HEPATITE A: ALTERAÇÃO DO PADRÃO EPIDEMIOLÓGICO E

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 HEPATITE A: ALTERAÇÃO DO PADRÃO EPIDEMIOLÓGICO E SUAS CONSEQUÊNCIAS Laura de Oliveira Tavares Chaves Cruz1
1
Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, Portugal
[email protected]
Sob
orientação do Professor Doutor Luís Filipe Furtado Soares Tomé
Índice Índice .......................................................................................................................................... 1
Índice de Figuras ........................................................................................................................ 3
Índice de Tabelas ........................................................................................................................ 3
Lista de abreviaturas................................................................................................................... 4
Resumo ....................................................................................................................................... 5
Abstract ...................................................................................................................................... 7
Introdução................................................................................................................................... 9
Materiais e métodos ................................................................................................................. 12
Descrição da amostra ........................................................................................................... 12
Análise estatística ................................................................................................................. 12
Resultados ................................................................................................................................ 13
Distribuição da seroprevalência ao longo dos anos ............................................................. 13
Seroprevalência do IgG anti-VHA, por faixa etária, nos anos 2004 e 2014 ........................ 15
Discussão .................................................................................................................................. 19
Diminuição da seroprevalência entre 2004 e 2014 .............................................................. 19
Aumento da seroprevalência do IgG anti-VHA com a idade............................................... 19
Relação entre VHA e DHC .................................................................................................. 20
Coinfecção VHA e VHB .................................................................................................. 21
Coinfecção VHA e VHC .................................................................................................. 23
Limitações ............................................................................................................................ 24
Conclusão ................................................................................................................................. 25
1 Agradecimentos ........................................................................................................................ 26
Bibliogragia .............................................................................................................................. 27
2 Índice de Figuras
Figura 1 seroprevalência do IgG anti-VHA ao longo dos anos ............................................... 15
Figura 2 seroprevalência do IgG anti-VHA, por faixa etária, em 2004 e 2014 ....................... 18
Índice de Tabelas
Tabela 1 seroprevalência do IgG anti-VHA ao longo dos anos ............................................... 14
Tabela 2 seroprevalência do IgG anti-VHA, por faixa etária, em 2004................................... 16
Tabela 3 seroprevalência do IgG anti-VHA, por faixa etária, em 2014................................... 17
3 Lista de abreviaturas
AgHbS – Antigénio de Superfície da Hepatite B
ARN – Ácido Ribonucleico
CHUC – Centro Hospitalar Universitário de Coimbra
CLD – Chronic Liver Disease
DHC – Doença Hepática Crónica
HAV – Hepatitis A virus
HBV – Hepatitis B virus
HCV- Hepatitis C virus
FH- Fulminant Hepatitis
HF- Hepatite Fulminante
IgM anti-VHA- anticorpo da classe IgM anti- Vírus da Hepatite A
IgG anti-VHA – anticorpo da classe IgG anti- Vírus da Hepatite A
VHA – Vírus da Hepatite A
VHB - Vírus da Hepatite B
VHC – Vírus da Hepatite C
4 Resumo
Introdução: A hepatite A é uma infeção viral comum, que afecta 120 milhões de pessoas
anualmente e, transmite-se por via fecal-oral. A sua prevalência está a diminuir globalmente,
pelo que uma maior percentagem de população fica susceptível ao vírus. A severidade da
infeção aumenta com a idade e, com a coexistência de doença hepática crónica.
Estudámos a evolução da seroprevalência do VHA nos períodos compreendidos entre 2003 –
2005 e, entre 2012-2014 e, a distribuição da seroprevalência do VHA por faixa etária.
Métodos : analisámos a distribuição da seroprevalência do anticorpo IgG anti-VHA em 12
618 registos clínicos, disponibilizados pelo serviço de Sangue e Medicina Transfusional dos
CHUC, entre os períodos 2003-2005 e 2012-2014. Para analisar a distribuição da
seroprevalência do IgG anti-VHA de acordo com a idade, os doentes foram estratificados por
10 faixas etárias. A análise estatística foi efectuada utilizando o teste qui-quadrado.
Resultados: a seroprevalência do anticorpo IgG anti-VHA registada ao longo dos anos foi a
seguinte: 55,8% (2003); 78,5% (2004); 76,0% (2005), 73,3 % (2012); 74,3% (2013); 74,5 %
(2014).
Os resultados referentes à distribuição da seroprevalência por faixa etária, apenas contemplam
os anos 2004 e 2014. No ano 2004 a seroprevalência do IgG anti-VHA por década foi a
seguinte : 0-10 anos, 40%; 10-20 anos, 27,6%; 20-30 anos, 45,9%; 30-40 anos, 73,1%; 40-50
anos, (89,2%); 50-60 anos, 96,4%; 60-70 anos 98,5%; 70-80 anos, 100%; 80-90, 100 %; 90100, 100%. No ano 2014 a prevalência do IgG anti- VHA por década foi a seguinte: 0-10
5 anos, 0,00%; 10-20 anos, 22,9%; 20-30 anos, 23,0%; 30-40 anos, 52,1%; 40-50 anos, 78,2%;
50-60 anos, 94,9%; 60-70 anos 96,4%; 70-80 anos, 100%; 80-90, 100 %; 90-100, 100%.
Discussão: comparando os anos 2004 e 2014, a seroprevalência do anticorpo IgG anti-VHA
foi menor no último possivelmente devido à melhoria das condições socioeconómicas da
população. No ano 2004 a seroprevalência aumentou significativamente a partir dos 40 anos,
enquanto que em 2014 o aumento significativo ocorreu a partir dos 50 anos, pelo que
concluímos que a infeção ocorreu mais tardiamente e, por isso a sua severidade e a
percentagem de HF poderão ter aumentado, nomeadamente nos doentes com doença hepática
crónica.
Conclusão: se a seroprevalência continuar diminuir, a probabilidade de futuros surtos de
hepatite A, o número de infecções sintomáticas e, a percentagem coinfecção VHA e VHB/
VHC aumentarão, o que poderá conduzir ao aumento da taxa de mortalidade nos doentes com
DHC.
Palavras-chave: Hepatite A; IgG anti-VHA; seroprevalência; idade; doença hepática crónica;
coinfeção; mortalidade.
6 Abstract
Introduction: hepatitis A is a common acute viral infection that affects 120 million people
annualy and it spreads through the faecal-oral route. Seroprevalence rate has been declining
in recent decades globally and so the proportion of people susceptible to the virus also has
increased. The severity of infection is related to age and coexistence of chronic liver disease.
We studied the evolution of HAV seroprevalence during the periods of 2003-2005 and 20122014. We also analysed the the distribuition of the IgG anti-HAV according to age.
Methods: we analysed the IgG anti- HAV seroprevalence in 12618 clinical records which
were provided by the Blood and Transfusional Medicine Service of CHUC between 20032005 and 2012-2014. In addition, the seroprevalence of IgG anti-HAV was compared among
10 age groups in 2004 and in 2014. The chi-square test for trend was used for statistical
analysis.
Results: the IgG anti-HAV seroprevalence during the years in study was as follows: 55,8%
(2003); 78,5% (2004); 76,0% (2005), 73,3 % (2012); 74,3% (2013); 74,5 % (2014).
The IgG anti-HAV seroprevalence during 2004 was as follows: 0-10 years, 40%; 10-20 years,
27,6%; 20-30 years, 45,9%; 30-40 years, 73,1%; 40-50 years, (89,2%); 50-60 years, 96,4%;
60-70 years 98,5%; 70-80 years, 100%; 80-90 years, 100 %; 90-100 years, 100%.
The IgG anti-HAV seroprevalence during 2014 was as follows: 0-10 years, 0,00%; 10-20
years, 22,9%; 20-30 years, 23,0%; 30-40 years, 52,1%; 40-50 years, 78,2%; 50-60 years,
94,9%; 60-70 years 96,4%; 70-80 years, 100%; 80-90 years, 100 %; 90-100 years, 100%.
7 Discussion: comparing the years of 2004 and 2014, the IgG anti-HAV was lower in 2014,
probably due to an increase in the socioeconomic status of the population.
In 2004 the seroprevalence increased significantly after 40 years and in 2014 the increase was
mainly after 50 years. So we concluded that the age of infection happened later and that the
severity of infection and the proportion FH may have increased, particularly in people with
CLD.
Conclusion: in the future, it is expected that, if seroprevalence decreases, there will be more
hepatitis A outbreaks, more sintomatic infections and more HAV and HBV/HCV
coinfections, which may lead to an increase in mortality rates in CLD patients.
Key-words: Hepatitis A; IgG anti- HAV; seroprevalence; age; chronic liver disease;
coinfection; mortality.
8 Introdução
A hepatite A é uma infeção viral comum causada pelo VHA que afecta 120 milhões de
pessoas anualmente.(1) (2)
O VHA é um virus hepatotrópico, pertencente à família Picornaviridae e género Hepatovirus.
Não apresenta invólucro e, é constituído por uma cadeia única de ARN no sentido positivo.
Na maioria dos casos, a transmissão viral ocorre por via fecal-oral através do contacto com
indivíduos infetados, em contextos de grande proximidade interpessoal. Outras fontes
potenciais de infeção incluem o consumo de água e alimentos contaminados; práticas sexuais
entre homens; viagens para países onde o VHA é endemico e, utilização de drogas
intravenosas. Raramente a transmissão pode ocorrer através de transfusões sanguíneas e
contacto com hemoderivados.(2)(3)
O espectro clínico da hepatite A é variado, incluindo infecção assintomática; infeção
subclínica, revelada por testes hepáticos anormais; infeção clinicamente aparente e, hepatite
fulminante.(4)
As manifestações clínicas de hepatite A dependem da idade do doente, verificando-se maior
probabilidade de desenvolver infecção sintomática, à medida que a faixa etária de infeção
aumenta
(1).
Após um período de incubação de 2 a 7 semanas, ocorre o aparecimento da fase
pré-ictérica, com uma duração aproximada de 5 a 7 dias, que se apresenta sob a forma febre,
mal-estar geral, náuseas, vómitos, desconforto abdominal e cefaleias. A fase ictérica apresenta
uma duração variável, de 4 a 30 dias e, inicia-se com bilirrubinuria conjugada, seguida de
fezes palidas, e icterícia.(2)
9 A hepatite fulminante constitui uma complicação rara da hepatite A, apresentando uma
incidência que varia entre 0,015% e 0,5%. Doentes com doença hepatica crónica e, indivíduos
com mais de 50 anos apresentam uma maior percentagem de mortalidade associada a hepatite
fulminante.(1)
Estudos na literatura sugerem que o mecanismo fisiopatologico mais provável, subjacente à
falência hepática por VHA, está relacionado com uma resposta imune vigorosa que se
acompanha de uma redução marcada da carga virusal.(2)
O diagnóstico de hepatite A é feito através da deteção de anticorpos IgM anti-VHA, que
aparecem antes do início dos sintomas e, declinam entre três a seis meses. Os anticorpos IgG
conferem imunidade a longo prazo, sugerindo infeção ou imunização prévia. Surgem durante
a fase aguda e, na fase de convalescença tornam-se predominantes no soro.(3)(5)
A prevalência mundial do VHA é altamente variável obsevando-se regiões de elevada
endemicidade e, regiões de baixa endemicidade.(1)
África, América Latina, Médio Oriente e Sudeste Asiático apresentam taxas elevadas de
seroprevalência. Estados Unidos e Canadá apresentam baixos níveis de infecção por VHA. (1)
Na Europa existem diferenças importantes a salientar. As regiões Oeste e Norte apresenta
taxas de seroprevalência baixas e muito baixas, respectivamente. Pelo contrário, nas regiões
este e sul a seroprevalência é intermédia No caso particular de Portugal, a seroprevalência
está a diminuir e, é similar à situação de Espanha.(6)
Nas últimas décadas a seroprevalência da hepatite A tem diminuído, em consequência da
melhoria das condições socioeconómicas das populações, qualidade da água, condições de
higiene e, saneamento básico.(3)(7)(1)
10 À medida que a incidência diminui, a idade de infeção aumenta, pelo que um maior número
de indivíduos jovens fica suscetível ao VHA,(8) nomeadamente os grupos de risco - viajantes
para países com níveis de endemicidade intermédio e alto; homossexuais; utilizadores de
drogas ilegais injectáveis; portadores de doença hepatica crónica; doentes que aguardam ou já
receberam transplante hepático e, grupos marginalizados que habitam em meios com más
condições sanitárias.(3)
Neste contexto, com este trabalho propusémo-nos a estudar a evolução da seroprevalência do
VHA ao longo dos anos 2003-2005 e 2012-2014 e a avaliar a distribuição da seroprevalência
do VHA, por faixa etária, no periodo de tempo referido.
11 Materiais e métodos
Descrição da amostra
Os dados selecionados para o estudo foram disponibilizados pelo Serviço de Sangue e
Medicina Transfusional dos CHUC e, reportaram-se aos períodos compreendidos entre 20032005 e 2012-2014.
Nestes períodos analisou-se o número de doentes com imunidade para o vírus da hepatite A,
definido pela presença de IgG anti-VHA sérico.
A nossa amostra era constituída por 12618 doentes e, destes, 9174 eram portadores de
anticorpo IgG anti-VHA nos anos de 2003 (n=954), 2004 (n=1652), 2005 (n=1641), 2012
(n=1235), 2013 (n=1687) e 2014 (n=2005).
Para estudar o padrão de distribuição da seroprevalência do IgG anti-VHA de acordo com a
idade, os doentes foram estratificados por 10 intervalos de faixas etárias.
Análise estatística
As variáveis categóricas foram apresentadas como contagem (número) e percentagem. A
comparação entre estas variáveis categóricas foi efetuada usando o teste qui-quadrado. A
análise estatística foi efetuada utilizando o programa Statistical Package for the Social
Sciences (SPSS®) v.21.0 e considerou-se um nível de significância (p) de 0,05 para todos os
testes de hipótese.
12 Resultados
Distribuição da seroprevalência ao longo dos anos
Existem diferenças estatisticamente significativas na seroprevalência do anticorpo IgG antiVHA ao longo dos anos (2003, 2004, 2005, 2012, 2013 e 2014) (p=0,000).
No ano 2003, 2004 e 2005 a seroprevalência do anticorpo IgG anti-VHA encontrada foi de
55,8%, 78,5% e 76,0%, respectivamente (tabela 1, figura 1).
Nos anos 2012, 2013 e 2014 a seroprevalência do anticorpo IgG anti-VHA encontrada foi de
73,3%, 74,3% e 74,5%, respectivamente (tabela 1, figura 1).
Tendo em conta o panorama da seroprevalência ao longo dos anos (tabela 1, figura 1), embora
no período compreendido entre 2003-2005, o ano 2003 tenha apresentado uma
seroprevalência significativamente menor em relação aos anos 2004 e 2005, nestes dois
últimos anos, o comportamento da seroprevalência foi semelhante. No período compreendido
entre os anos 2012 e 2014 o comportamento da seroprevalência também foi semelhante entre
si. Por esta razão optámos por nos focar nos anos 2004 e 2014 pelo que apenas analisámos a
evolução da seroprevalência ao longo destes dois anos e, os resultados referentes à
distribuição da seroprevalência por faixa etária também contemplam apenas estes anos.
13 Tabela 1- Seroprevalência do IgG anti-VHA ao longo dos anos
Resultados, n (%)
Ano
p*
VHA IgG+
Total
2003
954 (55,8)
1709 (100)
2004
1652 (78,5)
2105 (100)
2005
1641 (76,0)
2158 (100)
2012
1235 (73,3)
1684 (100)
2013
1687 (74,3)
2270 (100)
2014
2005 (74,5)
2692 (100)
Total
9174 (75,4)
12618 (100)
0,000
*Qui-quadrado, n(%): numero (percentagem dentro de cada ano), VHA IgG+: resultado positivo para
anticorpo IgG anti-Virus da hepatite A.
14 Figura 1 - Seroprevalência do IgG anti-VHA ao longo dos anos
Seroprevalência do IgG anti-VHA, por faixa etária, nos anos 2004 e 2014
Nestes anos encontraram-se diferenças estatisticamente significativas entre a seroprevalência
do anticorpo IgG anti-VHA e a faixa etária (p=0,000), (tabela 2, tabela 3, figura 2).
A seroprevalência do anticorpo IgG anti-VHA no ano 2004 foi a seguinte: 0-10 anos, 40%;
10-20 anos, 27,6%; 20-30 anos, 45,9%; 30-40 anos, 73,1%; 40-50 anos, (89,2%); 50-60 anos,
96,4%; 60-70 anos 98,5%; 70-80 anos, 100%; 80-90, 100 %; 90-100, 100% (tabela 2).
A seroprevalência do anticorpo IgG anti-VHA no ano 2014 foi a seguinte: 0-10 anos, 0,00%;
10-20 anos, 22,9%; 20-30 anos, 23,0%; 30-40 anos, 52,1%; 40-50 anos, 78,2%; 50-60 anos,
94,9%; 60-70 anos 96,4%; 70-80 anos, 100%; 80-90, 100 %; 90-100, 100% (tabela 3).
15 Tabela 2 Seroprevalência do IgG anti-VHA, por faixa etária, em 2004
Resultados, n (%)
Faixa etária (anos)
p*
+
VHA IgG
Total
0-10
2 (40,0)
5 (100)
10-20
21 (27,6)
76 (100)
20-30
174 (45,9)
379 (100)
30-40
369 (73,1)
505 (100)
40-50
315 (89,2)
353 (100)
0,000
50-60
317 (96,4)
329 (100)
60-70
261 (98,5)
265 (100)
70-80
139 (100,0)
139 (100)
80-90
51 (100,0)
51 (100)
90-100
3 (100,0)
3 (100)
Total
1652 (78,5)
2105 (100)
*Qui-quadrado, n(%): numero (percentagem dentro de cada faixa etária), VHA IgG+:
resultado positivo para anticorpo IgG anti-Virus da hepatite A
16 Tabela 3 Seroprevalência do IgG anti-VHA, por faixa etária, em 2014
Resultados, n (%)
Faixa etária (anos)
p*
+
VHA IgG
Total
0-10
0 (0,0)
1 (100)
10-20
8 (22,9)
35 (100)
20-30
72 (23,0)
313 (100)
30-40
270 (52,1)
518 (100)
40-50
469 (78,2)
600 (100)
0,000
50-60
487 (94,9)
513 (100)
60-70
351 (96,4)
364 (100)
70-80
248 (100,0)
248 (100)
80-90
95 (100,0)
95 (100)
90-100
5 (100,0)
5 (100)
Total
2005 (74,5)
2692 (100)
*Qui-quadrado, n(%): numero (percentagem dentro de cada faixa etária), VHA IgG+:
resultado positivo para anticorpo IgG anti-Virus da hepatite A
17 Figura 2 - Seroprevalência do IgG anti-VHA, por faixa etária, em 2004 e 2014
18 Discussão
Diminuição da seroprevalência entre 2004 e 2014
Arbitrariamente foram comparados os 2004 e 2014, para determinar se a seroprevalência do
anticorpo IgG anti-HVA aumentou recentemente.
Ao comparar a seroprevalência do anticorpo IgG anti-VHA entre os dois anos, verificou-se
que o ano de 2004 foi significativamente diferente. Neste ano, observou-se um maior número
de casos positivos para o anticorpo VHA. Portanto, verificámos que a seroprevalência do
anticorpo diminuiu entre os dois anos.
Os nossos resultados foram consistentes com a maioria dos estudos que consideraram que a
prevalência global da hepatite A estava a diminuir.(6)
Aumento da seroprevalência do IgG anti-VHA com a idade
Numa segunda fase deste trabalho, estudámos a distribuição da seroprevalência do anticorpo
IgG anti-VHA por faixa etária. Optámos por intervalos de uma década para as faixas etárias,
uma vez que a agregação das mesmas em intervalos maiores (duas em duas décadas ou três
em três décadas) conduzia a perdas estatísticas relevantes, pelo que não era possível verificar
se a idade de infecção por VHA aumentou em 2014.
No ano 2004 a seroprevalência foi mínima na faixa etária dos 10-20 anos. A partir desta faixa
etária a seroprevalência do IgG anti-VHA aumentou com a idade (figura 2). No ano 2014 a
seroprevalência foi nula na faixa etária dos 0-10 anos. Entre as faixas etárias dos 10-20 e 2030 ocorreu um ligeiro aumento da seroprevalência e, entre os 30-40 anos e os 70-80 anos este
19 aumento foi mais acentuado. Em ambos os anos, a seroprevalência estabilizou e, atingiu o
maior valor registado entre as faixas etárias dos 70-80 anos e 90-100 anos (figura 2).
Os nossos resultados vão de encontro ao estudo de revisão realizado por Jacobsen et. al, que
verificaram que Portugal se incluia nos países de baixa endemicidade já que neste estudo a
seroprevalência do anticorpo anti-VHA atingiu os 21% aos 6-7 anos e, os 38% aos 18 anos(6).
No nosso estudo as seroprevalências registadas para as mesmas idades foram ainda menores o
que também nos levou a concluir que ao longo dos anos a seroprevalência diminuiu nas faixas
etárias mais jovens.
Verificámos que em 2004 e 2014 a diminuição mais significativa ocorreu nas faixas etárias
dos 0-10 anos; dos 20-30 anos e, dos 30-40 anos.
No ano 2004 a seroprevalência aumentou significativamente a partir dos 40 anos, enquanto
que em 2014 este aumento ocorreu sobretudo, a partir dos 50 anos, o que nos levou a acreditar
que a infecção ocorreu mais tardiamente (tabela 2, tabela 3).
À luz destes dados considerámos que ocorreu uma diminuição da circulação do vírus entre a
população, que conduziu a mudança epidemiológica no padrão de infecção do VHA na
região centro, que se traduziu em uma maior percentagem de indivíduos mais jovens e mais
susceptíveis ao VHA.
Relação entre VHA e DHC
De acordo com os nossos resultados considerámos que os doentes com DHC estariam,
provavelmente mais suscetíveis às consequências do VHA.
O fenómeno epidemiológico que mencionámos também foi descrito por Almasio e
Amoroso,(9) que estudaram a percentagem de doentes com DHC suscetíveis à infeção por
VHA e, analisaram o curso clínico da infecção nos doentes com DHC. Verificaram que a
20 percentagem de doentes portadores de DHC e IgG anti-VHA era muito alta. Contudo, quando
os doentes foram estratificados por faixa etária, a imunidade natural contra VHA diminuía nas
faixas etárias mais baixas, onde atingia taxas inferiores a 30%. De acordo com estas
observações e, com a diminuição da circulação do vírus entre a população, um novo coorte de
doentes seronegativos, mais suscetíveis ao VHA, começou a surgir.
Também mais recentemente, um grupo de trabalho da Coreia do Sul analisou a
seroprevalência do anticorpo IgG anti-VHA em 986 doentes com hepatopatia crónica por
VHC ou VHB e, chegou à mesma conclusão que Almaso e Amoroso. A seroprevalência foi
significativamente maior acima dos 40 anos: 20 -29 (6,67%); 30-39 (50,86%), 40-49 (92,29
%); 50-59 (97,77%) e 60-69 (100%).(10)
Por outro lado, uma vez que a severidade da infecção pelo VHA aumenta com a idade, no ano
2014 a severidade de infecção por VHA e a percentagem de hepatite fulminante poderão ter
sido maiores, sobretudo em doentes portadores de DHC. Esta hipótese teve em conta vários
estudos que analisaram as consequências da sobreinfeção do vírus A em doentes com hepatite
B crónica e hepatite C crónica.
Coinfecção VHA e VHB
No que diz respeito à hepatite B crónica, a maioria dos trabalhos nesta área verificou que a
hepatite A, num contexto de DHC, associa-se a doença mais severa com falência hepática
fulminante e a uma maior taxa de mortalidade.(11)
A epidemia de Shanghai, entre Janeiro e Fevereiro de 1988, constitui um exemplo
paradigmático que demonstrou o impacto da infecção por VHA em doentes com doença
hepática prévia, nomeadamente, com hepatite crónica B.
21 Nesta epidemia 8,8% dos doentes hospitalizados eram portadores de hepatite B crónica, nos
quais a mortalidade observada foi maior em relação aos doentes sem doença hepática (0,054%
vs 0,015%). Neste grupo de doentes, metade apresentava cirrose hepática e, outra metade
sucumbia à morte por necrose maciça.
Concluiu-se também que os indivíduos mais
severamente afectados eram portadores de hepatite B crónica com antigénio IgE.(11)
Entre 1983 e 1988, o Centro de Controlo e Prevenção de Doenças também concluiu que o
risco de morte da infecção por VHA, em doentes com hepatite B era maior (29 vezes).(12)
Contudo, em Taiwan, durante um surto de hepatite A de 143 casos, 20% dos doentes eram
portadores do AgHBs e, nestes, não se verificou aumento da severidade da doença ou maior
taxa de mortalidade em relação a doentes sem hepatite B crónica. No sentido de justificar
estes resultados controversos, Fukumoto et al, postularam que o grau de severidade da DHC
subjacente tinha um impacto importante no prognóstico da hepatite A.(13)
O seu trabalho mostrou que em doentes cirróticos ou com hepatite B ativa, a severidade da
hepatite A era maior. Pelo contrário, doentes portadores do AgHBs saudáveis apresentavam
uma clínica semelhante àquela encontrada em doentes sem hepatite B.(13)
Vários mecanismos podem conduzir ao aumento da severidade da coinfecção VHA/VHB e,
uma possível explicação poderá estar relacionada com a diminuição do número de hepatócitos
nos portadores de hepatite B crónica. Assim, quando o doente contrai hepatite A o dano
hepatócitario será maior.(14)
22 Coinfecção VHA e VHC
A história natural da hepatite C crónica pode incluir “flares” hepáticos que podem ser
espontâneos, consequência da recuperação do sistema imunitário face a imunossupressão
farmacológica ou espontânea ou, devido a infecções por outros vírus, nomeadamente o
VHA.(15)
Um estudo prospectivo, de 7 anos, realizado em Itália, descreve um aumento considerável de
falência hepática aguda (41%) e de morte (35,5%) em doentes com hepatite A e hepatite C
prévia. Contrariamente, os estudos da epidemia de Shanghai não mostraram aumento da
mortalidade associada à infecção por vírus C. (16)
Um estudo em Itália, realizado em 1990, por Vento et al, investigou o efeito da hepatite A
sobreposta à hepatite crónica C. Neste estudo 595 doentes, com evidência de hepatite C
crónica (n=432) e hepatite B crónica (n=163), sem imunidade contra VHA, foram testados,
durante 86 meses, a cada 4 meses, para o aparecimento de IgG e IgM anti-HVA séricos. Dos
doentes com hepatite C crónica, 17 desenvolveram hepatite A aguda. Destes, 10 apresentaram
doença não complicada e, 7 desenvolveram hepatite fulminante. À admissão hospitalar o
ARN–HCV era indetectável em todos os doentes e, seis dos sete doentes morreram por
necrose hepática maciça.(16)
Os resultados de Vento et al foram antagonizados pelo trabalho desenvolvido por Sagneli et
al. Este grupo estudou 121 doentes com DHC com curso clínico benigno, sem evidência de
cirrose hepática, que desenvolveram hepatite A. Verificaram que a sobreinfeção do VHA
produziu doença ligeira em todos os doentes, nomeadamente naqueles com hepatite C
crónica. Paralelamente, observaram uma marcada inibição do genoma do VHC.(17)
23 Posteriormente, Deterding et al, também não encontrou nenhum caso de hepatite fulminante
em doentes com hepatite C crónica infectados por VHA. Os autores consideram que a
morbimortalidade da infeção VHA associada ao vírus B é maior do que aquela associada ao
vírus C e, que o risco de hepatite fulminante dos doentes portadores de Hepatite C foi
sobrestimado em estudos anteriores. Contudo, a hepatite A pode causar morbilidade e
mortalidade significativa dos doentes com hepatite C, especialmente se já apresentarem
cirrose hepática. (18)
Limitações
O nosso estudo apresentou algumas limitações.
Este estudo foi apenas referente a um Centro Hospitalar da região centro, pelo que não foi
possível extrapolar os nossos resultados para outras regiões do país. Não foi possível apurar
as causas subjacentes à diminuição da seroprevalência tendo em conta que não analisámos os
factores socioeconómicos.
24 Conclusão
Tendo em conta os nossos resultados, se a seroprevalência continuar a diminuir a
probabilidade de surtos futuros de hepatite A aumentará. Os custos, em termos de saúde
pública, associados a estes surtos serão maiores. Por outro lado, o número de casos de
hepatite A sintomática, outrora raros, irá aumentar.
Além disso, é importante realçar que no futuro a percentagem de doentes com DHC e
infecção por VHA poderá aumentar, nomeadamente o número de coinfecções VHAVHB/VHC. Uma vez que a coexistência de DHC está associada a formas mais severas de
hepatite A, a mortalidade decorrente da infecção por VHA e de hepatite fulminante também
poderá ser maior.
Tendo em conta que a vacina contra o VHA é segura, mesmo em doentes com DHC e, que
existem lacunas na vacinação de doentes de alto risco, nos países de baixa endemicidade,
(1)
recomendamos a implementação de políticas de vacinação mais rigorosas neste grupo de
doentes. Para tal sugerimos a realização de mais estudos de forma a atualizar o esquema de
vacinação contra o VHA na população portuguesa ou de forma a avaliar outras medidas mais
sustentáveis.
25 Agradecimentos
Finalizo este trabalho com um sincero agradecimento ao Professor Doutor Luís Filipe Furtado
Soares Tomé, pela sua orientação e disponibilidade, pelas correções, críticas e sugestões e
acima de tudo por todas as palavras encorajadoras que me transmitiu ao longo de todos estes
meses.
Ao serviço de Sangue e Medicina Transfusional dos CHUC, em particular ao Dr. José Rafael
Fernandez, pela sua disponibilidade e empenho no fornecimento dos dados para a realização
deste trabalho.
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