a contribuição do estudo do impacto de vizinhança como processo

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A CONTRIBUIÇÃO DO ESTUDO DO IMPACTO
DE VIZINHANÇA COMO PROCESSO DE
TRANSFORMAÇÃO DO DIREITO DE
PROPRIEDADE
Raquel Helena Valési*
*Doutoranda e Mestre em Direito Civil ,
Pós Graduada em Direito Processual Civil,
todas pela PUC/SP. Professora de Direito
Civil e Processo Civil na USJT. Professora
da Escola Superior de Advocacia de São
Paulo (ESA). Professora convidada da Escola Paulista de Direito (EPD). Professora do Curso de Direito Contratual na Pós
Graduação da PUC/SP – COGEAE. É co-autora da obra “Comentários ao Código
Civil”, pela RT; Obra: Direito Civil – Coleção de Método de Ensino, editora Elsivier,
possui artigos publicados em Revistas
Especializadas, advogada em São Paulo.
Sumário
INTRODUÇÃO. 1 - FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE. 2 – ESTATUTO DA CIDADE: REALIZAÇÃO DA FUNÇÃO DA PROPRIEDADE. 3 – CONSIDERAÇÕES INICIAIS SOBRE O ESTUDO DO IMPACTO AMBIENTAL NA LEI
10.257/01. 4 - CONSIDERAÇÕES INICIAIS SOBRE ESTUDO DO IMPACTO DE VIZINHANÇA. 5 – NATUREZA JURÍDICA E DEFINIÇÃO DO EIV. 5.1 – NATUREZA JURÍDICA. 5.2 – DEFINIÇÃO DO EIV. 5.3 – CARACTERÍSTICAS E
FINALIDADES DA EIV. 6 – REGULAMENTAÇÃO DO EIV EM SÃO PAULO. 7 – O EIV, DIREITO DE CONSTRUIR E O
DIREITO DE VIZINHANÇA. 8 – LICENÇA URBANÍSTICA E O EIV. 9 – A PARTICIPAÇÃO POPULAR NO PROCESSO
DE ELABORAÇÃO DO EIV. 9.1 – DA PARTICIPAÇÃO POPULAR. 10 – EIV (ESTUDO DO IMPACTO DE VIZINHANÇA)
E O EIA (ESTUDO DE IMPACTO AMBIENTAL). 10.1 – TRAÇOS COMPARATIVOS ENTRE O EIA E EIV. 10.2 – FINALIDADES DO EIA E EIV. 10.3 – LICENCIAMENTO. 10.4 – QUANTO AO LOCAL DE APLICAÇÃO. 10.5 – DISPENSA
DO EIV E DO EIA. CONCLUSÃO.
Resumo
Será com a análise do impacto de vizinhança avaliar a pertinência da implantação de um determinado empreendimento imobiliário poderá também ser aprovado, ou seja, o Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV) está dentre os
instrumentos de gestão previstos no Estatuto da Cidade que permite à Prefeitura verificar os impactos causados
por empreendimentos e atividades urbanas.
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municipal e que permitem a avaliação dos impactos causados por empreendimentos e atividades urbanas. Trata-se
de um instrumento contemporâneo, que atende às exigências da vida moderna e que está integrado ao direito urbano
ambiental, que tem sua matriz no cumprimento da função
social da propriedade. A partir da análise dos impactos é
possível avaliar a pertinência da implantação do empreendimento ou atividade no local indicado, ou seja, avaliar
se o proposto está adequado ao local, estabelecendo uma
relação da cidade com o empreendimento e do empreendimento com a cidade, considerando o meio no qual está
inserido.
INTRODUÇÃO
O
Estatuto da Cidade, lei federal que institui a política urbana de que tratam os artigos 182 e 183 da
Constituição Federal, criou um sistema de normas
e institutos que tem sua base a ordem urbanística, trata de
um direito urbano-ambiental dotado de institutos e características peculiares, fundamentado no texto constitucional,
que possibilita a construção do conceito de cidade sustentável e ainda ver as necessidades urbanas e estabelecer
os limites para a vida em sociedade pois esta sociedade é
dinâmica e com escassez de recursos naturais.
O desenvolvimento econômico das cidades, em conjunto
com o crescimento populacional têm ocasionado incômodo
e perturbação geralmente relacionado aos efeitos diretamente
exercidos pelo ruído de certas atividades, o que tem levado a
Administração Pública Municipal a adotar posturas preventivas, visando minimizar os impactos ambientais ocorridos.
O Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV) está dentre os
instrumentos de gestão que dependem da regulamentação
Nesse trabalho tentaremos analisar o EIV na conformidade
do Estatuto da Cidade e preceitos constitucionais.
1 – FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE
A noção de função social da propriedade ganhou relevo e
destaque a partir da Constituição de 1988. A CF trabalha
a ideia não só de um direito individual do proprietário mas
também agregada a estrutura da propriedade que deveria
haver a disponibilidade desta aos fins sociais, de justiça
social (art. 5º, XXII e XXIII da CF). A função social não concerne, apenas, aos limites ou à definição do direito de propriedade, senão que é atinente a todos os aspectos a esse
direito podem dizer respeito1.
163
Assim, o Poder Público além de impor restrições e limitações ao uso da propriedade privada também pode impor
a utilização dela. A noção de função social da propriedade
que está no texto constitucional confere instrumento ao Poder Público para que incentive ou imponha ao proprietário a
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utilização da mesma e, sua inação pode acarretar até mesmo a perda da propriedade2.
Arruda Alvim3 ensina que “Como destinatários do mandamento da função social enxergam-se o legislador, o juiz e
o proprietário, e, bem assim terceiros, que em nome da
função social podem exigir determinado comportamento (o
que decorre do art. 1228, §2º do CC)”. Aqui ainda acrescentamos que neste mesmo ideal haverá uma verdadeira expropriação da propriedade em proveito de terceiros quando
a norma prevê a indenização ao proprietário e a propriedade passa para as pessoas mencionadas no artigo 1.228, §
4º e 5º do Código Civil.
Nesse diapasão, partindo da base constitucional prevista no
artigo 5º, XXII e XXIII e ulteriormente pela análise dos artigos
182 e 183 percebemos que a Lei Federal 10.257/01 é norma
que redireciona, amolda à novas perspectivas ao princípio da
função social da propriedade quando oferece contornos para
mitigar a especulação imobiliária urbana e corrige a forma
de ocupação do solo urbano, é o que se reconhece com a
leitura dos artigos 2º e 3º da referida Lei Federal.
2 – ESTATUTO DA CIDADE: REALIZAÇÃO DA FUNÇÃO
DA PROPRIEDADE
O Estatuto da Cidade foi instituído com a Lei 10.257, de 10
de julho de 2001, o qual regulamentou os artigos 182 e 183
da Constituição Federal. A referida Lei regula o uso da propriedade urbana a favor do bem social coletivo, bem como
tem o condão de ordenar o pleno desenvolvimento da cidade, garantindo o direito as cidades sustentáveis.
A interferência na regulação do desenvolvimento urbano
equilibrado, sobretudo quando se pensa nas grandes cidades, tornou-se uma imposição para o Poder Público. Ele
deve controlar e ordenar o crescimento das cidades com a
utilização dos instrumentos de organização urbana expostos no Estatuto da Cidade prevenindo o caos na política
urbana das grandes cidades.
A referida Lei Federal está destinada a ser o instrumento pelo
qual a Administração Pública Municipal (e porque não dizer
aos proprietários) realiza a função social da propriedade, que
atendendo aos anseios da coletividade, poderá determinar
(v.g. e assim prevenir), quando, como e onde edificar de maneira a melhor satisfazer o interesse público seja por razões
estéticas, funcionais, econômicas, sociais ou ambientais, retirando poder dos especuladores imobiliários4 5.
3 – CONSIDERAÇÕES INICIAIS SOBRE O ESTUDO DO
IMPACTO AMBIENTAL NA LEI 10.257/01
A preocupação da humanidade com a degradação do meio
ambiente gerou a necessidade da criação de instrumentos de
tutela ambiental, visando a reparação do dano. Mais recentemente o direito incorporou instrumentos que buscam a prevenção do dano ambiental. Dentre tais instrumentos sobressaem-se o zoneamento ambiental, o planejamento ambiental
e o estudo de impacto ambiental. No Brasil, as avaliações
ambientais foram introduzidas por intermédio da Lei Federal
nº 6.938/81, que criou o sistema nacional do meio ambiente.
Apesar da lei não ter restringido o âmbito de aplicação ao
meio ambiente natural a incidência maior de aplicação visou a mitigação de impactos a este meio.
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A partir da Constituição de 1988 e da Resolução Conama
nº 237/97, com a definição de competências expressas aos
municípios em matéria ambiental estabelecida na Constituição Federal , é que o meio urbano passou a ser objeto
de maiores avaliações, identificando a preocupação com a
incidência da legislação ambiental e dos instrumentos de
planejamento previstos nesta.
Deste movimento é que começaram a aparecer Estudos
de Impacto Ambiental para implantação de condomínios,
grandes loteamentos , shopping centers, hipermercados,
todas atividades urbanas impactantes ao meio ambiente
construído, e que precisam ser avaliadas.
A Constituição Federal, em seu art. 225 estabelece que
todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia
qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
A dicção legal recepcionada Constituição adota uma conceituação ampla de meio ambiente, que engloba a vida em
todas as suas formas, pressupondo a integração do homem
a este meio.
E, é a adoção deste conceito amplo que permite a avaliação
dos impactos no meio ambiente urbano, compreendendo-o
como notadamente construído e modificado pelo homem
e com todas as interações relativas ao ambiente natural,
social, ao desenvolvimento econômico e sócio-cultural, na
cultura local e na infraestrutura da cidade.
Nesse diapasão, o Estudo do Impacto de Vizinhança (EIV)
é mais um dos instrumentos que permitem a tomada de
medidas preventivas pelo Poder Público a fim de evitar o
desequilíbrio no crescimento urbano e garantir condições
mínimas de ocupação dos espaços habitáveis, em especial
no grande centros6.
Podemos ainda afirmar que o Estudo Prévio de Impacto
Ambiental é instrumento de Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81), elevado a nível constitucional (artigo
225, § 1º, IV, de CF) por ser um importante instrumento administrativo de prevenção7. O Poder Público deve exigir o
instrumento na forma da lei quando da instalação de obra
ou atividade potencial ou efetivamente causadora de significativa degradação ambiental.
Nesse mesmo preceito o Estudo de Impacto de Vizinhança,
o Estudo Prévio de Impacto Ambiental, também é solicitado
objetivando um aperfeiçoamento das análises de custo/benefício de um empreendimento, por prevenção.
De acordo com o determinado no art. 37 do Estatuto da
Cidade, o EIV será executado de forma a contemplar os
efeitos positivos e negativos da atividade quando a qualidade de vida da população residente na área e suas proximidades. Já o EIA deve ser exigido de empreendimentos que
modifiquem ou alterem substancialmente e negativamente,
causando prejuízos extensos à flora, à fauna, às águas, ao
ar e à saúde humana.
Assim, ambos institutos são instrumentos que contribuem
para o planejamento e desenvolvimento sustentável urbano, concretizando dessa forma a função social da proprie-
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dade urbana, como estabelece a CF.
4 - CONSIDERAÇÕES INICIAIS SOBRE ESTUDO DO IMPACTO DE VIZINHANÇA
O Estatuto da Cidade estabelece em seu artigo 36, que “lei
municipal definirá os empreendimentos e atividades privados ou públicos em área urbana que dependerão de elaboração de estudo prévio de impacto de vizinhança (EIV) para
obter as licenças ou autorizações de construção, ampliação
ou funcionamento a cargo do Poder Público Municipal”.
Como dito antes, o Estudo do Impacto de Vizinhança é um
instrumento precaução, que tem como fim evitar o desequilíbrio no crescimento urbano e garantir condições mínimas
de ocupação dos espaços habitáveis.
Assim, o direito de propriedade passa a ser observado de
uma forma não absoluta, pois deve atender à sua função
social, a fim de assegurar que o uso da propriedade pelo
particular não coloque em risco outros valores ou garantias
assegurados à coletividade.
No que tange a lei que disciplina o assunto, a mesma deverá
dispor que as Prefeituras examinem a adequação do empreendimento no respectivo local e entorno, com relação aos
aspectos do sistema viário e de transportes, produção de
ruídos e resíduos sólidos, capacidade de infraestrutura instalada, etc. As restrições a serem feitas pela Prefeitura não são
de natureza civil, mas de caráter ambiental urbanístico.
Paulo Vitor Fernandes8, sustenta que com a entrada em
vigor do Estatuto da Cidade, tanto o Estudo Prévio de Im-
pacto Ambiental quanto o estudo prévio de impacto de vizinhança foram erigidos como instrumentos da política urbana (artigo 4.º, VI).
A Lei impõe algumas condições para se obter as respectivas licenças de construir, bem como quando da ampliação
de obra já existente. Isso deve ocorrer, objetivando que se
faça um planejamento e decida se o local comportará a atividade sem causar grandes danos ao meio. E não se trata
de discutir danos ao meio ambiente, os quais serão analisados no EIA.
Aduz Gilda Amaral Cassilha9, que o EIV será executado de
forma a contemplar a análise dos efeitos positivos e negativos do empreendimento ou atividade, na qualidade de vida
da população residente na área e em suas proximidades,
incluindo, ao menos, a análise do incremento populacional
na vizinhança, a taxa de impermeabilização do terreno (aumento da temperatura), o impacto sobre a paisagem natural
(morros, dunas, vales) ou construída (diversidade do solo,
prédios com valor cultural ou histórico), impactos sobre o
comércio e serviços locais ou sobre a produção de pequenos agricultores, sobre a perda de empregos ou renda, a
sobrecarga nos equipamentos públicos e na infraestrutura
de saneamento, no sistema viário e na demanda por transporte coletivo.
Também deve ser levada em consideração a opinião da população diretamente afetada pelo empreendimento, o que
não pode ser um entrave na realização de alguns empreendimentos relevantes para toda a cidade e por consequência
para o município, como, por exemplo: cemitérios, delegacias, terminais, dentre outros de fundamental importância
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para as cidades e que podem vir a ser objeto de resistência
dos moradores circunvizinhos ao empreendimento.
5 – NATUREZA JURÍDICA E DEFINIÇÃO DO EIV
5.1 – NATUREZA JURÍDICA
Esta disciplina do EIV insere-se no Direito Urbanístico como
instrumento de justiça social na ocupação dos espaços das
cidades possibilitando um melhor planejamento urbanístico
para as cidades.
O EIV faz parte de um conjunto de instrumentos criados
pelo Estatuto da Cidade, tais como, a outorga onerosa do
direito de construir, operação consorciada, dentre outros,
como ferramenta do Direito Urbanístico para alcance das
funções clássicas da urbs como é a habitação, trabalho,
circulação e diversão.
5.2 – DEFINIÇÃO DO EIV
Segundo Mariana Mencio “ o Estudo do Impacto de Vizinhança consiste em um instrumento que permite a tomada
de medidas preventivas pelo ente estatal com o propósito
de evitar o desequilíbrio no crescimento urbano e garantir condições mínimas de ocupação dos espaços habitáveis, principalmente, os grandes centros. Como forma de
alcançar o planejamento urbano, o EIV é capaz de prever
as repercussões que determinados empreendimentos gerarão na região em que será implementado para que o Poder Público, no momento necessário, adote medidas que
procurem amenizar efeitos e manter o equilíbrio da vida da
população ao seu redor. Trata-se de adequar a construção
ao meio no qual será inserida ou vice-versa”10.
E ainda a mesma autora aduz que:“ A interferência negativa sobre o meio ambiente urbano, capaz de comprometer
o equilíbrio da ordem urbanística, é considerada Impacto
de Vizinhança nos termos do Estatuto da Cidade (...) Nesse
sentido, o Estatuto da Cidade obedece ao conceito ampliativo indicado pela doutrina, passando a considerar o Impacto Ambiental inserido no âmbito urbano”.11
O Estatuto da Cidade não traz o conceito expresso de impacto de vizinhança mas é possível extrair uma conceituação pela interpretação do disposto no artigo 2º, IV, V, VI ,b”
e “d”, VIII, combinado com os artigos 36 e 37 do Estatuto.
De acordo com esta interpretação, toda e qualquer atividade econômica do Município sob sua influência deve ser feita
de forma compatível com os limites da sua sustentabilidade
ambiental, social e econômica, buscando evitar e corrigir as
distorções do crescimento e seus efeitos negativos sobre o
meio ambiente, evitando a proximidade de usos incompatíveis ou inconvenientes e a geração de tráfego, sem previsão da infraestrutura correspondente12.
Devemos observar que , além de se adequar às restrições
do zoneamento e às normas de uso e ocupação do solo, o
empreendimento almejado deve ser compatível com planejamento global da cidade, seja nos termos do plano diretor
para os municípios ou que tenham outra legislação. Deve
ainda atender a função social da propriedade, evitando a
especulação imobiliária e preservando a qualidade de vida
dos habitantes das áreas circunvizinhas.
5.3 – CARACTERÍSTICAS E FINALIDADES DA EIV
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Diante do quanto está previsto na Constituição de que a
propriedade também tem função social, a execução de determinada obra pelo particular ou pelos agentes públicos
não deve colocar em risco outros valores ou garantias assegurados à coletividade.
autorizações administrativas de construção, ampliação ou
funcionamento de empreendimentos na área urbana. Deve
ser exigido tanto para obras públicas como para os particulares, sendo que sua exigência depende de regulamentação
por lei municipal.
Alguns projetos arquitetônicos podem causar distúrbios
para a vizinhança seja pelo incômodo que decorre de sua
implantação, seja pela inadequação da obra.
As interferências na utilização ou ocupação de um determinado lote urbano produzem impactos positivos e negativos
sobre o seu entorno, podendo interferir diretamente na vida
e dinâmica urbana. Portanto, quanto maior o empreendimento, maior o impacto que ele poderá ou não causar sobre a vizinhança.
Nesse sentido, o EIV tem caráter preventivo pois se presta a
antever as repercussões que determinado empreendimento vai gerar na região em que será erigido, a fim de que
o Poder Público, quando necessário, ordene medidas para
amenizar aqueles efeitos e manter o equilíbrio da vida da
população13.
Para Celso Fiorillo o EIV tem um sentido de harmonização,
“o EIV visa harmonizar a ordem econômica do capitalismo
(art. 1º, IV e art. 170 da CF) em face dos valores fundamentais ligados às necessidades de brasileiros e estrangeiros
residentes no país justamente em decorrência do trinômio
vida-trabalho-consumo”.14
Nesse diapasão, podemos afirmar que o EIV caracteriza-se
como instrumento que permite a tomada de medidas preventivas pelo poder público a fim de evitar o desequilíbrio
no desenvolvimento urbano e garantir condições adequadas de ocupação dos espaços habitáveis, objetivando a
proteção dos interesses difusos dos cidadãos.
Trata-se o relatório de EIV de um documento técnico que
deve ser elaborado previamente à emissão das licenças e
Este instrumento (EIV) é instrumento de mediação entre
os interesses privados dos empreendedores, que garante
o direito à qualidade urbana de quem mora ou transita no
entorno da obra.
Nos artigos 36 a 38 do Estatuto da Cidade, determina-se
que o estudo seja elaborado pelo empreendedor, sendo
analisado e aprovado pelo poder público.
Conforme o artigo 37, a análise dos impactos ambientais
contemplada na elaboração do EIV deve abranger alguns
aspectos, como: adensamento populacional; os equipamentos urbanos e comunitários; o uso e ocupação do solo;
valorização imobiliária; geração de tráfego; demanda por
transporte público; paisagem urbana; patrimônio natural e
cultural.
Por meio do estudo é possível controlar os efeitos do planejamento urbano e ambiental do empreendimento, propondo
ações mitigadoras e compensatórias que minimizem os da-
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nos ambientais e descontroles urbanísticos. Logo, o EIV é
considerado um instrumento significativo de análise e controle das questões de políticas públicas urbanas.
O objetivo do EIV parece-nos que seja democratizar a tomada de decisão sobre os grandes empreendimentos das
cidades, sugerindo adequações e melhorias no projeto.
As vantagens do EIV poderiam ser traçadas como: contribuir
para a aprovação do empreendimento; estabelecer condições ou contrapartidas para o funcionamento do empreendimento; apresentar propostas de adequações necessárias
para a defesa ambiental, viabilizando o empreendimento;
recomendar o direcionamento dos ajustes necessários na
infraestrutura do entorno, a fim de melhorar ou minimizar os
impactos gerados para a região urbana15.
Podemos ainda ressaltar que o EIV destina-se a medir o impacto dos novos empreendimentos no espaço urbano e apontar modificações no projeto, seja este público ou privado, com
intuito de eliminar ou minimizar os efeitos indesejáveis.
Caberá a administração pública impor a execução de intervenções urbanísticas à expensas do interessado para melhorar a
capacidade de infraestrutura do bairro ou da região, pois não
seria razoável atribuir esse ônus ao conjunto da sociedade.
Embora seja tarefa do Município determinar quais os tipos de empreendimentos ou atividades que estarão sujeitos ao Estudo, a proteção do bem estar social cabe
às entidades estatais (União, Estado e Município) porque
todas elas são instituídas para a defesa dos interesses da
comunidade16.
Em geral, a predominância dos interesses do Município
justifica-se pelo interesse local, sendo assim caracterizada
toda matéria que guarde uma ligação direta com as necessidades e os interesses do Município cuja repercussão recai na vida de seus habitantes. Contudo, a mesma matéria
pode ter influência nas esferas de interesse da União ou do
Estado, justificando-se a intervenção destes entes, inclusive na esfera judicial quando tal circunstância ocorrer.
A ordem urbanística deve ser defendida pelo Ministério Público no sentido de garantir o meio ambiente urbano de qualidade e exigir dos Poderes Públicos a regulamentação dos institutos criados pelo Estatuto da Cidade, dentre os quais o EIV.
A fundamentação dessa exigência decorre do artigo 30 da
CF que em seu inciso I determina a competência do Município para legislar sobre assuntos de interesse local conjugado com o artigo 182 da CF que determina ao Município
a tarefa de executar a política de desenvolvimento urbano
com o objetivo de ordenar o pleno desenvolvimento das
funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus
habitantes.
Uma vez deixando de exercer esta competência e ocorrendo
lesão ao patrimônio público em virtude dessa omissão, seja
ela dolosa ou culposa, a chamada Lei de Improbidade Administrativa garante a responsabilização do agente público
com integral ressarcimento do dano (art. 5º da Lei 8.249/92).
Por fim, é importante notar que o EIV não deve discutir impactos ou danos ambientais uma vez que estes devem ser analisados em outra espécie de estudo, o EIA (Estudo de Impacto
Ambiental), não havendo de se confundir os dois institutos.
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6 – REGULAMENTAÇÃO DO EIV EM SÃO PAULO
A Lei Orgânica do Município de São Paulo de 1990, no seu
artigo 159, determinou que os projetos de implantação de
obras ou equipamentos de iniciativa pública ou privada,
legalmente definidos como de significativa repercussão
ambiental ou na infraestrutura urbana, deveriam vir acompanhados de relatório de impacto vizinhança (RIVI), assegurada a realização de audiência pública, sempre que requerida, na forma da lei, pelos moradores e associações.
Ao Plano Diretor de São Paulo (Lei nº 13.430/02) definiu no
seu artigo 257 a obrigatoriedade do EIV e seu respectivo
Relatório de Impacto de Vizinhança (EIV/RIV) para os empreendimentos ou atividades especificados em lei municipal, previamente à emissão de licenças ou alvará de construção, reforma ou funcionamento.
Mesmo antes desse da promulgação do Estatuto da Cidade, o Município de São Paulo já contava com legislação
própria dispondo sobre o Relatório de Impacto de Vizinhança – RIVI através do Decreto nº 34.713/94, alterado pelo
Decreto nº 36.613/96.
Na verdade este Decreto é vigente até hoje pelo fato de
que nele se define quais os empreendimentos que estão
sujeitos à elaboração do EIV como condição de obtenção
de licença urbanística. O critério adotado para determinar
a exigibilidade, ou não, do EIV, foi a da área construída em
relação ao tipo de atividade prevista para o imóvel.
Estão sujeitos ao EIV, para área industrial, aquela com construção igual ou superior a 20.000 metros quadrados, para
construção institucional, igual ou superior a 40.000 metros
quadrados; para estabelecimentos destinados a serviços
ou comércio, igual ou superior a 60.000 metros quadrados;
e, por fim, para empreendimentos com finalidade residencial, igual ou superior a 80.000 metros quadrados (art. 1º do
Decreto 34.713/94).
7 – O EIV, DIREITO DE CONSTRUIR E O DIREITO DE VIZINHANÇA
O EIV não deve ser visto como derivação do direito de construir e nem tão pouco como limitação do direito de construir.
O direito de construir e o direito de vizinhança são ramos
de ordem privada e disciplinam a construção e seus efeitos
nas relações com terceiros, enquanto o direito urbanístico
ordena o espaço urbano enunciando regras estruturais e
funcionais da edificação urbana coletivamente considerada.
No caso do direito de construir (regra inserida nos direitos
de vizinhança), sob o aspecto do Direito Civil, a liberdade é
plena, com exceção da alguma lei ou regulamento impeça a
construção. É o que se infere do artigo 1.299 do CC, segundo o qual “o proprietário pode levantar em seu terreno as
construções que lhe aprouver, salvo o direito dos vizinhos e
os regulamentos administrativos”.
Caio Mário da Silva Pereira comenta o referido artigo: “O
proprietário tem o direito de levantar em seu terreno as
construções que lhe aprazam. É uma verdade tão comezinha que não haveria mister enunciar-se. No entanto, a lei
proclama mais um com o propósito de lhe imprimir um condicionamento: a observância a regulamentos administrati-
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vos que subordinam as edificações a exigências técnicas,
sanitárias e estéticas; e o respeito ao direito dos vizinhos
que não deve ser violado pelas edificações”17.
Neste dispositivo do Código Civil notam-se duas premissas
fundamentais: a proteção do direito dos vizinhos e o impedimento de erigir edificações contrariamente aos regulamentos
administrativos, consubstanciados em diplomas legais especiais, editados pelo poder público competente, no que diz respeito à segurança, forma, higiene e estrutura das edificações.
Hely Lopes Meirelles aborda sobre o tema da seguinte forma:
“ No poder de levantar em seu terreno as construções que
entender está consignada, para o proprietário, a regra da liberdade de construção; na proibição do mau uso da propriedade está o limite dessa liberdade. A normalidade o direito
de construir se traduz no respeito ao direito dos vizinhos e às
prescrições administrativas sobre a construção”18.
No que diz respeito a concessão de licença, existe a possibilidade de revisão, pela Administração ou a cassação. Em
matéria ambiental, a Resolução do Conama nº 237/97, em
seu artigo 19, trata de hipóteses em que a licença pode ser
revisada ou cancelada em razão de violação de normas legais, omissão de informações ou superveniência de graves
riscos ambientais e de saúde.
8 – LICENÇA URBANÍSTICA E O EIV
A licença urbanística, como o alvará e a autorização para
edificar ou promover reformas, consiste em ato administrativo emanado do Poder Público, mediante requerimento do
interessado.19
Trata-se o Direito de Construir de limitação da liberdade
de edificar, a qual se faz necessária a fim de evitar consequências danosas à coletividade, já no caso da licença para
construir, ou mesmo para ampliar obra pré-existente, deve
sim ficar condicional à prévia verificação do impacto que
aquele empreendimento pode causar, conforme as hipóteses estabelecidas por lei municipal.
No que diz respeito ao alvará coexistem duas espécies, que
são a autorização e a licença. A distinção fundamental consiste no fato de que a licença é definitiva, ou seja, o confere
ao seu titular o reconhecimento do direito de, por exemplo,
edificar ou demolir no terreno. Importante ressaltar que a
Súmula 473 do STF20 permite que a Administração, com
base no seu poder de autotutela, anular seus próprios atos,
quando eivados de vícios que os tornam ilegais, já a autorização representa uma liberalidade da Administração que
pode ser revogada a qualquer tempo segundo seu próprio
juízo de conveniência.
Um dos pontos de intersecção que se percebe entre o Direito Urbanístico e o Direito Civil, é que tanto o Poder Público
tem o direito de fazer cessar as interferências pelo mau uso
da propriedade como também o particular pode fazer uso
desse direito se o uso inadequado atentar contra s segurança, sossego ou saúde de quem habita o imóvel vizinho.
Lucia Valle Figueiredo define a licença para construir : “Dissemos ser licença ato constitutivo-formal por entendermos que
não é, por seu intermédio, criado o direito. Perfilhamos, destarte, o entendimento do ilustre Oswaldo Aranha Bandeira
de Mello, quando, distinguindo autorização da licença, assim
se expressou: o primeiro (autorização) cria direito, ao ampliar
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as faculdades jurídicas de quem recebe a autorização, enquanto que o segundo (a licença) consiste em acertamento
constitutivo-forma, pois se trata de declaração recognitiva de
direito, de asseguramento da situação jurídica”21.
Os atos de concessão de licença urbanística são vinculados, significando que, uma vez cumpridas as exigências legais, a licença deve ser concedida pela autoridade pública
ao interessado.
Nesse sentido José Afonso da Silva preleciona: “ A licença reconhece e consubstancia um direito do requerente. Trata-se,
porém, de um direito cujo exercício é condicionado ao preenchimento de determinadas exigências e de alguns requisitos
impostos em lei. A outorga da licença significa o atendimento dessas exigências e requisitos, salvo se a própria licença
houver sido liberada com desrespeito às normas legais, caso
em que será inválida, não surtindo aqueles efeitos”22.
Diante do quanto ensina o referido autor, nesta mesma obra,
que podemos considerar que são cinco os princípios gerais relacionados às licenças urbanísticas: a) necessidade,
pois o interessado é obrigado a requerê-las sempre que a
lei assim exigir; b) indispensabilidade pois a administração
não poderá dispensá-las nem substituí-las por qualquer outra exigência ou compensação; c) caráter vinculado, uma
vez que não podem ser legitimamente negadas quando o
requerente preencher todas as exigências de boa margem
de discricionariedade técnica da Administração; d) transferibilidade, posto que as licenças transmitem-se automaticamente aos sucessores no domínio do imóvel; e) autonomia,
no sentido de que as licenças não tem efeito relativamente às relações jurídicas do requerente com terceiros, não
se envolvendo a Administração em questões alheias à sua
competência.23
O procedimento para obtenção de licença edilícia, que são
aquelas destinadas à construção, reforma, ampliação ou
demolição, é composto de três fases: a introdutória, a de
apreciação do pedido e a decisória.
Será justamente na fase introdutória que se estabelece a
relação entre o interessado na obtenção de licença e a Administração urbanística. As partes dessa relação são, portanto, o requerente e a pessoa jurídica de direito público
competente para outorgar a licença. Esta fase instaura-se
pela apresentação do requerimento do interessado que
submete o projeto à aprovação do Município, acompanhado dos documentos legalmente exigidos.
Nesse cenário e, diante do quanto estipula-se o artigo 36
do Estatuto da Cidade será nesta fase que deve ser apresentado o Estudo Prévio de Impacto de Vizinhança para os
empreendimentos ou atividades que a lei municipal exigir,
uma vez que o pedido deve ser instruído com todos os documentos previstos na legislação edilícia e urbanística.
9 – A PARTICIPAÇÃO POPULAR NO PROCESSO DE
ELABORAÇÃO DO EIV
9.1 – DA PARTICIPAÇÃO POPULAR
O artigo 2º do Estatuto da Cidade prescreve que dentre as
diretrizes de Política Urbana a gestão democrática e a audiência do Município e da população nos processos de licenciamento é fundamental (incisos II e XIII do referido artigo).
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Márcio Cammarosano comentando sobre as diretrizes destaca: “ Não será possível um Administrador Público, ou o
Presidente da Câmara de Vereadores, argumentar ser desnecessária ou ineficaz a utilização dos instrumentos de
gestão democrática das cidades, considerados diretriz da
política urbana pelo artigo 2º, II do Estatuto da Cidade. O
planejamento urbano, sobretudo a edição do Plano Diretor,
não poderá mais ser realizado de forma tecnocrática, em
gabinetes, pois a noção de planejamento participativo pressupõe a atuação e oitiva de todos os membros da cidade na
escolha do espaço urbano que efetivamente desejem viver.
Até porque tanto a jurisprudência quanto o Estatuto da Cidade previram sanções para os agentes públicos violadores
das regras de planejamento urbano democrático”.24
Os debates, audiências e consultas públicas, previstos no
artigo 43, II do Estatuto da Cidade, são formas de participação popular no processo administrativo, no sentido de
garantir a gestão democrática das cidades.
Na abordagem sobre as vantagens da participação popular
no processo de elaboração do EIV, Mariana Mencio ensina:“ A necessidade de participação popular decorre do fato
das pessoas que habitam a região serem mais habilitadas
para contribuir com críticas necessárias para elaboração
do estudo, uma vez que é detentora das informações mais
precisas sobre a região e o funcionamento das infra –estruturas públicas no local (...) Ao lado dos aspectos técnicos,
a elaboração e interpretação dos dados do Estudo devem
ser baseadas em uma decisão coletiva, compartilhada entre a Administração Pública e a sociedade, resultando em
um pacto social no qual vários interesses envolvidos sejam
ponderados de maneira a ordenar o território de forma sus-
tentável, assegurando, basicamente, à população espaços
adequados ao lazer, transporte, habitação e trabalho”25.
A audiência pública, portanto, representa uma forma de
intervenção democrática nos processos decisórios dos órgãos públicos e pode ter papel decisivo na elaboração do
EIV, caracterizando-se como instrumento de exercício da
democracia direta, uma vez que possibilita a qualquer interessado intervir diretamente em debates sobre fatos que lhe
dizem respeito à sua comunidade.
10 – EIV (ESTUDO DO IMPACTO DE VIZINHANÇA ) E O
EIA (ESTUDO DE IMPACTO AMBIENTAL)
O Estudo do Impacto Ambiental (EIA) é instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente, previsto no artigo 9º, III da
Lei 6.938/81. Cuida-se de um modelo de estudo que tem
por base um juízo de valor, ou seja, uma avaliação favorável
ou desfavorável a um determinado projeto26.
Trata-se de um estudo técnico complexo que tem por objetivo identificar, prever e interpretar as consequências sobre
o meio ambiente, de uma determinada atividade ou obra,
sendo que as atividades que podem provocar degradação
do meio ambiente encontram-se relacionadas no artigo 2º
da Resolução do CONAMA 01/86.
Para os projetos urbanos, EIA é exigido quando o empreendimento é de grande porte, ou irá se situar em uma área
particularmente frágil, ou ainda quando este vier a ser um
agente de transformação significativa do uso e ocupação
do solo em uma região.
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Diante da leitura do artigo 38 do Estatuto da Cidade o legislador optou por não dispensar a elaboração do EIA nas
hipóteses em que o EIV é exigido. Conclui-se, portanto, que
sempre que a legislação exigir, o empreendedor deverá providenciar ambos os Estudos uma vez que o objeto de cada
um deles é distinto.
10.1 – TRAÇOS COMPARATIVOS ENTRE O EIA E EIV
Tendo em vista que o EIA e o EIV reúnem , entre si, semelhanças e distinções, embora um não exclua o outro no
momento da sua elaboração – cumpre investigar os elementos que podem servir para comparação entre os dois
institutos.
O EIV, assim como o EIA, tem por finalidade orientar a Administração Pública sobre as consequências prejudiciais ou
não de determinado empreendimento. Com efeito, trata-se
de um documento de cunho informativo, cujos resultados
dependem de interpretação do administrador e da avaliação das vantagens e dos riscos envolvidos na aprovação
do projeto em discussão.
Enquanto o EIV cuida de elementos relacionados à política
urbana e à organização da cidade, o objetivo do EIA é voltado a questões do meio ambiente , tendo por fundamento os
preceitos da preservação do meio ambiente e conservação
dos recursos naturais.
Sobre essa semelhança de função entre um e outro, Daniela
Campos Libório Do Sarno esclarece:“ O princípio da precaução aplicável às normas de Direito Ambiental busca valorizar
uma postura preventiva diante de ações que possam trazer
risco de dano ambiental. Para o Direito Urbanístico, a aplicação desse princípio em atos isolados torna-se difícil em
face da complexidade da comprovação do risco. O estudo
do impacto ambiental e o estudo de impacto de vizinhança
tem a função de criar os parâmetros específicos para o empreendimento analisado, verificando possíveis danos na sua
implementação (...) será no plano urbanístico (em especial
non plano diretor) que os valores e as características de qualidade de vida deverão estar delineados. Se assim estiverem,
o descumprimento ao plano será entendido como uma atitude degradante para a qualidade de vida urbana”27.
10.3 – LICENCIAMENTO
Com relação ao licenciamento observa-se que tanto no EIA
quanto no EIV ambos visam informações e elementos técnicos conclusivos a serem apresentados à Administração Pública, como subsídios necessários à tomada de decisão que
permitirá, ou não, o licenciamento pretendido, ou seja, a própria realização do empreendimento ou instalação de atividade.
Enquanto no EIA o objetivo é ter a licença ambiental o EIV
buscará o empreendedor o deferimento do alvará ou a autorização urbanística, sendo que ambas as licenças revelam-se
necessárias para a consecução do novo empreendimento.
10.2 – FINALIDADES DO EIA E EIV
O traço de maior identidade entre o EIA e EIV está concentrado na sua função dentro do ordenamento jurídico.
As licenças, portanto, não se excluem entre si, não basta
ao empreendedor obter apenas uma das permissões para
iniciar e levar a cabo o projeto idealizado. Cada espécie de
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licença conta com regulamentação própria e características
que lhe são inerentes28.
A competência para matéria ambiental é concorrente (art.
24, VI da CF), portanto, tanto a União como os Estados
e Distrito Federal podem legislar sobre o meio ambiente.
Também aos Municípios cabe a tarefa de legislar no que
couber nos termos do artigo 30 da CF.
No que diz respeito ao EIV, tendo em vista o quanto previsto
nos artigos 36 a 38 do Estatuto da Cidade, a competência legislativa e administrativa é do Município a quem cabe expedir
licenças urbanísticas e controlar o uso e a ocupação do solo.
10.4 – QUANTO AO LOCAL DE APLICAÇÃO
O EIV destina-se a avaliar potenciais impactos no espaço
urbano e mais especificadamente na área de influência do
novo empreendimento. O seu conteúdo mínimo deve abordar questões de adensamento populacional, equipamentos
urbanos e comunitários, uso e ocupação do solo, valorização imobiliária, conforme previsto no Estatuto da Cidade.
Já o EIA tema aplicabilidade tanto no meio urbano como
na área rural conforme se vê do artigo 2º da Resolução CONAMA nº 01/86 das atividades sujeitas a esse Estudo para
obtenção da licença ambiental.
10.5 – DISPENSA DO EIV E DO EIA
Para Paulo de Bessa Antunes há possibilidade de ser dispensado o EIV ou EIA quando: “ Tais estudos de impacto,
têm por objetivo investigar os assuntos relacionados como
conteúdo mínimo do EIV. Penso que o EIV é um instrumento
mais do que suficiente para que se avaliem os impactos
gerados por uma nova atividade a ser implantada em área
urbana – não se tratando de atividade industrial, e que o EIV
nada mais é do que um EIA para áreas urbanas e, data vênia, creio ser completamente destituída de lógica ou razão
a obrigatoriedade de ambos os estudos”29.
Diante de tais argumentos e do quanto consta determinado no
Estatuto da Cidade, acreditamos que embora o EIV seja similar ao EIA, não o substitui necessariamente, dependendo da
verificação de cada caso específico pois há situações que no
EIA não foram analisados alguns aspectos econômicos para a
aprovação do projeto que, por sua vez, poderia ser analisado
no EIV, bem como os casos de adensamento populacional,
valorização imobiliária, dentre outros, não se analisa no EIA.
Assim, não se poderia falar em automática dispensa do EIV
em razão da exigibilidade do EIA e nem o inverso.
CONCLUSÃO
A avaliação dos impactos é uma exigência contemporânea,
de uma sociedade que está assistindo ao escasseamento
dos recursos naturais, ao esgotamento dos grandes aglomerados urbanos e a degradação das relações de vizinhança e que não tem mais como viver em sociedade, buscando
padrões de qualidade de vida, sem analisar e incidir sobre
os empreendimentos, as atividade e o seu próprio universo,
a partir da relação estabelecida do projeto com a possibilidade de absorção pelo meio no qual irá se inserir.
O Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV) é mais um instrumento de gestão previsto para avaliação de impactos urbanos.
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Entendemos que é similar ao EIA, porém como estabelece
a própria lei, não o substitui (art. 38, Estatuto da Cidade),
sendo que, é nossa opinião, que nas hipóteses que cabe
EIA não há que se falar em EIV. Ou é um ou é outro.
REFERÊNCIAS
Ambos são instrumentos de gestão para avaliação de impactos, sendo que o EIA é mais complexo, prevê alternativas locacionais e tem assento Constitucional.
ARRUDA Alvim, José Manoel. Comentários ao Código Civil, Vol. XI, Tomo I, Rio de Janeiro:Forense, 2009
Quanto aos empreendimentos sujeitos a elaboração do
Estudo de Impacto de Vizinhança, o artigo 36 do Estatuto
da Cidade, dispõe que Lei municipal definirá os empreendimentos e atividades privados ou públicos em área urbana
que dependerão do estudo. Assim, cada município fixará
critério, por meio de lei municipal, a partir dos quais serão
determinados as atividades e empreendimentos submetidos à regra da lei federal.
Ressalte-se que não será possível disciplinar sobre a matéria via decreto, proveniente do executivo local, necessitando a participação do Legislativo. Desta feita, cada
município terá que fixar critérios pois terá condições de
averiguar quais as atividades podem gerar um distúrbio
de grande porte a ponto e exigir a intervenção do poder
público.
Ainda é relevante ressaltar que a obrigatoriedade na elaboração do EIV não é dirigida apenas aos particulares,
mas também ao Poder Público, motivo pelo qual a exigência do estudo não visa restringir a liberdade do proprietário, mas adequar o empreendimento ao meio ambiente em
que será inserido.
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. Rio de Janeiro: Lumen. 2008
CASSILHA, Gilda Amaral. Planejamento Urbano e Meio
Ambiente, 2010
DALLARI, Adilson Abreu ( coord.). Estatuto da Cidade Comentários à Lei 10.257/01,São Paulo:Malheiros, 2006
DI SARNO, Daniela Campos Liborio. Elementos de Direito
Urbanístico. Barueri: Manoeli, 2004
FERNANDES, Paulo Victor. Impacto Ambiental doutrina e jurisprudência. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005.
FIGUEIREDO, Lucia Valle. Disciplina Urbanística da Propriedade. São Paulo:Melheiros, 2005.
FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Estatuto da Cidade
Comentado. Rio de Janeiro: RT. 2008
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2007
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito de Construir. São
Paulo:Malheiros 2008
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MENCIO, Mariana. A Influencia do Estudo do Impacto de Vizinhança na Expedição da Licença Urbanística para Construção de Empreendimentos ou Atividades com Efeitos Potencialmente Negativos sobre o Meio Ambiente Urbano. In:
PIRES, Luis Manuel Fonseca, MENCIO, Mariana (coords).
Estudos de Direito Urbanístico I – Licenças Urbanísticas e questões polêmicas sobre as exigências da Lei de
Parcelamento do Solo, p. 53/54.
PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições de Direito Civil. Rio de Janeiro: Gen. 2011
SILVA, José Afonso da. Direito Urbanístico. São Paulo:
Malheiros. 2010
SOARES, Lucéia Martins. Estudo de Impacto de VizinhanD
ça. São Paulo: Malheiros, 2006
Notas
1. Arruda Alvim, José Manoel. Comentários ao Código Civil, Vol. XI, Tomo I, Rio de Janeiro:Forense, 2009, p. 281
2. Adilson Abreu Dallari coord. Estatuto da Cidade Comentários à Lei 10.257/01,São Paulo:Malheiros, 2006, pag. 303
3. Dallari. Ob cit. pag. 282
4. Artigo 39 da Lei 10.257/01: “ A propriedade cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no
plano diretor, assegurando o atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida, à justiça social e ao desenvolvimento das atividades
econômicas...”
5. ARRUDA ALVIM, ob. cit. p. 266
6. DALLARI, “Estatuto”..ob.cit. p. 306
7. Na Declaração de Wingspread [1998] (sede da Joyhnson Foundation, em Racine, estado de Wisconsin) aborda-se o Princípio da Precaução da seguinte
maneira:
“Quando uma atividade representa ameaças de danos ao meio ambiente ou à saúde humana, medidas de precaução devem ser tomadas, mesmo se algumas relações de causa e efeito não forem plenamente estabelecidos cientificamente.” (www.fgaia.org.br/texts/t-precau, tradução de Lúcia A. Melin). Na
maioria dos documentos anteriores à declaração do Rio de Janeiro [Rio 92], preponderava o termo prevenção em vez de precaução. E apesar dos referidos
termos apresentarem significados semelhantes, é preciso fazer uma distinção entre ambos para que se possa entender de forma correta o princípio da
precaução. No princípio da prevenção previne-se porque se sabe quais as conseqüências de se iniciar determinado ato, prosseguir com ele ou suprimi-lo.
O nexo causal é cientificamente comprovado, é certo, decorre muitas vezes até da lógica.No princípio da precaução previne-se porque não se pode saber
quais as conseqüências que determinado ato, ou empreendimento, ou aplicação científica causarão ao meio ambiente no espaço e/ou no tempo, quais os
reflexos ou conseqüências. Há incerteza científica não dirimida (www.ecoambiental.com.br/ principal/principios).Assim afirma Canotilho: Comparando-se
o princípio da precaução com o da atuação preventiva, observa-se que o segundo exige que os perigos comprovados sejam eliminados. Já o princípio da
precaução determina que a ação para eliminar possíveis impactos danosos ao ambiente seja tomada antes de um nexo causal ter sido estabelecido com
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evidência científica absoluta. (apud MORATO LEITE, 2000, p. 48). Princípio 15: de modo a proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deve ser
amplamente observado pelos Estados, de acordo com suas capacidades. Quando houver ameaça de danos sérios ou irreversíveis, ausência de absoluta
certeza científica não deve ser utilizada como razão para postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental.
(apud MACHADO, 2001, p.50).Princípio 17: a avaliação do impacto ambiental, como instrumento internacional, deve ser empreendida para as atividades
planejadas que possam vir a ter impacto negativo considerável sobre o meio ambiente, e que dependam de uma decisão de autoridade nacional competente. (apud AYALA, 2000, p.77).Precaução e inversão do ônus da prova – particular deve comprovar que a dúvida que pode animar a precaução é injustificada.
8. FERNANDES, Paulo Victor. Impacto Ambiental doutrina e jurisprudência. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005., p.118
9. CASSILHA, GILDA AMARAL , Planejamento Urbano e Meio Ambiente, pag. 32
10. A Influencia do Estudo do Impacto de Vizinhança na Expedição da Licença Urbanística.., Ob. cit. pag. 61
11. MENCIO, Mariana. A Influencia do Estudo do Impacto de Vizinhança na Expedição da Licença Urbanística para Construção de Empreeendimentos ou
Atividades com Efeitos Potencialmente Negativos sobre o Meio Ambiente Urbano. In: PIRES, Luis Manuel Fonseca, MENCIO, Mariana (coords). Estudos de
Direito Urbanístico I – Licenças Urbanísticas e questões polêmicas sobre as exigências da Lei de Parcelamento do Solo, p. 53/54.
12. A Influencia do Estudo do Impacto de Vizinhança na Expedição da Licença Urbanística ..Ob.cit. pag 54
13. SOARES, Lucéia Martins, Estudo de Impacto de Vizinhança.In: DALLARI, Adilson de Abreu; FERRAZ, Sérgio (coords). Estatuto da Cidade (Comentários
à lei federal 10.257/01), p. 307
14. FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Estatuto da Cidade Comentado, p. 74
15. TJ-SP - Agravo de Instrumento AI 990093669625 SP (TJ-SP) Data de publicação: 12/11/2010
Ementa: COMPETÊNCIA. Capital. Shopping Cidade Jardim. Apresentação prévia do Estudo de Impacto de Vizinhança e do Relatório de Impacto de Vizinhança. Direito urbanístico e posturas edilícias. Área urbana. Questão sem conotação ambiental. Incompetência da Câmara Reservada ao Meio Ambiente.
Devolução à 13a Câmara de Direito Público.
16. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito de Construir. P. 41
17. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito de Construir. P. 41
18. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito de Construir. P. 29
19. STJ - RECURSO ESPECIAL REsp 1148457 DF 2009/0029119-9 (STJ) Data de publicação: 29/04/2010
Ementa: PROCESSO CIVIL. ADMINISTRATIVO. INSTALAÇÃO E FUNCIONAMENTO DE ESTAÇÃO DE RÁDIO BASE (ERB). ACÓRDÃO RECORRIDO FUNDAMENTADO NA LEGISLAÇÃO LOCAL. COTEJO ENTRE LEI LOCAL E LEI FEDERAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. STF. FUNDAMENTO INATACADO.
RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO. 1. O mandado de segurança foi impetrado contra ato do Diretor de Fiscalização de Atividades Urbanas de
Brazlândia/DF, com o objetivo de anular dois autos de notificação e um auto de infração lavrados pela autoridade coatora, em razão de a impetrante ter
instalado, sem prévia licença distrital, torre de telefonia para operar uma Estação de Rádio Base (ERB). Alega-se que a regulamentação da matéria é atribuição exclusiva do poder público federal. 2. Para o acórdão recorrido, a prévia licença do poder público distrital para a instalação de ERB fundamenta-se na
Lei Distrital 2.105/98 - que dispõe sobre a obrigatoriedade de licenciamento para a edificação de obras em área urbana ou rural; bem como na Lei Distrital
nº 3.446/2004, a qual preceitua a necessidade de a licença para o empreendimento ser precedida de audiência pública e de relatório de impacto sobre
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a vizinhança. Não se presta o apelo especial à análise da legislação local. Incidência da Súmula 280/STF. 3. A teor do disposto no art. 102 , III , c e d , da
Constituição Federal , com a redação dada pela EC 45 /2004, compete ao STF julgar, em recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última
instância, quando a decisão recorrida julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face da Carta Maior . 4. O recorrente não suscitou ofensa à Lei
Federal nº 8.919 /94, utilizada pelo Tribunal a quo para fundamentar que a competência privativa da União para legislar sobre telefonia não excepciona a
incidência das normas federais, estaduais e municipais sobre construções, escavações e logradouros públicos. A falta de impugnação a esse fundamento
obsta o conhecimento do apelo nobre, ante a incidência da Súmula 283/STF. 5. Recurso especial não conhecido.
20. Súmula 473 STF: “A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.”
21. FIGUEIREDO, Lucia Valle. Disciplina Urbanística da Propriedade, p. 129
22. SILVA, José Afonso da. Direito Urbanístico. P. 440
23. OB.CIT, P. 441
24. CAMMAROSANO, Marcio, Prefácio à obra: Regime Jurídico da Audiência Pública na Gestão Democrática das Cidades”, de Marina Mencio, p. 14
25. MENCIO, Mariana. A Influencia do Estudo do Impacto de Vizinhança na Expedição da Licença Urbanística..ob cit. p. 75/79
26. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro, p.194/195
27. DI SARNO, Daniela Campos Liborio. Elementos de Direito Urbanístico, p. 101.
28. Tramita no Congresso projeto de lei 3.057/00 – Lei de Responsabilidade Territorial - que trata de regras simplificadas para regularização fundiária sustentável e para que se possa haver o licenciamento integrado de parcelamento do solo, compreendendo os aspectos urbanísticos e ambientais.
29. ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental, p. 315/316.
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