XXV Encontro Nac. de Eng. de Produção – Porto Alegre, RS, Brasil, 29 out a 01 de nov de 2005 Preservação dos pontos de atração turística através da metodologia do cálculo de carga João Eduardo Di Pietro (UFSC) [email protected] João Eduardo Di Pietro Filho (UFSC) [email protected] Resumo Este trabalho tem como objetivo principal avaliar e melhorar a distribuição dos turistas no tempo e no espaço, proporcionando estadas mais longas, reduzindo o impacto ambiental e fazendo com que o visitante estimule o orgulho e o sentimento de propriedade junto as comunidades locais, enriquecendo sua experiência. Com isso aumenta-se a possibilidade deste turista retornar, promovendo uma maior consciência ecológica na população local e fazendo com que o visitante compreenda a importância da preservação da natureza. Palavras-chave: Capacidade de carga; desenvolvimento sustentável; turismo. 1. Introdução A determinação da Capacidade de Carga foi aplicada primeiramente na pecuária, visando saber se as pastagens eram suficientes para que o gado tivesse uma boa alimentação, e os pastos cresciam para alimentar o ciclo seguinte. Já nos anos 50, nos EUA, verificou-se uma grande demanda por áreas de conservação. Naquele momento, considerava-se apenas o visitante que o local poderia receber, mas nas décadas seguintes a preocupação com o desenvolvimento exagerado do turismo chegou a preocupar, e é até hoje amplamente divulgada pela mídia. A revista National Geographic citava que Acapulco seria destruída pelo próprio turismo. Nesse período as praias do Mediterrâneo recebiam um enorme número de turistas e, nessa mesma época, ocorreu o apogeu da caça predatória na África. Nos anos 80 e 90 houve uma revisão dos conceitos existentes, surgindo assim metodologias de controle de visitantes. O principio de capacidade de carga turística, que se refere ao conjunto de métodos e procedimentos criados para discutir as questões referentes à demanda turística e sua inserção sobre os recursos turísticos tornou-se, assim, importante. A metodologia Carrying Capacity (Capacidade de Carga) é apenas uma das propostas no campo da avaliação, monitoramento e manejo de visitantes. O manejo de visitantes, independentemente da metodologia empregada pelo planejador, é um instrumento do turismo moderno e sustentável e que tem como objetivos: − Com relação ao turista − Enriquecer a experiência − Aumentar a possibilidade de retorno; − Estimular gastos mais elevados; − Promover e fazer o visitante compreender a importância da conservação da natureza. Com relação ao local de destino − Distribuir melhor os turistas no tempo e no espaço; − Estimular estadas mais longas; ENEGEP 2005 ABEPRO 5011 XXV Encontro Nac. de Eng. de Produção – Porto Alegre, RS, Brasil, 29 out a 01 de nov de 2005 − Reduzir o impacto ambiental; − Estimular o orgulho e o sentimento de propriedade junto à comunidade local. 2. Capacidade de Carga O conceito de Capacidade de Carga é entendido como o equilíbrio entre as atividades econômicas em relação à área ou região e à ocupação humana ou ao nível de exploração que os recursos naturais podem suportar, assegurando a satisfação dos visitantes e o mínimo efeito sobre o meio ambiente. Estes são conceitos que pressupõem a conservação e não a proteção. São estabelecidos limites para o desenvolvimento de uma atividade turística equilibrada (LIMDBERG, DONALD E. HAWKINS, 2001). Ruchsmann (1997) entende a capacidade de carga de um recurso turístico como o número máximo de visitantes que uma área pode suportar, antes que ocorram alterações nos meios físico e social. Cerro (1993) conceitua capacidade de carga pela saturação do equipamento turístico, degradação do meio ambiente e pela diminuição da qualidade da experiência turística. Boullón (1994) define a Capacidade de Carga em: capacidade material, capacidade psicológica e capacidade ecológica. A capacidade material refere-se às condições da superfície da água ou da terra; a capacidade psicológica refere-se ao número de visitantes simultâneos que uma área pode acolher de modo satisfatório; a capacidade ecológica é medida pela quantidade de dias por ano, pelo número de visitantes simultâneos e pela rotatividade diária que uma área pode absorver, sem que se altere o seu equilíbrio ecológico. A medição da capacidade ecológica de uma área indicada para o aproveitamento turístico requer estudo de profissionais especializados, a fim de garantir a diluição de impactos ambientais decorrentes da exploração. Segundo Boullón (1994), mesmo abandonando a defesa da ecologia, deve haver controle no número máximo de pessoas que possam ocupar um espaço simultaneamente. É necessário ter presente que as vertentes ecológica e social do ambiente constituem os principais ativos do setor turístico regional, e que, se os limites de sustentabilidade forem ignorados, as atividades turísticas poderão estar comprometidas, e o próprio destino seriamente desvalorizado. O conhecimento e respeito pelos limiares de utilização, em termos de capacidade de carga dos recursos e das infra-estruturas, é condição fundamental para a manutenção das condições propícias às atividades turísticas. Nesta perspectiva, o Plano de Ordenamento Turístico (POT) e os Planos de Ordenamento da Orla Costeira (POOC), em elaboração, deverão constituir instrumentos importantes para equacionar os problemas antevistos com o crescimento da oferta turística na região e apontar soluções. Assim, é fundamental implementar uma política de desenvolvimento turístico que minimize o turismo de "massas" e a conseqüente degradação do destino, definindo os destinos "das praias" e “as trilhas”, em conformidade com as exigências de um desenvolvimento sustentável, melhorando a qualidade do produto turístico regional e a sua competitividade. Como já foi citado anteriormente, todo e qualquer espaço relacionado ao desenvolvimento do turismo deve ser conciliado à proteção do meio ambiente, pois a questão “natureza” é fonte principal do produto turístico. Por isso, o tema altamente discutido nos meios acadêmicos é a sustentabilidade. ENEGEP 2005 ABEPRO 5012 XXV Encontro Nac. de Eng. de Produção – Porto Alegre, RS, Brasil, 29 out a 01 de nov de 2005 Esta discussão não condiz somente ao meio ambiente natural, mas a todos aqueles fatores que de certa forma possam alterar seu estado natural, em primeira instância; a sustentabilidade se relaciona muito com o respeito por aquilo que se usufrui, e depende da preservação da viabilidade de seus recursos de base, e do equilíbrio entre os interesses econômicos que o turismo estimula. Em suma, o desenvolvimento sustentável deve ter alta prioridade no planejamento para que gerações futuras possam aproveitar o mesmo recurso que o turismo proporcionou a tempos atrás. O planejamento turístico deve também, ser conciliado a segmentos afins do meio, e deve trabalhar de forma integrada com o poder público e população autóctone, para que obtenha o resultado pretendido. Segundo Beni (1987), esta integração também considera o conjuntos de relações ambientais que envolvem os subsistemas ecológico, social, econômico e cultural; a organização estrutural da comunidade e as ações operacionais que envolvem o mercado, bem como oferta e a demanda, optando sempre pelo melhor modo de distribuição. O planejamento turístico deve, da mesma forma considerar as características e singularidades regionais, a fim de adotar medidas apropriadas a cada caso. No turismo, o plano de desenvolvimento constitui o instrumento fundamental na determinação e seleção das prioridades para a evolução harmoniosa da atividade, determinando suas dimensões ideais, para que, a partir daí, possa-se estimular, regular ou restringir, sua evolução, levando em consideração também o ciclo de vida da destinação em estudo e o perfil psicográfico do turista que se pretende atingir. No entanto, sua maior importância está relacionada à aceitação e participação da comunidade, que deverá buscar o turismo não somente como fonte de renda temporária, como acontece em muitas cidades litorâneas desse nosso país, mas tornar a atividade um novo conceito de economia, cultura, lazer e progresso. Deve ser bom e duradouro, trabalhar com ética e responsabilidade, buscar profissionais capacitados, e inserir o planejamento em todos os setores da atividade. “O turismo somente será bom para o município se antes for bom para a comunidade” (BENI 2001). 3. Metodologia A proposta mais difundida é a da Capacidade de Carga de Miguel Cifuentes. Este procedimento foi aplicado em 1984, no Parque Nacional de Galápagos, no Equador, como parte da revisão do Plano de Manejo do Parque. Em 1990, o procedimento metodológico foi revisado na Reserva Biológica Carara, na Costa Rica, e deu origem ao clássico manual “Determinación de La Capacidade de Carga Turística em áreas protegidas”, de 1992, e é hoje a referência para a aplicação da metodologia em atrativos naturais, podendo ser adaptada para qualquer atrativo, seja ele protegido por lei ou não. Este manual indica que a metodologia aplicada é a mais fácil, compreensível e útil para a determinação da Capacidade de Carga Turística, considerando que os atrativos mais belos do mundo estão localizados nos países em desenvolvimento, e que nestes locais há falta de pessoal qualificado e falta de tecnologia para estudos mais complexos. O autor ressalta que a Capacidade de Carga Turística não tem um fim em si mesma, e não é a solução dos problemas de visitação a uma unidade de conservação. É uma ferramenta de planejamento que sustenta e requer decisões de manejo. Este calculo deve se basear nos objetivos da unidade de conservação, quando for o caso, e na legislação local em vigor, e cada um dos locais deve ter sua própria Capacidade de Carga Turística calculada. ENEGEP 2005 ABEPRO 5013 XXV Encontro Nac. de Eng. de Produção – Porto Alegre, RS, Brasil, 29 out a 01 de nov de 2005 4. Cálculo de Capacidade de Carga Turística No cálculo da Capacidade de Carga Turística deve-se considerar, caso existam, as “variáveis criticas”, isto é, que possam restringir significativamente o potencial de uso da área. Escassez de água, inexistência de pontos de apoio, precariedade do serviço de salvamento, falta de estacionamento e outras variáveis semelhantes devem ser avaliadas. A Capacidade de Carga em si é definida em três níveis: − Capacidade de Carga Física (CCF) que é uma relação simples entre espaço e necessidade de espaço por pessoa; − Capacidade de Carga Real (CCR), em que a CCF é submetida a Fatores de Correção (FC) particulares a cada local, de acordo com suas características; − Capacidade de Carga Efetiva (CCE), que restringe a CCR em função da capacidade de manejo da área. A Capacidade de Carga Física (CCF), interpretada como o limite máximo de visitas que pode acontecer em uma área em um tempo determinado, é expressa pela fórmula CCF = ST TT ⋅ SV TV sendo: ST – Superfície total da área SV – Superfície ocupada por um visitante TT – Tempo total diário de abertura da área à visitação TV – Tempo requerido para uma visita A Capacidade de Carga Real é obtida através da multiplicação da CCF pelos diferentes Fatores de Correção considerados, conforme a seguir: CCR = CCF ⋅ FC1 ⋅ FC 2 ⋅ ... ⋅ FCn Os Fatores de Correção podem ser biofísicos, ambientais ou de manejo. Quanto maior o numero de FC considerados, maior a restrição imposta à Capacidade de Carga. Por esse motivo, deve-se buscar selecionar apenas aqueles fatores que realmente implicam em uma redução da visitação. São considerados entre quatro a sete FC. Os mais usados são: − Fator de Correção Social (FCsoc) Busca proporcionar uma experiência de qualidade ao visitante, oferecendo não apenas o espaço efetivamente ocupado, mas também aquele que conduz a um conforto desejado: FC SOC = SV SC sendo: SV – Superfície ocupada por um visitante SC – Superfície que confere o conforto desejado ao visitante − Fator de Erosão (FCero) Fator de Correção que funciona como indicador de fragilidade ambiental. Considerar áreas sujeitas a este fenômeno: ENEGEP 2005 ABEPRO 5014 XXV Encontro Nac. de Eng. de Produção – Porto Alegre, RS, Brasil, 29 out a 01 de nov de 2005 FC ero = 1 − SE ST sendo: SE – Superfície erodida ou sujeita à erosão ST – Superfície total da área − Fator de Alagamento (FCala) Outro fator que indica a fragilidade ambiental. Também são consideradas as áreas com evidências de alagamento e/ou sujeitas a esse tipo de ocorrência: FC ala = 1 − SA ST sendo: SA – Superfície alagada ou sujeita ao alagamento ST – Superfície total da área − Fator de Acessibilidade (FCace) Mede o grau de dificuldade que teriam os visitantes para se deslocarem na área. É dado pela inclinação (acima de 20% são consideradas de difícil acesso multiplicadas por 1,5, de 10% e 20% são consideradas medianas sendo assim ponderadas por 1). As inclinações abaixo de 10% são desconsideradas: FC ace = 1 − 1,5 SD + SM ST sendo: SD – Superfície de difícil acesso (inclinação superior a 20%) SD – Superfície de dificuldade de acesso mediana (inclinação entre 10% e 20%) ST – Superfície total da área − Fator de precipitação (FCpre) É um fator que impede a visitação normal, pois a grande maioria das pessoas não está disposta a visitar ambientes naturais sob chuva. Deve-se considerar a média de horas de chuva diária nos meses em que a precipitação é significativa: FC pre = 1 − TP TA sendo: TP – Tempo total anual de precipitação nos períodos de visitação aberta TA – Tempo total anual de possível abertura da área à visitação − Fator de Insolação (FCins) Em alguns locais, o brilho solar é demasiadamente forte em algumas horas do dia, restringindo a visitação. Aplicado somente a superfícies descobertas: FC ins = 1 − TI SS ⋅ TA ST sendo: TI – Tempo total anual de insolação excessiva nos períodos de visitação aberta TA – Tempo total anual de possível abertura da área à visitação SS – Superfície exposta ao Sol ST – Superfície total da área ENEGEP 2005 ABEPRO 5015 XXV Encontro Nac. de Eng. de Produção – Porto Alegre, RS, Brasil, 29 out a 01 de nov de 2005 − Fator de fechamento temporário (FCfec) Fechamentos da visitação para manutenção da área por períodos de reprodução de animais. Devem ser considerados como fatores de correção: FC fec = 1 − TF TA sendo: TF – Tempo total anual de fechamentos temporários nas visitações TA – Tempo total anual de possível abertura da área à visitação − Fator de Capacidade de Manejo A Capacidade de Carga Efetiva é obtida através da multiplicação da CCR pelo Fator de Capacidade de Manejo (FM). CCE = CCR ⋅ FM 5. Conclusão A proposta apresentada para determinação da Capacidade de Carga Turística é hoje um referencial, em todo mundo, para se buscar a preservação, tanto do patrimônio natural como do histórico. Com esta metodologia aplicada, pode-se tomar medidas com relação à proteção do patrimônio ambiental, começando com campanhas de conscientização da população, abrangendo principalmente os municípios, a fim de se obter um consenso nacional sobre a importância do patrimônio a ser protegido. Sabe-se também que a Capacidade de Carga Turística não tem um fim em si mesma, e não é a solução dos problemas de visitação a uma unidade de conservação, mas, com ela, pode-se não somente atrair turistas aficcionados, mas também visitantes que não se caracterizam como turistas convencionais e que não buscam as altas temporadas, mas sim o sossego das baixas temporadas, onde o objetivo seja somente estar em contato direto com a natureza, e não com os problemas ocasionados pelos outros turistas. Este calculo deve se basear nos objetivos da unidade de conservação, alem de ser uma ferramenta de planejamento que sustenta e requer decisões de manejo. Quando isso acontecer, a legislação local em vigor deverá ter sua própria Capacidade de Carga Turística calculada. É preciso despertar a consciência ecológica para que as futuras gerações possam usufruir e preservar nossas belezas naturais. 6. Referências Bibliográficas AGENDA 21. Agenda 21 Florianópolis. Disponível em http://www.florianopolis.sc.gov.br, acesso em 16 junho 2003. AGENDA 21. Meio ambiente http://www.florianopolis.sc.gov.br. quem faz é a gente. Prefeitura Municipal de Florianópolis, DI PIETRO, J.E.F. Ilha do Campeche: A importância do Estudo de Capacidade de Carga. Florianópolis, Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção) – Programa de pós-graduação em Engenharia de Produção, UFSC 2003. INSTITUTO TEOROS, Curso de Capacidade de Carga Turística, 2004. RUSCHMANN, D., Turismo e Planejamento Sustentável : a proteção do meio ambiente. Campinas, SP: Papirus, 2001 THEOBOLD, W. Global tourism: the next decad. Oxford: B. Heinemann, 2001 ENEGEP 2005 ABEPRO 5016