Ética VII A cosmovisão medieval foi profundamente marcada pela influência cultural e política da Igreja Católica, que articulou nos fundamentos da teologia cristã a filosofia grega. Desta forma, na Alta Idade Média (século II d.C. até séc. IX aproximadamente), Platão foi amplamente utilizado para fundamentar as verdades reveladas da fé cristã. Santo Agostinho (354 – 430 d.C.), partindo de uma perspectiva platônica, divide o mundo entre cidade de Deus e cidade dos homens. Na Baixa Idade Média (séculos XI a XV), ocorre no ocidente por inúmeros fatores econômicos, políticos, sociais e filosóficos, uma espécie de "renascimento" cultural, na medida em que se foi tomando conhecimento, pelo movimento de traduções do árabe, de obras de filosofia, entre elas as de Aristóteles, de matemática, medicina entre outras. É necessário levar em consideração que determinadas obras ocidentais tornaram-se desconhecidas da primeira Idade Média e um autor da importância de Aristóteles, somente “volta” ao Ocidente por meio de traduções do árabe nesse último período. Desta forma, a obra de Aristóteles vai ter uma influência extraordinária na Baixa Idade Média, na medida em que filósofos árabes como Avicena (Abu Ali al-Hussayn ibn Abd-Allah ibn Sina – 980 a 1037) e Averróes (Abul Walid Muhammad Ibn Achmed – 1125 a 1198), constroem seus sistemas filosóficos sobre as bases aristotélicas apresentando-as ao ocidente. Aristóteles (384 - 322 a.C) discípulo de Platão, discorda da dualidade de mundos de seu mestre e funda sua filosofia no que se pode denominar como realismo filosófico. Muitos o consideram o precursor da ciência, na medida em que busca por meio da razão e da experiência explicar através de categorias as causas materiais e formais dos fenômenos. Através da concepção de "ato e potência", procura explicar a dinâmica do devir, daquilo que definimos como realidade. Aristóteles escreveu uma vasta obra sobre diversas áreas do conhecimento: política, lógica, moral, ética, teologia, pedagogia, metafísica, didática, poética, retórica, física, antropologia, psicologia e biologia. É neste contexto de "renascimento", marcado por significativas transformações sociais, políticas e culturais, entre elas o nascimento das primeiras universidades no ocidente, que surge a "Escolástica" como movimento filosófico cristão. Este período do pensamento cristão caracteriza-se pela filosofia ensinada nas escolas pelos mestres, chamados, por isso, escolásticos. As matérias ensinadas nas escolas medievais eram representadas pelas chamadas artes liberais, divididas em trívio - gramática, retórica, dialética - e quadrívio - aritmética, geometria, astronomia, música. Santo Tomás de Aquino (1225 - 1274), surge neste contexto. Reconhecidamente um dos maiores teólogos da Igreja Católica. Seu mérito está no fato de articular a síntese do cristianismo com a visão aristotélica do mundo, de forma a obter uma sólida base filosófica para a teologia e retificando o materialismo de Aristóteles. Em suas duas "Summa", sistematizou o conhecimento teológico e filosófico de sua época: são elas a "Summa Theologiae", a "Summa Contra Gentiles". A partir dele a Igreja passou a ter uma teologia, fundada na revelação e uma filosofia baseada no exercício da razão humana, que se fundem numa síntese definitiva: fé e razão, unidas em sua orientação comum rumo a Deus. Sustentou que a filosofia não pode ser substituída pela teologia e que ambas não se opõem. Em seu pensamento, filosofia e teologia se complementam e não cabe a filosofia o papel de serva da teologia como nos congêneres séculos filosóficos. Afirmou que não pode haver contradição entre fé e razão. Portanto, fé e razão são complementares e não contraditórias. A partir destes pressupostos a ética proposta por São Tomás de Aquino, consiste no homem agir de acordo com sua natureza racional. Dotado de livre-arbítrio todo homem tem capacidade de discernimento entre o bem e o mal, enfim de captar, abstrair, ou apreender a ordem moral; e o primeiro postulado da ordem moral é: "Faze o bem e evita o mal". Neste contexto, para São Tomás de Aquino, há uma lei Divina revelada por Deus aos homens e que consiste nos Dez mandamentos, mas há também uma Lei eterna que se apresenta no plano racional de Deus e que ordena todo o universo como obra de sua criação. Mas ainda uma Lei natural que é articulada por meio da Lei eterna no homem, criatura racional que desta forma é convocado a participar do plano da criação. A participação no plano da criação exige do homem a elaboração da Lei positiva que é o que lhe permite a vida em sociedade. Porém, esta se subordina à Lei Natural e não pode contrariá-la sob pena de se tornar em lei injusta e sendo assim não há a obrigação de obedecer a lei injusta. Assim se estabelece o fundamento objetivo e racional da verdadeira consciência. Desta forma, a ética Aquiniana confere ao homem a responsabilidade e a capacidade de discernimento diante das decisões a serem tomadas. Na perspectiva aristotélica que funda o pensamento de São Tomás, o critério supremo da vida ética é o justo meio-termo, preconizado por Aristóteles: nada de excessivo, ou seja, o alcance da felicidade, finalidade última da existência humana teologicamente concebida na contemplação da realidade na perfeita bondade, na visão de Deus. Portanto, uma ética fundamentada na fé cristã e fundamentada na consciência racional do homem que reconhece o pressuposto da fé. Professor Sandro Luiz Bazzanella - Formado em Filosofia – doutorando em Ciências Humanas UFSC - ViceCoordenador do Curso de Ciências Sociais da UnC-Canoinhas - e-mail: [email protected] Professor André Bazzanella. Formado em filosofia, Mestre em educação e Cultura (UDESC). Diretor Geral do INSTITUTO VERITAS, Professor da FURB (Blumenau) e UNIASSELVI (Indaial). E-mail: [email protected].