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Achados genéticos, audiológicos e da linguagem oral de um núcleo
familial com diagnóstico da síndrome Branquio-oto-renal (SBOR)
Renata H. Furlan 1, Natália F. Rossi 2, Ana Claudia V. Cardoso 3, Antonio Richieri-Costa 1, Suely
M. Motonaga 3 , Célia M. Giacheti 3
1 Setor de Genética Clínica/ Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofacias – HRAC/USP-Bauru.
2 Instituto de Biociências de Botucatu – IBB / Universidade Estadual Paulista – UNESP-Botucatu.
3 Departamento de Fonoaudiologia/ Universidade Estadual Paulista – UNESP-Marília.
Palavras Chave: Audiologia, Linguagem, Síndrome Branchio-Oto-Renal
INTRODUÇÃO
A síndrome Branchio-Oto-Renal; SBOR (OMIM 113650) é uma afecção genética
transmitida por padrão autossômico dominante, descrita por Melnick et al. 1. Os sinais clínicos
descritos pelos autores, seguidos até o momento como indicadores diagnósticos da síndrome,
constituem a presença de fissuras braquiais, fístulas cervicais, anormalidades renais,
malformações estruturais da orelha externa, média e interna, perda auditiva neurossensorial,
condutiva ou mista de grau leve à profundo 2-7.
A incidência desta síndrome está estimada em 1: 40.000 nascidos e corresponde a 2% da
população pediátrica diagnosticada com perda auditiva profunda. A deficiência auditiva é a
característica mais comum desta síndrome, podendo ser detectada em 90 % dos indivíduos com a
SBOR 4.
Esta síndrome apresenta alta penetrância e expressividade variável e o diagnóstico clínico
da SBOR é realizado com a presença de no mínimo 3 dos principais achados supracitados, ou na
presença de 2 ou mais membros afetados na família 8. Vários estudos descreveram a mutação no
gene EYA1 no braço longo do cromossomo 8 (8q13.3) como a base molecular desta condição
genética
9-11
. Porém, recentemente, outras pesquisas identificaram mutações no gene SIX5, o que
sugere a existência de mais um gene relacionado à etiologia da SBOR 12.
Apesar da característica mais comum desta síndrome ser a deficiência auditiva, estudos
relacionando essa característica à possíveis alterações de linguagem ainda são escassas na
literatura.
OBJETIVO
Caracterizar o fenótipo da SBOR, enfatizando os aspectos genéticos e fonoaudiológicos de
11 indivíduos de uma mesma família diagnosticados com esta síndrome.
MATERIAL E MÉTODO
Figura 1. Heredograma
I
1
2
I
1
3
2
4
5
III
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IV
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13
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15
Foram avaliados 11 indivíduos com faixa etária variável de ambos os gêneros com
diagnóstico clínico da síndrome de BOR. No heredograma (Figura 1) é possível verificar que 11
dos 27 indivíduos da família são afetados pela síndrome e apresentam os principais sinais clínicos
que inclui: fistula pré-auricular (Figura 2), queixa de hipoacusia, deformidades de orelha e queixas
renais. Nem todos os indivíduos afetados puderam realizar os procedimentos fonoaudiológicos,
por residirem em outras localidades.
Figura 2. Note a presença de fistula pré-auricular em um dos casos descritos neste estudo
diagnosticado com a SBOR.
Para audiometria tonal limiar e logoaudiometria foi utilizado o audiômetro GSI-61(padrão
ANSI S 3.6-1989 e S3.43-1992) com fones TDH-50. As medidas de imitãncia acústica foram
obtidas por intermédio de um imitanciômetro GSI-38 (Grason Stadler), com tom puro de corda de
226 Hz, com fone intraauricular e sistema de sonda. Após a vedação do meato acústico externo,
foi efetuada a timpanometria e a pesquisa dos limiares do reflexo acústico do músculo estapédio,
modo contralateral, nas freqüências sonoras pré-estabelecidas de 500, 1.000, 2.000 e 4.000 Hz.
Realizamos a investigação audiológica em todos os indivíduos da terceira geração e em
dois da quarta geração (IV-11 e IV-12).
A avaliação da fala e da linguagem foi realizada no núcleo familial correspondente aos
indivíduos III-12, IV-11 e IV-12. Foi realizada a avaliação clínica da fala e da linguagem oral,
expressiva e receptiva, abrangendo as habilidades sintática, semântica e pragmática,
complementada com a aplicação dos testes Token
Psicolingüísticas (ITPA)
13
e Teste Illinois de Habilidades
14
. A aplicação do teste Token foi realizada nos 3 indivíduos e o ITPA foi
aplicado apenas no indivíduo IV-12 respeitando os critérios de idade cronológica previsto pelo
teste.
RESULTADOS
A avaliação audiológica realizada nos indivíduos da terceira geração identificou perda
auditiva do tipo mista, simétrica, de grau severo bilateral em 1 indivíduo com a SBOR (III-12). Os
demais indivíduos, tanto afetados (III-2, III-3, III-9 e III-16) como não afetados pela síndrome
apresentaram limiares audiométricos dentro dos padrões de normalidade
15
. Na quarta geração,
onde há 4 indivíduos com a SBOR, foi possível realizar a investigação audiológica apenas nos
indivíduos IV-11 e IV-12 com a SBOR. Os resultados audiológicos apontaram para perda auditiva
do tipo condutiva, assimétrica, de grau leve para orelha direita e moderado para a esquerda (IV11); perda auditiva do tipo mista, assimétrica, de grau leve para a orelha direita e severo para a
esquerda (IV-12). O indivíduo IV-11 apresentou curva timpanométrica do tipo C na orelha direita e
do tipo B na esquerda, com reflexos acústicos, modo contralateral, ausentes; e o indivíduo IV-12
curva timpanométrica do tipo A na orelha direita e do tipo B na esquerda, com reflexos acústicos,
modo contralateral ausentes em ambas as orelhas.
A avaliação da fala e linguagem (III-12, IV-11 e IV-12) evidenciou hipernasalidade de grau
variado nos 3 indivíduos. O indivíduo III-12 (genitora) apresentou histórico de correção cirúrgica de
fissura palatina, caracterizando ininteligibilidade de fala de grau severo. A genitora apresentou
também intensidade vocal fraca, disfluências comuns e imprecisão articulatória. A ininteligibilidade
de fala das filhas (IV-11 e IV-12) é de grau leve e foi associada à velocidade de fala aumentada e
imprecisão articulatória. As filhas apresentaram resultados dentro dos padrões de normalidade
para os aspectos da linguagem oral e a genitora apresentou alterações nas habilidades,
expressiva e receptiva da linguagem. No teste Token, a genitora apresentou dificuldade de
compreensão de grau leve e as filhas apresentaram resultados dentro do esperado para idade e
escolaridade. No ITPA o indivíduo IV-12 apresentou escore aquém da idade cronológica nos
subtestes de recepção auditiva e visual, associação visual, expressão verbal, closura gramatical,
auditiva e combinação de sons.
DISCUSSÃO
Conforme apresentado na literatura compilada o diagnóstico clínico da SBOR é realizado
com a presença de no mínimo 3 dos principais achados clínicos, ou na presença de 2 ou mais
membros afetados na família 8,16. Os casos afetados descritos neste estudo satisfizeram ambas as
exigências para o diagnóstico genético clínico; correspondendo tanto a presença dos principais
sinais clínicos encontrados que incluiu a presença de malformações estruturais da orelha externa,
perda de audição do tipo neurossensorial, condutiva ou mista, fístulas pré-auricular e
anormalidades renais
2-7
;e também a recorrência familial caracterizando o padrão de herança
autossômico dominante 1, ilustrado pelo heredograma na figura 2.
A investigação audiológica realizada em alguns membros desta família, incluindo
indivíduos com e sem diagnóstico da SBOR possibilitou a identificação de perda auditiva tanto
condutiva quanto mista e achados timpanométricos condizentes com os dados da literatura 2-7.
Quanto aos aspectos da fala e da linguagem nota-se que os indivíduos avaliados com a
SBOR (III-12, IV-11 e IV-12) apresentaram alterações de fala como parte do fenótipo da síndrome
incluindo prejuízos com comprometimento variável entre os mesmos quanto a ressonância e
velocidade de fala. Tais manifestações estiveram associadas ao quadro de ininteligibilidade de
fala, também variável quanto ao nível de comprometimento. A presença de dificuldades de
linguagem, ressaltando aspectos receptivos, mas principalmente expressivos observados em um
dos indivíduos (III-12) mostraram a presença de prejuízos sintáticos e semânticos como parte do
fenótipo deste indivíduo. Destaca-se, porém, que a produção verbal mais comprometida deve-se à
associação de manifestações relacionadas à fala, considerando ainda que este caso foi o que
apresentou nível mais comprometido de hipernasalidade, disfluências da fala e o quadro de
ininteligibilidade.
Ressalta-se, no entanto, que não foram encontrados na literatura compilada estudos que
utilizassem testes que avaliam habilidades específicas que subjazem a linguagem, como as
habilidades auditivas e visuais testadas no ITPA. Conforme descrito nos resultados, a presença de
dificuldades apontadas no desempenho do indivíduo IV-12 é sugestiva, principalmente, de
prejuízos no processamento auditivo da informação, o que sugerem relação com os achados
audiológicos.
Especula-se a partir dos resultados encontrados que a variabilidade de manifestações
fonoaudiológicas, bem como quanto ao nível de comprometimento, seja nos aspectos da fala
como da linguagem; podem ser justificadas pelo fator de penetrância e expressividade variável da
síndrome 8,16.
Para tal constatação, principalmente quanto aos aspectos relacionados à linguagem,
sugere-se que estudos mais específicos sobre este tema poderiam confirmar se esses dados
podem ou não constituir o espectro da SBOR, uma vez que não foram encontrados relatos na
literatura compilada.
CONCLUSÃO
Concluímos que o fenótipo dos indivíduos com a SBOR, avaliados neste estudo, inclui a
presença de prejuízos auditivos; freqüentemente descrito na literatura. Quanto aos aspectos da
fala e da linguagem este estudo concluiu que os prejuízos mais comuns entre os indivíduos
avaliados foram decorrentes de alterações na ressonância e velocidade de fala; ainda que um dos
casos avaliados tenha apresentado prejuízos relacionados à linguagem, o que sugere que
quadros de distúrbio de linguagem/aprendizagem podem compor o fenótipo desta síndrome.
Estudos associando a investigação audiológica dos aspectos de fala e linguagem podem
contribuir para o conhecimento do fenótipo desta condição genética e apontar para programas de
intervenção mais específicos a necessidades desses indivíduos.
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