INTERAÇõES IÔNICAS E SEUS EFEITOS NA NUTRIÇãO DAS

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INTERAÇÕES IÔNICAS E SEUS EFEITOS
NA NUTRIÇÃO DAS PLANTAS
Maria Ligia de Souza Silva1
Anderson Ricardo Trevizam2
Introdução
A
disponibilidade de nutrientes para as plantas é afetada por diversas reações de natureza física, química
e biológica. Vários mecanismos estão envolvidos,
dentre eles as interações iônicas, cujo efeito pode refletir na composição mineral da planta.
Conforme relatado por Prado (2008), apesar do processo de
absorção de nutrientes ser específico e seletivo, existe certa competição entre eles, podendo ser favorável (sinérgica), quando um íon
auxilia a absorção de outro, ou desfavorável (antagônica), quando
a absorção de um íon é prejudicada pela presença de outro. Marschner (2012) afirma que, na realidade, os transportadores iônicos
raramente são específicos e os íons podem competir diretamente
pelo transporte. Esta competição é influenciada pelas propriedades
do próprio transporte e pela diferença na concentração dos íons na
solução. Espécies, cultivares, como também o estádio de desenvolvimento da planta, influenciam os efeitos antagônicos e sinérgicos.
Íons com propriedades físico-químicas semelhantes (valência e raio iônico) provavelmente compartilham o mesmo transportador. As proteínas transportadoras auxiliam a passagem dos íons que
estão na solução rizosférica pela membrana plasmática, atingindo
o citoplasma das células da raiz.
Diversos estudos são realizados visando aprimorar as formas
de adubação, com o objetivo de atingir a produção máxima das
culturas. Porém, não se pode esquecer que o equilíbrio entre os íons
no sistema solo-planta pode ser um fator limitante fundamental.
As interações entre os elementos afetam desde processos que
ocorrem no solo, como o contato do nutriente com as células da raiz,
como na planta, na absorção, transporte, redistribuição e metabolismo,
podendo induzir desordem nutricional, seja esta por deficiência, seja
por toxidez, refletindo na produção das culturas (PRADO, 2008).
Na literatura encontram-se três classificações de interações,
que são antagonismo, inibição e sinergismo. O antagonismo ocorre
quando a presença de um íon diminui a absorção de outro, independentemente da concentração do íon na solução do solo. Esta
interação pode evitar problemas de toxidez, como, por exemplo, o
cálcio (Ca2+) impede a absorção exagerada do cobre (Cu2+).
Na inibição, a presença de um íon diminui a absorção de
outro. Pode ser dividida em inibição competitiva e inibição não
competitiva. Na inibição competitiva, dois íons competem pelo
mesmo sítio do transportador, diminuindo a absorção dos íons que
estiverem em menor concentração. Isso ocorre particularmente entre
íons com propriedades físico-químicas semelhantes (valência e raio
iônico), sendo que o transportador não consegue distingui-los. Por
exemplo, entre cátions alcalinos como potássio (K+), rubídio (Rb+),
césio (Cs+) e sódio (Na+), e entre ânions, como selenato (SeO42-) e
sulfato (SO42-), dentre outros.
A inibição não competitiva acontece quando os íons não
competem pelo mesmo sítio do transportador. Neste caso, ocorre
redução efetiva da Vmáx (FERNANDES; SOUZA, 2006). Um
exemplo dessa interação é o efeito do K+ e do cálcio (Ca2+) que
frequentemente induzem a deficiência do magnésio (Mg2+).
O sinergismo ocorre quando um íon aumenta a absorção de
outro íon, proporcionando efeito benéfico no desenvolvimento da
planta. Por exemplo, o Ca2+ em concentrações muito elevadas aumenta
a absorção de cátions e de ânions devido ao seu papel na manutenção da
integridade da plasmalema. Esse efeito tem consequência na prática
da adubação, considerando-se que, com a calagem, além de haver
correção do pH do solo também aumenta-se a concentração de Ca2+.
Interações
• Nitrogênio x enxofre
As pesquisas no Brasil relatam que a estimativa da eficiência
global do fertilizante nitrogenado aplicado tem sido ao redor de
50%, entretanto, sua absorção pelas culturas pode ser alterada pela
presença de outros elementos, entre eles o S.
De acordo com Malavolta e Moraes (2007), o N e o S podem
sofrer sinergismo e influenciar diretamente na qualidade do produto. Segundo esses autores, o S aumenta o teor de metionina nas
proteínas dos cereais e o N pode mudar a proporção de albuminas,
globulinas, polaminas e glutelinas.
Na fisiologia da planta, a união das rotas metabólicas de
assimilação do N e do S é representada pela incorporação do sulfeto na O-acetilserina pela enzima OAS-tiol-liase na formação da
cisteína (CRAWFORD et al., 2000). O aminoácido O-acetilserina
é originário da serina por ação da enzima acetiltransferase da serina
(SATase). Por sua vez, a serina é formada no processo de fotorrespiração da planta, sendo o N, presente em sua estrutura, produto
da redução e assimilação do N absorvido do solo (KOPRIVA;
RENNENBERG, 2004). Limitações de N ou S nas plantas são
manifestadas nesse ponto de convergência das rotas assimilatórias, o que ocasiona acúmulo ou carência de produtos sintetizados
Abreviações: As = arsênio; Ca = cálcio; Cd = cádmio; Cs = césio; Cu = cobre; K = potássio; Mg = magnésio; Mn = manganês; N = nitrogênio; Na =
sódio; Ni = níquel; P = fósforo; Pb = chumbo; Rb = rubídio; S = enxofre; Se = selênio; Si = silício; Zn = zinco.
1
2
rofessora Adjunta do Departamento de Ciência do Solo, Universidade Federal de Lavras, Lavras, MG; email: [email protected]
P
Químico, Doutor em Ciências com ênfase em Química na Agricultura e no Ambiente, Pesquisador, Universidade Federal de Lavras, Lavras, MG.
10
INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 149 – MARÇO/2015
(PROSSER et al., 2001; NIKIFOROVA et al., 2006), sendo esse
desbalanço nutricional refletido na síntese de proteínas vegetais
(DIJKSHOORN; van WIJK, 1967).
A interação N x S no metabolismo aparenta não se restringir
apenas à síntese de proteínas. Em diversos estudos com espécies
vegetais foi constatada redução na atividade da enzima redutase
do nitrato sob condições de limitação de S no substrato, o que
culminou em incremento das concentrações de nitrato no tecido
vegetal (GIORDANO; PEZZONI; HELL, 2000; THOMAS et al.,
2000; PROSSER et al., 2001). Desse modo, infere-se que o metabolismo das plantas pode ser alterado de acordo com a forma de N
combinada com o S na adubação.
Em trigo cultivado em solo franco arenoso obteve-se resposta ao S com uma menor relação N/S (WARMAN; SAMPSON,
1994). Para canola, o melhor rendimento da cultura foi obtido
quando a disponibilidade de N e S estava em equilíbrio (JANZEN;
BETTANY, 1984). A relação N/S ótima foi estimada para a cultura
em 7:1. Lucas et al. (2013) obtiveram aumento da produtividade
da canola com adubação de N e S, porém, estes não alteraram significativamente os teores de óleo e proteína bruta nos grãos. Para
palmeira, uma relação N/S de 9,4 a 6,4 pode ser considerada adequada para o desenvolvimento da cultura (ABO-RADY et al., 1988).
Na cultura do feijão, Crusciol et al. (2006) encontraram
decréscimo da relação N/S na aplicação de S em cobertura; entretanto, os autores obtiveram máxima produtividade com a relação
N/S de 25,5. Furtini Neto et al. (2000) também encontraram relação
ótima N/S de 20 para a mesma cultura.
Orman e Kaplan (2011) e Orman (2012) encontraram relação
N/S variando de 3 a 5,85 para a cultura do tomate. Em ambos os
trabalhos, os autores destacaram a importância desta relação para
a cultura. Silva et al. (2014) obtiveram maior produtividade de
frutos de tomate com a relação N/S de 2,36, conforme ilustrado
na Figura 1.
Figura 1. Relação N/S e produção de frutos de tomate.
Fonte: Silva et al. (2014).
• Nitrogênio x silício
O efeito do Si no metabolismo do N também tem sido
estudado. Bybordi (2012) e Feng et al. (2010) relatam que com a
utilização do Si houve aumento na atividade das enzimas redutase
do nitrato, glutamina sintetase, glutamato sintetase e glutamato
desidrogenase, melhorando a eficiência no metabolismo do N.
Em estudo sobre a relação NO3- e NH4+, com aplicação de Si (2 e
4 mmol L-1), em plantas de canola sob condições salinas, Bybordi
INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 149 – MARÇO/2015
(2010) observou relação benéfica do Si com NH4+. Quando em alta
concentração de NH4+ e em presença de Si houve incrementos na
produção de matéria fresca e área foliar. Campos (2013) observou
o mesmo efeito em plantas de cana de açúcar e pepino (Tabela 1).
Porém, ainda há poucos estudos sobre a eficiência no uso do Si
para minimizar o estresse, garantindo o melhor desenvolvimento
das plantas sob excesso de N, especialmente do NH4+, que induz
distúrbios fisiológicos irreversíveis nas plantas.
Tabela 1. Efeito das interações entre Si e fontes de N (amoniacal e nítrica
na dose de 60 mmol L-1) na área foliar e na produção de matéria
seca da parte aérea de plantas de cana-de-açúcar e pepino.
Doses
de Si
(mmol L-1)
Fonte de N
NH4
+
NO3
NH4+
-
NO3-
Área foliar
Matéria seca da parte aérea
- - - - - (cm²) - - - - - -
- - - - - - - (g planta-1) - - - - - - -
Cana-de-açúcar
0
133,43
449,53
1,32
6,88
1
245,25
454,47
2,40
6,94
10
248,03
452,72
2,40
6,93
Pepino
0
394,07
1342,69
1,36
4,34
1
768,20
1345,35
2,70
4,37
10
771,51
1359,55
2,69
4,44
Fonte: Extraída e adaptada de Campos (2013).
• Fósforo x nitrogênio
O fósforo (P) e o nitrogênio (N) interagem de forma sinérgica, de acordo com Shuman (1994), pois, em doses adequadas,
o efeito conjunto na produção vegetal é melhor do que quando
aplicados separadamente. A absorção de NO3- é um processo ativo,
requer energia metabólica para o transporte contra o gradiente de
potencial eletroquímico, necessitando de substâncias redutoras e de
ATP (KLEINHOFS; WARNER, 1990). O suprimento inadequado
de P pode diminuir a absorção de NO3- e NH4+, diminuir a translocação do NO3- absorvido para a parte aérea (acúmulo de NO3- nas
raízes), com acúmulo de aminoácidos tanto nas folhas como nas
raízes, que pode ser devido à inibição da síntese ou à degradação das
proteínas (ISRAEL; RUFTY JR, 1988; RUFTY JR, MACKOWN,
C. T.; ISRAEL, 1990; RUFTY JR et al., 1993; JESCHKE et al.,
1997; ARAUJO; MACHADO, 2006).
O suprimento limitado de P também tem impacto negativo na
fixação biológica de N2, pois tanto a redução do N2 atmosférico, que
ocorre nos bacteroides, quanto a assimilação do NH4+ em aminoácidos e ureideos no vegetal são processos consumidores de energia.
Assim, a falta de P reduz a atividade específica da nitrogenase e
também a concentração de ATP nos nódulos (SÁ; ISRAEL, 1991).
Plantas dependentes da fixação do N2 atmosférico têm maior
necessidade de P para um crescimento ótimo do que aquelas supridas com NO3-. Os processos associados à fixação do N respondem
mais ao suprimento de P do que aqueles associados ao próprio
crescimento da planta (CASSMAN et al., 1980; ISRAEL, 1987).
• Fósforo x magnésio
Dentre as principais funções do Mg nas plantas destaca-se a
sua participação como ativador enzimático. Quase todas as enzimas fosforilativas, tanto de incorporação como de transferência
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do P inorgânico, dependem da presença de Mg, que é capaz de
formar uma ponte entre o ATP e/ou ADP e a molécula da enzima.
Essa transferência de energia é fundamental para os processos de
fotossíntese, respiração, reações de síntese de compostos orgânicos,
absorção iônica e trabalho mecânico, como a expansão radicular
(MALAVOLTA, 2006; PRADO, 2008; MARSCHNER, 2012).
Ocorre um sinergismo entre P e Mg, ou seja, a absorção de
P é máxima quando na presença de Mg na solução do solo, por se
tratar de um carregador de P, como resultado da participação do Mg
na ativação de ATPases da membrana responsáveis pela absorção
iônica (MALAVOLTA; VITTI; OLIVEIRA, 1997; MALAVOLTA,
2006).
A interação existente entre P e Mg foi estudada por diversos
autores (SKINNER; MATTHEWS, 1990; REINBOTT; BLEVINS,
1994, 1997; FAGERIA, 2001; SALEQUE et al., 2001; LANGE,
2007). Andrew e Robins (1971), avaliando a adubação fosfatada
em solo com baixo teor de P, observaram que o aumento das doses
de P aumentaram as concentrações de Mg em nove gramíneas
tropicais. Com a combinação de doses de P e de doses de Mg em
solução nutritiva para o cultivo de Brachiaria brizantha e Brachiaria decumbens, Almeida (1998) concluiu que o aumento das doses
de Mg possibilitou maior acúmulo de P nos casos em que este não
foi limitante. Já Santos et al. (2004) verificaram que as doses de P
combinadas às de Mg apresentaram interação significativa para a
concentração de P e de Mg na parte aérea.
Reinbott e Blevins (1994), submetendo a forrageira festuca
(Festuca arundinaceae) a doses de P e Mg, demonstraram que o P
foi determinante para o aumento da concentração de Mg na parte
aérea da planta, mesmo quando em baixa concentração.
• Fósforo x boro
O baixo teor de P no solo pode interferir no metabolismo
do B, agravando os sintomas de deficiência e/ou toxidez (SINHA;
DUBE; CHATTERJEE, 2003). O alto teor de B é conhecido por
diminuir a concentração de P em folhas de espinafre e amendoim
(BLAMEY; CHAPMAN, 1979). Yamanouchi (1980) relatou que
o teor de B nas folhas de tomate diminuiu com o aumento do
fornecimento de P. Kaya et al. (2009) observaram que as altas
concentrações de B reduziram o peso seco, o rendimento de frutos
e a concentração de P em plantas de tomate, porém, a aplicação
complementar de P melhorou a produção de biomassa seca, a produção de frutos e teor de P nas plantas.
Com isso, pode-se inferir que doses mais elevadas de P
podem diminuir a toxidez de B nas culturas, porém, deve-se tomar
cuidado para não causar um desequilíbrio no metabolismo do B,
caso a dose de P seja muito elevada.
• Fósforo x zinco (Zn)
Há diversos trabalhos publicados sobre a interação P x Zn
mostrando que o P pode aumentar a absorção de Zn, mas também
pode diminuir, e até mesmo não interferir. A adição de P nos solos
deficientes em Zn pode estimular o crescimento das plantas e, com
isso, diluir a concentração de Zn nos tecidos, mas também pode
diminuir o transporte de Zn da raiz para a parte aérea (LONERAGAN et al., 1982; WEBB; LONERAGAN, 1988; ARAUJO;
MACHADO, 2006).
Essas informações denotam as diferentes interações entre P e
Zn, sendo que essas podem ser influenciadas pela espécie estudada
ou até mesmo pelas condições de estudo, como disponibilidade
de água, estádio de desenvolvimento da cultura, dentre outras. A
interação mais comum ocorre quando, adicionando-se P ao solo, há
12
diminuição na concentração de Zn na parte aérea, quando este se
apresenta em teor limitante. A forma como esta diminuição ocorre
pode variar, como já abordado, podendo ser pelo efeito de diluição,
diminuição da absorção ou até mesmo restrição do transporte para
a parte aérea. Conhecer a forma como esta interação ocorre nas
culturas ajuda a amenizar os possíveis problemas de deficiência
de Zn nas plantas.
De acordo com Loneragan e Webb (1993) e Araujo e Machado
(2006), a adição de P ao solo pode diminuir a absorção de Zn devido
à alteração do pH na rizosfera. Com a dissolução dos fertilizantes
fosfatados são liberados íons H+, e a absorção do Zn é sensível às
variações de pH. Essa alteração do pH também pode promover a
precipitação de Zn nos componentes do solo, comprometendo sua
disponibilidade para absorção pelas plantas.
Há algumas indicações de que o K+ pode favorecer a absorção de P e Zn, diminuindo a intensidade da interação entre eles
(ADRIANO; PAULSEN; MURPHY, 1971; DIBB; THOMPSON
JR., 1985), no entanto, ainda não foram encontrados exemplos desta
interação em condições brasileiras (ROSOLEM, 2005). O K parece
exercer maior ou menor influência na absorção de Zn, dependendo
do pH do solo e das concentrações de Ca na solução, tornando difícil a caracterização da interação (LONERAGAN; WEBB, 1993).
• Fósforo x metais pesados
A interação entre P e chumbo (Pb) foi observada por Miller,
Hasset e Koeppe (1975) em estudo das propriedades do solo na
disponibilidade de Pb para milho, verificando uma forte ação dos
ânions fosfatados na precipitação do Pb. Estudos realizados em
solos com altas concentrações de Zn, cádmio (Cd), Cu e Pb, em
área de rejeito oriunda da extração e industrialização de Zn, Paim
(2006) demonstrou que a adição conjunta de silício (Si) e P ao solo
contribuíram na diminuição da disponibilidade de Zn, Cd, Cu e Pb.
Estudos sobre a imobilização de Pb em solos contaminados
através da adição de fontes de P são citados também em Cao et al.
(2003). De acordo com Tang et al. (2004), adições de P em solos
contaminados com Pb promovem a imobilização deste elemento,
transformando-o em formas insolúveis.
Diversos trabalhos demonstram a eficácia da aplicação de
P na remediação de solos contaminados com Pb, entretanto, esse
resultado também pode ser aplicável a outros elementos, como Cd,
Zn e Cu (HAMON; MIKE; COZENS, 2002; FAYIGA; MA, 2006;
CHEN; ZHU; MA, 2006; CHEN et al., 2007), que frequentemente
podem estar associados à contaminação do solo por Pb. Porém, a
implementação dessa prática em solos contaminados com diversos
metais pesados e a avaliação da eficácia da utilização de P sobre os
diferentes metais pesados são pouco conhecidas (CHEN et al., 2007).
Exemplo da eficácia é descrito em Fayiga e Ma (2006), que
utilizaram rocha fosfatada para a imobilização de arsênio (As), Pb,
Cd e Zn, e concluíram que a rocha fosfatada aumentou significativamente a absorção de As e diminuiu a de Pb e Cd em samambaia
(Pteris vittata). McGowen, Basta e Brown (2001) avaliaram um
solo contendo teor total de 69.200 mg kg-1 de Zn, 5.150 mg kg-1 de
Pb e 1.090 mg kg-1 de Cd, e teores disponíveis de 1.171 mg kg-1,
12 mg kg-1 e 39,9 mg kg-1, respectivamente. Para a imobilização
desses elementos aplicaram fosfato diamônico nas doses de 460,
920 e 2.300 mg kg-1, concluindo que a aplicação da maior dose de
P foi mais efetiva na imobilização dos teores de Zn, Pb e Cd.
Wang et al. (2001), estudando um solo com 3.153 mg kg-1
de Zn, 19 mg kg-1 de Ni, 956 mg kg-1 de Pb e 4,52 mg kg-1 de Cd,
teores disponíveis, e aplicação combinada de Ca(H2PO4)2 e CaCO3,
INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 149 – MARÇO/2015
concluíram que a aplicação desta mistura foi efetiva na redução
de 96% do Zn, 65% de Ni, 99% do Pb e 98% do Cd disponíveis.
Além do efeito de diluição, também existe a inibição competitiva entre esses íons. O aumento nas concentrações de K+ e Ca2+
no solo frequentemente induzem à deficiência de Mg2+ nas plantas
(Tabela 2) (MARSCHNER, 2012).
Zwonitzer, Pierzynski e Hettiarachchi (2003) avaliaram
um solo contendo 29.100 mg kg-1 de Zn, 2.800 mg kg-1 de Pb
e de 370 mg kg-1 de Cd. Para mobilizar esses elementos no solo,
adicionaram CaCO3 nas doses de 0 e 2.000 mg kg-1 conjuntamente
com KH2PO4 ou fosfato natural nas doses de 0, 1.100 mg kg-1 e
2.200 mg kg-1. Os autores concluíram que a disponibilidade de Zn,
Pb e Cd diminuiu com o aumento da dose de P, independentemente
da fonte, para a cultura do sorgo.
Trevizam et al. (2010) estudaram a imobilização de Cd em
solo contaminado e concluíram que a utilização de P interferiu na
disponibilidade do Cd no solo. A aplicação de doses variando de
250 a 1.000 mg kg-1 de P reduziu os teores de Cd na alface cultivada
nesse solo, porém o acúmulo de Cd na planta, nessas doses, aumentou em relação ao tratamento controle (Figura 2). Nesse sentido,
vale ressaltar que muitos trabalhos verificam a redução dos teores
de metais pesados na parte aérea das plantas e não o acúmulo, que
leva em consideração a produção de matéria seca da cultura.
Tabela 2. Efeito do K+ e do Ca2+ sobre a absorção do 28Mg2+ por plântulas
de cevada (concentração de cada cátion = 0,25 mM).
Mg2+ absorvido [µmol Mg2+ (10 g)-1 raiz fresca 8 h-1]
Parte da
planta
Mg Cl2
MgCl2 + CaSO4
MgCl2 + CaSO4 + KCl
Raiz
165
115
15
Parte aérea
88
25
6,5
Fonte: Schimansky (1981), em MARSCHNER (2012).
É interessante destacar que os teores elevados de Mg2+ não
causam o mesmo efeito sobre o K+ (FONSECA; MEURER, 1997).
Isso ocorre porque o K pode atravessar a membrana plasmática com
maior velocidade, diminuindo a absorção de cátions mais lentos
como Ca e Mg. A absorção preferencial do íon K+ ocorre por este
ser monovalente e de menor grau de hidratação quando comparado
aos divalentes, no caso o Mg2+ (PRADO, 2008). A presença de Mn2+
na rizosfera também inibe a absorção de Mg2+ pelas raízes, mas tem
um efeito pequeno na absorção do K+ (MARSCHNER, 2012). Isso
reflete o contraste da especificidade da resposta dos transportadores
para a absorção de cada cátion.
Já entre Ca2+ e Mg2+ o efeito é antagônico, ou seja, o excesso
de um prejudica a absorção do outro (MOORE; OVERSTREET;
JACOBSON, 1961; PRADO, 2008).
Há vários trabalhos destacando a interação entre K, Ca e Mg,
como em Rosolem (1989); Rosolem et al. (1992); Mascarenhas et
al. (2000); Oliveira et al. (2001); Rossetto et al. (2004); Araujo,
Santos e Camacho (2013), dentre outros.
Rosolem et al. (1984) observaram, por meio da diagnose
foliar, que os teores de Ca nas folhas de sorgo sacarino diminuíram com a aplicação de K (Tabela 3), resultando em diminuição
da produtividade.
Figura 2. Correlação entre acúmulo de P e acúmulo de Cd na alface.
*Significativo a 5% de probabilidade, pelo teste F.
Fonte: Extraída e adaptada de Trevizam et al. (2010).
• Enxofre x selênio
Nas plantas, o Se apresenta propriedades químicas semelhantes às do S e, por isso, partilham vias metabólicas em comum.
A presença de compostos isólogos nas plantas indica que esses elementos competem em processos biológicos que afetam a absorção,
translocação e assimilação nos processos de crescimento das plantas
(SORS et al., 2005). O Se mostrou ser benéfico no crescimento
e na qualidade das plantas devido aos seus efeitos antioxidantes
(Hartikainen, 2005, citado por KESKINEN, 2012). Nos tecidos
das plantas, o Se entra nos atalhos da assimilação e metabolismo
do sulfato, substituindo a cisteína e a metionina nas proteínas.
• Potássio x cálcio x magnésio
Trata-se da interação mais conhecida. O aumento no teor
de K na solução do solo causa diminuição dos teores de Ca e Mg
nas plantas. Isso pode ser explicado pelo efeito de diluição, como
abordado por Rosolem (2005). Uma planta bem nutrida em K
cresce mais e, mesmo com a diminuição dos teores de Ca e Mg na
planta, muitas vezes não há prejuízo no crescimento ou na produção.
Contudo, se os teores de K forem excessivamente altos, poderá
haver danos na produção pela intensificação do efeito de diluição.
Tabela 3. Matéria seca (MS) de colmos de sorgo sacarino, teores de Ca nas folhas e relação Ca/K no solo, em função da aplicação de calcário e fertilizante potássico.
Potássio (kg ha-1)
0
Calagem
100
Matéria seca de colmos
Ca
(t ha-1)
(g planta-1)
(g kg-1)
0
10,30
0,98
4
13,00
1,27
Ca/K
Matéria seca de colmos
Ca
Ca/K
(g planta-1)
(g kg-1)
3,7
11,65
0,83
1,5
7,4
10,98
0,93
3,1
Fonte: Adaptada de Rosolem et al. (1984).
INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 149 – MARÇO/2015
13
Alternativamente, o Se poderá ser acumulado como derivados metilados ou volatilizados da planta (HAWKESFORD; ZHAO, 2007).
• Boro x zinco
Dentre os micronutrientes, o B e o Zn são os que mais
limitam o rendimento das culturas. O B está diretamente ligado
ao crescimento meristemático, à biossíntese da parede celular, ao
funcionamento da membrana celular, ao transporte de auxinas (AIA)
e ao metabolismo do carboidrato. O Zn faz parte da composição de
inúmeras enzimas, a maior parte envolvida na regulação da transcrição do DNA e na síntese e no transporte de RNA, além de manter a
integridade estrutural da membrana celular (MALAVOLTA, 2006).
A deficiência de qualquer um desses nutrientes prejudica fortemente
o desenvolvimento da planta.
As interações nutricionais interferem na composição mineral
da planta, podendo um elemento estimular ou inibir a absorção de
outros elementos (MENGEL; KIRKBY, 2001). Estudos revelaram
que a toxicidade do B e a deficiência de Zn estão relacionadas
(RAJAIE et al., 2009). A diminuição dos teores de Zn em função
do aumento da concentração de B foi relatada para folhas de tabaco
(LÓPEZ-LEFEBRE et al., 2002), no milho (MOZAFAR, 1989;
HOSSEINI et al., 2007) e limão (RAJAIE et al., 2009) enquanto
a interação positiva desses dois micronutrientes foi apresentada
para a raiz de tabaco (LÓPEZ-LEFEBRE et al., 2002) e por outras
culturas (GREWAL et al., 1998).
Araujo e Silva (2012), avaliando a interação de B e Zn no
crescimento, desenvolvimento e nutrição do algodoeiro, observaram
que o teor e o conteúdo de B na parte aérea foram influenciados
pelas concentrações de Zn na solução nutritiva, de modo que as
maiores concentrações de Zn proporcionaram maior absorção e
extração de B pelas plantas de algodão.
• Ferro x zinco
Muitas reações antagônicas têm sido observadas para Fe,
Mn, Cu e Zn (KABATA-PENDIAS; PENDIAS, 2001). Em solos
muito ácidos, grande parte das espécies torna-se clorótica quando
exposta a níveis excessivos de Zn, sendo que a aplicação de sulfato
ou quelato de Fe corrige a deficiência, indicando que o Zn interfere
na absorção, translocação ou na utilização de Fe nas folhas, e talvez na biossíntese da clorofila (CHANEY; RYAN, 1993). White,
Chaney e Decker (1979) verificaram que doses crescentes de Zn
provocaram aumento na concentração de Mn nas folhas e nas raízes
e diminuição de Fe nas folhas, e nos tratamentos com doses elevadas
de Zn as folhas apresentaram-se severamente cloróticas, apesar de
não conterem níveis deficientes de Fe.
Agarwala, Bisht e Sharma (1977) e Soares et al. (2001)
observaram que o excesso de Zn reduziu a translocação de Fe para
as partes aéreas. A presença de Zn inibe o metabolismo do Fe, daí o
aparecimento de sintomas de deficiência induzida de Fe, que, caso
severa, se caracteriza por queda dos níveis de clorofila, deixando
as folhas totalmente cloróticas, e posteriormente esbranquiçadas,
caracterizando acentuado atraso no crescimento da planta (Figura
3). Não se sabe a causa da deficiência induzida de Fe provocada
pelo excesso de Zn, mas a similaridade entre o raio iônico desses
elementos tem sido apontada como a causa desse fenômeno (WOOLHOUSE, 1983; Romheld, 2001).
Silva, Vitti e Trevizam (2014) observaram sintomas de
deficiência de Fe em plantas de soja, demonstrando a interferência do Zn no metabolismo do Fe (Figura 3), confirmado pelos
altos teores de Zn (2.562,1 mg kg-1) em relação aos teores de Fe
(840,9 mg kg-1) no tecido vegetal.
14
Figura 3. E
volução (25 dias) crescente dos sintomas de deficiência de
ferro em folhas de soja (a, b, c, d, e) cultivada em solo com
alto teor de zinco.
Fonte: Adaptada de Silva, Vitti e Trevizam (2014).
Na diagnose foliar, faz-se a determinação dos teores totais
dos elementos. A amostra sofre digestão, mineralizando os elementos, que depois são determinados por métodos diversos. Segundo
Malavolta, Vitti e Oliveira (1997), em folhas de plantas cloróticas
os teores de Fe total podem estar mais altos ou, pelo menos, iguais
aos encontrados em folhas normais. Esses dados sugerem que, nas
plantas carentes, parte do Fe encontra-se inativado. Nesse caso,
é conveniente a determinação do “Fe ativo”, e não do “Fe total”.
O Fe tem numerosas funções fisiológicas nas plantas, porém,
para a expressão dos sintomas visuais, seu envolvimento na formação do cloroplasto e na síntese de porfirina são os processos mais
importantes (RÖMHELD, 2001). O Fe também compete por sítios
de absorção na membrana plasmática com o Cd, ocasionando sintomas de deficiência induzida do mesmo (GALLEGO; BENAVIDES;
TOMARO, 1996; SIEDLECKA; KRUPA, 1999).
• Zinco x cádmio
O acúmulo de Cd nas culturas pode ser influenciado pela
baixa concentração de Zn na planta, sendo tal efeito explicado pela
inibição do Cd pelo Zn. Em geral, aplicações de Zn diminuem a
absorção e acumulação de Cd nas plantas (KÖLELI; EKER; CAKMAK, 2004; OLIVER et al., 1994).
A interação entre Zn e Cd foi constatada em arroz quando a
deficiência de Zn provocou aumento do acúmulo de Cd (HONMA;
HIRATA, 1978). Outros trabalhos demonstraram que a aplicação
de Zn diminuiu o acúmulo de Cd em alface (McKENNA; CHNEY;
WILLIAMS, 1993), parte aérea e grãos de trigo (OLIVER et
al., 1994; KHOSHGOFTAR et al., 2004), e tubérculos de batata
(McLAUGHLIN et al., 1994).
Köleli, Eker e Cakmak (2004), trabalhando com trigo, três
doses de Cd e duas de Zn, observaram que os resultados foram
compatíveis com a hipótese de que o Zn protege as plantas contra
a toxicidade de Cd. Hart et al. (2002) atribuíram a interação competitiva entre Cd e Zn à existência de um sistema de transporte
comum nas membranas celulares. Segundo Chaney e Ryan (1994),
o Zn em níveis altos (1% Zn) nos solos pode agir como protetor da
planta, bloqueando o Cd e controlando sua absorção, e de humanos
através dos alimentos.
INFORMAÇÕES AGRONÔMICAS Nº 149 – MARÇO/2015
Oliver et al. (1994) demonstrou que aplicações de Zn na
cultura de trigo cultivada em solos severamente deficientes neste
elemento, no Sul da Austrália, diminuíram a concentração de Cd
nos grãos em até 50%. Mckenna, Chney e Williams (1993), trabalhando com alface e espinafre, demonstraram que a adição de Zn
reduziu em ambos a absorção de Cd pelas raízes e o transporte do
Cd através do xilema da raiz para parte aérea.
O Zn interfere na translocação do Cd das raízes para as
folhas jovens por meio do favorecimento da retenção do Cd nas
raízes, mas um alto teor de Zn na solução do solo pode interferir na
absorção de Cd pelas raízes (GRANT et al., 1998). A complexidade
da interação entre Zn e Cd demonstra a dificuldade em se prever
como as práticas agronômicas afetarão a acumulação desses dois
elementos nas plantas. Assim, cuidado especial deve ser tomado
na adoção de novas práticas que são propostas com a finalidade de
biofortificação com Zn e sobretudo em solos com altos teores de Cd.
Considerações Finais
(c)
As pesquisas, de forma geral, estão relacionadas à adubação com a utilização de um único nutriente, aplicado em doses
crescentes, procurando encontrar a dose que proporcione a maior
produtividade da cultura, com menor custo do fertilizante. Dessa
forma, grande parte das interações entre os elementos acabam
sendo esquecidas. No entanto, o conhecimento dessas interações é
de fundamental importância para a compreensão da dinâmica dos
nutrientes no solo e na planta e, consequentemente, para o aumento
da produtividade das culturas.
Existem outras interações ainda pouco discutidas na literatura, como, por exemplo, P x S, N x Cl, P x Se, P x As, N x Ni,
dentre outras. Algumas das citadas, como P x B, S x Se, N x S,
S x Mo e também P x Zn possuem literatura escassa. Assim, são
necessárias mais pesquisas visando a busca do equilíbrio, sobretudo estudos em condições de solos brasileiros. Vale ressaltar que
os efeitos das interações iônicas, benéficos ou prejudiciais, podem
ser diferenciados entre as espécies cultivadas.
O conhecimento das faixas de valores, visando compreender
as interações iônicas, possivelmente poderá auxiliar na redução ou
no equilíbrio das fontes de fertilizantes a serem aplicadas às culturas,
promovendo, desta forma, redução dos custos de produção bem
como minimizando possíveis impactos ambientais.
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