ADRIANA TAVARES LIRA Fornecimento Medicamentos

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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA BAHIA
Processo n º
Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA
Réu: MUNICÍPIO Y
SENTENÇA
Vistos etc.
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO BAHIA propôs a presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA, com pedido liminar, em defesa dos interesses de XXXXX, em face do
MUNICÍPIO Y. Sustenta que XXXX necessita fazer uso contínuo de três medicamentos,
CLOPIDOGREL 75 mg, SELOZOK 200 mg e CILOSTAZOL 100mg, por ser portador de doença
cardíaca, acrescentando que o assistido não possui condições financeiras de arcar com o custo da
medicação prescrita. Aduz que tentou solução na via administrativa, expedindo ofício à Secretaria
Municipal de Saúde, entretanto não logrou obter o medicamento almejado. Juntou procuração,
documentos pessoais e relatórios médicos às fls. 12/20.
Às fls. 22/27, decisão que deferiu a antecipação dos efeitos da tutela,
determinando-se ao requerido o fornecimento dos medicamentos descritos na petição inicial, sob
pena de multa diária de R$ 800,00, em caso de descumprimento.
Às fls. 33/44, comunicação da interposição de agravo de instrumento pelo
Município, contra a decisão liminar.
Às fls. 45, decisão deste juízo que manteve a liminar por seus próprios
fundamentos.
Às fls. 47/62, contestação enviada por fax, e original tempestivamente
juntada às fls. 63/70, acompanhada de documentos de fls. 71/121, onde a Procuradoria Geral do
Município arguiu, preliminarmente, inépcia da petição inicial por impossibilidade jurídica do
pedido, porquanto não caberia ao Poder Judiciário interferir na política pública de saúde de
responsabilidade do Chefe do Poder Executivo. Ainda preliminarmente, afirmou que não há
interesse de agir, uma vez que os medicamentos listados na petição inicial não fazem parte do
padrão de remédios fornecidos pelo SUS. Aduziu que é parte passiva ilegítima para a causa,
argumentando que o Estado da Bahia que deveria figurar no pólo passivo da demanda, conforme
portaria do SUS que relaciona o medicamento. Argumentou por fim, que o pedido viola o princípio
federativo e a cláusula da reserva do possível.
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Às fls. 121/129, decisão do relator que negou seguimento ao agravo de
instrumento, por manifesta improcedência, bem como acórdão que negou provimento ao agravo
regimental.
Às fls. 131/142, réplica à contestação apresentada pela parte autora,
acompanhada de fotografias para atestar as condições de saúde do paciente.
É o relatório. Decido.
Presentes os pressupostos de constituição e desenvolvimento válido e regular
do processo, bem como satisfeitas as condições da ação, e sendo a prova dos autos exclusivamente
documental, passo ao julgamento antecipado da lide, nos termos do art. 330, I, do CPC.
Inicialmente, verifico que as questões preliminares suscitadas se referem
eminentemente ao mérito da causa, motivo pelo qual serão a seguir devidamente analisadas.
A saúde é um direito fundamental de qualquer cidadão, de valor inestimável,
devendo ser prestado pelo Estado, conforme preceito contido no art. 196 da Carta Magna.
"Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado,
garantido mediante políticas sociais e econômicas que
visem à redução do risco de doença e de outros agravos e
ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para
sua promoção, proteção e recuperação. "
A Constituição da República ainda dispõe que:
Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios:
(...)
II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e
garantia das pessoas portadoras de deficiência.
A obrigação do fornecimento da medicação é pois, consectário constitucional
da garantia fundamental à saúde, direito social previsto no artigo 19.
Infraconstitucionalmente, dispõe a lei 8.080/90 a obrigatoriedade do Estado
através do Sistema Único de Saúde - SUS, em prover as medidas necessárias, inclusive
farmacêuticas, para proporcionar o acesso dos cidadãos a assistência à saúde (art. 6º, I, "d, do
dispositivo legal citado).
Assim, o cidadão que tem o seu direito à saúde preterido pelo ente
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encarregado de sua promoção, deve encontrar amparo judicial para a obtenção do bem da vida
almejado, já que o Estado, em todas as suas esferas de poder, deve assegurar o direito à vida e à
saúde, fornecendo gratuitamente o tratamento médico, que a família não tem condições de custear.
Não se trata, portanto, de interferência indevida do Judiciário na política
pública de saúde, como alegou a parte ré, mas sim de uma atuação garantidora dos direitos
fundamentais e concretizadora do princípio da dignidade da pessoa humana, função tipicamente
exercida pelo Poder Judiciário.
Privar o paciente dos medicamentos necessários e serviços médicos e
complementares especializados, implicará no risco concreto de morte, cabendo ao Poder Judiciário, como
concretizador dos direitos fundamentais, assegurar a proteção do direito à saúde e dignidade.
Registre-se que a responsabilidade entre os entes políticos é solidária, e
obriga igualmente União, Estados, Distrito Federal e Municípios, já que o Sistema Único de Saúde
é uno, orgânico e hierarquizado, no qual todos os entes federados possuem idênticas
responsabilidades, de forma que as ações podem ser proposta contra um, alguns ou todos eles, de
conformidade com o entendimento jurisprudencial pacificado (STJ, AgRg no Ag 886974 / SC, Rel.
Min. João Otávio Noronha, DJ 29/10/2007 p. 208; AgRg no Ag 961677 / SC, Rel. Min. Eliana
Calmon, DJe 11/06/2008).
Por outro lado, descabida é a alegação da reserva do possível, pois não se
pode transferir para o indivíduo que necessita do tratamento de saúde a responsabilidade pelos
entraves financeiros ou orçamentários do Poder Público, sobretudo quando está em questão o direito
à vida, bem maior, protegido constitucionalmente.
Ademais, a alegação do Município de ser medida mais “onerosa” em termos
financeiros, está desacompanhada de qualquer comprovação nos autos sobre a sua incapacidade
orçamentária.
Neste sentido, após análise da prova documental acostada aos autos,
sobretudo dos relatórios médicos de fls. 16/19, bem como das fotografias de fls. 140/142, verifico
que razão assiste à parte autora.
Conforme atesta o relatório de fls. 16, o paciente foi submetido a tratamento
cardíaco, além de cirurgia complexa, e é portador de síndrome progressiva. Ainda segundo o
relatório médico, a evolução da doença é agressiva e progressiva, com curso inexorável, sobrevindo
a morte acaso não ministre os medicamentos adequados.
Assim, restou comprovada a necessidade dos medicamentos para o paciente,
necessários ao restabelecimento da sua saúde, ante a debilidade do seu estado de saúde, aliada a sua
idade avançada.
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Cumpre pontuar, por fim, que os medicamentos em questão têm registro na
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), não se enquadrando, portanto, na categoria dos
medicamentos sem registro, off label ou experimentais.
Assim, verifica-se que o acionado não pode deixar de fornecer os
medicamentos necessários, prescritos por profissional com habilitação técnica, sob pena de
cometimento de flagrante ilegalidade.
Nesta linha de entendimento, os princípios da dignidade da pessoa humana,
da boa-fé objetiva, da segurança e da confiança devem preponderar, com o objetivo de proteger o
bem mais essencial, a vida.
Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO para,
confirmando a liminar deferida e tornando-a definitiva, DETERMINAR ao Município Y que
forneça os medicamentos CLOPIDOGREL 75 mg, SELOZOK 200 mg e CILOSTAZOL
100mg mensalmente ao paciente, sob pena de multa diária de R$ 800,00 (oitocentos reais), em
caso de descumprimento.
P.R.I.C
Município Y, 12 de novembro de 2015.
Adriana Tavares Lira
Juíza de Direito
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