6ª SÉRIE CONHECIMENTO NA FILOSOFIA GREGA CLÁSSICA – Parte 01 Em Sócrates, encontramos as características próprias da filosofia. São elas: 1 – a construção de conceitos; 2 – a argumentação e a problematização. A partir da capacidade de problematizar, com a formulação de perguntas, abordaremos a construção dos conceitos por meio da busca das características essenciais de um ser. Uma das características de Sócrates, nos diálogos, é fazer perguntas. Seu discurso não é um conjunto de afirmações, mas é, por meio das perguntas, que ele vai buscando o conhecimento sobre os temas discutidos. A exigência de construções rigorosas de conceitos será desenvolvida por outros pensadores, em particular por Platão e Aristóteles. PLATÃO: Importante filósofo grego, que viveu entre 427 e 347 a.C., considerado uma das referências fundamentais do pensamento ocidental. Alfred Whitehead, filósofo inglêns do início do século XX, chegou a dizer que toda a filosofia ocidental não passaria de uma série de notas de pés de página ao pensamento de Platão. Seus trabalhos filosóficos têm influência de outro grande filósofo grego: Sócrates, a quem conheceu ainda muito jovem e acompanhou até sua execução. Sofreu influência também das correntes de pensamento pitagórico e do confronto entre os pensamentos de Parmênides e Heráclito. Fez várias viagens, especialmente, pelo sul da Itália, onde viu frustrado seu propósito de fundar uma cidade governada por sábios – sofocracia. Sentindo-se, como Sócrates, vocacionado a ilustrar seus concidadãos, em 387, fundou uma escola de pesquisa e estudos – não só em Filosofia mas também em Ciências, Matemática, Retórica, Ética, entre outras áreas – à qual deu o nome de Academia. Nesta, Platão passou grande parte de seu tempo ensinando e escrevendo. Trinta obras, principalmente, sob a forma de diálogo, compõem o chamado Corpus Platonicum ou Academicum. Suas obras mais importantes e conhecidas são Apologia de Sócrates, em que faz um retrato da vida e do pensamento do mestre; O Banquete, que apresenta diversos discursos sobre o amor, e A República, em que analisa a política grega, a cidadania e questões sobre a imortalidade da alma. 1 ARISTÓTELES: Filósofo grego nascido em 384 a.C., tendo sido um dos mais importantes filósofos de todas as épocas. Aos 17 anos, foi para Atenas, tornando-se discípulo de Platão na Academia. Sua obra era dividida em duas espécies de escritos – uma destinada ao grande público e outra de caráter demonstrativo e didático. Focalizou a lógica enquanto instrumento do fazer científico, criou o método dedutivo – de premissas gerais e verdadeiras explica-se o particular – e tratou da indução como o método que possibilita que o conhecimento produzido seja generalizado, atingindo o plano universal. Estudioso de anatomia comparada, Aristóteles foi também pioneiro nos estudos da Biologia. Nessa área, além de dedicar-se ao estudo da estrutura, dos hábitos e do crescimento dos animais, revelou diversos fatos que só seriam redescobertos a partir do século XVII. Seu interesse em relação às funções das palavras nas línguas deu origem às gramáticas e o fez um dos precursores da filosofia da linguagem. Ao ser descoberta pelos árabes, sua obra foi traduzida para o latim, o que acabou por modelar o pensamento medieval tanto nas artes quanto nas ciências. A essência deve ser definida por aquelas características que expressam a natureza verdadeira e única de um ser. Desse modo, devemos distinguir ainda entre a essência e o próprio. Por exemplo... ...a essência do homem será a de um animal racional. Contudo, alguém poderia afirmar que o homem pode ser definido como um animal que ri. Por ser o único entre os animais que ri, essa definição seria adequada ao homem, pois se aplicaria apenas a ele e a nenhum outro ser. No entanto, apesar de o riso ser algo próprio ao homem, não expressaria nossa verdadeira natureza, o que só seria feito pela racionalidade. Essas características é que permitirão elaborar uma definição adequada para os conceitos. 2 A sutileza no exame da linguagem mostrou-se necessária aos filósofos na formulação de um ponto de vista distinto do dos sofistas. Etimologicamente, o termo sofista significa sábio. Entretanto, com o decorrer do tempo, ganhou o sentido de impostor, devido, sobretudo, às críticas de Platão. Os sofistas eram professores viajantes que, por determinado preço, vendiam ensinamentos práticos de sabedoria, em particular de oratória. Levando em consideração os interesses dos alunos, davam aulas de eloquência e sagacidade mental. Ensinavam conhecimentos úteis para o sucesso dos negócios públicos e privados. As lições sofísticas tinham como objetivo o desenvolvimento do poder de argumentação, da habilidade retórica, do conhecimento de doutrinas divergentes. Eles transmitiam todo um jogo de palavras, raciocínios e concepções que seria utilizado na arte de convencer as pessoas, driblando as teses dos adversários. Segundo essas concepções, não haveria uma verdade única, absoluta. Tudo seria relativo ao homem, ao momento, a um conjunto de fatores e circunstâncias. “O homem é a medida de todas as coisas”. Enquanto os sofistas usavam o discurso como forma de persuadir pela adesão primordialmente emotiva, apaixonada, os filósofos buscam descobrir os critérios de racionalidade presentes no discurso. Para sabermos do que falamos, devemos considerar, amplamente, o que buscamos conhecer. Sócrates mostra, em seus diálogos, como as opiniões apresentadas por seus interlocutores levavam a contradições. Ora, uma opinião que se contradiz não pode ser considerada verdadeira. Com esse procedimento, mostrava que diversas pessoas da cidade, em particular aqueles que se julgavam sábios ou eram assim julgados por outros, não sabiam do que estavam falando... SÓCRATES: Filósofo grego considerado um dos principais de toda a história da filosofia ocidental. Desempenhou alguns cargos políticos e foi sempre modelo irrepreensível de bom cidadão. Formou sua instrução, sobretudo, por meio da reflexão pessoal, na moldura da alta cultura ateniense da época, em contato com o que de mais ilustre houve na cidade 3 de Péricles. Quanto à política, foi ele valoroso soldado e rígido magistrado. Entretanto, em geral, conservou-se afastado da vida pública e da política contemporânea, que contrastavam com seu temperamento crítico e com seu reto juízo. Julgava que devia servir à pátria conforme suas atitudes, vivendo justamente e formando cidadãos sábios, honestos, temperados – diversamente dos sofistas, que agiam para o próprio proveito e formavam grandes egoístas, capazes unicamente de se acometerem uns contra os outros e escravizar o próximo. Podemos identificar nas refutações realizadas por Sócrates um procedimento lógico. Sócrates constrói raciocínios, afirmações que se articulam com outras de modo a demonstrar a verdade de suas conclusões. Essa análise das formas lógicas da linguagem vai ser desenvolvida por Aristóteles. Essa parte de sua obra chamou-se Órganon, palavra que significa instrumento. Atualmente, conhecemos essa parte das teorias de Aristóteles como lógica ou teoria do silogismo. A lógica pode ser compreendida como a teoria do raciocínio correto. Era preciso distinguir os raciocínios corretos dos raciocínios errados ou enganadores, que não conduziam a conclusões verdadeiras. Portanto, se a retórica busca as regras do discurso persuasivo, a filosofia vai buscar as regras do discurso verdadeiro. Sócrates dizia usar um método chamado maiêutica, isto é, a arte de partejar, a arte das parteiras, de saber fazer nascer as crianças, os novos começos, as ideias. Por meio de suas perguntas, ela não transmitia um saber para seus interlocutores, mas os ajudava a encontrar as respostas para suas questões. O primeiro passo da maiêutica, no entanto, é mostrar que aquilo que pensamos que sabemos, na verdade, ainda não é um saber. Sócrates realiza uma refutação das ideias apresentadas pelos interlocutores por intermédio de uma série de perguntas. Ao responder a essas perguntas, o companheiro de diálogo de Sócrates, geralmente, cai em uma contradição... ...fazendo afirmações que negam umas às outras, e, dessa forma, Sócrates mostra que aquele suposto saber não tem qualquer valor. A Lógica: O próprio Aristóteles não usa o termo lógica, que só tempos depois de sua morte adquire o sentido que lhe damos hoje. O termo utilizado por ele para o estudo do raciocínio era analítica. A analítica não era considerada uma ciência teórica como as outras, mas uma espécie de instrumento do conhecimento. A palavra para instrumento, em grego, é órganon, sendo esse o título sob o qual foram 4 organizados os trabalhos lógicos de Aristóteles, por Alexandre de Afrodísia, em 200 d.C. ...segundo Aristóteles, [a lógica] é, não uma ciência substantiva, mas uma parte da cultura geral que cada um deve receber antes de iniciar o estudo de qualquer ciência, bem como a única capaz de ensinar-lhe a conhecer qual a espécie de proposições que requerem uma prova e qual a espécie de provas que são exigidas para essas proposições. Fonte: ROSS, David. Aristóteles. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1987, p. 31 Todas essas operações são pré-requisitos da prática científica, e várias delas seriam utilizadas de forma enganosa ou transgredidas pelos sofistas, ao exercerem a oratória. Pela análise da linguagem e das formas corretas e incorretas de raciocínio, Aristóteles formulou um instrumento capaz de combater os sofistas e construir uma noção de verdade própria da filosofia. Apresentaremos, a seguir, uma introdução a alguns aspectos da lógica e como ela pode ser entendida, modernamente, de uma maneira acessível, pelos estudantes. Não se trata, portanto, da lógica como Aristóteles estritamente a formulou, mas, sem dúvida, os conceitos apresentados podem ser vistos como pertencentes à tradição inaugurada pelo estagirita. O estudo da lógica... permite-nos saber o que é um argumento. auxilia-nos a argumentar com rigor e refutar (recusar) argumentos de outros. Ajuda-nos a saber o que são conceitos, definições e juízos. O uso comum da palavra lógica envolve uma justificação. Vejamos um exemplo... Em uma conversa, alguém diz: – É lógico que vou viajar nas férias. Se perguntada sobre o porquê de tal afirmação, a pessoa poderia dizer: – Ora, eu adoro viajar, e as férias são a única oportunidade que tenho para isso, não posso deixar de aproveitá-las. Aquela expressão é lógico que parecia estar subentendendo essas outras afirmações, que servem de justificação para a afirmativa inicial. Com a lógica, nós vamos estudar uma coisa que usamos a todo momento, no dia a dia, e de que, muitas vezes, nem nos damos conta. Essa coisa é o raciocínio. A questão central da lógica é examinar que relação os enunciados que servem como premissa – ou como prova – têm de manter entre si para que possam ser aceitos como prova, justificação ou garantia de um outro enunciado, a conclusão. O que é um raciocínio correto? O que é um argumento válido? 5 A lógica se concentra nos resultados dos raciocínios, quer dizer, não considera tudo o que passa pela mente de alguém quando realiza um raciocínio, mas está interessada na expressão linguística de um raciocínio, que toma a forma de um argumento. Um argumento é formado por dois tipos de enunciados – as premissas + a conclusão. Exemplos de argumentos lógicos: 1 – Todo pássaro voa. A pomba é um pássaro. Logo, a pomba voa. 2 – Todo felino é felpudo. O gato é um felino. Logo, o gato é felpudo. 3 – Almocei todos os dias do ano no Mcdonald. O lanche do Mcdonald é ruim. Dizer que um argumento é válido significa dizer que, dadas aquelas premissas, podemos afirmar, com segurança, a conclusão. Ou, se as premissas são verdadeiras, então, a conclusão também o será. Um argumento será válido segundo esta condição: Se suas premissas forem verdadeiras, a conclusão será necessariamente verdadeira. Em sua obra Metafísica, Aristóteles procura esclarecer o que é a Filosofia Primeira ou a Sabedoria Primeira, aquela que é a ciência do ser enquanto ser. Isso significa o ser que cabe a todos os seres, e não apenas um desses seres em particular. A ciência é o conhecimento das causas e a primeira das ciências ou a primeira sabedoria. É o conhecimento das primeiras causas e princípios. O conhecimento desses primeiros princípios não pode se dar por demonstração, pois deles – ou conforme a eles – é que se devem derivar as demais conclusões, mas eles mesmos não são derivados de outros princípios. Se o fossem, esses outros é que seriam primeiros. Aristóteles evita, portanto, o erro de cair em um regresso infinito na fundamentação da ciência. A justificação da ciência deve encontrar os primeiros princípios dos quais deve partir, senão nunca será propriamente uma ciência, isto é, um conhecimento necessário e universal. O primeiro princípio será o princípio da não contradição... Uma coisa não pode ser e não ser ao mesmo tempo sob o mesmo aspecto. 6 Esse princípio, que vale para os seres e também para a lógica, é a base do edifício metafísico construído por Aristóteles e, talvez, do próprio desenvolvimento da razão, por grande parte da história do Ocidente. Aristóteles cria uma ontologia da substância, na qual a substância é primeira. A substância é sempre um composto de forma e matéria, sendo a forma a essência da coisa, aquilo que define a coisa. Por isso, será importante o conceito de forma substancial. 7