SER E ESSÊNCIA EM STo ANSELMO Fernanda Ferreira de Campos (PIBIC/CNPQ-Fundação Araucária-UEM), Marco Aurélio Oliveira da Silva (Orientador), e-mail: [email protected]. Universidade Estadual de Maringá/Departamento de Filosofia/Maringá, PR. Área: Ciências Humanas Sub-área: Filosofia Palavras-chave: Deus; existência; Filosofia Medieval. Resumo O objetivo deste projeto é analisar as provas da existência de Deus, tal como formuladas nos tratados Monologion e Proslogion de Anselmo de Cantuária. Esse problema acerca da existência de Deus ocupa grande parte da história da filosofia, desde a antiguidade até nossos dias. Desta forma, podemos encontrar em inúmeros filósofos respostas acerca da existência de Deus. Uma das respostas sobre a existência divina é dada por Santo Anselmo, tanto no Monologion (1076) quanto no Proslogion (1077), dois de seus principais escritos. No Monologion, o autor parte de uma realidade dada, da experiência, para elaborar as provas da existência de Deus. No Proslogion, o autor desenvolve um argumento único, posteriormente denominado por Kant como “argumento ontológico”. Esse argumento ontológico afirma a existência de Deus a partir de sua definição, dizendo ser Deus “algo tal que não se pode pensar nada maior”, desta forma, devendo existir tanto no pensamento quanto na coisa, na realidade. Esta pesquisa investiga o modo pelo qual o homem pode falar de um modo adequado, dentro de seus limites, sobre o ser de Deus. Introdução A humanidade sempre buscou, e ainda busca, compreender algo a respeito de Deus e de sua existência, seja esse Deus cristão ou não. Isso ocorre pelo desejo humano de responder a certas perguntas, tais como : “de onde viemos e para onde vamos?”, da mesma forma ocorre com Deus e sua existência. Após tantos filósofos terem anunciado a morte de Deus, ou terem afirmado a impossibilidade de se provar sua existência, ainda assim a humanidade busca a Deus e anseia por encontrá-lo. Essa não é uma busca somente do homem contemporâneo, pois o problema acerca de Deus ocupa grande parte da história da filosofia desde a antiguidade até nossos dias. Na Idade Média, o Deus admitido e reconhecido pela fé torna-se também matéria do entendimento, isto é, o homem pode vir a alcançar certo entendimento daquilo que Deus é. Anselmo de Cantuária (1033-1109), um autor medieval do séc. XI, procurou provar a existência de Deus. Para tanto, quis utilizar-se apenas de Anais do XIX EAIC – 28 a 30 de outubro de 2010, UNICENTRO, Guarapuava –PR. sua própria razão. O Doutor Magnífico procurava discutir os artigos de fé em um campo neutro, o da razão, no qual todos, tanto os que crêem quanto os que não crêem, pudessem entender a dinâmica da argumentação e as conclusões às quais o autor chegou. A fé era o ponto de partida da discussão sobre a existência de Deus, mas era através da razão que o autor procurara fundamentar sua crença. Revisão de literatura Para a elaboração dessa pesquisa, contamos prioritariamente com as obras de Anselmo de Cantuária, os dois tratados intitulados “Proslogion” e “Monologion”. Também foram utilizados obras de literatura secundária para o desenvolvimento dessa pesquisa. Resultados e Discussão Anselmo de Cantuária ao investigar a existência de Deus ocupa-se com o tema da relação entre fé e razão. Esses dois termos muitas vezes são considerados antagônicos, mas são vistos por Anselmo como dois lados de uma mesma moeda, ou seja, dois pontos de vista distintos que caminham juntos no processo de ascensão ao entendimento de Deus e de sua verdade. Mas a questão é como fé e razão agem no que diz respeito à existência de Deus. E nessa questão, o Doutor Magnífico é de certa forma, bem pontual, afirmando em “nada se persuadir no que se refere à autoridade das Sagradas Escrituras” (CANTORBERY, 2008). Com isso o autor deixa claro que é possível compreender o divino apenas utilizando a razão. Neste caso, a fé entra como plano de fundo da discussão; a fé oferece a matéria que a razão discute. Seguindo o preceito de utilizar apenas sua razão o autor escreve em 1076 o Monologion, no qual constrói provas sobre a existência de Deus. Essas provas fundamentam-se nas noções de bondade, grandeza, ser e graus de perfeição. Analisando a idéia de bem e de bondade, o Doutor Magnífico afirma que “todos aspiram a fruir das coisas que julgam boas”(CANTORBERY, 2008). E nesse processo admite a existência de graus na relação dos sujeitos com as qualidades. Desta forma, o autor constata que quando comparadas entre si, as coisas apresentam-se boas em graus iguais ou diferentes, sendo necessário que isso se dê por um algo que seja o mesmo em todas. E esse algo é único e supremo, algo soberanamente bom por si, do qual todos os demais bens derivam. Seguindo a mesma lógica da análise da bondade, no qual todas as coisas boas são derivadas de um único bem, soberanamente bom por si; ao falar da grandeza, o Doutor Magnífico conclui necessariamente haver algo soberanamente grande, e entenda-se grande como melhor, que também é por si. Esse algo soberanamente grande é tal, pois todas as coisas que são ditas grandes devem-no a esse algo. O ser soberanamente bom e soberanamente grande é também o ser por excelência, pois todos os demais seres derivam sua existência desse ser, que é por si. Tendo Anais do XIX EAIC – 28 a 30 de outubro de 2010, UNICENTRO, Guarapuava –PR. demonstrado, portanto, a existência de um ser que dá origem aos outros seres, Anselmo ressalta a desigualdade que há entre os seres e as coisas, pois nem todas podem ser colocadas no mesmo plano de dignidade. Essa gradação qualitativa dos seres não pode ser infinita, de forma a haver sempre um ser superior ao outro, mas ao contrário, deve haver uma natureza que não admita nenhuma que lhe seja superior; e essa natureza é Deus, o ser soberanamente superior aos demais. Essas são as provas levantadas no Monologion; que são derivadas da experiência. Já no Proslogion, o Doutor Magnífico procurava por um argumento único, que se provasse a si mesmo, sem que fosse preciso para tanto nada além da lógica da argumentação. Esse argumento único ficou conhecido na história da filosofia como “argumento ontológico”, nome dado por Kant. Esse argumento procura provar a existência de Deus a partir de sua definição, afirmando existir “algo tal que não se pode pensar nada maior”. Ao admitir a veracidade da existência de um algo do qual nada maior pode ser pensado, e tendo entendido e compreendido tal sentença, afirma-se a existência necessária desse algo. Esse algo existe tanto no pensamento quanto na realidade, pois existir na realidade é maior do que existir apenas no pensamento, e sendo esse algo o maior, deve existir tanto no pensamento quanto na coisa, na realidade. Desta forma, esse algo tal que não se pode pensar nada maior existe necessariamente, e é Deus. Conclusões Podemos concluir com Anselmo que fé e razão, apesar de teoricamente antagônicas, caminham juntas no processo de entendimento do divino. A razão proporciona uma racionalidade para a fé, que no entendimento de Moacyr Novaes (2007), indica a primazia da razão do ponto de vista da natureza dos homens, mas assegura igualmente a importância da fé. Nesse contexto Anselmo procurou, utilizando-se da razão, provar a existência de Deus. No Monologion, o autor baseou-se numa realidade dada, na experiência, para provar a existência de Deus. Através das noções de bondade, grandeza, ser e graus de experiência, que podem ser vistas na realidade, ele provou a existência de um ser soberanamente bom, soberanamente grande, ser por excelência e soberanamente superior aos demais; sendo esse ser, Deus. Mas não satisfeito com os múltiplos argumentos do Monologion, Anselmo elaborou o Proslogion, no qual elaborou um argumento único, autosuficiente para mostrar que Deus é tal como a fé afirma. Esse argumento não parte da experiência como os outros, mas do pensamento enquanto tal. Agradecimentos Agradecemos ao apoio financeiro à pesquisa promovido pelo PIBIC/CNPQFundação Araucária-UEM. Referências Anais do XIX EAIC – 28 a 30 de outubro de 2010, UNICENTRO, Guarapuava –PR. CANTORBERY, S. Anselme de. Monologion, Proslogion.Trad. Michel Corbin. Les Éditions Du Cerf, Paris, 1986 ANSELME, San. Proslogion. Trad. Judit Ribas y Jordi Corominas. Editorial Tecnos, Madrid,1998 BOEHNER, Philoteus; GILSON, Etienne. História da Filosofia Cristã. Trad. Raimundo Vier. Editora Vozes, Petrópolis, 2003. JEAUNEAU, Édouard. Filosofia Medieval. Trad. Miguel Freitas da Costa. Editorial Verbo, Lisboa, 1968. LIBERA, Alain de. A Filosofia Medieval. Trad. Nicolás Nyimi Campanário; Yvone Maria de Campos Teixeira da Silva. Edições Loyola, 2004. MARTINES, Paulo Ricardo. O “argumento único” do Proslogion de Anselmo de Cantuária. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1997. NOVAES, Moacyr. Fé e Razão. In: A razão em exercício – Estudos sobre a filosofia de Agostinho. Discurso Editorial, 2007. TOMATIS, Francesco. O argumento ontológico: a existência de Deus de Anselmo a Schelling. São Paulo: Paulus, 2003. ZILLES, Urbano. Filosofia da Religião. São Paulo: Edições Paulinas,1991. Anais do XIX EAIC – 28 a 30 de outubro de 2010, UNICENTRO, Guarapuava –PR.