Físico-Química Experimental FQE001 Exp. 05 Tensão Superficial 1. Introdução A tensão superficial surge nos líquidos como resultado do desequilíbrio entre as forças intermoleculares (atração de van der Waals) que agem sobre as moléculas da superfície em relação àquelas que se encontram no interior da solução. Átomos e moléculas de um líquido podem se mover livremente procurando ocupar uma posição de menor energia potencial. Ou seja, um lugar onde as forças (atrativas e repulsivas), que agem em todas as direções, estejam em equilíbrio. Por outro lado, as moléculas situadas na superfície de separação líquido – ar estão submetidas a forças de atração não balanceadas, produzindo uma força resultante para o interior do líquido, conforme ilustrado na Figura 1. O maior número possível de moléculas se deslocará da superfície para o interior do líquido, e a superfície tenderá a se contrair espontaneamente. Figura 1: Forças de atração atuando sobre as moléculas da interface água / ar e no interior do líquido. Devido a isto, as superfícies são sempre regiões de maior energia. E é justamente a diferença entre as energias das espécies na superfície e no interior do material que se denomina energia de superfície ou tensão interfacial. De acordo com o princípio da menor energia, a natureza tende sempre a um estado de mínima energia. Portanto, todas as superfícies líquidas tendem a reduzir sua superfície limite a um valor mínimo adquirindo a forma esférica. Da mesma forma, a adesão de um material sobre outro será tanto melhor quando maiores forem as energias de superfícies envolvidas. A tensão superficial () – ou energia livre superficial – de um líquido é definida como a força resultante da atração entre as moléculas do interior do líquido pelas moléculas na sua superfície, que atua ortogonalmente na superfície do líquido. É quantificada determinando o trabalho necessário para aumentar a superfície em uma unidade de área, por um processo isotérmico reversível. A energia necessária para aumentar a área de interface é facilmente contabilizada através do exemplo da Figura 2, em que existe um filme de líquido suportado por um arame. Suponha que se pretendia aumentar o tamanho do filme, ou seja, executar um deslocamento x no arame. Para isso é necessário aplicar uma força F no arame, relacionada com a tensão superficial do líquido. O trabalho (w) associado a esse deslocamento é: 𝑤 = |𝐹|. ∆𝑥 = 2𝛾. 𝑙. ∆𝑥 (1) onde o fator 2 indica a existência de duas interfaces líquido-ar, uma em cada lado do filme. Físico-Química Experimental FQE001 Exp. 05 Figura 2: Tensão superficial como energia por unidade de área de interface. No processo, é criada uma área interfacial (A) definida por: 2 (2) ∆𝑥 Assim, o trabalho ou energia despendida por unidade de área de interface é: ∆𝐴 = 𝑤 = 𝛾. ∆𝐴 (3) Esta observação constitui uma interpretação física alternativa de tensão superficial que, por isso, também é designada como energia de superfície (). Estas grandezas, equivalentes, tem dimensões de força por unidade de comprimento (N.m-1) ou energia por unidade de área (J.m-2). A Tabela 1 mostra alguns valores de tensão superficial para vários líquidos em contato com o ar. Repare, por exemplo, nos baixos valores para o hélio ou nitrogênio líquidos. Esses baixos valores explicam-se pelo fato de serem moléculas apolares, apresentando fracas interações intermoleculares. Por outro lado, líquidos metálicos e moléculas muito polares tem, em geral, altos valores de tensão superficial devido às fortes atrações intermoleculares. Tabela 1: Tensões superficiais para líquidos a 20 oC. Líquido / 10-3 N.m-1 Água 72,75 Benzeno 28,88 o *Hélio líquido (-269 C) 0,12 *Nitrogênio líquido (-183 oC) 23,7 CCl4 26,8 Líquido Etanol n-Octanol n-Hexano n-Octano Mercúrio / 10-3 N.m-1 22,3 27,5 18,4 21,8 485 A tensão superficial da maioria dos líquidos diminui com o aumento da temperatura, de maneira quase linear, e se torna muito pequena nas proximidades da temperatura crítica, onde as forças coesivas intermoleculares tendem a zero. 1.1 Tensão superficial de soluções A adição de um soluto a um líquido altera sua tensão superficial. Na interface, as concentrações de solvente e de soluto não são iguais às do seio da solução. Isto porque uma das espécies deve ser preferencialmente adsorvida na interface. A tensão superficial da solução pode ser maior ou menor que a do solvente puro. Quando o soluto se concentra na interface, então a tensão superficial da solução é menor, e o oposto ocorre quando o soluto evita a interface. Estes comportamentos podem ser explicados Físico-Química Experimental FQE001 Exp. 05 com base nas interações intermoleculares. Se as interações soluto-solvente são mais fortes que as soluto-fase gasosa, então o soluto evita a interface e a tensão superficial da solução aumenta. Se o soluto atrai fracamente o solvente, ou apenas interage favoravelmente com uma parte da sua molécula, então a tensão superficial diminui. Entre os solutos que aumentam a tensão superficial da água incluem-se os sais iônicos solúveis e os glicídios. Os primeiros formam interações íon-dipolo com a água, enquanto os glicídios, tendo muitos grupos hidroxila, formam ligações de hidrogênio. São interações fortes, que fazem com que os solutos evitem a interface. Os solutos que diminuem a tensão superficial são designados agentes tensoativos ou surfactantes. Muitas moléculas anfóteras, isto é, que apresentam simultaneamente grupos hidrofóbicos e hidrofílicos, têm essa propriedade. Por exemplo, ácidos graxos ou espécies químicas com estrutura análoga, como as utilizadas em produtos de limpeza, baixam a tensão superficial. Estes solutos adsorvem na interface, pois a parte hidrofóbica da molécula tende a interagir com a fase gasosa, orientando-se neste sentido, enquanto os grupos hidrofílicos permanecem em contato com a água, conforme mostra a Figura 3. Figura 3: Distribuição de moléculas tensoativas nas interfaces ar – água e óleo – água. A parte circular das moléculas representa a parte polar hidrofílica, e a parte retangular representa a cadeia carbônica não-polar. Os tensoativos tendem a migrar até a superfície da solução e originar ali películas orientadas. Quando a concentração aumenta, certas moléculas tendem a tomar a mesma orientação que na superfície, formando verdadeiros agregados coloidais, as micelas. Normalmente o filme superficial formado é bem homogêneo e não aceita mais nenhuma molécula quando a solução atinge uma determinada concentração, chamada de concentração micelar crítica (CMC). Se continuarmos a aumentar a concentração, acima dessa concentração crítica, notaremos que a tensão superficial continuará constante, conforme mostra o gráfico da Figura 4. Figura 4: Variação da tensão superficial com a concentração de detergente. Físico-Química Experimental FQE001 Exp. 05 Os fenômenos associados à tensão superficial e aos agentes tensoativos estão inerentes a uma imensidão de produtos comerciais: produtos de limpeza e cosméticos, tintas, adesivos, lubrificantes, revestimentos, espumas e aerossóis, etc. Assim, uma clara compreensão destes fenômenos torna-se essencial na formação em ciências físico-químicas. 2. Objetivos Compreender a influência das forças intermoleculares nas propriedades e compatibilidades de diferentes materiais. Observar a variação da tensão superficial em com a concentração de um sal ou em soluções contendo surfactante através de medidas da tensão superficial pelo método da gota pendente e pela variação do ângulo de contato. 3. Metodologia A tensão superficial é uma propriedade de interface. Desta maneira, ela é medida fazendo-se um balanceamento entre a força de atração superficial numa linha limítrofe contra uma força igual que se pode medir. São três os métodos mais utilizados para a determinação de : o método do arrancamento (onde é medida a força necessária para romper um filme líquido), o método capilar (onde se mede a ascensão capilar do líquido contra a ação da gravidade) e o método da gota pendente. 3.1 Medida da tensão superficial pelo método da gota pendente No método da gota pendente, deixa-se formar uma gota na extremidade de um tubo vertical, cujo raio externo (2πr) é considerado como linha limítrofe. A gota cai exatamente no momento em que seu peso gera uma força de atração gravitacional (mg) maior que a força decorrente da tensão superficial aplicada à linha de contato da mesma com o perímetro do bico do qual ela cai (2πrγ). Ou seja, neste momento: 𝑚𝑔 = 2𝜋𝑟𝛾 (4) sendo m a massa da gota ideal, g a aceleração da gravidade e r o raio da ponta da bureta. Para o cálculo da tensão superficial do líquido a partir do volume da gota, basta utilizar a relação entre volume e massa, ou seja, a densidade do líquido (): 𝛾= 𝑚𝑔 𝑉𝜌𝑔 = 2𝜋𝑟 2𝜋𝑟 (5) 3.2 Determinação da molhabilidade através de medidas de ângulo de contato Outra metodologia para a visualização da tensão superficial é a medida do ângulo de contato da gota formada pelo líquido numa superfície sólida conhecida. Formalmente, o ângulo de contato entre uma gota de um líquido e uma superfície sólida depende da relação entre as forças adesivas (que fariam a gota se espalhar sobre a superfície) e as forças coesivas do líquido (que querem contrair a gota a uma esfera com uma superfície mínima). Se a gota repousa sobre uma superfície homogênea perfeitamente nivelada, forma-se um ângulo de contato de equilíbrio entre o líquido e a superfície sólida em qualquer ponto da linha de três fases, onde se encontram o sólido, o líquido e a fase de vapor, conforme mostra a Figura 5. Físico-Química Experimental FQE001 Exp. 05 Figura 5: Tensões superficiais nas interfaces entre três fases distintas. O comportamento de uma gota em uma superfície pode ser diverso: podem ter a tendência de se espalhar pela superfície em contato (como a água sobre o vidro), ou podem ter a tendência de minimizar o contato com essa superfície (como o mercúrio sobre o vidro). O resultado depende das forças intermoleculares que se estabelecem entre as fases. No caso da água sobre o vidro, formam-se interações fortes entre as moléculas polares da água e os grupos também polares (sílica e alumina) do vidro. Assim, devido a essas fortes forças de adesão, a água se espalha, ou molha, essa superfície. Por outro lado, o mercúrio segmenta-se em pequenas esferas, com zonas de contato com o vidro muito restritas. Diz-se que o mercúrio não molha o vidro. Esse comportamento deve-se ao fato de que os átomos de Hg preferem interagir entre si, com fortes forças de coesão, ao invés de interagir com as substâncias do vidro. A Figura 5 mostra que o líquido forma um ângulo de contato () entre a superfície sólida e o plano tangencial à superfície líquida. Formalmente, o ângulo de contato () entre uma gota de um líquido com uma tensão superficial conhecida e uma superfície sólida depende da relação entre as forças adesivas (que fariam a gota se espalhar sobre a superfície) e as forças coesivas do líquido (que querem contrair a gota a uma esfera com uma superfície mínima). Se a gota repousa sobre uma superfície homogênea perfeitamente nivelada, formase um ângulo de contato de equilíbrio entre o líquido e a superfície sólida em qualquer ponto da linha de três fases, onde se encontram o sólido, o líquido e a fase de vapor. Assim, o ângulo de contato representa uma medida quantitativa do processo de molhabilidade. A Figura 6 sistematiza as diferentes possibilidades para . Se 0o < < 90o, o líquido tem a tendência de molhar a superfície, e o oposto ocorre para 90o < < 180o. A água e o mercúrio em vidro formam ângulos de contato muito próximos de 0o e de 140o, respectivamente. Por outro lado, quando = 180°, tem-se cos = -1, e o trabalho de adesão líquido-sólido é zero. Este é o caso limite quando não há adesão entre as duas fases (o líquido não apresenta molhabilidade; Figura 4d). Figura 6: Ângulos de contato de líquidos com superfícies sólidas para líquido: (a) perfeitamente molhante; (b) predominantemente molhante; (c) predominantemente nãomolhante; (d) não-molhante. Físico-Química Experimental FQE001 Exp. 05 4. Procedimento Experimental Materiais Água destilada NaCl Solução de Dodecilsulfato de sódio (SDS), 50 mmol/L 06 balões volumétricos de 5 mL Proveta de 10 mL Pipeta Balança de precisão Procedimento Neste experimento a turma será dividida em duas equipes: Equipe A Prepare 6 soluções de NaCl nas concentrações entre 2% e 16% (m/V) utilizando os balões volumétricos e a proveta. No equipamento apropriado, meça a tensão superficial da água deionizada no volume apropriado para formar a gota pendente. Em seguida, meça o ângulo de contato formado por uma gota de 5 µL. Repita o procedimento para as diferentes soluções de NaCl, começando pela solução mais diluída. Equipe B No equipamento apropriado, meça a tensão superficial da água deionizada no volume apropriado para formar a gota pendente. Em seguida, meça o ângulo de contato formado por uma gota de 5 µL. Repita o procedimento para as diferentes soluções de SDS, começando pela solução mais diluída. 5. Discussão dos Resultados Utilize os dados da Equipe A e Equipe B para representar graficamente os valores de tensão superficial pela concentração. Faça um gráfico de vs. c e outro vs. ln c, onde c é a concentração em % de massa. Observe como a tensão superficial varia para soluções salinas e para soluções de detergentes. Observe a variação do ângulo de contato ao comparar a água pura com as soluções de NaCl e SDS. Faça um gráfico da variação do ângulo de contato com a concentração das duas soluções estudadas. Físico-Química Experimental FQE001 Exp. 05 Tensão Superficial Resultados Experimentais Nome: 1. Equipe A: Variação da tensão superficial de soluções salinas Tabela 1: Valores tensão superficial e ângulo de contato de soluções de NaCl em diferentes concentrações. Concentração de NaCl / % 0 (água) Observações: / 10-3 N.m-1 Físico-Química Experimental FQE001 Exp. 05 Figura 1: Variação da tensão superficial de soluções salinas com a concentração de NaCl. Figura 2: Variação do logaritmo natural da tensão superficial (ln ) com a concentração de NaCl *Entregar os gráficos em papel separado. Observações: Físico-Química Experimental FQE001 Exp. 05 2. Equipe B: Tensão superficial de soluções de surfactante. Tabela 2: Valores tensão superficial e ângulo de contato de soluções de SDS em diferentes concentrações. Concentração de SDS / g.mL-1 0 (água) Observações: / 10-3 N.m-1 Físico-Química Experimental FQE001 Exp. 05 Figura 3: Variação da tensão superficial de soluções salinas com a concentração de NaCl. Figura 4: Variação do logaritmo natural da tensão superficial (ln ) com a concentração de NaCl *Entregar os gráficos em papel separado. Observações: Físico-Química Experimental FQE001 Exp. 05 Tensão Superficial Pré-Laboratório Nome: 1. Explique o que são tensoativos e procure como eles são classificados. 2. Procure por tesoativos aniônicos, catiônicos e não-iônicos comerciais e indique onde são utilizados.