Roteiro para Leitura Dramática: O Pequeno Príncipe Antoine de Saint‐Exupéry 1 A LÉON WERTH Peço perdão às crianças por dedicar este livro a uma pessoa grande. Tenho um bom motivo: essa pessoa grande é o melhor amigo que possuo. Entretanto, tenho outro motivo: essa pessoa grande é capaz de compreender todas as coisas, até mesmo os livros de criança. Tenho ainda um terceiro: essa pessoa grande mora na França, e ela tem fome e frio. Ela precisa de consolo. Se todas esses motivos não bastam, eu dedico então esse livro à criança que essa pessoa grande já foi. Todas as pessoas grandes foram um dia crianças. (Mas poucas se lembram disso). Corrijo, portanto, a dedicatória: A LÉON WERTH QUANDO ELE ERA CRIANÇA 2 O Pequeno Príncipe Capítulo I Narrador: Aos seis anos, o aviador viu num livro sobre a Floresta Virgem, Histórias Vivivdas, uma impressionante gravura. Ela representava uma jibóia que engolia um animal. Eis a cópia do desenho: N: Assustado com o que vira e após refletir muito sobre as aventuras da selva, fez seu desenho número 1. N: Mostrou sua obra-prima às pessoas grandes e perguntou se o desenho lhes fazia sentir medo. Adulto: Por que é que um chapéu faria sentir medo? N: Aquele desenho não representava um chapéu. Representava uma jibóia digerindo um elefante. O menino desenhou, então, o interior da jibóia, a fim de que as pessoas grandes pudessem entender melhor. De acordo com ele, elas têm sempre necessidade de explicações detalhadas. O desenho número 2 era assim: 3 Aviador: As pessoas grandes têm sempre necessidade de explicações detalhadas e é cansativo, para as crianças, ficar toda hora explicando... N: Sem acreditar na criatividade e na comunicação, desistiu de seguir “uma promissora carreira de pintor” e escolheu ser aviador. Manteve-se longe do contato humano. Com seu avião, poderia ver todos os lugares, mas sem permanecer em nenhum deles. Ser aviador é uma linda profissão que, assim como todas as outras, exige imaginação, criatividade e amor, mas ele ainda não estava pronto para compreender que o problema não estava na profissão escolhida, mas nele próprio. Por não ter sido compreendido quando criança, o avidor se fechou em si mesmo. Confessa que ao longo da vida teve vários contatos, mas nunca um verdadeiro amigo. A falta de comunicação fez com que se tornasse um homem arrogante e ressentido. Sempre em busca de ser adivinhado, quando adulto, ao encontrar uma pessoa que julgava ser um pouco esclarecida, fazia a experiência de seu desenho número 1 que sempre conservou consigo, mas a resposta era sempre a mesma: Adulto: É apenas um chapéu. N: Como os adultos não adivinhavam o medo que imaginava expressar em seu desenho, sua mágoa aumentava, assim como seu tom de superioridade. Deixava, então, de falar de jibóias, de florestas virgens e de estrelas e passava a falar de bridge, de golfe ou de gravatas. Assim, afastava as pessoas ainda mais. 4 Capítulo II N: Essa postura arrogante durou até o encontro com o Pequeno Príncipe no dia em que uma pane o obrigou a fazer um pouso de emergência no deserto do Saara, há cerca de seis anos. Alguma coisa se quebrara no motor. E como não trazia consigo nem mecânico nem passageiros, preparou-se para executar sozinho aquele difícil conserto. Era, para ele, questão de vida ou morte. A água que tinha para beber só dava para oito dias. Na primeira noite, adormeceu sobre a areia, a milhas e milhas de qualquer terra habitada. Imaginem qual foi a sua surpresa, quando, ao amanhecer, uma vozinha estranha o acordou. P P: Por favor... desenha-me um carneiro! Aviador: O quê? P P: Desenha-me um carneiro... N: Levantou-se num salto, como se tivessse sido atingido por um raio, esfregou bem os olhos. Olhou ao seu redor e viu aquele homenzinho extraordinário, que o observava seriamente. Olhava para essa aparição com olhos arregalados de espanto. Não esqueçam que ele se achava a mil milhas de qualquer terra habitada. Ora, o pequeno visitante não lhe parecia nem perdido, nem morto de fadiga, nem morto de fome, de sede ou de medo. Aviador: Mas... que fazes aqui? P P: Por favor... desenha-me um carneiro... N: Quando o mistério é impressionante demais, a gente não ousa desobedecer. Por mais absurdo que aquilo lhe parecesse a mil milhas de todos os lugares habitados e com a vida em perigo, tirou do bolso uma folha de papel e uma caneta. Mas lembrou-se, então, que havia estudado principalmente geografia, história, matemática e gramática. Aviador: Eu não sei desenhar. P P: Não tem importância. Desenha-me um carneiro. N: Como jamais houvesse desenhado um carneiro, refez para ele um dos dois únicos desenhos que sabia: o da jibóia fechada. E ficou surpreso com a reação do principezinho. P P: Não! Não! Eu não quero um elefante numa jibóia. A jibóia é perigosa e o elefante toma muito espaço. Tudo é pequeno onde eu moro. Preciso é de um carneiro. Desenha-me um carneiro. N: Pela primeira vez em toda sua vida, alguém o tinha adivinhado. Onde todos viam um chapéu, o principezinho enxergou a jiboia engolindo o elefante, mas teve a coragem e a firmeza de dizer ao aviador que não era aquilo que havia 5 pedido. Precisava de um carneiro. E então ele desenhou. P P: Não! Esse já está muito doente. Desenha-me outro. N: Desenhou novamente. P P (sorrindo paciente): Bem vês que isto não é um carneiro. É um bode... Olha os chifres... N: Fez outro desenho que foi recusado como os anteriores. P P: Esse aí é muito velho. Quero um carneiro que viva muito tempo. N: Então, perdendo a paciência e como tinha pressa de desmontar o motor, rabiscou outro desenho. Aviador: Esta é a caixa. O carneiro que queres está aí dentro. N: E ficou surpreso ao ver iluminar-se a face do seu pequeno juiz: P P: Era assim mesmo que eu queria! N: O desenho da caixa ganha vida na imaginação do principezinho. Ali caberia o carneirinho que desejasse. 6 P P: Será preciso muito capim para esse carneiro? Aviador: Por quê? P P: Porque é muito pequeno onde eu moro... Aviador: Qualquer coisa chega. Eu te dei somente um carneirinho! P P: Não é tão pequeno assim... Olha! Ele adormeceu... N: E foi assim que conheceu, um dia, o pequeno príncipe. 7 Capítulo III N: O aviador levou algum tempo para entender de onde ele viera. O principezinho, que fazia milhares de perguntas, parecia nunca escutar as do aviador. Palavras pronunciadas ao acaso é que foram, pouco a pouco, revelando sua história. Quando viu pela primeira vez o avião perguntou: P P: Que coisa é aquela? Aviador (orgulhoso): Não é uma coisa. Aquilo voa. É um avião. O meu avião. P P (assustado): Como? Tu caíste do céu? Aviador (humildemente): Sim... P P: Ah! Isto é engraçado... Então, tu também vens do céu! De que planeta tu és? Aviador: Tu vens então de outro planeta? P P (balançando a cabeça): É verdade que, nisto aí, não podes ter vindo de muito longe... Aviador: De onde vens, meu caro? Onde é tua casa? Para onde queres levar meu carneiro? (silêncio) P P: O bom é que a caixa que me deste poderá, de noite, servir de casa para ele. Aviador: Sem dúvida. E se tu fores um bom menino, te darei também uma corda para amarrá-lo durante o dia. E uma estaca para prendê-lo. P P: Amarrar? Que ideia estranha! Aviador: Mas se tu não o amarras, ele vai-se embora e se perde... P P (rindo): Mas onde pensas que ele vai? Aviador: Não sei... Por aí... Andando sempre em frente. P P (sério): Não faz mal, é tão pequeno onde moro! Quando a gente anda sempre em frente, não pode mesmo ir longe... N: Pouco a pouco, na relação com o Pequeno Príncipe, o aviador começa a recuperar a imaginação, a perceber o mundo a sua volta e a se interessar verdadeiramente pelos outros. 8 Capítulo IV N: Este fora apenas o início de uma relação que resultou em uma profunda transformação na vida do aviador. Ele, que até então vivera sozinho e ressentido, passou a encarar a vida de outra forma. Seis anos depois, refletindo sobre as experiências vividas naquele tempo, diz: Aviador: Gostaria que minha história tivesse começado como nos contos de fada. Gostaria que tivesse sido assim: "Era uma vez um pequeno príncipe que habitava um planeta pouco maior que ele, e que tinha necessidade de um amigo..." Para aqueles que compreendem a vida, isto pareceria, sem dúvida, muito mais verdadeiro. Não gosto de gente que lê superficialmente. Dá-me tanta tristeza resgatar essas lembranças! Já faz seis anos que meu amigo se foi com seu carneiro. Se tento descrevê-lo, é justamente porque não quero esquecê-lo. É triste esquecer um amigo. Nem todo mundo tem amigo. E eu corro o risco de ficar como as pessoas grandes, que só se interessam por números. N: Esse encontro foi marcante e o aviador quer mantê-lo vivo em sua memória. A couraça com a qual se protegia e que evitava qualquer possibilidade de relacionamento, foi se desfazendo na convivência com o principezinho. Aviador: Foi por isso que comprei um estojo de aquarelas e alguns lápis. É difícil voltar a desenhar na minha idade, principalmente quando não se fez outra tentativa além das jibóias fechadas e abertas, aos seis anos! Experimentarei, é claro, fazer os retratos mais parecidos que puder. Mas não tenho muita certeza de conseguir. Vou arriscando então, aqui e ali. Provavelmente esquecerei detalhes dos mais importantes. Peço que me perdoem. Meu amigo nunca dava explicações. Julgava-me talvez semelhante a ele. N: Ele, que até então, acreditava ser superior a todos, começava a perceber que suas críticas aos outros se referiam também a si mesmo: Aviador: Infelizmente, não sei ver carneiros através de caixas. Talvez eu seja um pouco como as pessoas grandes. Devo ter envelhecido. 9 Capítulo V N: A cada dia o aviador ficava sabendo mais alguma coisa do planeta do principezinho, da partida, da viagem. Mas isso devagarzinho, ao acaso das informações colhidas e de suas observações. Foi assim que veio a conhecer, no terceiro dia, o drama dos baobás. Dessa vez, ainda, foi graças ao carneiro. Como se tivesse um sério problema, o principezinho lhe perguntou: P P: É verdade que os carneiros comem arbustos? Aviador: Sim. É verdade. P P: Ah! Que bom! N: O aviador não entendeu imediatamente por que era tão importante que os carneiros comessem arbustos, mas, o pequeno príncipe acrescentou: P P: Então eles comem também os baobás? Avidor: Os baobás não são arbustos, mas árvores grandes como igrejas. E que, mesmo que levasse consigo toda uma manada de elefantes, eles não chegariam a destruir um único baobá. P P (rindo): Seria preciso colocar um em cima do outro... Mas os baobás, antes de crescer, são pequenos. Aviador: É verdade! Mas por que tu desejas que os carneiros comam os baobás pequenos? P P: Ora! Vejamos! É óbvio, não? N: De fato, no planeta do principezinho havia, como em todos os outros planetas, ervas boas e más. Consequentemente, sementes boas, de ervas boas; sementes más, de ervas más. Mas as sementes são invisíveis. Elas dormem nas entranhas da terra até que uma cisme de despertar. Então ela se espreguiça e lança, timidamente, para o sol, um inofensivo galhinho. Se for de roseira ou rabanete, que cresça à vontade. Mas, quando se trata de uma planta ruim, é preciso que seja arrancada imediatamente. Havia sementes terríveis no planeta no Pequeno Príncipe... as sementes de baobá, que quando não são arrancadas, suas raízes penetram o planeta todo, atravacando-o. E se o planeta é pequeno e os baobás numerosos... P P: O planeta acaba rachando. N: Sim, o planeta acaba rachando... Mas o pequeno príncipe sabia como resolver o problema antes que as más sementes infestassem seu planeta. P P: É uma questão de disciplina. Quando a gente acaba a higiene matinal, começa a fazer com cuidado a higiene do planeta. É preciso que nos 10 habituemos a arrancar regularmente os baobás logo que se diferenciem das roseiras, com as quais muito se parecem quando pequenos. É um trabalho sem graça, mas de fácil execução. N: O principezinho ressalta a importancia de discernir o bom do ruim, e de cuidar permanentemente para que as más sementes não tomem conta do planeta. O trabalho de prevenção é primordial para que nos protejamos tanto dos perigos internos, quanto dos externos, que fazem parte da vida. Por isso, o principezinho aconselhou o aviador a fazer um belo desenho para que as crianças do nosso planeta se consciêntizem desse perigo. P P: Se algum dia tiverem de viajar, poderá ser útil para elas. Às vezes não há inconveniente em protelar um trabalho. Mas, quando se trata de baobás, é sempre uma catástrofe! Conheci um planeta habitado por um preguiçoso. Ele havia deixado que ali crescessem três arbustos... N: Seguindo as orientações do principezinho, o aviador desenhou o planeta do preguiçoso com o objetivo de alertar as crianças sobre o perigo dos baobás. O aviador não gosta de parecer moralista, mas o perigo dos baobás é tão pouco conhecido, e tão grandes são os riscos para aquele que um dia se perca num asteróide, que, ao menos uma vez, abriu exceção e disse: Aviador: Meninos! Cuidado com os baobás! N: Foi para advertir seus amigos de um perigo que há tanto tempo os ameaçava, como ao próprio aviador, e do qual nunca suspeitamos, que tanto caprichou naquele desenho. Perguntarão, talvez: Todos: Por que não há nesse livro outros desenhos tão impressionantes como 11 o dos baobás? N: A resposta é simples: Ele tentou, mas não conseguiu. Quando desenhou os baobás, estava inteiramente tomado pela iminência de seu perigo. 12 Capítulo VI N: Na manhã do quarto dia, o aviador aprendeu um novo detalhe que o fez compreender melhor os segredos da triste vidinha do pequeno príncipe. Durante muito tempo, ele não tivera outra distração a não ser a doçura do pôrdo-sol. P P: Gosto muito de pôr-do-sol. Vamos ver um... Aviador: Mas é preciso esperar. P P: Esperar o quê? Aviador: Esperar que o sol se ponha. P P: Ah é! Eu sempre imagino estar em casa! N: O planeta do principezinho era muito pequeno. Bastava recuar um pouco a cadeira e contemplar o crepúsculo quantas vezes desejasse... P P: Um dia eu vi o sol se pôr quarenta e quatro vezes! Quando a gente está muito triste, gosta de admirar o pôr-do-sol... Aviador: Estavas tão triste assim no dia em que contemplaste os quarenta e quatro? N: Mas o principezinho não respondeu. 13 Capítulo VII N: No quinto dia, sempre graças ao carneiro, um segredo da vida do pequeno príncipe foi revelado. P P: Um carneiro, se come arbusto, come também as flores? Aviador: Um carneiro come tudo que encontra. P P: Mesmo as flores que tenham espinhos? Aviador: Sim. Mesmo as que têm. P P: Então... para que servem os espinhos? N: O aviador não sabia responder. Estava ocupadíssimo naquele instante, tentando desatarraxar do motor um parafuso muito apertado. Estava bastante preocupado, pois a pane começava a parecer muito grave, e a água que tinha para beber era tão pouca que temia o pior. O principezinho jamais renunciava a uma pergunta, uma vez que a tivesse feito. P P: Para que servem os espinhos? N: Mas o aviador estava irritado com o parafuso e respondeu qualquer coisa: Aviador: Espinhos não servem para nada. São pura maldade das flores. P P (indgnado): Oh! Não acredito! As flores são fracas, ingênuas. Defendem-se como podem. Elas se julgam poderosas com os seus espinhos... Aviador (consigo mesmo): Se esse parafuso não afrouxar, vou fazê-lo soltar com uma martelada! P P: E tu achas então que as flores... Aviador: Ora! Eu não acho nada. Eu respondi qualquer coisa. Eu só me ocupo com coisas sérias! P P (irritado): Coisas sérias! Tu falas como as pessoas grandes! Tu confundes todas as coisas... Misturas tudo! Eu conheço um planeta onde há um sujeito vermelho, quase roxo. Nunca cheirou uma flor. Nunca olhou uma estrela. Nunca amou ninguém. Nunca fez outra coisa senão contas. E o dia todo repete como tu: "Eu sou um homem sério! Eu sou um homem sério!" e isso o faz inchar-se de orgulho. Mas ele não é um homem, é um cogumelo! Aviador: Um o quê? P P (irritado): Um cogumelo! Há milhões de anos que as flores produzem espinhos. Há milhões e milhões de anos que apesar disso os carneiros as comem. E não será importante procurar saber por que elas perdem tanto 14 tempo produzindo espinhos inúteis? Não terá importância a guerra dos carneiros e das flores? Não será mais importante que as contas do tal sujeito? E se eu, por minha vez, conheço uma flor única no mundo, que só existe no meu planeta, e que um belo dia um carneirinho pode destruir num só golpe, sem saber o que faz, - isto não tem importância? Se alguém ama uma flor da qual só existe um exemplar em milhões e milhões de estrelas, isso basta para fazê-lo feliz quando as contempla. Ele pensa: "Minha flor está lá, em algum lugar..." Mas se o carneiro come a flor, para ele é, como se todas as estrelas repentinamente se apagassem! E isto não tem importância! N: O pequeno príncipe não conseguiu dizer mais nada. Pôs-se a soluçar. A noite caíra. O aviador largou as ferramentas. Ria-se do martelo, do parafuso, da sede e da morte. Havia numa estrela, num planeta, a Terra, um principezinho a consolar! Tomou-o nos braços. Embalou-o. Nesse instante, a falta de comunicação dá lugar a um entendimento profundo entre eles. Aviador (acalmando-o): A flor que tu amas não está em perigo... Vou desenhar uma mordaça para o carneiro... Uma cerca para a tua flor... Eu... N: Ele não sabia o que dizer. Sentia-se envergonhado. Não sabia como consolá-lo, como se aproximar dele... É tão misterioso o país das lágrimas! 15 Capítulo VIII N: O aviador logo aprendeu a conhecer melhor aquela flor. Sempre houvera, no planeta do pequeno príncipe, flores muito simples, ornadas de uma só fileira de pétalas, e que não ocupavam espaço nem incomodavam ninguém. Apareciam pela manhã, na relva, e à tarde já murchavam. Mas aquela brotara um dia de uma semente trazida não se sabe de onde, e o principezinho resolvera vigiar de perto o pequeno broto, que era tão diferente dos outros. P P: Podia ser uma nova espécie de baobá. N: Mas o arbusto logo parou de crescer, e na sua extremidade começou então a se formar uma flor. O principezinho, que assistia ao surgimento de um enorme botão, pressentiu que dali sairia uma aparição miraculosa, mas a flor não acabava mais de preparar sua beleza, no seu verde aposento. Escolhia as cores com cuidado. Vestia-se lentamente, ajustava uma a uma suas pétalas. Não queria sair, como os cravos, amarrotada. Ela queria aparecer no esplendor da sua beleza. P P: Ah, sim! Era vaidosa. N: Sua misteriosa toalete, portanto, demorara alguns dias. E eis que, numa manhã, justamente à hora do sol nascer, ela se mostrou. Rosa (bocejando): Ah! eu acabo de despertar... Desculpa... Estou ainda toda despenteada... P P (espantado): Como és bonita! Rosa: É verdade. E nasci ao mesmo tempo que o sol... N: O principezinho percebeu logo que a flor não era modesta. Mas era tão envolvente! Rosa: Creio que é hora do café da manhã. Tu poderias cuidar de mim... N: E o principezinho, atordoado, tendo ido buscar um regador com água fresca, aguou a flor. Assim, ela começou a atormentá-lo com sua doentia vaidade. Um dia, por exemplo, falando dos seus quatro espinhos, dissera ao pequeno príncipe: Rosa: Os tigres, eles podem aparecer com suas garras! P P: Não há tigres no meu planeta. Além disso, tigres não comem ervas. Rosa (suavemente): Não sou uma erva. P P: Perdoa-me... Rosa: Não tenho receio dos tigres, mas tenho horror das correntes de ar. Não 16 terias por acaso um para-vento? P P (consigo mesmo): Horror das correntes de ar... Isso não é bom para uma planta. É bem complicada essa flor... Rosa: À noite me colocarás sob uma redoma de vidro. Faz muito frio no teu planeta. Não é nada confortável. De onde eu venho... N: De repente, calou-se. Viera em forma de semente. Não pudera conhecer nada dos outros mundos. Encabulada por ter sido surpreendida em uma mentira tão tola, tossiu duas ou três vezes e, para fazê-lo sentir-se culpado, pediu: Rosa: E o para-vento? P P: Ia buscá-lo. Mas tu me falavas... N: Então ela forçou a tosse para causar-lhe remorso. Assim, o principezinho, apesar da sinceridade do seu amor, logo começara a duvidar dela. Levara a sério palavras sem importância, e isto o fez sentir-se muito infeliz. P P: Não devia tê-la escutado, não se deve nunca escutar as flores. Basta admirá-las, sentir seu perfume. A minha perfumava todo o planeta, mas eu não sabia como desfrutá-la. Aquela história das garras, que tanto me irritara, devia ter-me enternecido... Não soube compreender coisa alguma! Deveria tê-la julgado por seus atos, não pelas palavras. Ela exalava perfume e me alegrava... Não podia jamais tê-la abandonado. Deveria ter percebido sua ternura por trás daquelas tolas mentiras. As flores são tão contraditórias! Mas eu era jovem demais para saber amá-la. 17 Capítulo IX N: Foi assim que o pequeno principe decidiu partir, aproveitando-se da migração de pássaros selvagens. Na manhã da viagem, pôs o planeta em ordem. Revolveu cuidadosamente seus vulcões. Ele possuía dois vulcões em atividade, o quê era muito cômodo para esquentar o café da manhã. Possuía também um vulcão extinto. Mas, como ele dizia: P P: Nunca se sabe! N: Revolveu também o extinto. O principezinho arrancou também, não sem um pouco de tristeza, os últimos rebentos de baobás. Ele pensava em nunca mais voltar. Mas todos esses trabalhos rotineiros lhe pareceram, naquela manhã, extremamente agradáveis. E, quando regou pela última vez a flor e se preparava para colocá-la sob a redoma, percebeu que tinha vontade de chorar. P P: Adeus. (silêncio) P P: Adeus. N: A flor tossiu. Mas não era por causa do resfriado. Rosa: Eu fui uma tola. Peço-te perdão. Procura ser feliz. N: A ausência de censuras o surpreendeu. Ficou parado, completamente sem jeito, com a redoma nas mãos. Não conseguia compreender essa delicadeza. Rosa: É claro que eu te amo. Foi minha culpa não perceberes isso. Mas não tem importância. Foste tão tolo quanto eu. Tenta ser feliz... Larga essa redoma, não preciso mais dela. P P: Mas o vento... Rosa: Não estou tão resfriada assim... O ar fresco da noite me fará bem. Eu sou uma flor. P P: Mas os bichos... Rosa: É preciso que eu suporte duas ou três larvas se quiser conhecer as borboletas. Dizem que são tão belas! Do contrário, quem virá visitar-me? Tu estarás longe... Quanto aos bichos grandes, não tenho medo deles. Eu tenho as minhas garras. Não demores assim, que é exasperante. Tu decidiste partir. Então vai! N: Ela não queria que ele a visse chorar. Embora fosse uma flor muito orgulhosa, compreendeu a importância da separação, ambos haviam sido tolos e precisam conhecer a vida para aprender o verdadeiro significado do amor. 18 Capítulo X N: Após a despedida, o pequeno príncipe começou uma viagem de muitos aprendizados. Foram seis os asteróides visitados por ele e, em cada uma deles, conheceu uma pessoa diferente. Ao retratar cada um dos habitantes dos planetas que visitara, o principezinho nos mostra estereótipos de “pessoas grandes” que, infelizmente, não encontraram um sentido na vida e vivem sós, cada uma no seu planeta de forma limitada. O primeiro era habitado por um rei, que sentava-se, vestido de púrpura e arminho, num trono muito simples, embora majestoso. Rei: Ah! Eis um súdito! P P (perguntando a si mesmo): Como pode ele reconhecer-me, se jamais me viu? N: Ele não sabia que, para os reis, o mundo é muito mais simples. Todos os homens são súditos. Rei (orgulhoso): Aproxima-te, para que eu te veja melhor. N: O principezinho olhou em volta para achar onde sentar-se, mas o planeta estava todo ocupado pelo magnífico manto de arminho. Ficou, então, de pé. Mas, como estava cansado, bocejou. Rei: É contra a etiqueta bocejar na frente do rei. Eu o proíbo. P P: Não posso evitar. Fiz uma longa viagem e não dormi ainda... Rei: Então, eu te ordeno que bocejes. Há anos que não vejo ninguém bocejar! Os bocejos são uma raridade para mim. Vamos, boceja! É uma ordem! P P: Isso me intimida... assim eu não consigo... Rei (gaguejando envergonhado): Hum! Hum! Então... então eu te ordeno ora bocejares e ora... N: O rei fazia questão que sua autoridade fosse respeitada. Não tolerava desobediência. Era um monarca absoluto. Mas, como era muito bom, dava ordens razoáveis. Rei: Se eu ordenasse, que um general se transformasse numa gaivota, e o general não me obedecesse, a culpa não seria do general, seria minha. P P (timidamente): Posso sentar-me? Rei: Eu te ordeno que te sentes. N: Mas o principezinho estava espantado. O planeta era minúsculo. Sobre quem reinava o rei? 19 P P: Majestade... eu vos peço perdão por ousar interrogar-vos... Rei: Eu te ordeno que me interrogues. P P: Majestade... sobre quem reinais? Rei: Sobre tudo. P P: Sobre tudo? N: O rei, com um gesto simples, indicou seu planeta, os outros planetas, e também as estrelas. P: Sobre tudo isso? Rei: Sobre tudo isso. P P: E as estrelas vos obedecem? Rei: Sem dúvida. Obedecem prontamente. Eu não tolero indisciplina! N: Tanto poder maravilhou o pequeno príncipe. Se ele fosse detentor desse poder, teria podido assistir não a quarenta e quatro, mas a setenta e dois, ou mesmo a cem, ou mesmo a duzentos pores-do-sol no mesmo dia, sem precisar nem mesmo afastar a cadeira! E, como se sentisse um pouco triste ao pensar no seu pequeno planeta abandonado, ousou solicitar ao rei uma graça: P P: Eu desejava ver um pôr-do- sol... Fazei-me esse favor. Ordenai ao sol que se ponha... Rei: Se eu ordenasse a meu general voar de uma flor a outra como borboleta, ou escrever uma tragédia, ou transformar-se numa gaivota, e o general não executasse a ordem recebida, quem, ele ou eu, estaria errado? P P: Vós. Rei: Exato. É preciso exigir de cada um o que cada um pode dar. A autoridade se baseia na razão. Se ordenares a teu povo que ele se lance ao mar, todos se rebelarão. Eu tenho o direito de exigir obediência porque minhas ordens são razoáveis. P P: E meu pôr-do-sol? Rei: Teu pôr-do-sol, tu o terás. Eu exigirei. Mas esperarei, na minha sabedoria de governante, que as condições sejam favoráveis. P P: Quando serão? Rei: Hum-hum. Será por volta de... por volta de sete e quarenta, esta noite! E tu verás como sou bem obedecido. 20 N: O principezinho bocejou. E sentia falta do seu pôr do sol. E, também, já estava começando a se aborrecer! P P: Não tenho mais nada que fazer aqui. Vou prosseguir minha viagem. Rei: Não partas, não partas; eu te faço ministro! P P: Ministro de quê? Rei: Da... da justiça. P P: Mas não há ninguém para julgar! Rei: Nunca se sabe... Ainda não vi todo o meu reino. Estou muito velho, não tenho espaço para uma carruagem, e andar cansa-me muito. P P: Oh! Mas eu já vi! Não consigo ver ninguém... Rei: Tu julgarás a ti mesmo. É o mais difícil. É bem mais difícil julgar a si mesmo que julgar os outros. Se consegues fazer um bom julgamento de ti, és um verdadeiro sábio. P P: Mas eu posso julgar-me a mim próprio em qualquer lugar. Não preciso, para isso, ficar morando aqui. Rei: Ah! Eu tenho quase certeza de que há um velho rato no meu planeta. Eu o escuto à noite. Tu poderás julgar esse rato. Tu o condenarás à morte de vez em quando. Assim, a vida dele dependerá da tua justiça. Mas tu o perdoarás sempre, para poupá-lo. Pois só temos um. P P: Eu... eu não gosto de condenar à morte, e acho que vou mesmo embora. Rei: Não! N: Mas o principezinho, tendo terminado os preparativos, não quis afligir o velho monarca. P P: Se Vossa Majestade deseja ser prontamente obedecido, poderá dar-me uma ordem razoável. Poderia ordenar-me, por exemplo, que partisse em menos de um minuto. Parece-me que as condições são favoráveis... N: Como o rei não dissesse nada, o principezinho hesitou um pouco, depois suspirou e partiu. Rei (gritando): Eu te faço meu embaixador. P P (para si mesmo): As pessoas grandes são muito esquisitas. 21 Capítulo XI N: O segundo planeta visitado pelo principezinho era habitado por um vaidoso que, mal o avistara, exclamou: Vaidoso: Ah! Ah! Um admirador vem visitar-me! N: Para os vaidosos, os outros homens sempre são seus admiradores. Para eles, lidar com a crítica é muito difícil. P P: Bom dia. Tu tens um chapéu engraçado. Vaidoso: É para agradecer. Para agradecer Infelizmente, não passa ninguém por aqui. quando me aclamam. P P: Ah, é? Vaidoso: Bate tuas mãos uma na outra... N: O principezinho bateu as mãos uma na outra. O vaidoso agradeceu modestamente, erguendo o chapéu. P P (para si próprio): Ah, isso é mais divertido que a visita ao rei. N: E recomeçou a bater as mãos uma na outra. O vaidoso tornou a agradecer, tirando o chapéu. P P (cansado): E para o chapéu cair, que é preciso fazer? N: Mas o vaidoso não ouviu. Os vaidosos só ouvem os elogios. Vaidoso: Não é verdade que tu me admiras muito? P P: Que quer dizer “admirar”? Vaidoso: “Admirar” significa reconhecer que eu sou o homem mais belo, mais bem-vestido, mais rico e o mais inteligente de todo o planeta. P P: Mas só tu moras no teu planeta! Vaidoso: Dá-me esse prazer. Admira-me assim mesmo! P P (dando de ombros): Eu te admiro. Mas de que te serve isso? N: E o pequeno príncipe foi-se embora. P P (consigo mesmo): As pessoas grandes são de fato muito estranhas. 22 Capítulo XII N: A terceira visita foi muito curta, mas deixou o principezinho mergulhado numa profunda tristeza. Neste planeta, conheceu um bêbado que estava silenciosamente acomodado diante de inúmeras garrafas vazias e diversas garrafas cheias. P P: Que fazes aí? Bêbado: Eu bebo. P P: Por que é que bebes? Bêbado: Para esquecer. P P (sentindo pena): Esquecer o quê? Bêbado (baixando a cabeça): Esquecer que eu tenho vergonha. P P: Vergonha de quê? Bêbado: Vergonha de beber! N: Aquele homem estava preso em um círculo vicioso do qual não conseguia se livrar. E o principezinho foi-se embora, perplexo, dizendo para si mesmo: P P: As pessoas grandes são decididamente estranhas, muito estranhas. 23 Capítulo XIII N: O quarto planeta visitado foi o do empresário. Estava tão ocupado que sequer levantou a cabeça à chegada do príncipe. P P: Bom dia. O seu cigarro está apagado. Empresário: Três e dois são cinco. Cinco e sete, doze. Doze e três, quinze. Bom dia. Quinze e sete, vinte e dois. Vinte e dois e seis, vinte e oito. Não tenho tempo para acendê-lo de novo. Vinte e seis e cinco, trinta e um. Ufa! São quinhentos e um milhões, seiscentos e vinte e dois mil, setecentos e trinta e um. P P: Quinhentos milhões de quê? Empresário: Hem? Ainda estás aí? Quinhentos e um milhões de... eu não sei mais... Tenho tanto trabalho. Sou um sujeito sério, não me preocupo com futilidades! Dois e cinco, sete... P P: Quinhentos milhões de quê? Empresário (levantando a cabeça): Há cinqüenta e quatro anos habito este planeta, e só fui incomodado três vezes. A primeira vez foi há vinte e dois anos, por um besouro que veio não sei de onde. Fazia um barulho terrível, e cometi quatro erros na soma. A segunda foi há onze anos, quando tive uma crise de reumatismo. Por falta de exercício. Não tenho tempo para passear. Sou um sujeito sério. A terceira... é esta! Eu dizia, portanto, quinhentos e um milhões... P P: Milhões de quê? Empresário: Milhões dessas coisinhas que se vêem às vezes no céu. P P: Moscas? Empresário: Não, não. Essas coisinhas que brilham. P P: Vagalumes? Empresário: Também não. Essas coisinhas douradas que fazem sonhar os preguiçosos. Mas eu sou uma pessoa séria! Não tenho tempo para divagações. P P: Ah! Estrelas? Empresário: Isso mesmo. Estrelas. P P: E que fazes com quinhentos milhões de estrelas? Empresário: Quinhentos e um milhões, seiscentas e vinte e duas mil, setecentas e trinta e uma. Eu sou um sujeito sério. Gosto de exatidão. 24 P P: E que fazes com essas estrelas? Empresário: O que faço delas? P P: Sim. Empresário: Nada. Eu as possuo. P P: Tu possuis as estrelas? Empresário: Sim. P P: Mas eu já vi um rei que... Empresário: Os reis não possuem. Eles "reinam" sobre. É muito diferente. P P: E de que te serves possuir as estrelas? Empresário: Serve-me para ser rico. P P: E de que te serves ser rico? Empresário: Para comprar outras estrelas, se alguém achar. P P (para si mesmo): Esse aí, raciocina um pouco como o bêbado. Como pode a gente possuir as estrelas? Empresário (exaltado): De quem são elas? P P: Eu não sei. De ninguém. Empresário: Logo, são minhas, porque pensei primeiro. P P: Basta isso? Empresário: Sem dúvida. Quando achas um diamante que não é de ninguém, ele é teu. Quando achas uma ilha que não é de ninguém, ela é tua. Quando tens uma idéia antes dos outros, tu a registras: ela é tua. Portanto, eu possuo as estrelas, pois ninguém antes de mim teve a idéia de as possuir. P P: Isso é verdade. E que fazes tu com elas? Empresário: Eu as administro. Eu as conto e reconto. É complicado. Mas eu sou um homem sério! P P: Eu, se possuo um lenço de seda, posso colocá-lo em volta do pescoço e levá-lo comigo. Se possuo uma flor, posso colhê-la e levá-la comigo. Mas tu não podes levar as estrelas. Empresário: Não. Mas posso colocá-las no banco. P P: Que quer dizer isso? 25 Empresário: Isso quer dizer que eu escrevo num pedaço de papel o número de estrelas que possuo. Depois tranco o papel numa gaveta. P P: Só isso? Empresário: Isso basta... P P (para si mesmo): É divertido. É bastante poético. Mas sem muita utilidade. N: O principezinho tinha, sobre as coisas sérias, idéias muito diferentes do que pensavam as pessoas grandes. O empresário levava o seu trabalho muito a sério, porém, apesar de possuir as estrelas, não as sabia admirar. P P: Eu possuo uma flor que rego todos os dias. Possuo três vulcões que revolvo toda semana, porque revolvo também o que está extinto. A gente nunca sabe! É útil para os meus vulcões, é útil para a minha flor que eu os possua. Mas tu não és útil às estrelas... N: O empresário abriu a boca, mas não encontrou nenhuma resposta, e o principezinho se foi... P P (para si mesmo): As pessoas grandes são mesmo extraordinárias. 26 Capítulo XIV N: O quinto planeta era muito curioso. Era o menor de todos. Tinha espaço suficiente para um lampião e para o acendedor de lampiões... O principezinho não conseguia entender para que serviriam, no céu, num planeta sem casa e sem gente, um lampião e um acendedor de lampiões. P P (para si mesmo): Talvez esse homem seja mesmo um tolo. No entanto, é menos tolo que o rei, que o vaidoso, que o empresário, que o beberrão. Seu trabalho ao menos tem um sentido. Quando acende o lampião, é como se fizesse nascer mais uma estrela, ou uma flor. Quando o apaga, porém, faz adormecer a estrela ou a flor. É uma belo trabalho. E, sendo belo, tem sua utilidade. N: Quando alcançou o planeta, saudou educadamente o acendedor: P P: Bom dia. Por que acabas de apagar teu lampião? Acendedor: É o regulamento. Bom dia. P P: Qual é o regulamento? (Apagando o lampião) Acendedor: É apagar meu lampião. Boa noite. (Acendendo o lampião) P P: Mas por que acabas de acendê-lo de novo? Acendedor: É o regulamento. P P: Eu não compreendo. Acendedor: Não é para compreender. Regulamento é regulamento. Bom dia. Eu executo uma tarefa terrível. No passado, era mais sensato. Apagava de manhã e acendia à noite. Tinha o resto do dia para descansar e a noite toda para dormir... (Apagando o lampião) P P: E depois disso, mudou o regulamento? Acendedor: O regulamento não mudou. Aí é que está o problema! O planeta a cada ano gira mais depressa e o regulamento não muda! N: Mesmo com a mudança da realidade, o acendedor continua fazendo a mesma coisa e não pensa na possibilidade de mudar o regulamento. Assim como ele, existem pessoas que não conseguem criar novas regras quando necessário. 27 P P: E então? Acendedor: Agora, que ele dá uma volta por minuto, não tenho mais um segundo de repouso. Acendo e apago uma vez por minuto! P P: Ah! Que engraçado! Os dias aqui duram um minuto! Acendedor: Não é nada engraçado. Já faz um mês que estamos conversando. P P: Um mês? Acendedor: Sim. Trinta minutos. Trinta dias. Boa noite. (Acendendo o lampião) N: O principezinho respeitou-o, e gostou daquele acendedor tão fiel ao regulamento. Lembrou-se das vezes que em ele mesmo provocara o pôr-dosol, apenas recuando sua cadeira. Quis ajudar seu amigo. P P: Sabes? Conheço uma maneira de descansar quando quiseres... Acendedor: Eu sempre quero descansar. Pois a gente pode ser, ao mesmo tempo, fiel e preguiçoso. P P: Teu planeta é tão pequeno, que podes, com três passos, contorná-lo. Basta andares bem lentamente, de modo a ficares sempre ao sol. Quando desejares descansar, tu caminharás... e o dia durará o tempo que quiseres. Acendedor: Isso não adianta muito. O que eu gosto mais na vida é dormir. P P: Então não há solução. Acendedor: Não há solução. Bom dia. (E apagou o lampião) P P (para si mesmo): Esse aí seria desprezado por todos os outros, o rei, o vaidoso, o beberrão, o empresário. No entanto, é o único que não me parece ridículo. Talvez por ser o único que se ocupa de outra coisa que não seja ele próprio. Era o único com quem eu poderia ter feito amizade. Mas seu planeta é mesmo pequeno demais. Não há lugar para dois... N: O que o principezinho não ousava admitir é que lamentava partir daquele planeta abençoado com mil quatrocentos e quarenta pores-do-sol a cada vinte e quatro horas! 28 Capítulo XV N: O sexto planeta era dez vezes maior e era habitado por um velho que escrevia em livros enormes. Geógrafo: Ora vejam! Eis um explorador! N: O principezinho sentou-se à mesa, meio ofegante. Já viajara tanto! Geógrafo: De onde vens? P P: Que livro é esse? Que faz o senhor aqui? Geógrafo: Sou geógrafo. P P: Que é um geógrafo? Geógrafo: É um especialista que sabe onde se encontram os mares, os rios, as cidades, as montanhas, os desertos. P P: Isso é bem interessante. Eis, afinal, uma verdadeira profissão! N: E lançou um olhar, ao seu redor, no planeta do geógrafo. Nunca havia visto planeta tão grandioso. P P: O seu planeta é muito bonito. Há oceanos nele? Geógrafo: Não sei te dizer. P P (decepcionado): E montanhas? Geógrafo: Não sei te dizer. P P: E cidades, e rios, e desertos? Geógrafo: Também não sei te dizer. P P: Mas o senhor é geógrafo! Geógrafo: É verdade, mas não sou explorador. Falta-me exploradores! Não é o geógrafo quem vai contar as cidades, os rios, as montanhas, os mares, os oceanos, os desertos. O geógrafo é muito importante para estar passeando. Nunca abandona sua escrivaninha. Mas recebe os exploradores, interroga-os e anota os seus relatos de viagem. E quando algum lhe parece mais interessante, o geógrafo faz um inquérito sobre a moral do explorador. P P: Por quê? Geógrafo: Porque um explorador que mentisse produziria catástrofes nos livros de geografia. Assim como o explorador que bebesse demais. P P: Por quê? 29 Geógrafo: Porque os bêbados vêem em dobro. Então o geógrafo anotaria duas montanhas onde, na verdade, só há uma. P P: Conheço alguém que seria um mau explorador. Geógrafo: É possível. Pois bem, quando a moral do explorador parece boa, faz-se uma investigação sobre a sua descoberta. P P: Vai-se vê-la? Geógrafo: Não. Seria muito complicado. Mas exige-se do explorador que ele forneça provas. Tratando-se, por exemplo, da descoberta de uma grande montanha, é essencial que ele traga grandes pedras. (entusiasmado-se) Mas tu vens de longe. Certamente és explorador! Portanto, vais descrever-me o teu planeta! N: E o geógrafo, tendo aberto o seu caderno, apontou o lápis. Anotam-se primeiro à lápis as narrações dos exploradores. Espera-se, para anotar à caneta, que o explorador tenha trazido as provas. Geógrafo: Então? P P: Oh! Onde eu moro não é interessante: é muito pequeno. Eu tenho três vulcões. Dois em atividade e um vulcão extinto. Mas a gente nunca sabe... Geógrafo: A gente nunca sabe. P P: Tenho também uma flor. Geógrafo: Nós não anotamos as flores. P P: Por que não? É o mais bonito! Geógrafo: Porque as flores são efêmeras. P P: Que quer dizer "efêmera"? Geógrafo: Os livros de geografia são os mais exatos. Nunca ficam ultrapassados. É muito raro que uma montanha mude de lugar. É muito raro um oceano secar. Nós escrevemos coisas eternas. P P: Mas os vulcões extintos podem voltar à atividade. Que quer dizer "efêmera"? Geógrafo: Que os vulcões estejam extintos ou não, isso dá no mesmo para nós. O que nos interessa é a montanha. Ela não muda. P P: Mas que quer dizer "efêmera"? Geógrafo: Quer dizer "ameaçada de desaparecer brevemente". 30 P P: Minha flor está ameaçada de desaparecer em breve? Geógrafo: Sem dúvida. P P (com remorso): Minha flor é efêmera, e não tem mais que quatro espinhos para defender-se do mundo! E eu a deixei sozinha! N: A conversa com o geógrafo assustou o principezinho e o fez refletir sobre o significado do eterno. O geógrafo não percebe que uma flor, em si, é efêmera, mas que pode se eternizar na memória de quem a cativou. P P: Qual planeta me aconselha visitar? Geógrafo: A Terra. Goza de boa reputação... N: E o principezinho partiu, pensando em sua flor. A visita aos seis planetas o fez refletir sobre diferentes assuntos, como poder, admiração, esquecimento, ambição, submissão e efemeridade. Mas será no sétimo planeta que descobrirá o verdadeiro significado de cativar. 31 Capítulo XVII N: O sétimo planeta foi, portanto, a Terra. Esperava encontrar um planeta povoado, e surpreendeu-se ao não ver ninguém. Já receava ter se enganado de planeta, quando um anel cor de lua se remexeu na areia. P P: Boa noite. Serpente: Boa noite. P P: Em que planeta me encontro? Serpente: Na Terra, na África. P P: Ah!... E não há ninguém na Terra? Serpente: Aqui é o deserto. Não há ninguém nos desertos. A Terra é grande. P P (erguendo os olhos para o céu): As estrelas são todas iluminadas... Será que elas brilham para que cada um possa um dia encontrar a sua? Olha o meu planeta. Está bem em cima de nós... Mas como ele está longe! Serpente: Teu planeta é belo. Que vens fazer aqui? P P: Tenho problemas com uma flor. Serpente: Ah! (silêncio) P P: Onde estão os homens? A gente se sente um pouco sozinho no deserto. Serpente: Entre os homens a gente também se sente só. P P: Tu és um bichinho engraçado. Fino como um dedo... Serpente: Mas sou mais poderosa do que o dedo de um rei. P P (sorrindo): Tu não és tão poderosa assim... não tens nem patas... não podes sequer viajar... Serpente: Eu posso levar-te mais longe que um navio. N: Ela enrolou-se no tornozelo do pequeno príncipe, como se fosse um bracelete de ouro. Serpente: Aquele que eu toco devolvo à terra de onde veio. Mas tu és puro e vens de uma estrela... (silêncio) 32 Serpente: Tenho pena de ti, tão fraco, nesta terra de granito. Posso ajudar-te um dia, se tiveres muita saudade do teu planeta. Posso... P P: Oh! Eu te compreendo muito bem. Mas por que falas sempre por enigmas? Serpente: Eu os resolvo todos. N: E calaram-se os dois. Após despedir-se da serpente, o pequeno príncipe continuou sua caminhada. Viu uma florzinha insignificante, escalou uma grande montanha e, após muito caminhar, levou um grande susto... 33 Capítulo XX N: Mas aconteceu que o pequeno príncipe, tendo andado muito pelas areias, pelas rochas e pela neve, descobriu, enfim, uma estrada. E as estradas vão todas em direção aos homens. P P: Bom dia! N: Era um jardim cheio de rosas. Rosas: Bom dia. N: Ele as contemplou. Eram todas iguais à sua flor. P P (espantado): Quem sois? Rosas: Somos as rosas. P P: Ah! N: E ele se sentiu profundamente infeliz. Sua flor lhe havia dito que ela era a única de sua espécie em todo o universo. E eis que havia cinco mil, iguaizinhas, num só jardim! P P (pensativo): Ela teria se envergonhado se tivesse visto... Começaria a tossir, simularia morrer para escapar ao ridículo. E eu seria obrigado a fingir que cuidava dela; porque senão, só para me humilhar, ela seria bem capaz de morrer de verdade... Eu me julgava rico por ter uma flor única, e possuo apenas uma rosa comum. Uma rosa e três vulcões que não passam do meu joelho, estando um, talvez, extinto para sempre. Isso não faz de mim um príncipe muito poderoso... N: E, deitado na relva, ele chorou. 34 Capítulo XXI N: Depois de sua jornada por diversos planetas, sem ter encontrado nada que lhe fizesse sentido e percebendo que talvez não fosse tão importante quanto se julgava, o pequeno príncipe se sente vazio e triste ao ver que sua rosa não era a única no mundo e é nesse momento que está pronto para ouvir a raposa. Foi então que ela apareceu. Raposa: Bom dia. P P: Bom dia. Raposa: Eu estou aqui. P P: Quem és tu? Tu és bem bonita... Raposa: Sou uma raposa. P P: Vem brincar comigo. Estou tão triste... Raposa: Eu não posso brincar contigo. Não me cativaram ainda. P P: Ah! Desculpe... Que quer dizer "cativar"? Raposa: Tu não és daqui. Que procuras? P P: Procuro os homens. Que quer dizer "cativar"? Raposa Os homens têm fuzis e caçam. É bem assustador! Criam galinhas também. É a única coisa que fazem de interessante.Tu procuras galinhas? P P: Não. Eu procuro amigos. Que quer dizer "cativar"? Raposa: É algo quase sempre esquecido. Significa "criar laços”... P P: Criar laços? Raposa: Exatamente. Tu não és ainda para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos. E eu não tenho necessidade de ti. E tu também não tens necessidade de mim. Não passo a teus olhos de uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo. E eu serei para ti única no mundo... P P: Começo a compreender. Existe uma flor... eu creio que ela me cativou... Raposa: É possível. Vê-se tanta coisa na Terra... P P: Oh! Não foi na Terra. Raposa (intrigada): Num outro planeta? P P: Sim. 35 Raposa: Há caçadores nesse planeta? P P: Não. Raposa: Que bom! E galinhas? P P: Também não. N: A raposa ensina ao principezinho a arte de cativar. Explica que quando cativamos e somos cativados, a vida deixa de ser monótona e se torna maravilhosa. Quando confiamos, perdemos o medo e saímos de nosso esconderijo. Raposa (suspirando): Nada é perfeito... Minha vida é monótona. Eu caço as galinhas e os homens me caçam. Todas as galinhas se parecem e todos os homens se parecem também. E isso me incomoda um pouco. Mas, se tu me cativas, minha vida será como que cheia de sol. Conhecerei um barulho de passos que será diferente dos outros. Os outros passos me fazem entrar debaixo da terra. Os teus me chamarão para fora da toca, como se fossem música. E depois, olha! Vês, lá longe, os campos de trigo? Eu não como pão. O trigo para mim não vale nada. Os campos de trigo não me lembram coisa alguma. E isso é triste! Mas tu tens cabelos dourados. Então será maravilhoso quando me tiveres cativado. O trigo, que é dourado, fará com que eu me lembre de ti. E eu amarei o barulho do vento no trigo... (silêncio) Raposa: Por favor... cativa-me. P P: Eu até gostaria, mas eu não tenho muito tempo. Tenho amigos a descobrir e muitas coisas a conhecer. Raposa: A gente só conhece bem as coisas que cativou. Os homens não têm mais tempo de conhecer coisa alguma. Compram tudo já pronto nas lojas. Mas como não existem lojas de amigos, os homens não têm mais amigos, Se tu queres um amigo, cativa-me! P P: Que é preciso fazer? Raposa: É preciso ser paciente. Tu te sentarás primeiro um pouco longe de mim, assim, na relva. Eu te olharei com o canto do olho e tu não dirás nada. A linguagem é uma fonte de mal-entendidos. Mas, cada dia, te sentarás um pouco mais perto... N: No dia seguinte o principezinho voltou. Raposa: Teria sido melhor se voltasses à mesma hora. Se tu vens, por exemplo, às quatro da tarde, desde as três eu começarei a ser feliz. Quanto mais a hora for chegando, mais eu me sentirei feliz. Às quatro horas, então, 36 estarei inquieta e agitada: descobrirei o preço da felicidade! Mas se tu vens a qualquer momento, nunca saberei a hora de preparar meu coração... É preciso ter ritos. N: A Raposa fala sobre a importância da espera alegre e confiante que nos prepara para a intensidade do encontro. Para criar vínculos, é preciso tempo, pois é o tempo que dedicamos às coisas que as tornam especiais para nós. P P: Que é um ritual? Raposa: É uma coisa muito esquecida também. É o que faz com que um dia seja diferente dos outros dias; uma hora, das outras horas. Os meus caçadores, por exemplo, adotam um ritual. Dançam na quinta-feira com as moças da aldeia. A quinta-feira é, então, um dia maravilhoso! Vou passear até a vinha. Se os caçadores dançassem em qualquer dia, os dias seriam todos iguais e eu nunca teria férias! N: Compreendendo o significado do “cativar” e a importância do ritual, o principezinho pôde cativar a raposa. Mas, passado algum tempo, chegou o momento da separação... Raposa: Ah! Eu vou chorar. P P: A culpa é tua, eu não queria te fazer mal; mas tu quiseste que eu te cativasse... Raposa: Quis. P P: Mas tu vais chorar! Raposa: Vou. P P: Então, não terás ganhado nada! Raposa: Terei, sim, por causa da cor do trigo. N: A raposa ensina ao príncipe e o prepara tanto para o encontro, como para a despedida. Demonstra que, na separação, há um um lucro, pois o que foi vivido ganha mais intensidade ao se tornar lembrança. Raposa: Vais rever as rosas. Assim compreenderás que a tua é a única no mundo. Tu voltarás para me dizer adeus, e eu te presentearei com um segredo. N: Então o principezinho foi rever as rosas. P P: Vós não sois absolutamente iguais à minha rosa, vós não sois nada ainda. Ninguém ainda vos cativou, nem cativastes a ninguém. Sois como era a minha raposa. Era uma raposa igual a cem mil outras. Mas eu a tornei minha amiga. Agora ela é única no mundo. Sois belas, mas vazias. Não se pode morrer por 37 vós. Um passante qualquer sem dúvida pensaria que a minha rosa se parece convosco. Ela sozinha é, porém, mais importante que todas vós, pois foi ela que eu reguei. Foi ela que pus sob a redoma. Foi ela que abriguei com o paravento. Foi por ela que eu matei as larvas (exceto duas ou três, por causa das borboletas). Foi ela que eu escutei se queixar ou se gabar, ou mesmo calar-se algumas vezes, já que ela é a minha rosa. N: As rosas ficaram desapontadas e o principezinho voltou para se despedir da raposa. P P: Adeus... Raposa: Adeus. Eis o meu segredo. É muito simples: só se vê bem com o coração. O essencial é invisível aos olhos. P P: O essencial é invisível aos olhos... Raposa: Foi o tempo que perdeste com tua rosa que a fez tão importante. P P: Foi o tempo que eu perdi com a minha rosa... Raposa: Os homens esqueceram essa verdade. Mas tu não a deves esquecer. Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas. Tu és responsável pela tua rosa... P P: Eu sou responsável pela minha rosa... N: O principezinho repete os ensinamentos da raposa para não se esquecer, mas este ensinamento será internalizado mais adiante, quando compreender verdadeiramente o significado da separação e a importância da limbrança, que permanece como o essencial que é invisível aos olhos, mas intenso na memória. A eterna responsabilidade está em manter vivo o aprendizado que se deu no encontro. O que se ganha é esse aprendizado de que fala a raposa, é o que precisa ficar preservado para sempre na nossa lembrança. 38 Capítulo XXII P P: Bom dia. Manobreiro: Bom dia. P P: Que fazes aqui? Manobreiro: Eu separo os passageiros em blocos de mil. Despacho os trens que os carregam, ora para a direita, ora para a esquerda. N: E um trem iluminado, roncando como um trovão, fez tremer a cabine do manobreiro. P P: Eles estão com muita pressa. O que estão procurando? Manobreiro: Nem o homem da locomotiva sabe. N: E apitou, vindo em sentido inverso, um outro trem iluminado. P P: Já estão de volta? Manobreiro: Não são os mesmos. É uma troca. P Príncipe: Não estavam contentes onde estavam? Manobreiro: Nunca estamos contentes onde estamos. (E o apito de um terceiro trem soou) N: O descontentamento não decorre necessariamente do lugar, mas do fato de que as pessoas nao estão verdadeiramente presentes ali. Quando alguém está com muita pressa, não dá tempo à coisas e não consegue valorizar o momento presente, tornando-se insatisfeito e triste. P P: Estão correndo atrás dos primeiros viajantes? Manobreiro: Não correm atrás de nada. Estão dormindo lá dentro, ou bocejando. Apenas as crianças apertam seus narizes contra as vidraças. P P: Só as crianças sabem o que procuram. Perdem tempo com uma boneca de pano, e a boneca se torna muito importante, e choram quando ela lhes é tomada... Manobreiro: Elas são felizes... 39 Capítulo XXIII P P: Bom dia. Vendedor: Bom dia. N: Era um vendedor de pílulas especiais que saciavam a sede. Toma-se uma por semana e não é mais preciso beber. P P: Por que vendes isso? Vendedor: É uma grande economia de tempo. Os peritos calcularam. A gente ganha cinquenta e três minutos por semana. P P: E o que se faz com esses cinquenta e três minutos? Vendedor: O que a gente quiser... Pequeno Príncipe (pensando): Eu, se tivesse cinquenta e três minutos para gastar, iria caminhando calmamente em direção a uma fonte... 40 Capítulo XXIV N: Estavam no oitavo dia da pane do avião no deserto. Justamente quando bebia a última gota de sua reserva d´água, o aviador escutou essa história do vendedor das pílulas especiais. Aviador: Ah! São bem bonitas as tuas lembranças, mas eu não consertei ainda meu avião, não tenho mais nada para beber, e eu também seria feliz se pudesse ir caminhando calmamente em direção a uma fonte! P P: Minha amiga raposa me disse... Aviador: Meu caro, não se trata mais da raposa! . P P: Por quê? Aviador: Porque vamos morrer de sede... P P: É bom ter tido um amigo, mesmo que a gente vá morrer. Eu estou muito contente de ter tido a raposa como amiga... Aviador (pensando): Ele não pode avaliar o perigo. Não tem nunca fome ou sede. Um raio de sol lhe basta. N: Mas o principezinho olhou para o aviador como que respondendo ao seu pensamento: P P: Tenho sede também... procuremos um poço... N: O aviador, fazendo um gesto de desânimo, pensou que era absurdo procurar um poço ao acaso, na imensidão do deserto. No entanto, puseram-se a caminho. Já tinham andado horas em silêncio quando a noite caiu e as estrelas começaram a brilhar. O aviador as apreciava como num sonho, porque a sede o tornara febril. As palavras do pequeno príncipe ressoavam em sua memória. Aviador: Tu tens sede também? P P: A água pode também ser boa para o coração... N: Embora não tivesse entendido sua resposta, o aviador se calou. Sabia que não adiantava interrogá-lo. P P: As estrelas são belas por causa de uma flor que não se pode ver... Aviador: É verdade. N: Respondeu mantendo-se em silêncio e fixando os olhos nas ondulações da areia iluminada pela Lua. 41 P P: O deserto é belo... N: E era verdade. O aviador sempre havia amado o deserto onde era possível se sentar numa duna de areia, onde não se via nada, não se escutava nada. De repente, alguma coisa irradia no silêncio... P P: O que torna belo o deserto é que ele esconde um poço em algum lugar. Aviador: Quer seja a casa, as estrelas ou o deserto, o que os torna belo é invisível! P P: Estou contente que estejas de acordo com a minha raposa. N: O aviador ficou surpreso por compreender de repente essa misteriosa irradiação da areia. Quando era pequeno, morava numa casa antiga e, diziam as lendas, que ali fora enterrado um tesouro. Ninguém jamais conseguiu descobri-lo, nem talvez o tenha procurado. Mas isto encantava a todos. Pouco a pouco, as lembranças emergiam em sua memória e o faziam compreender o verdadeiro significado do segredo que lhe havia revelado a raposa. Aviador (pensando): Minha casa escondia um tesouro no fundo do seu coração... N: Como o principezinho adormecesse, o aviador tomou-o nos braços e prosseguiu a caminhada. Estava emocionado e tinha a impressão de carregar um frágil tesouro. Parecia-lhe mesmo não haver na Terra nada mais frágil. Observava, à luz da Lua, aquele rosto pálido, seus olhos fechados, suas mechas de cabelo que se agitavam com o vento. Aviador (pensando): O que eu vejo não passa de uma casca. O mais importante é invisível... N: Percebendo um sorriso se esboçar nos lábios entreabertos do principezinho, o aviador pensou: Aviador: O que tanto me comove nesse príncipe adormecido é sua fidelidade a uma flor; é a imagem de uma rosa que brilha nele como a chama de uma lamparina, mesmo quando ele dorme... É preciso proteger a chama com cuidado: um simples sopro pode apagá-la! N: E, continuando a caminhada, ele descobriu o poço, ao raiar do dia. 42 Capítulo XXV P P: Os homens embarcam nos trens, mas já não sabem mais o que procuram. Então eles se agitam, sem saber para onde ir. E isso não leva a nada... N: O poço a que tinham chegado não se parecia de forma alguma com os poços do Saara. Os poços do Saara são simples buracos na areia. Aquele, parecia um poço de aldeia. Mas não havia ali aldeia alguma, e o aviador pensava estar sonhando. Aviador: É estranho. Tudo está preparado: a roldana, o balde e a corda. N: O principezinho riu, pegou a corda e fez girar a roldana. E a roldana gemeu como geme um velho cata-vento. P P: Tu escutas? Estamos acordando o poço, ele canta... Aviador: Deixa que eu puxo. É muito pesado para ti. N: Lentamente, o aviador içou o balde e, com cuidado, o colocou na borda do poço. O canto da roldana ainda permanecia nos seus ouvidos, e na água ainda trêmula ele podia ver o reflexo do sol. P P: Tenho sede dessa água. Dá-me de beber... N: E o aviador compreendeu o que o principezinho havia buscado! Levantou o balde até sua boca. Ele bebeu, de olhos fechados. Era doce como uma festa. Aquela água era muito mais que um alimento. Nascera da caminhada sob as estrelas, do canto da roldana, do esforço do seu braço. Era boa para o coração, como um presente. Quando o aviador era pequeno, as luzes da árvore de Natal, a música da missa da meia-noite e a doçura dos sorrisos se refletiam nos presentes que ganhava. P P: Os homens do teu planeta cultivam cinco mil rosas num mesmo jardim... e não encontram o que procuram... Aviador: É verdade... P P: E, no entanto, o que eles procuram poderia ser encontrado numa só rosa, ou num pouco de água... Aviador: É verdade. P P: Mas os olhos são cegos. É preciso ver com o coração... N: Eles se puseram a caminho sem saber exatamente para onde estavam indo, mas, no caminhar, encontraram o que buscavam: o poço que estava escondido nas profundezas de sua alma despertou da caminhada, desta jornada principezinho e aviador empreenderam juntos. O despertar da fonte recupera a 43 memória de um tempo anterior, de quando era criança, e a lembrança do Natal conecta o aviador à mais longínqua infância. Nesse reencontro entre a sensação presente e a sensação passada, ele desperta sua consciência para a vida verdadeira, enfim, descoberta e tornada clara. Essa vida está presente em todos os homens, mas só é desvendada através do esforço. Aviador (pensando): Eu tinha bebido daquela água. Respirava normalmente. Ao amanhecer a areia é cor de mel. E a cor de mel também me fazia feliz. Por que, então, eu estava triste? P P: É preciso que cumpras a tua promessa. Aviador: Que promessa? P P: Tu sabes... a focinheira do meu carneiro... eu sou responsável por aquela flor! N: O aviador tirou do bolso seus esboços de desenho. P P (rindo): Teus baobás mais parecem repolhos... Aviador (pensando): Oh! E eu caprichara tanto nos meus baobás! P P (rindo): Tua raposa... as orelhas dela... parecem chifres... e são compridas demais! Aviador: Tu és injusto, meu caro, eu só sabia desenhar jibóias abertas e fechadas... P P: Não faz mal, as crianças entendem. N: O aviador então rabiscou uma pequena focinheira. Mas, ao entregá-la ao principezinho, sentiu um aperto no coração. Aviador: Tu tens planos que eu desconheço... P P: Lembras-te da minha chegada à Terra? Será amanhã o aniversário... Caí pertinho daqui... N: Sem compreender por que, o aviador sentiu uma estranha tristeza. Aviador: Então não foi por acaso que vagavas sozinho quando te encontrei, há oito dias, a quilômetros e quilômetros de qualquer região habitada! Estavas retornando ao local aonde chegaste? Talvez por causa do aniversário?... N: O principezinho ficou vermelho. Não respondia nunca às perguntas. Mas, pensou o aviador, quando a gente fica vermelho, é o mesmo que dizer "sim". Aviador: Ah! Eu tenho medo... 44 P P: Tu deves agora trabalhar. Voltar para teu aparelho. Espero-te aqui. Volta amanhã de noite... Aviador (pensando): Mas eu não estava seguro. Lembrava-me da raposa. A gente corre o risco de chorar um pouco quando se deixou cativar... N: Depois de terem bebido da água da fonte, o aviador e o pequeno príncipe estão preparados para a separação. Mas, apesar de ter bebido da água da fonte e de ter contemplado a beleza do amanhecer no deserto, o aviador estava triste: chegara o momento em que o principezinho deveria voltar ao seu planeta. 45 Capítulo XXVI N: Havia, ao lado do poço, a ruína de um velho muro de pedra. Quando voltou do trabalho, no dia seguinte, o aviador viu, de longe, o seu pequeno príncipe sentado no alto com as pernas balançando. E ele o escutou dizer: P P: Tu não te lembras então? Não foi bem esse o lugar! N: Uma outra voz lhe respondeu, porque em seguida o principezinho replicou. P P: Não! Não estou enganado. O dia é este, mas não é este o lugar... N: O aviador prosseguiu em direção ao muro. Não enxergava nem ouvia ninguém a não ser o principezinho... no entanto, o principezinho replicou novamente. P P: ... Está bem. Tu verás na areia onde começam as marcas dos meus passos. Basta me esperar. Estarei lá esta noite. N: O aviador estava a vinte metros do muro e continuava a não ver nada. P P: O teu veneno é do bom? Estás certa de que não vou sofrer por muito tempo? N: O avidor parou com o coração apertado, ainda sem compreender nada. P P: Agora, vai-te embora... eu quero descer! N: O aviador, então, baixou os olhos para o pé do muro e deu um salto! Lá estava, erguida para o principezinho, uma dessas serpentes amarelas que nos liquidam em trinta segundos. Rapidamente procurou o revólver no bolso. Mas, percebendo o barulho, a serpente deslizou pela areia, como um esguicho de água que de repente seca, e, vagarosamente, se enfiou entre as pedras com um leve tinir metálico. Chegou ao muro a tempo de segurar nos braços o seu caro príncipe, pálido como a neve. Aviador: Que história é essa? Tu conversas agora com as serpentes? N: O aviador afrouxou o nó do lenço dourado que ele sempre usava no pescoço. Molhou sua testa. Deu-lhe de beber. Não ousava perguntar-lhe mais nada. O principezinho o olhou seriamente e abraçou o seu pescoço. Sentia-lhe o coração bater de encontro ao seu, como o de um pássaro morrendo, atingido por um tiro. P P: Estou contente de teres consertado o defeito de tua máquina. Vais poder voltar para casa... Aviador: Como soubeste? N: O aviador ia justamente avisar-lhe que, contra toda expectativa, havia 46 conseguido realizar o conserto! P P (triste): Eu também volto hoje para casa... é bem mais longe... bem mais difícil... N: O aviador percebia claramente que algo de extraordinário se passava. Apertava-o nos braços como se fosse uma criancinha, mas tinha a impressão de que ele ia deslizando num abismo, sem que nada pudesse fazer para detêlo... Seu olhar estava sério, vagando no além. P P (sorrindo com tristeza): Tenho o teu carneiro. E a caixa para o carneiro. E a focinheira... N: O aviador esperou muito tempo. Sentia que seu corpo, aos poucos, se reaquecia. Aviador: Meu caro, tu tiveste medo... P P: Terei mais medo ainda esta noite... N: O sentimento do irremediável fez o aviador gelar de novo. E ele compreendeu que não poderia suportar a ideia de nunca mais escutar aquele riso que era para ele como uma fonte no deserto. Aviador: Meu caro, eu quero ainda escutar o teu riso... P P: Faz já um ano esta noite. Minha estrela estará exatamente sobre o lugar aonde cheguei no ano passado... Aviador: Meu caro, essa história de serpente, de encontro marcado, de estrela, não passa de um pesadelo, não é mesmo? P P: O que é importante não se vê... Aviador: Sim, eu sei... P P: É como com a flor. Se tu amas uma flor que se acha numa estrela, é bom, de noite, olhar o céu. Todas as estrelas estarão floridas. Aviador: É verdade... P P: É como a água. Aquela que me deste para beber parecia música, por causa da roldana e da corda... Lembras como era boa? Aviador: Sim, lembro-me... P P: À noite, tu olharás as estrelas. Aquela onde moro é muito pequena para que eu possa te mostrar. É melhor assim. Minha estrela será para ti qualquer uma das estrelas. Assim, gostarás de olhar todas elas... Serão todas tuas amigas. E, também, eu lhe darei um presente... 47 N: Ele riu outra vez. Aviador: Ah! Meu caro, meu querido, como eu gosto de ouvir esse riso! P P: Pois é ele o meu presente... será como a água... Aviador: Que queres dizer? P P: As pessoas vêem estrelas de maneiras diferentes. Para aqueles que viajam, as estrelas são guias. Para outros, elas não passam de pequenas luzes. Para os sábios, elas são problemas. Para o empresário, eram ouro. Mas todas essas estrelas se calam. Tu, porém, terás estrelas como ninguém nunca as teve... Aviador: Que queres dizer? P P: Quando olhares o céu à noite, eu estarei habitando uma delas, e de lá estarei rindo; então será, para ti, como se todas as estrelas rissem! Desta forma, tu, e somente tu, terás estrelas que sabem rir! N: E ele riu mais uma vez. P P: E quando estiveres consolado (a gente sempre se consola), tu ficarás contente por teres me conhecido. Tu serás sempre meu amigo. Terás vontade de rir comigo. E às vezes abrirás tua janela apenas pelo simples prazer... E teus amigos ficarão espantados de ver-te rir olhando o céu. Tu explicarás então: "Sim, as estrelas, elas sempre me fazem rir!" E eles te julgarão louco. Será uma peça que te prego... N: E riu de novo. P P (rindo): Será como se eu te houvesse dado, em vez de estrelas, montes de pequenos guizos que sabem rir... N: Assim como a raposa, que se lembrará do principezinho ao ver os campos de trigo, o aviador poderá olhar para as estrelas e se lembrar do amigo. Ao olhar as estrelas, o aviador – e somente ele – ouvirá o riso do pequeno príncipe em todas elas. No poema “Ouvir estrelas”, Olavo Bilac também expressa essa idéia: Todos: "Ora (direis) ouvir estrelas! Certo Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto, Que, para ouvi-las muita vez desperto E abro as janelas, pálido de espanto... E conversamos toda noite, enquanto A Via Láctea, como um pálio aberto, 48 Cintila. E, ao vir o sol, saudoso e em pranto, Inda as procuro pelo céu deserto. Direis agora: "Tresloucado amigo! Que conversas com elas? Que sentido Tem o que dizes, quando não estão contigo?" E eu vos direi: "Amai para entendê-las! Pois só quem ama pode ter ouvido Capaz de ouvir e de entender estrelas." P P (sério): Esta noite... por favor... não venhas. Aviador: Eu não te deixarei. P P: Eu parecerei estar sofrendo... parecerei estar morrendo. É assim. Não venhas ver. Não vale a pena... Aviador: Eu não te abandonarei. P P (preocupado): Se eu te peço isto... é também por causa da serpente. As serpentes são más. Podem morder apenas por prazer... Aviador: Eu não te abandonarei. P P: É verdade que elas não têm veneno para uma segunda mordida... N: Naquela noite, o aviador não viu o príncipe partir. Saiu sem fazer barulho. Quando conseguiu alcançá-lo, ele caminhava decidido, num passo rápido. Disse-lhe apenas: P P: Ah! Aí estás... N: E, segurando o aviador pela mão, preocupou-se de novo. P P: Fizeste mal. Tu sofrerás. Eu parecerei morto, e isso não será verdade... Tu compreendes. É muito longe. Eu não posso carregar este corpo. É muito pesado. Mas será como uma velha concha abandonada. Não tem nada de triste numa velha concha... Será lindo, sabes? Eu também olharei as estrelas. Todas as estrelas serão como poços com uma roldana enferrujada. Todas as estrelas me darão de beber... N: O aviador se emudecia, mas o medo da separação é superado pela sabedoria de que o essencial é invisível aos olhos e de que, na ausência, nos fazemos presentes pela lembrança. P P: Será tão divertido! Tu terás quinhentos milhões de guizos, eu terei quinhentos milhões de fontes ... N: E o principezinho também se calou, porque estava chorando... 49 P P: É aqui. Deixa-me ficar só. N: E sentou-se, porque tinha medo. P P: Tu sabes... minha flor... eu sou responsável por ela! Ela é tão frágil! Tão ingênua! E tem apenas quatro pequenos espinhos para defender-se do mundo... N: O aviador sentou-se também, pois não podia mais ficar de pé. P P: Pronto... É isso... N: O principezinh ainda hesitou um pouco, mas depois se levantou. Deu um passo. O aviador não podia mover-se. Houve apenas um clarão amarelo perto da perna do príncipezinho. Permaneceu, por um instante, imóvel. Não gritou. Tombou devagarinho, como tomba uma árvore. Não fez sequer barulho, por causa da areia. 50 Capítulo XXVII Aviador: E agora já se passaram seis anos... jamais contara essa história. Os companheiros que me encontraram quando voltei ficaram contentes de me ver são e salvo. Eu estava triste, mas lhes dizia: “É o cansaço...” Agora já me conformei um pouco. Mas não completamente. Tenho certeza de que ele voltou ao seu planeta, pois, ao raiar do dia, não encontrei o seu corpo. Não era um corpo tão pesado assim... E gosto, à noite, de escutar as estrelas. É como ouvir quinhentos milhões de guizos... Mas eis que acontece uma coisa extraordinária. Na focinheira que desenhei para o pequeno príncipe, esqueci de juntar a correia de couro! Ele não poderá jamais prendê-la no carneiro. E então eu pergunto: "O que terá acontecido no seu planeta? Talvez o carneiro tenha comido a flor..." Às vezes penso: "Certamente que não! O principezinho guarda sua flor todas as noites na redoma de vidro e vigia atentamente seu carneiro..." Então, eu me sinto feliz. E todas as estrelas riem docemente. Ou penso: "Às vezes a gente se distrai e isso basta! Uma noite ele se esqueceu de colocar a redoma de vidro ou o carneiro saiu de mansinho, no meio da noite, sem que fosse notado...” E todos os guizos então se transformam em lágrimas. Eis aí um grande mistério. Para vocês, que também amam o pequeno príncipe, como para mim, todo o universo fica diferente se, em algum lugar que não sabemos onde, um carneiro que não conhecemos comeu ou não uma rosa... Olhem o céu. Perguntem a si mesmos: O carneiro terá ou não comido a flor? E verão como tudo fica diferente... E nenhuma pessoa grande jamais entenderá que isso tenha tanta importância! 51 52 53 54 Aviador: Esta é, para mim, a mais bela e a mais triste paisagem do mundo. É a mesma da página anterior. Mas desenhei-a de novo para mostrá-la bem. Foi aqui que o principezinho apareceu na Terra, e desapareceu depois. Olhem atentamente esta paisagem para que estejam certos de reconhecê-la, se viajarem um dia na África, através do deserto. E se passarem por ali, eu lhes peço que não tenham pressa e esperem um pouco bem debaixo da estrela ! Se de repente um menino vem ao encontro de vocês, se ele ri, se tem cabelos dourados, se não responde quando é perguntado, adivinharão quem ele é. Façam, então, um favor! Não me deixem tão triste: escrevam-me depressa dizendo que ele voltou... N: O aviador desenha duas vezes a paisagem do lugar em que o principezinho apareceu e desapareceu na Terra. No primeiro desenho, há uma estrela e o principezinho em uma duna de areia. O segundo desenho tem a mesma estrela e a duna, porém, o principezinho não está mais na paisagem, justamente porque não precisa estar representado, afinal, “o essencial é invisível aos olhos.” 55