O tema da entrevista é a possibilidade de aborto em caso de microcefalia (doença em que a cabeça e o cérebro da criança são menores que o normal para a sua idade) após comprovação médica de que o bebê vai nascer sem chance de vida. Queremos saber o posicionamento Federação Espírita sobre o assunto. O juiz goiano Jesseir Coelho já declarou que autoriza o aborto se o médico emitir o diagnóstico. O aumento dos casos de microcefalia em todo o país tem suscitado, mais uma vez, a discussão sobre malformações congênitas e aborto. Inicialmente gostaríamos de fazer algumas considerações. As malformações congênitas são a segunda causa de mortalidade infantil e atinge cerca de 7,5% das crianças menores de 5 anos, elas podem ser de origem genética, mas podem ser consequências de uma infecção intraútero ou do uso de medicações, outras ainda permanecem sem etiologia definida. A microcefalia é a diminuição do tamanho do cérebro, associado em 90% das vezes a um atraso cognitivo, mas de grau extremamente variável e de difícil mensuração nos primeiros dias de vida, quanto mais intra-utero. Não só o Zika pode levar a microcefalia, mas outros agentes como a Toxoplasmose, o Citomegalovírus a Rubéola entre outros. Além disso, uma criança pode ter sido gerada sem nenhuma anomalia genética, sem infecções, mas durante o parto sofrer o que chamamos de anóxia perinatal, ou seja, “falta de oxigênio” e evoluir com microcefalia. Portanto esta é uma condição que poderá ocorrer no pós-parto também. O ponto principal e que não podemos deixar de mencionar é a neuroplasticidade cerebral, que na criança é surpreendente. Já tivemos a oportunidade de acompanhar muitas crianças com lesões cerebrais por infecção, outras por AVC- acidente vascular cerebral - que tiveram mais da metade do cérebro comprometido e que evoluíram com discretas deficiências, contrariando o prognóstico inicial. Predizer que uma microcefalia diagnosticada por ultrassom será incompatível com a vida é arriscar no escuro. Proibir o seu nascimento, é arbitrariedade inaceitável. Só quem pode determinar quem vive e quem morre é Deus, assim como o tempo de vida de cada ser. A vida começa na fecundação, é o que nos ensina os livros de embriologia humana. A alma se liga ao corpo na fecundação é o que nos ensina a Doutrina Espirita na pergunta 344 de “O Livro dos Espiritos”. Também nos ensina que a reencarnação é sublime oportunidade de recomeço e de aprendizado; que o corpo é uma benção que auxilia o progresso do Espírito, independente do tempo de vida, seja horas, dias ou longos anos. Para a Doutrina Espirita a vida é um bem inalienável e que deve ser respeitada desde a fecundação e, por isso, todo abortamento provocado é considerado contrário a Lei de Deus; exceção feita nos casos de risco da vida materna, vide as questões 357-360 do referido livro. Entretanto cada pessoa tem sua livre escolha, tal qual uma semeadura que inexoravelmente resultará em colheita, lembrando que o evangelho de Jesus nos ensina que não devemos condenar ninguém, só a Deus cabe julgar. Dessa forma a FEEGO e a AME-Goiás se posicionam contrárias ao aborto em todos os casos, com exceção feita nos casos em que a mãe corre risco de vida. Dra Ana Paula Vecchi Pediatra e Reumatologista Pediatra pela FMUSP-SP Professora Adjunta da PUC-Goiás Secretária da AME –Goiás (Associação Médico-Espírita)