas de estímulo fiscal.
Quando chegou a reunião no Canadá no ano
passado, alguns dos países industrializados, avançados, deduzindo, equivocadamente, que a crise tinha
acabado, resolveram inverter as políticas econômicas:
em lugar de estímulos fiscais, ajustes fiscais.
Isso foi liderado sobretudo pela Alemanha, na
Europa, e envolveu a França e, depois, Londres, Inglaterra, porque tinha mudado o governo inglês; Gordon
Brown, que era do Partido Trabalhista, tinha saído e
entrou Cameron, que é do Partido Conservador. Esses três países articularam a ideia das estratégias de
saída dos estímulos fiscais. Então, em lugar de fazer
estímulo fiscal, eles passaram a fazer ajuste fiscal.
O que significa isso? Significa cortar gastos públicos, reduzir o mercado interno e gerar excedentes
exportáveis como única forma de sustentar o crescimento da economia. Então, a ameaça que paira sobre
a gente não é propriamente uma ameaça que vem da
crise; é uma ameaça que vem das políticas econômicas
adotadas para combater a crise, porque, nesse ínterim,
os Estados Unidos também tiveram eleições parlamentares intermediárias. O Partido Republicano, empurrado pelo movimento Tea Party, ganhou a Câmara com
este mesmo princípio: fazer ajuste fiscal. Empurrou o
governo Obama para a ideia de cortar dramaticamente
a dívida pública e o déficit público para supostamen-
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te reconquistar a confiança do mercado, o que é uma
coisa ideológica, não tem nenhuma base real.
Na verdade, o empresariado não está atrás de
psicologia, mas de saber o seguinte: eu consigo vender? Eu tenho mercado? Isso é o que move a decisão
empresarial. E, à medida que se reduz o mercado, a
perspectiva empresarial vai ser pessimista, não retoma. E estamos vendo.
Os países europeus que foram imediatamente
submetidos a políticas fiscais, a esse receituário fiscal mais profundamente, como a Grécia... A Grécia,
Senador Paim, teve uma queda no produto este ano
estimado em 10%. A Grécia está sendo destruída pela
política de ajuste fiscal. Portugal, do mesmo jeito; Irlanda, do mesmo jeito. Quer dizer, eles fazem um ajuste
fiscal supostamente para reduzir o déficit, mas o déficit aumenta. Por quê? Porque a receita pública, com o
mercado contraído, cai. E a relação débito, a relação
dívida, a relação déficit/PIB vai aumentar, porque o PIB
cai, a receita pública cai, o denominador da equação
cai, portanto há um aumento da relação déficit/PIB.
Qual é o risco desse receituário para a gente?
Se em todo o mundo, houvesse um país apenas em
crise e se esse país fizesse reajuste fiscal é de supor
que ele iria gerar excedentes exportáveis e, como todo
mundo está bem, só ele está em crise, não há problema, porque ele faz o ajuste, começa a exportar, as exportações criam demanda para a indústria, então está
resolvido. Mesmo que socialmente seja complicado,
que haja consequências danosas do ponto de vista
social, do ponto de vista econômico funciona.
Nesse caso, porém, todos os países estão em
crise, os países industrializados avançados estão todos
com o mercado contraído. Diante disso, não adianta
fazer excedentes exportáveis, porque os outros países
não querem, a não ser os que estão com reservas altas,
que é o caso dos países emergentes. Então, a ideia
que está circulando é a seguinte: quem vai facilitar o
equilíbrio dos países industrializados avançados serão
os países emergentes, que podem exportar porque a
crise é menor ou não têm crise.
O Brasil tem US$350 bilhões em reservas. É um
belo mercado importador. A China está com US$3,2
trilhões em reservas e é um supermercado importador.
Então, do ponto de vista aritmético, visa-se à ideia maluca de que se vão reequilibrar os países industrializados e avançados com uma economia de quase US$40
trilhões através de economias muito menores. A própria economia chinesa, com US$6 trilhões, comparada
à economia americana e à economia europeia, com
mais de US$35 trilhões, não tem como equilibrar os
mercados dos países industrializados desenvolvidos.
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