CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO Processo CCR1412/2008 Interessado: Lincoln Braga e Souza Assunto: Petrobrás Petróleo Brasileiro S/A Relatório Trata-se de denúncia narrando, em síntese, que a empresa exige do participante em curso de formação o pagamento de multa de R$50.000,00 na hipótese de desligamento voluntário da empresa antes de dois anos de contrato de trabalho. Na ratificação do relatório de arquivamento, subscrito pela ilustre Procuradora do Trabalho Isabella Gameiro da Silva Terzi e após o exame do recurso do denunciante, está assentado conclusivamente que, verbatim: “Ante a inexistência de arbitrariedade na conduta da empresa denunciada em exigir pagamento de multa indenizatória dos gastos efetuados durante seus cursos de formação ou não razoabilidade e proporcionalidade entre os valores efetivamente custeados pela denunciada e o valor cobrado a título de cláusula penal, promoveu esta Procuradora o arquivamento do feito, em 26/02/08, com intimação do denunciante, na forma da Resolução nº 69, do CSMPT. (...) Conforme ata de audiência juntada às fls. , não se verifica qualquer denúncia de lesão coletiva sobre a cobrança de multa pelo desligamento de curso de formação, ao revés, todos os fatos narrados referem-se a acontecimentos relativos somente ao denunciante, o que configura lesão individual alheia à órbita de legitimidade do MPT. (...) Tendo-se em vista a falta de indícios de lesão coletiva na impugnação protocolizada após a promoção de arquivamento, a inexistência de arbitrariedade na conduta da empresa, conforme acima esposado, bem como a inexistência de cerceio à liberdade de trabalho, mantém-se a promoção de arquivamento. Saliente-se que a empresa investigada, conforme art. 173 da CF/88, deve observar as normas de direito privado, inclusive quanto ao Direito do Trabalho, sem, porém, se furtar aos ditames do art. 37 da Magna Carta. Tal aplicação sistemática das leis constitucionais possui como fundamento a natureza jurídica da empresa, qual seja, sociedade de economia mista, pertencente à Administração Pública Indireta, e, como tal, lhe é imprescindível, para o alcance de seu objeto social, mormente considerando-se o setor da economia em que atua de alta concorrência e especificidade, ter certa liberdade na estipulação das cláusulas dos contratos de trabalho e das exigências pré-contratuais, como no caso em exame – a cláusula penal é informada em edital e o termo de compromisso é apresentado ao pretenso empregado antes da formação do vínculo empregatício, desde que observados os limites da Constituição Federal e os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade o que in casu, se verificou, conforme fundamentação supra”. (fl. 120) Não obstante existir um fundamento que é suficiente para ratificar o arquivamento deste procedimento, que é a propositura de reconvenção pelo interessado à ação de cobrança em que é réu, admite-se conveniente, em se tratando de uma empresa pública do porte da investigada, ampliar o campo de análise quanto à possibilidade da cláusula penal entelada provocar lesão metaindividual. Registre-se, desde logo, não haver fundamento para uma criptoalegação de cerceamento de defesa – por ausência de oitiva do requerente em atendimento ao despacho de folha 96 porque, segundo procedimento a doutrina administrativo majoritária, o princípio não do se aplica no contraditório (CARVALHO FILHO, José dos Santos. Ação civil pública, Lúmen Júris, 2007, p. 260) Por outro lado, inexiste ausência de fundamento legal para a cobrança de cláusula penal, eis que a cláusula tem adequado assento no artigo 444 da Consolidação das Leis do Trabalho, bem como nos artigos 418 e 422 do Código Civil. No que diz respeito à comprovação de custos, não há controvérsia de que se está diante de uma cláusula penal, ou pena convencional, e que a obrigação não foi cumprida por fato imputável ao devedor, sem a ocorrência de caso fortuito ou de força maior. Inferindo-se que a natureza da cláusula não é só a de ressarcimento, mas inclui também o direito de perdas e danos – como pode ser exemplo as da frustração no planejamento da utilização de mão de obra qualificada - que, nesse caso, já se acham pré-fixadas na pena, é de se afastar a exigência de uma relação biunívoca: custo = ressarcimento. Milita no tópico, ainda, em desfavor do recorrente a cobrança parcial da multa, no valor de R$33.283,95, uma vez que desligado antes da conclusão do curso, como se infere da ação de cobrança encartada à folha 31 e seguintes, sem que viesse ao procedimento, como seria de se esperar, os termos da reconvenção, no qual, provavelmente, haveria a impugnação do valor indicado acima. Observa-se das manifestações (folha 26/folha que 43) o denunciante afirma que “os participantes do curso de formação, antes do início, são obrigados a assinar o termo de compromisso e responsabilidade contemplando a permanência na empresa de dois anos após o curso de formação”. Desse modo tem-se que o denunciante salienta o conseqüente – a obrigação da assinatura da cláusula penal, pacto acessório – com desprezo, porém, pelo antecedente – a liberdade de contratar, pacto principal. Assim ao firmar, Responsabilidade para livremente, o Participante Termo de de Compromisso Curso de e Formação, ‘Termo’ que, registre-se por importante, consta do Edital de Concurso no item 13.4, não parece correto pretender-se a aplicação do princípio da boa-fé, pela regra do artigo 422 do Código Civil, apenas ao empregador. Significando a boa-fé objetiva uma atuação refletida, levando em consideração o parceiro contratual, o requerente podia – e, acrescente-se, devia considerando o seu potencial que está evidenciado pela aprovação em vários concursos - buscar uma melhor colocação profissional no mercado, assumindo, porém, o ônus a que se obrigara livre e contratualmente. É razoável, ainda, a assertiva da empresa investigada de que a concorrência incorporar aos seus pode ter quadros interesse o em pagar profissional a multa qualificado e às custas de outrem (fl. 48), daí que, num mercado competitivo como o da exploração de petróleo, é razoável não ter aplicação a regra de isenção de multa quando o profissional venha a ser aproveitado em outro órgão da administração em geral, porque nada impede o empregado de, na seqüência transferir-se para a iniciativa privada. Ademais, quanto ao tema específico, asseverou corretamente a ilustre Procuradora-oficiante, litteris: “Assim, não entende esta Procuradora que há desvirtuamento da finalidade pública da exigência de multa indenizatória por gastos no curso de formação mesmo do empregado-candidato que toma posse em cargo ou emprego público da Administração Pública Direta ou Indireta. A liberação da multa para outro cargo da PETEROBRAS se mostra compatível com o setor petrolífero que é de extrema especificidade e concorrência mundial.” Conclusão Razão pela qual a proposta de voto é pelo não provimento do recurso do denunciante e, conseqüentemente, homologação da promoção do arquivamento. Brasília, 23 de junho de 2008