A necessidade de fundamentação da moral Duas perspetivas filosóficas diferentes: a teoria deontológica de Kant e a teoria utilitarista/consequencialista de Stuart Mill A necessidade de fundamentação da moral O estudo destas 2 teorias procura responder às questões: Qual o fundamento da moralidade? Qual o critério para avaliar a moralidade das acções? Teoria deontológica: o critério é o respeito pelos princípios Teoria utilitarista / consequencialista: o critério são as sequências que resultam da acção con A necessidade de fundamentação da moral O que é que torna boas/más (corretas/incorreta s) as nossas ações? A intenção das mesmas Ética Kantiana As suas consequências Utilitarismo A ética deontológica de Kant 1. A ética é um sistema de regras absolutas; 2. O valor moral das ações provém das intenções com que são praticadas; 3. As regras morais devem ser respeitadas independentemente das consequências; 4. As regras morais são leis que a razão estabelece para todos os seres racionais. A ética deontológica de Kant Regras absolutas 1. As obrigações morais são absolutas porque não estão sujeitas a excepções, mesmo se aplicá-las tem consequências negativas. 2. Esta é uma caraterística das morais deontológicas: agir moralmente consiste em respeitar direitos. Agir de forma a promover as melhores consequências não é permitido se implicar a violação de um direito. 3. A obrigação de não mentir não varia consoante as circunstâncias. Logo impõe que se diga sempre a verdade. A ética deontológica de Kant Deontologia 1. Nem sempre a ação que tem as melhores consequências previsíveis deve ser praticada. 2. O lançamento da bomba atómica em Hiroxima tinha previsivelmente melhores consequências do que não o fazer: evitava um número de mortos muito superior caso não houvesse a rendição do Japão. 3. Segundo Kant, e os deontologistas em geral, matar pessoas inocentes é sempre moralmente errado, sejam quais forem as consequências de o fazermos. A ética deontológica de Kant Para determinar o valor moral de uma ação é preciso saber a intenção com que foi praticada. Imperativos hipotéticos Tem em conta as contrapartidas que o sujeito pode obter. Fórmula: “Se queres…, então deves…” EX. Se queres ser um grande pianista, então deves praticar bastante. Uma obrigação (ou imperativo) é hipotética quando existe apenas em certas condições, mas não noutras. Não tem uma natureza moral. Obrigações morais • Serão as nossas obrigações morais apenas hipotéticas? • Se a moral fosse seguir regras hipotéticas, só teríamos, por exemplo, a obrigação de ajudar os outros em certas condições, não em todas. • Mas temos o dever de ajudar quem precisa em todas as circunstâncias, quaisquer que sejam os nossos desejos. • A obrigação de ajudar os outros não deixa de existir porque deixámos, por exemplo, de querer agradar. Continua a existir mesmo nesse caso. • Kant conclui que a obrigação de não mentir (como qualquer outra obrigação), não é hipotética. A perspetiva deontológica de Kant Segundo Kant, o que torna uma ação moral? O respeito pelo dever A moralidade das ações resulta apenas e só do cumprimento do de ver São diferentes as ações boas praticadas de acordo com a norma, e as ações morais porque realizadas de acordo com a norma, mas pr aticadas por dever. Legalidade ≠ moralidade (Conforme a norma) (Conforme a norma e o dever) Diferentes tipos de ações Como descobrir a validade moral de uma ação? Diferentes tipos de ações Ações contrárias ao dever – ações imorais que não cumprem as normas; surgem por inclinação sensível. Imoralidade e Ilegalidade Ações conforme ao dever – ações de acordo com as normas mas sem qualquer valor moral . Ocorrem por interesse ou vantagem pessoal ou por qualquer sentimento. Legalidade Ações por dever – ações em cumprimento e respeito pela lei moral e em respeito ao dever. Moralidade A perspectiva deontológica de Kant O que é agir por dever? É agir de acordo com a vontade racional de cumprir o seu dever . É agir de acordo com uma vontade boa. Para Kant, as leis morais são incondicionais e absolutas, apre sentando-se sob a forma de um imperativo categórico. O imperativo categórico é uma espécie de ordem incondicional , que impõe a realização da acção como necessária e justifican do-a como um fim em si mesma. “Age apenas segundo uma máxima tal que possas, ao mesmo tempo, querer que ela se torne lei universal”. (Kant) O imperativo categórico O imperativo categórico corresponde às exigências que a razão nos coloca sempre que queremos agir corretamente. Cada indivíduo, enquanto ser racional, é o autor das regras morais que impõe a si mesmo. Essas normas morais da acção, para serem válidas, devem respeitar as exigências da universalidade e do reconhecimento do ser humano, enquanto pessoa como um fim em si mesmo e nunca como um meio. Deste modo Kant: Afirma a autonomia e a liberdade moral do agente: a moralida de das nossas acções não depende de nada que nos seja dado do exterior (sociedade, Deus…) mas do interior. O homem é livre quando a sua vontade se submete às leis da razão. A moral Kantiana Formal sem conteúdo empírico, a priori autóno ma, universal Diz-nos como devemos agir, mas não diz o que devemos fazer. Imperativo categórico É universal e a priori porque é comum a todos os seres humanos e antecede a própria ação O dever para alcançar um fim A moral Kantiana A moral kantiana é: Formal – porque vazia de conteúdo. Autónoma – os seus princípios não dependem dos fins a atingir. Universal – porque válida para todos a nível de princípios. Racional – os seus princípios refletem a própria natureza da razão. A moral Kantiana A conceção moral de Kant evidencia: Uma ideia de Homem como fim e não como meio. O conceito de Homem como um valor A defesa intransigente do respeito pelo Ser Humano enquanto portador de uma dignidade que, em nenhum momento, poderá ser posta em causa Críticas à ética kantiana A ética kantiana é incapaz de resolver situações de conflito moral Em algumas circunstâncias, cumprir uma obriga ção moral pode implicar deixar de cumprir outra. O cumprimento cego das obrigações morais pode conduzir a consequências funestas. Vejamos… Críticas à ética kantiana Na Segunda Guerra Mundial, durante a ocupação alemã, os pescadores holandeses transportaram clandestinamente nos seus barcos, para países aliados ou neutrais (como a Inglater ra ou a Suécia), milhares de foragidos judeus. Por vezes, os barcos de pesca com refugiados a bordo eram intercetados por barcos- patrulha nazis. Quando isto acontecia, os pesca dores mentiam e obtinham autorização de passagem, seguin do depois viagem com os judeus perseguidos. Com esta ação evitaram que muitos judeus fossem aprisionados e mortos nos campos de concentração e extermínio nazis. 1. Do ponto de vista de Kant, a ação dos pescadores é moralmente admissível? Fundamenta. Críticas à ética kantiana Os pescadores encontravam-se perante o seguinte dilema: “ou mentimos ou permitimos o homicídio de pessoas ino centes.” Logo, teriam de escolher uma das opções. Segundo Kant, qualquer uma delas é errada, pois as regras morais “não devemos mentir” e “não devemos matar” ou permitir o assassínio de inocentes (como neste caso), são absolutas. Então, o que fazer? Kant não saberia responder perante este conflito porque proíbe ambas as possibilidades de ação: mentir ou deixar matar inocentes já que qualquer uma delas é moralmente incorreta. Por vezes, a defesa de regras morais absolutas choca com a realidade. A teoria consequencialista/utilitarista de Stuart Mill O que torna as ações boas ou más? Qual o critério para as avaliar? Segundo Stuart Mill: O princípio moral em que se baseia o utilitarismo é a utilida de ou o princípio da maior felicidade. Assim, uma ação é boa quando promove a felicidade, a “única coisa desejável como fim” que é, por isso, boa em si mesma. O que é a felicidade? A felicidade é um estado de prazer (bom) e de ausência de dor ou sofrimento (mau). A teoria consequencialista/utilitarista de Stuart Mill O pensamento ético de Mill tem como base o critério do resultado da ação e assenta em 3 pressupostos: Consequencialismo (a ação deve ser avaliada apenas pelo resultado); Hedonismo (a ação deve orientar-se pela procura do prazer); Imparcialidade (a ação deve considerar todos os sujeitos em pé de igualdade). A teoria consequencialista/utilitarista de Stuart Mill O utilitarismo concebe a felicidade do maior número como fim da moralidade. Segundo o utilitarismo: O fim da moralidade é a felicidade geral, não a felicidade indi vidual. O que torna uma ação boa é a sua utilidade, isto é, o seu contri buto para criar a maior felicidade (consequencialismo). Na avaliação das consequências duma ação o que se deve ter em conta é a felicidade/infelicidade ou prazer/sofrimento que ela poderá provocar. Para podermos fazer uma opção moral temos de: A teoria consequencialista/utilitarista de Stuart Mill 1 – Inventariar todas as alternativas possíveis. 2 – Avaliar as consequências de cada uma dessas alternativas. 3 – Selecionar a alternativa que previsível e imparcialmente produzirá maior felicidade/prazer/bem-estar. Para o utilitarismo o critério de avaliação moral das ações é a sua utilidade. • Neste sentido, o importante não é aquilo que nos é mais útil enquanto indivíduos (o que não seria mais do que egoísmo), mas aquilo que proporcionará a felicidade máxima consoante as circunstâncias. A teoria consequencialista/utilitarista de Stuart Mill Para os utilitaristas: bem felicidade prazer (identificam-se) Uma ação é boa quando contribui para a felicidade do maior número de pessoas. Logo: Temos a obrigação moral de agir de modo a produzir os melhores benefícios para o maior número. A teoria consequencialista/utilitarista de Stuart Mill Stuart Mill contrariando os críticos, distingue dois tipos de prazer: Prazeres superiores – qualitativamente melhores, mais durá veis, são os prazeres espirituais ligados a necessidades intelec tuais, sociais, morais estéticas… : o prazer de apreciar um pôr -do-sol ou uma obra de arte, o prazer de partilhar afetos, de ler um livro, de ajudar os outros… Prazeres inferiores – os prazeres sensoriais, corporais, qualitativamente mais pobres, menos duráveis. A teoria consequencialista/utilitarista de Stuart Mill Para Stuart Mill: os prazeres espirituais são os mais valiosos porque: satisfazer os instintos é próprio dos animais; as capacidades superiores são mais importantes que os instintos; somente a satisfação dos prazeres intelectuais e espirituais proporciona felicidade aos seres humanos; A teoria consequencialista/utilitarista de Stuart Mill Aquele que usufrui dos mais altos prazeres espirituais não poderá senão desejar o bem-estar comum, onde se inclui a felicidade do outro. Em síntese: O utilitarismo é uma ética consequencialista: é a acção bem como as suas consequências, que devem ser julgadas e não o caráter do agente ou os seus motivos. A teoria consequencialista/utilitarista de Stuart Mill Os fins justificam os meios? Os utilitaristas foram acusados, frequentemente, de defenderem que os fins a alcançar justificam meios que, habitualmente, considera mos menos próprios (mentir, roubar,…) Contudo, os utilitaristas não aceitam sem restrições segundo o qual os princípios justificam os meios. Assim, será necessário: que o fim seja bom que os meios sejam bons ou que os seus inconvenientes sejam menores do que o bem esperado do fim; que seja como for os meios implicados comportem mais bem (ou menos mal) do que todos os outros que permitiriam alcançar o mesmo fim. A teoria consequencialista/utilitarista de Stuart Mill O valor moral das ações provém das consequências das mesmas; O princípio da felicidade geral deve guiar as nossas ações morais; As escolhas a fazer dizem respeito às circunstâncias; não há regras morais indiscutíveis A teoria consequencialista/utilitarista de Stuart Mill Moral Utilitarista Material – com conteúdo empírico A posteriori Heterónoma Mandamentos hipotéticos Particular A felicidade como bem supremo A teoria consequencialista/utilitarista de Stuart Mill A ética consequencialista é: Empírica – porque derivada da experiência. Hipotética – porque prescreve normas em função de interesses materiais ou fins a atingir (se… então). Heterónoma – a lei moral não provém da razão, mas está condicionada pelos desejos, emana do exterior. Teleológica – (telos) fins Críticas ao utilitarismo O Utilitarismo é acusado, por vezes, de poder justificar ações que habitualmente consideramos imorais. Por exemplo, se estou em dívida para com alguém, mas sei que o dinheiro será utilizado por essa pessoa para com prar droga, que devo fazer? Como quantificar a felicidade? O utilitarismo pode questionar os direitos individuais (ver texto 10, Pág. 136).