Desde o Tratado de Vestfalia, no ano de , em que as relações

Propaganda
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA
Relações Internacionais
“A SOCIEDADE ANÁRQUICA”
Hedley Bull
“BRITISH INSTITUTIONALISTS, OR THE ENGLISH
SCHOOL, 20 YEARS”
Hidemi Suganami
Ana Júlia Papini
André Carvalho
Andrew Felipe Souza
Carolina Morales
Estefani Zani
Gabriele Higino
São Paulo
2011
Ana Júlia Papini
André Carvalho
Andrew Felipe Souza
Carolina Morales
Estefani Zani
Gabriele Higino
“A SOCIEDADE ANÁRQUICA”
Hedley Bull
“BRITISH INSTITUTIONALISTS, OR THE ENGLISH
SCHOOL, 20 YEARS”
Hidemi Suganami
Trabalho Acadêmico apresentado à disciplina
de Teoria das Relações Internacionais I, no
Centro de Ciências Sociais – Relações
Internacionais, da Pontifícia Universidade
Católica, como exigência de avaliação parcial.
Orientador: Prof ª Cláudia Marconi
São Paulo
2011
Desde o Tratado de Westfalia, no ano de 1648, em que as relações internacionais
tornaram-se mais evidentes, ou mais intensas, ou mais reais, muito discutiu-se acerca
delas mesmas e de suas complexidades - diversas são as opiniões e muitos são os
autores que as discutem.
A primeira parte do texto de Hidemi Suganami defende as Relações
Internacionais como uma área acadêmica de atuação específica, apartada da Política
Internacional, mas com base no reconhecimento do Sistema Internacional; faz o
delineamento de como surgiu a Corrente Inglesa e como ocorreu sua aceitação e
inserção na área de Relações Internacionais e cita estudiosos que, junto à Suganami,
contribuíram para seu desenvolvimento, como Manning, Wight, Bull, James, Vincent e
Watson. Suganami caracteriza a Corrente Inglesa como institucionalista, devido ao
marcante interesse de seu grupo de estudos de Relações Internacionais em identificar e
investigar o funcionamento das instituições da sociedade internacional e os conjuntos de
regras sociais, convenções e práticas socialmente compartilhadas.
O autor destaca três orientações básicas seguidas pela Escola Inglesa para
elaborar as investigações na Política Internacional: a estrutural, a funcional e a histórica.
Estas orientações auxiliam na identificação, investigação detalhada e estudo da
evolução histórica das estruturas institucionais nas relações internacionais.
Mesmo em estruturas de governo descentralizadas ou de tendências anarquistas
é possível notar certo grau de ordem, por conta da influência que sofrem das práticas e
regras oriundas do Sistema Internacional.
Uma questão importante a abordar, é a verificação da existência de solidariedade
suficiente no Sistema Internacional para se alcançar um Contrato de cooperação das
Nações Unidas. Este contrato visaria o controle do uso da força, mas a Escola Inglesa
propõe exceção em caso de emergências humanitárias agudas. Neste caso, há dois
pontos de vista: a dos solidários, que argumentam que tal exceção deve ocorrer dentro
de certos limites de modo a não comprometer e soberania dos Estados e a dos
pluralistas, que defendem que este sistema poderia comprometer a ordem do Sistema
Internacional e que as ajudas humanitárias são meros paternalismos moralmente
desagradáveis.
Em certo tempo, criou-se uma tensão na Escola Inglesa, pois percebeu-se a
necessidade de estudo e acomodação de diversas culturas nos estudos de relações
internacionais através da sociedade internacional. Manning, apesar de nunca confirmar,
passou a ser considerado racista por alguns integrantes do grupo, pois defendia que a
co-existência pacífica entre culturas gerava problemas nas relações internacionais.
Outros integrantes do grupo destacavam o racionalismo da civilização ocidental,
classificando os Estados soberanos ocidentais como núcleo de valores modernos, com
destaque para a tolerância, o individualismo e a autodeterminação, baseadas no direito
internacional. Por isso, essas civilizações são consideradas pioneiras na evolução
política da humanidade. A Europa é destacada, pois nela foi estabelecida a sociedade
internacional de Estados soberanos com os Tratados de Westfália.
Agora, busca-se uma estrutura política “pós-westfaliana”, na qual o cidadão não
tem seu valor moral suprimido pelas instituições supranacionais e pelas práticas do
Sistema Internacional. Almeja-se uma estrutura política em que sejam valorizados os
Direitos humanos, o respeito pelo Estado de direito e a democracia.
Hedley Bull destaca a revolta que os Estados ocidentais causaram em outros
Estados - principalmente do Terceiro Mundo - pois além de pioneiros na evolução
política foram responsáveis também pelo desenvolvimento tecnológico e científico,
mantendo a hegemonia em diversos âmbitos no Sistema Internacional. Ele teme que
algumas atitudes, consideradas como barbarismo, possam prejudicar as sociedades
ocidentais, sendo nocivas às virtudes que possuem. Daí a importância do fortalecimento
de uma cultura cosmopolita, sem privilegiar e perpetuar a hegemonia da cultura
ocidental entre a sociedade internacional, mas adquirindo elementos não-ocidentais em
maior grau. Há, porém, receio – por conta do desconhecimento - de que a inserção da
cultura não-ocidental venha a minar os valores ocidentais, considerados como padrão
para o progresso humano.
É necessário inserir as culturas locais e regionais na sociedade internacional sem
sucumbí-las ante a globalização ou, caso isto não seja possível, globalizar elementos
destas culturas que contribuam com o desenvolvimento social, de modo a favorecer a
cristalização do cosmopolitismo, da cooperação mútua entre as nações e a configuração
da sociedade mundial.
No primeiro capítulo de A Sociedade Anárquica, Hedley Bull discute sobre “O
conceito da ordem na política mundial”. Contudo, antes, discorre sobre o que é a ordem
na vida social. A ordem na vida social é um meio para que indivíduos sigam regras
especificas para alcançar metas e/ou valores, atingindo um determinado fim: a boa
convivência em sociedade.
Para estabelecer esta conduta, essa ordem, a maioria das sociedades seguem
alguns objetivos gerais (meio). Todas as sociedades procuram garantir que a vida seja
protegida, evitando a existência do caos, que as promessas feitas sejam executadas, que
os acordos sejam implementados, fazendo com que não haja motivos para que as
pessoas fizessem algum movimento para que os acordos sejam implementados,
garantem o direito à posse, evitando conflitos constantes e ilimitados por propriedades.
Tais objetivos básicos para convivência em sociedade podem ser resumidos em vida,
verdade e propriedade. Não há nação que não use esses fundamentos: logo, tornaram-se
universais para a vida em sociedade. Percebe-se então, que em caso de guerras ou
revoluções, esses princípios básicos são deixados de lado, ocorre violência, o não
cumprimento de acordos, as regras são violadas.
Desse modo, podemos comparar a ordem social como termos para obediência às
normas de conduta, às regras da lei. Faz-se curioso destacar que esta maneira de se
entender a ordem conduz a conduta das pessoas, possibilitando assim a previsão dos
atos das mesmas, podendo-se analisar o passado e conduzir o presente e o futuro da
sociedade.
Outro ponto importante para a sociedade é a ordem internacional (ou ordem dos
estados). As relações internacionais existem por causa das relações entre os estados,
entre as comunidades políticas. Cada estado possui soberania interna sobre um território
e uma população, e externa - independência de um estado perante outras autoridades
externas. Antes dos europeus, as comunidades políticas independentes eram unidas pela
linhagem ou parentesco, tinham governo, mas não estado; sendo desta maneira inviável
afirmar que existiram relações internacionais, já que estas ocorrem entre estados.
O sistema de estados (sistema internacional) acontece quando dois ou mais
estados têm contato entre si e influenciam nas decisões uns dos outro: quando são partes
que formam um todo. Essa interação entre estados caracterizada como direta (estados
vizinhos e parceiros) ou indireta (relacionam-se por causa de um terceiro estado) pode
ser feita por meio da cooperação, conflito, neutralidade ou indiferença entre os estados.
Raymond Aron afirma que para haver sistema de estados basta que as comunidades
políticas “mantenham regularmente relações entre si” e que “sejam todas capazes de
estar implícitas em uma guerra generalizada”. Já Martin Wight distinguiu o “sistema
internacional de estados” e o “sistema de estados suzeranos”. No sistema de estados
suzeranos (mais antigo) existe um estado que exerce hegemonia permanente e
indisputável sobre outros (como o Império Romano e seus vizinhos); já no sistema
internacional de estados a hegemonia é disputada constantemente.
É perceptível que o “sistema de estados” percorreu um caminho até chegar ao
conceito que temos hoje. Heeren em 1809 via o sistema de estados como uma relação de
interesses e valores comuns, baseados em cultura ou civilização comum. Por exemplo: a
Liga Árabe é sistema de estados relacionando-se através de interesses e valores comuns.
Hedley Bull defende que a definição de Heeren está mais próxima do que chamamos
hoje de sociedade internacional - que é formada por estados que podem ter interesses e
valores comuns, seguem regras e participam de instituições comuns. Acima de tudo,
estes países respeitam a independência de cada um, honrando acordos e limitam os
estados quanto ao uso da força. Os estados cooperam no plano do direito internacional,
na maquinaria diplomática e na organização internacional. Vale ressaltar que um estado
pode participar do sistema internacional e não participar de uma sociedade
internacional, como, por exemplo, o Brasil com a União Européia: participa do sistema,
mas não da sociedade. Um sistema internacional não precisa ser uma sociedade
internacional e vice-verso, mas podemos ver características de um embutidas no outro.
Considerando tais conceitos, Hedley Bull define a “ordem internacional” com
objetivos fundamentais para a existência desta ordem, como vimos na ordem social. O
primeiro objetivo é o de preservar o sistema e a sociedade de estados através da união,
por serem os atores do cenário de política mundial, garantindo seus direitos e deveres.
Entretanto, existem fatores que ameaçam a preservação dessa sociedade como, por
exemplo, quando estados ou atores “supra-estatais” (como o Papado) tentam derrubar o
sistema para colocar em prática um império universal; outras ameaças podem surgir de
atores “sub-estatais” (movimentos incitados de dentro do estado), “trans-estatais” (que
ultrapassam as fronteiras dos estados), advindas de revoluções, contra-revoluções, como
a Reforma da Revolução Francesa e pela Revolução da Russa.
O segundo objetivo seguido pelos estados que integram o sistema é o
reconhecimento da sua própria independência da autoridade exercida externamente,
como a dos outros Estados integrantes. O reconhecimento da independência dos Estados
é um objetivo primordial para a sociedade, uma vez que para esta continuar existindo,
deve ser protegida. Esta proteção é feita pelas grandes potências, já que às vezes um
pequeno estado não consegue ser reconhecido pelos outros, sujeitando-se a conflitos e
desestabilizando o sistema. Para evitar isto ocorra, as grandes potências podem absorver
tais países menores para um reconhecimento mais rápido e zelar pela proteção do
sistema. Isso aconteceu principalmente durante o tratado de Westfália, em 1648, até o
Congresso de Viena, em 1815. O Tratado de Westfália pode ser entendido como uma
teoria crítica, uma vez que nesta teoria ocorre a emancipação dos estados que ocupam
posições periféricas.
O terceiro objetivo é a manutenção da paz que ocorre mediante a ausência de
guerra gerada pelo bom relacionamento entre os Estados. Assim, pode-se dizer que a
paz é subordinada à preservação do sistema de estados e a guerra se torna justificável
por ser a quebra do sistema. Este terceiro objetivo pode ser resumido em paz e
segurança (objetiva ou subjetiva), paz e independência.
O quarto objetivo é relacionado à limitação da violência. Os Estados conseguem
conter o limite de sua violência, controlando assim a violência dos outros integrantes do
sistema para manter a paz, o bom relacionamento. A guerra só pode ser exercida de
maneira justa e dentro de regras estipuladas, colocando limites na guerra.
Ao final, com as metas incorporadas no sistema e seguidas, define-se a ordem
internacional “estática”.
A ordem mundial é um fator diferenciado da ordem internacional. Por ordem
internacional entende-se uma ordem entre Estados. A ordem mundial é composta não só
pelos estados que fazem intercâmbios entre si, mas também pelos indivíduos e grupos
que participam dos mesmos. A ordem mundial diz respeito diretamente aos indivíduos à ordem moral que precede a ordem dentro de cada estado -, deste modo, a ordem
dentro de cada estado deve ser tratada para se ter uma ordem mundial. Para se ter ordem
mundial, deve-se ter a ordem internacional.
Tendo dissertado a respeito do que consiste a ordem social e como ela é
entendida no contexto da política mundial, Hedley Bull passa a se aprofundar nas
questões de manutenção da ordem. Para o autor são os interesses comuns, as regras e as
instituições os elementos responsáveis por manter a ordem na vida social. O primeiro
elemento diz respeito aos objetivos elementares, na medida em que se compartilha a
intenção em alcançá-los. No entanto, a comunhão de um objetivo não seria suficiente
para determinar que comportamento é e ou não aceitável para atingir esta meta. Daí a
importância das regras no sentido de orientação das condutas e das instituições
enquanto organização capaz de conferir eficácia às regras.
Amplamente tratado no capítulo 1, à questão dos interesses é destinado menor
foco no inicio do 3º, de modo que fosse possível maior exposição do conceito de regra
no sentido de ordem social. Segundo o autor, as regras podem ser expressas na forma de
lei, conduta ou etiqueta. Porém não devem ser confundidas com a ordem, pois esta
poderia muito bem existir baseada somente na vida social. O argumento do autor que
defende esta distinção consiste em ressaltar que mesmo as ações de descontentes com o
ordenamento atual não são interessadas em eliminar os objetivos elementares, mesmo
porque, sem a garantia deles, como também já visto, tem-se somente a desordem como
resultado.
Ainda a respeito das regras, Bull as entende como construções intelectuais cuja
função depende de sua eficácia que por sua vez ocorrerá no momento em que as
instituições cumprirem as seguintes funções: que a regra seja feita, seja comunicada,
administrada, interpelada, aplicada, legitimada, adaptável e protegida. No estado
moderno cabe ao governo o feitio das regras, bem como a comunicação, administração,
aplicação e assim por diante, conforme funções definidas pelo autor. Logo, a instituição
responsável pela manutenção da ordem dentro de um estado moderno é o governo, que
destaca-se ainda por sua possibilidade de recorrência ao uso da força.
Após esclarecer os meandros da ordem no estado moderno o autor leva o
problema para o plano internacional, destacando a ausência de governo na sociedade
internacional. Mesmo em uma sociedade anárquica, ressalta o autor, a ordem não só é
possível como existe efetivamente. Pala solucionar o desafio, Bull lança mão de uma
comparação da sociedade internacional com as sociedades primitivas, frisando suas
similaridades e diferenças a fim de construir uma analogia capaz de se fazer entender a
manutenção da ordem no âmbito internacional.
Primeiramente, para Bull, estas sociedades podem ser comparadas não somente
por sua ausência de governo, mas efetivamente devido à existência e manutenção de
ordem empenhada por grupos distintos, sejam estes famílias ou clãs em sociedades
primitivas, sejam estados na sociedade internacional. Em ambos os casos os grupos
podem defender seus interesses fazendo uso da força.
Como diferencial Bull aponta que se há a soberania do estado sobre o povo e
sobre o território o mesmo não pode ser conferido em relação ao grupo de uma
sociedade primitiva. Acusa, ainda, a homogeneidade vista nas sociedades primitivas e a
cultura heterogênea presente na sociedade de estado moderna. Outras características
incompatíveis destas sociedades são o caráter místico e secular (primitiva e
internacional, respectivamente) e seu tamanho relativo. Estes pontos, justifica o autor,
servem para demonstrar que as características da sociedade primitiva possibilitam maior
coesão social e que, ao contrário, a ordem da sociedade internacional é mantida não só a
despeito da ausência de governo mas também com menor solidariedade.
Para o autor a instituição mais importante para manutenção da ordem é o estado
soberano moderno. Logo, cabe a ele a garantia dos objetivos elementares constituintes
da ordem e para esta finalidade permite um sistema de regras diferenciados por Bull em
3 conjuntos. O primeiro conjunto seria justamente um complexo de orientações que
afirmem o Estado como principal grupo político de capacidade normativa. Na
sequência, um segundo grupo de regras garantem a coexistência e a observação dos
objetivos elementares (segurança, contrato e propriedade como já visto). O terceiro
grupo de regras é um conjunto facilitador da cooperação entre os estados.
Neste contexto de sociedade internacional, o estado, como instituição absoluta
na criação de regras participa da normatização das relações internacionais na medida em
que agem e se manifestam, pois as regras se instituem com base na prática e nas
convenções. Do mesmo modo como exposto acerca da ordem social no geral, no âmbito
internacional cabe à unidade política central que é o estado, não só fazer as leis, mas
administrá-las, aplicá-las, etc. Estas funções do estado se manifestam através de outras
instituições internacionais, tais quais o equilíbrio de poder, o direito internacional, os
mecanismos diplomáticos, o sistema administrativo das grandes potências e a guerra. A
soma destas instituições confere uma ilustração do que é a sociedade internacional.
Por fim, Bobbio reconhece a importância das instituições internacionais sem
retirar o papel central do Estado de sua análise o que seria uma via média de se teorizar
a respeito das relações internacionais tal como o é a escola a que pertence e ao que
propõe este trabalho.
BIBLIOGRAFIA
ARON, Raymond. Paz e Guerra entre as Nações (Brasília, Editora da Universidade de
Brasília, 1962). Citado na tradução para o inglês, p. 94.
BULL, Hedley. A Sociedade Anárquica. UnB, 2002. (pp. 7-29; 65-90)
HEEREN, Vide A. H. L. A Manual of the Political System of Europe and its Colonies,
Gottingen, 1809 (Oxford, Talboys, 1834), vol. I, p. V
SUGANAMI, Hidemi. British Institutionalists, or the English School, 20 Years On.
International Relations 2003.
WIGHT, Martin. Systems of States (Leicester Univ. Press. e London School of
Economics), cap.1.
Download