Anais do SEFiM, Porto Alegre, V.02 - n.2, 2016. Apontamentos sobre as estéticas do(s) rock(s) brasileiro(s) nos anos 1970 Notes about the aestheticims of the Brazilian(s) rock(s) in the 1970’s Palavras-chave: Estética; Rock brasileiro; Fato musical. Keywords: Aestheticism; Brazilian rock; Musical fact. Victor Henrique de Resende Universidade Federal de Minas Gerais [email protected] O presente resumo procura mostrar as possibilidades de se pensar nas várias estéticas do(s) rock(s) brasileiro(s) produzido(s) nos anos 1970. Bruce Baugh, em seu artigo Prolegômenos a uma estética do rock (1994), considera que é possível se pensar numa estética do rock. Para o autor, algumas características do rock podem determiná-lo e diferenciá-lo de outros fazeres musicais. Segundo Baugh, podem-se verificar três componentes importantes que definem uma certa estética do rock: a performance dos tons, como, por exemplo, os sons e ruídos executados na guitarra elétrica; a altura, onde é visto que o rock se define por seu volume elevado; e, por fim, o ritmo: o rock é feito para mexer o corpo, para dançar. Por sua vez, Jorge Cardoso Filho (2010) questiona os pressupostos estéticos de Bruce Baugh. Para Filho, é necessário mostrar os elementos técnicos, culturais e econômicos das produções do gênero. O autor afirma que deve-se considerar a estética nas variadas experiências humanas, levando-se em conta a expressão e a experiência musical de cada artista ou grupo, não apenas a performance dos tons, o volume e o ritmo. Para os autores Bernardo Alfredo Mayta Sakamoto e Rosa de Lourdes Aguilar Verástegui (2013), o rock pode ser objeto de fruição estética. Eles contrapõem a visão pessimista de Adorno ao pensamento de Schiller. Para Sakamoto e Verástegui, Adorno nega uma arte e uma estética maiores após os horrores do nazismo, enquanto Schiller defende o projeto de se pensar numa educação estética para o indivíduo. Embora os autores façam uma abordagem um pouco rasa no que se refere às considerações de Adorno, tem-se, contudo, o questionamento: é o rock uma arte de expressão ou uma regressão do gosto da audição? Nesse caso, indaga-se aqui se seria possível pensar numa estética do rock brasileiro para além dos pressupostos de Bruce Baugh. Melhor dizendo, se seria possível pensar nas várias estéticas dos rocks produzidos no Brasil. Foram tomados como exemplo alguns grupos de rock dos anos 1970 devido ao fato de que, nesse período, começam a proliferar várias bandas e a se consolidar um rock produzido em terras brasileiras. Parte-se da hipótese de que não só a performance, o ritmo ou a altura do som, como defende Baugh, configurariam uma estética do rock, quer para o rock produzido no Brasil ou em qualquer outra parte do mundo. Defende-se que todos 82 os possíveis elementos que constituem a música, seja de qualquer gênero, compõem ou configuram diversas estéticas dentro de cada tipo de rock construído e produzido pelos vários artistas e bandas, dentro de um determinado período e lugar, compreendendo aquilo que Jean Molino chama de fato musical. Segundo o autor, “não há, pois, uma música, mas músicas. Não há a música, mas um facto musical. Este facto musical é um facto social total” (MOLINO, 1975, p. 114). A música é, então, resultado de uma prática social e envolve produção, consumo, sonoridades, organologia, iconologia, contexto social, político, cultural e econômico, performance, bem como os discursos sobre o fazer musical. Nos anos 1970, houve uma farta proliferação de bandas de rock no país, que se apropriaram de vários estilos e combinaram diversos instrumentos em sua produção musical, apresentando formas diferenciadas de cantar e de tocar sua música. Por exemplo, o trio Sá, Rodrix & Guarabyra combinou violas, violões e guitarras, além de vários outros instrumentos tradicionais e modernos, e criou,no cenário musical brasileiro dos anos 1970, o conceito de rock rural (LPs Passado, Presente & Futuro, de 1972, e Terra, de 1973). Eles cantaram seu trânsito constante entre cidade e campo, meio urbano e rural. Um tipo de som parecido com o desse trio foi o da banda Recordando o Vale das Maçãs (LP As Crianças da Nova Floresta, 1977), que juntou violões e guitarras, trazendo ideias bucólicas em suas músicas. Produziram, também, canções próximas ao rock progressivo. Já o grupo Matuskela (LP Matuskela, 1973) surgiu com uma sonoridade folk e psicodélica, combinada com samba, baião, bossa nova, guitarras, violões, flautas e percussão, com destaque para letras que expressavam bucolismo. Os Novos Baianos (álbum Acabou Chorare, de 1972), por sua vez, aparecem com misturas de rock, baião, frevo, samba e suas vivências contraculturais no período. A banda Casa das Máquinas trouxe um som mais hard rock (disco Casa das Máquinas, 1974), com visuais extravagantes e performances ousadas para o contexto de repressão social e cultural do regime civil-militar. O grupo O Terço também combinou rock rural e rock progressivo em suas canções, cantando o campo, mas também dialogando com elementos modernos em suas composições, combinando guitarras, violas, teclados e sintetizadores. Importante destacar que dentro das produções de um mesmo grupo encontram-se estéticas e sons diferenciados. Citando como exemplo a banda O Terço, em seus discos encontram-se hard rock (LP Terço, 1973), rock progressivo (LPs Terço, 1973, Criaturas da Noite, 1975, e Casa Encantada, 1976), rock rural (LPs Criaturas da Noite, 1975, Casa Encantada, 1976, e Mudança de Tempo, 1978), aproximações com a contracultura, quando cantam suas experiências no campo, entre vários outros elementos. A sonoridade da banda O Terço ilustra bem essa multiplicidade estética, apresentando, em momentos diversos, composições com guitarras, pianos e violões – uma sonoridade resultante da combinação desses e de outros vários instrumentos, ou produzida a partir da ênfase dos efeitos sonoros de um instrumento sobre os demais. Portanto, como demonstrado, não se pode pensar apenas nas proposições estéticas de Bruce Baugh. Os grupos citados combinaram diversos sons, mostrando não um, mas vários rocks brasileiros. E, para além e apesar da ditadura civil-militar no Brasil, cantaram e tocaram suas percepções sobre a sociedade brasileira do período. 83 Referências BAUGH, Bruce. “Prolegômenos a uma estética do rock”. Novos Estudos, CEBRAP, n. 38, p.15-23, 1994. FILHO, Jorge Cardoso. “Da performance à gravação: pressupostos do debate sobre a estética do rock”. E-Compós, v. 13, n. 2, p. 1-16, maio/ago. 2010. MOLINO, Jean. “Facto musical e semiologia da música”. In: SEIXO, Maria Alzira (Org.). Semiologia da Música. Lisboa: Veja, 1975. p. 109-164. SAKAMOTO, Bernardo Alfredo Mayta; VERÁSTEGUI, Rosa de Lourdes Aguilar. “O rock: regressão auditiva ou liberdade de expressão?” I Congresso Internacional de Estudos do Rock. Anais... Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE, Cascavel-PR, 2013, p.1-15. 84