Artigo Original Sarcomas de partes moles de cabeça e pescoço na infância: análise de fatores prognósticos e epidemiológicos, preditivos de resposta ao tratamento Head and Neck soft tissue sarcomas in pediatric patients. Analysis of prognostic and epidemiological factors predictable of treatment outcome RESUMO Introdução: sarcomas de cabeça e pescoço (SCP) são tumores raros, acometendo em torno de 6.000 crianças por ano nos Estados Unidos. O rabdomiossarcoma é tipo histológico mais comum e possui uma sobrevida média de 50%. A principal causa é genética, associando-se secundariamente à radiação. Suas manifestações clínicas dependem da localização, mas manifestase geralmente como uma massa dolorosa. Metástase linfática é rara. O diagnóstico é clínico, comprovado por biópsia e melhor avaliado pela ressonância e tomografia. O tratamento de escolha é a radioterapia associada à quimioterapia. Objetivo: avaliar os fatores epidemiológicos, preditivos de resposta terapêutica e sobrevida dos pacientes portadores de SCP na infância, matriculados no INCA. Métodos: estudo retrospectivo pela análise de prontuários dos casos de SCP na população pediátrica, tratados em uma única instituição entre janeiro/1997 e janeiro/2007, excluindo-se: osteossarcomas, condrossarcomas, tumores desmóides, sarcomas de Kaposi, hemangiopericitoma e carcinossarcomas. Resultados: foram encontrados 39 pacientes, a maioria do gênero masculino (1,5:1). O sítio tumoral mais comum foi a órbita. Estadiamento T2 foi o mais encontrado com estágio avançado predominante. Rabdomiossarcoma alveolar foi o tipo histológico mais comum. O principal tratamento realizado foi a radioterapia com quimioterapia e a sobrevida global de 70,12%. Conclusão: o gênero mais acometido foi o masculino. Não houve predomínio de faixa etária. O tipo histológico mais comum foi o rabdomiossarcoma e o tratamento mais utilizado foi a associação da quimioterapia com radioterapia. Os fatores prognósticos envolvidos e considerados significativos incluem o subtipo e grau histológico bem como tipo de tratamento. O tipo histológico influenciou na sobrevida livre de doença dos pacientes. Terence Pires de Farias1 Rodrigo Maia da Costa2 Fernando Luiz Dias3 Fernando Gonçalves Botelho Junior4 Leonardo Guimarães Rangel2 Marcus Vinicius Menegasse Câmara2 Bernardo Cacciari Peryassu2 Pedro Collares Maia Filho2 André Leonardo de Castro Costa5 ABSTRACT Introduction: Head and neck soft tissue sarcomas are rare tumors. About 6,000 children are affected per year in the US. The rabdomiossarcoma is the commonest type, and has a overall survival rate of 50%. The main cause is genetical. The clinical manifestations are dependent of the anatomic situation, but it generally manifests as a painful mass. Lymphatic metastasis are rare. The diagnosis is clinical proven by a biopsy and better evaluated by the MRI and CT. The treatment of choice is radiotherapy associated with chemotherapy. Objective: To evaluate the epidemiological factors, and predictable factors of therapeutic outcome and overall survival in pediatric patients with HNSTS. Methods: Retrospective analysis of HNSTS cases, in a pediatric population, treated in a single institution between January, 1997 and January, 2007, excluding: osteosarcomas, condrosarcomas, desmoids tumors, Kaposi's sarcoma, hemangiopericitoma and carcinosarcomas. Results: 39 patients were found; men were the majority of the cases (1.5:1). The commonest tumor site was the orbit. Stage T2 was most found with an advanced predominant stage. Alveolar rhabdomyosarcoma was the commonest subtype. The principal treatment was radiotherapy with chemotherapy and the overall survival was 70.12%. Conclusion: The most prevalent gender was male. There was not a predominant age group. The commonest subtype was the rhabdomyosarcoma and the most utilized treatment was the association of chemotherapy with radiation. The most significant prognostic factors were the subtype and historical degree as well as the treatment that was implemented. The histological type has influence on the disease free survival of the patients. Key Words: Sarcoma. Head and Neck Neoplasms. Child. Retrospective Studies. Survival Rate. Descritores: Sarcoma. Neoplasias de Cabeça e Pescoço. Criança. Estudos Retrospectivos. Taxa de Sobrevida. 1) Titular da Seção de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Instituto Nacional de Câncer INCA – MS – RJ. Mestre em Oncologia pelo Instituto Nacional de Câncer INCA – MS – RJ. Professor de Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Pontifícia Universidade Católica PUC-RJ, Rio de Janeiro/RJ, Brasil. 2) Médico Residente de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Instituto Nacional de Câncer INCA – MS – RJ, Rio de Janeiro/RJ, Brasil. 3) Chefe da Seção de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Instituto Nacional de Câncer INCA – MS – RJ. Doutor em Medicina pelo Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP). Professor Coordenador do Curso de Cirurgia de Cabeça e Pescoço da PUC-RJ, Rio de Janeiro/RJ, Brasil. 4) Titular da Seção de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Instituto Nacional de Câncer INCA – MS – RJ. Professor de Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Pontifícia Universidade Católica PUC-RJ, Rio de Janeiro/RJ, Brasil. 5) Médico ex-Residente de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Instituto Nacional de Câncer INCA – MS – RJ, Rio de Janeiro/RJ, Brasil. Instituição: Curso de Pós-Graduação em Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) Correspondência: Terence Pires de Farias, Av. Gilberto Amado, 1059/202, Rio de Janeiro/RJ, Brasil. E-mail: [email protected] Recebido em: 08/12/2008; aceito para publicação em: 26/01/2009; publicado online em: 10/05/2009. Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma. 108 Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v. 38, nº 2, p. 108 - 112, abril / maio / junho 2009 INTRODUÇÃO Partes moles são definidas como tecidos mesenquimais não esquelético, não sendo considerado o sistema retículoendotelial, nervoso e parênquimatoso que preenche os órgãos. Tumores originados de partes moles são classificados de acordo com sua origem histológica e designados como sarcomas. Apesar de especular-se que a maioria dos sarcomas possui origem em uma célula mesenquimal primitiva, esta se torna inverídica quando se percebe que a maioria dos tumores possui suas manifestações fenotípicas de acordo com o tipo de mesênquima que os originou. Os sarcomas são tumores malignos de origem mesodérmica, podendo estar associados a síndromes genéticas, exposição prévia à radiação, infecções virais ou exposição a substâncias carcinogênicas, porém, comumente são de origem pouco esclarecida1. Esse tipo de neoplasia apresenta incidência em torno de 7.000 casos/ano, com mortalidade em torno de 4.000 casos/ano, ocupando o total de 1% de todos os tumores malignos e ocorrendo em apenas 5 a 15% de todos os casos na região de cabeça e pescoço1. Aproximadamente 6.000 crianças apresentam diagnóstico de câncer nos Estados Unidos. Seis a oito por cento desses casos devem-se a sarcomas. Nessa população, um de cada três sarcomas ocorre na região supracitada2. O conhecimento sobre esses tumores é restrito, por serem neoplasias raras, sendo a literatura constituída de estudos que tentam compensar o número restrito de indivíduos com um tempo de acompanhamento maior. Instituições de renome internacional não conseguem reunir um número significativamente expressivo de pacientes sem incluir outros tipos histológicos (com comportamento biológico diferente) ou adotar estudos multicêntricos3. Apesar de raros na cabeça e pescoço, ao atingirem estes sítios, acarretam dificuldades para tratamento efetivo por conta da anatomia nobre, não permitindo ressecções extensas, com margens amplas, que implicaria transtornos fisiológicos, funcionais e estéticos. Essa limitação pode estar associada ao pior prognóstico1. Outro fator de confusão é o debate da nomenclatura e diagnósticos pelos patologistas, pois essas entidades podem ser confundidas com linfomas, melanoma, carcinoma de células gigantes e processos benignos (que são a maioria dos tumores que acometem os sítios da cabeça e pescoço)4. Fatores genéticos e ambientais estão associados e contribuem para o aparecimento dos sarcomas. Certas desordens hereditárias estão associadas a um maior risco de aparecimento desses tumores, tais como a Síndrome de LiFraumeni que é uma mutação de uma região no gene supressor tumoral p53. O gene supressor tumoral Rb1 é associado a pacientes com neurofibromatose tipo I. Outras anomalias incluídas são: síndrome de Gardner, hemocromatose e síndrome de Werner1. Fatores ambientais podem contribuir com a ocorrência desses tumores. Radiação ionizante parece ser o principal fator associado. Outras causas não foram muito bem definidas em virtude da rara incidência desses tumores e sua difícil avaliação e seguimento. Incluemse nesses casos a exposição à uretano, derivados do etileno e hidrocarbonetos aromáticos. A infecção viral é uma causa descrita, havendo associação com o HIV e EBV1. O diagnóstico é geralmente feito em torno de seis anos de idade. A maioria dos pacientes apresenta sinais e sintomas inespecíficos. Em 80% dos casos, manifestam-se como uma massa dolorosa. Os sintomas vão ocorrer de acordo com a localização da área afetada. Geralmente, o diagnóstico é dado antes de haver metástases à distância, especialmente em virtude dessa localização ser pobre em drenagem linfática5. Metástases linfáticas e hematogênicas são comuns. A incidência de metástase cervical varia de acordo com o tipo histológico e a localização. Metástase hematogênica pode ocorrer frequentemente para pulmões e ossos6. Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v. 38, nº 2, p. 108 - 112, abril / maio / junho 2009 Biópsia geralmente é necessário para o diagnóstico e para determinar o tipo histológico. Associa-se normalmente o estudo imunoistoquímico e citogenético do tumor. Tomografia computadorizada ou ressonância nuclear magnética é indicada para avaliar melhor a extensão do acometimento da doença e sua invasão ao sistema nervoso central7. O tratamento do sarcoma é multimodal, englobando tanto a cirurgia quanto o uso da radioterapia e quimioterapia, sendo essa modalidade superior quando qualquer um desses três fatores é realizado separadamente8-9. Se houver presença de metástase linfonodal, existe benefício na realização do esvaziamento cervical, com o uso da radioterapia para aquelas crianças que apresentam múltiplas metástases cervicais10. Dentre os principais fatores prognósticos encontrados e avaliados destacam-se a localização e o tamanho do tumor, sua ressecabilidade cirúrgica e extensão da ressecção, grau de diferenciação, idade e a presença de metástase11-18. O objetivo foi a avaliação dos fatores epidemiológicos e dos fatores prognósticos preditivos de resposta terapêutica e sobrevida dos pacientes portadores de sarcomas de cabeça e pescoço na infância, matriculados no INCA. MÉTODOS A pesquisa foi baseada em estudo retrospectivo, observacional, não randomizado, uni-institucional. Foi realizado obtendo-se uma lista dos portadores de sarcomas e/ou tumores de cabeça e pescoço matriculados no INCA, com entrada de material para análise histopatológica e imunoistoquímica entre janeiro de 1997 e janeiro de 2007. Com a relação aos laudos histopatológicos e estudo dos prontuários, foram excluídos os diagnósticos de osteossarcomas, tumores desmóides, condrossarcomas, sarcomas de Kaposi, hemangiopericitoma e carcinossarcomas, assim como os parameníngeos, por serem entidades de comportamentos diferentes e não pertinentes a esse estudo. Analisaram-se os dados obtidos e compararam-se os mesmos com índices encontrados na literatura mundial. A análise estatística foi feita com SPSS 10.0, usando o teste de x2, adotando p significativo menor que 0,05 % e teste de Kaplan-Meier para determinar curvas de sobrevida global e livre de doença. As variáveis estudadas foram: idade, gênero, tipo histológico, estadiamento, grau histopatológico, tipo de tratamento, sobrevida global e livre de doença, sitio primário, local de invasão, presença de metástase, progressão para metástase regional e à distância, invasão de estruturas vizinhas e área ou volume da lesão. Esse trabalho foi aprovado pela comissão de ética do INCA. RESULTADOS A população estudada era composta por 23 pacientes do gênero masculino e 16 do feminino. Todos apresentavam idade abaixo dos 18 anos. De um total de 50, 11 foram excluídos devido à falta de dados ou dados incompletos nos prontuários, sendo analisados 39 casos. O local de origem dos tumores foi agrupado nas seguintes localizações anatômicas com as seguintes freqüências: seio maxilar 26 % (n = 10), cavidade oral 15% (n = 6), órbita 33% (n = 13), nariz 15% (n = 6) e face 11% (n = 4) – Figura 1. Com relação ao estadiamento, 32% eram T1 e 68%, T2. Em relação à condição linfonodal, 81,2% eram N0 e 18,8%, N1; e, analisando presença de metástase à distância, 95,5% eram M0 e 4,5%, M1. Metástase óssea foi predominante nesses casos (78%), portanto, a distribuição dos pacientes de acordo com o estágio foi a seguinte: E I 27%, E II 4,5%, E III 41,5% e E IV 27%. Desses pacientes formaram-se dois grupos: estágio avançado (E III e IV) 68% e não avançado (E I e II) 32%. 109 em apenas oito pacientes. Houve realização de cirurgia associada à quimioterapia adjuvante em apenas dois casos e cirurgia com radioterapia adjuvante em seis casos. Quimioterapia isolada foi realizada em dois pacientes. Quimioterapia pré-operatória seguida de cirurgia e radioterapia adjuvante foi feita em um paciente. Procedeu-se ao esvaziamento cervical em seis pacientes, não ocorrendo o mesmo em 33. Analisando essas peças, três tinham linfonodo positivo para neoplasia, enquanto três eram negativos. No estudo das margens cirúrgicas sete foram livres de neoplasia, enquanto 11 margens estavam comprometidas por neoplasia. Em seis casos, a margem foi ampliada para obtenção de margem livre de tumor, o que não houve em cinco casos. A recidiva regional ocorreu em dois pacientes, recidiva local em sete pacientes e a recidiva a distância em cinco. A sobrevida global em 10 anos em relação ao gênero masculino foi de 40,07,% e, no feminino, 54,03% (log rank 0,01 e p 0,78). O tipo histológico de melhor prognóstico foi o rabdomiossarcoma alveolar, com sobrevida global de 72,70%, acompanhado de rabdomiossarcoma SOE 72,20%, rabdomiorssarcoma embrionário com 50% e os demais tipos histológicos tiveram uma sobrevida global de 36,43%. – Gráfico 2. Figura 1 – Distribuição em porcentagem por localização dos sarcomas de cabeça e pescoço em pacientes tratados no INCA no período de janeiro de 1997 a janeiro de 2007, em menores de 18 anos. Os tipos histológicos encontrados e suas freqüências foram: fibrossarcoma 3% (n = 1), sinoviossarcoma 5% (n = 2), rabdomiossarcoma alveolar 10% (n = 4), rabdomiossarcoma embrionário 46% (n = 18), sarcoma soe 8% (n =3) e rabdomiossarcoma SOE 28% (n = 11). Os tipos histológicos que tiveram o número de casos menor ou igual a seis, quando analisado, formaram o grupo “outros”. Alto grau histológico somou um total de 26 casos e os que apresentavam baixo grau, totalizaram 13 pacientes – Gráfico 1. Gráfico 1 – Distribuição segundo tipos histológicos dos sarcomas de cabeça e pescoço em pacientes tratados no INCA no período de janeiro de 1997 a janeiro de 2007, em menores de 18 anos. A invasão de estruturas pelo tumor ocorreu da seguinte forma: invasão de pele (n = 5), invasão muscular (n = 15), invasão óssea (n = 15), invasão de cartilagem (n = 1), invasão neural (n = 10) e invasão angiolinfática (n = 2). Pacientes que não possuíam metástase cervical (N negativo) e progrediram com invasão linfática (N positivo) somaram um total de três pacientes, enquanto 29 permaneceram N negativo. Havia sete pacientes com linfonodo positivo inicialmente. Os que evoluíram com metástase à distância totalizaram quatro casos, enquanto 34 permaneceram M0. Um paciente já apresentava metástase à distância. O principal tratamento para esses pacientes foi a associação de radioterapia e quimioterapia concomitante em 20 casos, enquanto 19 pacientes foram tratados de forma alternativa, seja somente por cirurgia, somente radioterapia ou cirurgia associada a radioterapia. Cirurgia isoladamente como tratamento principal foi realizada 110 Gráfico 2 – Distribuição da sobrevida segundo tipos histológicos dos sarcomas de cabeça e pescoço em pacientes tratados no INCA no período de janeiro de 1997 a janeiro de 2007, em menores de 18 anos. Com relação ao sítio anatômico, a sobrevida global foi: seio maxilar 66,67%, cavidade oral 44,33%, órbita 77,78%, nariz 56%, face 33,33% (p = 0,06). A sobrevida global segundo estadiamento foi de 67,38% para T1 e 44.66% para T2; (p = 0,3). A condição linfonodal apresentou sobrevida de 42,34% para N0 e 34,55% para N1 ( p = 0,225). Com relação aos pacientes que apresentavam metástase à distância, tiveram sobrevida global para M0 de 54,35% e para M1 de 3% ( p = 0,02). A sobrevida para estágio inicial foi 53,33% e para avançado 33,33% (log rank 0,16, p = 0,32). A invasão tumoral para estruturas adjacentes teve sobrevida para invasão de pele de 66,67% (log rank 0,06, p = 0,2), muscular de 29,69% (log rank 0,96, p = 0, 77) e osso de 56,25% (log rank 0,93, p = 0,21). Tratamento com radioterapia e quimioterapia levou a uma sobrevida global de 70,12% e os que não foram submetidos a este tratamento apresentaram uma sobrevida global de 53,75% (log rank 1,55, p <10-4). DISCUSSÃO O rabdomiossarcoma é o tipo histológico mais frequentemente encontrado e usualmente se localiza na região de cabeça e pescoço, a despeito de outras áreas. Outros subtipos como osteossarcoma, fibrohistiocitoma maligno e angiossarcoma são também descritos, sendo menos frequentes. Esses outros tipos histológicos respondem apenas por 25% do total dos sarcomas encontrados. Cerca de 20% dessas neoplasias permanecem sem classificação nessa topografia do corpo1. Em nosso estudo, prevaleceu o rabdomiossarcoma embrionário (46%), seguido do rabdomissarcoma SOE (28%). Na infância, existe uma apresentação bimodal, onde um pico apresenta-se na primeira década de vida e o outro ocorre Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v. 38, nº 2, p. 108 - 112, abril / maio / junho 2009 durante a adolescência. Crianças jovens tendem a apresentar o subtipo embrionário, enquanto adolescentes apresentam uma porcentagem maior do rabdomiossarcoma tipo alveolar2. Em nosso estudo, pode-se observar que o tumor predomina no gênero masculino, comparado ao feminino apresentando uma proporção em torno de 1,5:1. Não houve predominância de faixa etária. O local mais comum de aparecimento foi a órbita (33%) predominando o tipo histopatológico radomiossarcoma embrionário (46%). Nosso estudo encontra-se em acordo com os dados da literatura mundial, não havendo variação19. Cirurgia é indicada quando não houver excessiva morbidade e quando a ressecção do tumor primário for permitir a não realização da radioterapia pós-operatória ou reduzir sua dose. Isso é particularmente verdadeiro para tumores não orbitários e não parameníngeos. Quando somente a ressecção parcial for possível ou o tumor for orbitário, a biópsia torna-se o único procedimento realizado na maioria dos casos. A radioterapia e quimioterapia usada nesses casos resultam em uma ótima sobrevida4. Tumores localizados na face, cavidade oral, espaço parafaríngeo e pele possuem os melhores índices prognósticos. Esse fato talvez se deva à facilidade de ressecção desses tumores8. Quando o tumor não for totalmente ressecável, a radioterapia é necessária. Ela é realizada diretamente no sítio primário gerando um largo campo determinado pela extensão do tumor clinico e radiologicamente avaliado. Não há benefício no uso da radioterapia hiperfracionada, no intuito de reduzir os efeitos danosos da radioterapia convencional. A radioterapia adjuvante tem mostrado uma diminuição na recorrência local da doença, porém não podemos dizer o mesmo em relação ao prognóstico para óbito9. Quase todos os pacientes pediátricos com SCP recebem tratamento com quimioterapia sistêmica. O protocolo utilizado varia de acordo com o estágio em que o paciente se encontra10,11. Os esquemas de quimioterapia para sarcomas são baseados na adriamicina. Quimioterapia neoadjuvante tem resposta e facilita nos procedimentos cirúrgicos10. A sobrevida global desses tumores gira em torno de 50% a 60%. A localização tumoral influencia na sobrevida, sendo maior quando afeta a órbita. Apresenta uma sobrevida que gira em torno de 95% em cinco anos nesses casos4. Na nossa casuística, encontramos sobrevida de 90% em cinco anos para tumores localizados na órbita, sendo o de melhor prognóstico. A sobrevida global em nosso estudo encontra-se acima da média (70%), talvez explicado pelo tamanho tumoral (<5 cm) (39,1%), que parece influenciar na sobrevida. Tumores menores que 5 cm apresentam melhor prognóstico em virtude da possibilidade de ressecção com margens significativas, aumentando a sobrevida livre de doença. A extensão da ressecção encontra-se atrelado ao prognóstico. Quanto mais extensa, menor a probabilidade de haver lesão residual14. O grau de diferenciação do tumor é o fator mais importante, sendo bem enfatizado na literatura. Quanto menor o grau, pior o prognóstico15. O mesmo foi visto em nossa casuística com sobrevida global de 25% para os pacientes que apresentavam tumores de baixo grau. Os fatores prognósticos mais importantes na literatura têm sido o grau, tamanho e as margens nos sarcomas de cabeça e pescoço, apesar de nosso estudo o que teve importância significativa como fator prognóstico para o óbito foi apenas o grau histológico dentre esses supracitados. Muitos trabalhos colocam como tamanho tumoral > 5 cm e alto grau histológico, como variáveis que negativamente afetam a sobrevida global. Margens positivas também influenciam negativamente a sobrevida livre de recidiva13-19. SCP raramente metastatizam para o pescoço, com uma incidência de 4%10, por isso, o esvaziamento cervical não é feito de rotina. Em nosso estudo, os pacientes com linfonodo Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v. 38, nº 2, p. 108 - 112, abril / maio / junho 2009 positivo foram sete (18,8% dos casos). Não indicamos esvaziamento cervical profilático. Torna-se difícil comparação de todos os dados referidos anteriormente com os da literatura, em virtude e exíguas publicações. Nossa casuística é uma das poucas existentes e torna-se, devido a isso, um fator contribuinte para avaliação do melhor tratamento indicado na população pediátrica. CONCLUSÃO Sarcomas na infância são tumores raros, de difícil tratamento apresentando sua maior prevalência no gênero masculino, tendo o rabdomiossarcoma embrionário como principal tipo histológico encontrado. Seu local preferencial de manifestação é a órbita e possui como principal forma de tratamento com resposta satisfatória a radioterapia combinada à quimioterapia. Não possui altas taxas de disseminação regional, bem como à distância, apresentando poucos casos de doença metastática. A ressecção cirúrgica é pouco indicada e realizada e, quando esta se faz presente, é difícil de obterem margens livres de doença. Possui baixa taxa de disseminação linfática, dispensando a necessidade de realização de esvaziamento cervical profilático. Os fatores prognósticos envolvidos e considerados positivamente significativos incluem o subtipo (rabdomiossarcoma alveolar possui melhor prognóstico) e grau histológico (baixo grau) bem como tipo de tratamento implementado (radioterapia e quimioterapia). Apesar do tipo histológico não poder ser considerado fator determinante do tipo de tratamento, ele influencia na sobrevida livre de doença dos pacientes. REFERÊNCIAS 1. Patel SG, Shaha AR, Shah JP. Soft tissue sarcomas of the head and neck: an update. Am J Otolaryngol. 2001;22(1):2-18. 2. Hicks J, Flaitz C. Rhabdomyosarcoma of the head and neck in children. Oral Oncol. 2002;38(5):450-9. 3. Figueiredo MT, Marques LA, Campos-Filho N. Soft-tissue sarcomas of the head and neck in adults and children: experience at a single institution with a review of literature. Int J Cancer. 1988;41(2):198-200. 4. Freedman AM, Reiman HM, Woods JE. Soft-tissue sarcomas of the head and neck. Am J Surg. 1989;158(4):367-72. 5. Farr HW. Soft part sarcomas of the head and neck. Semin Oncol. 1981;8(2):185-9. 6. Huber GF, Matthews TW, Dort JC. Soft-tissue sarcomas of the head and neck: a retrospective analysis of the Alberta experience 1974 to 1999. Laryngoscope. 2006;116(5):780-5. 7. 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